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O Deus Que Chama

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2.1 DECLARAÇÕES SOBRE A ATIVIDADE DE DEUS

2.1.7 O Deus Que Chama

Há uma ação de Deus que revela a sua interação com o ser humano em si- tuações condizentes ao serviço e à fidelidade à sua vontade, expressada por kale,w e outros verbos a seguir analisados. No exercício de sua vontade, Deus interage com o ser humano no sentido de chamá-lo para uma missão. Conforme visto nas declarações sobre o seu poder, Deus possui as condições de fazer valer a sua von- tade, independente das condições humanas. Neste presente tópico, vê-se o registro da ação divina, também fazendo valer a sua vontade, mas aceitando o ser humano como co-participante.

2.1.7.1 Deus chama sacerdotes

Em 5,1 o autor afirma: Pa/j ga.r avrciereu.j evx avnqrw,pwn lambano,menoj u`pe.r avn- qrw,pwn kaqi,statai ta. pro.j to.n qeo,n( i[na prosfe,rh| dw/ra, te kai. qusi,aj u`pe.r a`martiw/n “Porque todo sumo sacerdote, sendo tomado dentre os homens, é constituído nas coisas concernentes a Deus, a favor dos homens, para oferecer tanto dons como sacrifícios pelos pecados”. Há três ações expressas: lambano,menoj kaqi,statai e prosfe,rh|. Precedido por i[na, prosfe,rh| é o subjuntivo final que demonstra a ação sa- cerdotal que se espera. A atenção recai sobre o particípio presente passivo lamba- no,menoj e sobre o presente passivo do indicativo kaqi,statai. A inquirição importante para este tópico é: quem é o agente da passiva? Diz o texto que todo sumo sacerdo- te é tomado e é constituído, subentendendo-se a nomeação ou chamamento da or- dem de Arão. Westcott (1902/1950, p. 118) dá forte ênfase à origem humana do su- mo sacerdote, mas pode-se aceitar que o agente de lambano,menoj e kaqi,statai é Deus. Isso é mais evidente na declaração em 5,4, quando o autor escreve: kai. ouvc e`autw/| tij lamba,nei th.n timh.n avlla. kalou,menoj u`po. tou/ qeou/ kaqw,sper kai. VAarw,n “Nin- guém, pois, toma esta honra para si mesmo, senão quando chamado por Deus, co- mo aconteceu com Arão”. Sobre essas declarações, Guthrie (1984, p. 118) diz que “como o verbo é passivo, é subentendido que a nomeação do sumo sacerdote é feita por Deus. A ordem arônica não fez disposições para a eleição democrática, mas,

somente para nomeações teocráticas autoritárias”, referindo-se a kaqi,statai, Guthrie (1984, p. 120) é de opinião que

um fator importantíssimo no ofício do sumo sacerdote é a sua origem. Era uma nomeação divina e não uma auto-nomeação ou uma nomeação huma- na: „Ninguém, pois, toma essa honra para si mesmo‟. O caso de Arão agora é mencionado especificamente, porque foi chamado por Deus. A chamada divina é um fator importante no Novo Testamento como era no Antigo Tes- tamento, porque chama a atenção à iniciativa divina. Quando a compara- ção é feita com o nosso grande Sumo Sacerdote, fica evidente que Ele também foi nomeado para Seu ofício. Somos lembrados de que Ele reco- nhecia que Deus lhe deu a obra que viera realizar (cf. Jo 17:4).

Desta forma, a atividade divina na tomada ou chamamento do sacerdote é uma demonstração de seu interesse pessoal no culto que lhe é ofertado. Não se tra- ta tão somente de Deus estar impondo obrigações sobre aqueles que são chama- dos. Há uma finalidade no chamamento procedente de Deus: aquele que é chamado deve retornar a Deus com oferendas (5,1.3.7; 7,27; 8,3; 9,7.9.14.25.28; 10,1.2.8.11.12; 11,4.17).12 Esses textos fazem separação entre oferendas adequa- das ou não. O que se ratifica, porém, é a ação divina na chamada sacerdotal: ele chama sacerdotes para a oferenda de sacrifícios, sendo Jesus o maior dentre os sacerdotes já chamados, pertencente a uma outra ordem sacerdotal que se impõe sobre a ordem de Arão, denominado quase pleonasticamente de avrciere,a me,gan “grande sumo sacerdote” (4,14).

2.1.7.2 Deus chama outras pessoas

Diferentes daqueles que são chamados para a função sacerdotal, há outros que recebem de Deus o chamamento e, por tal atitude divina, são denominados de oi` keklhme,noi “aqueles que têm sido chamados” (9,15). É possível que, para o autor, esses “chamados” tenham a sua origem em Abraão, que de igual modo foi chamado por Deus (11,8). Se por um lado os sacerdotes foram chamados para apresentarem oferendas a Deus, dentre os quais somente Cristo pode apresentar o verdadeiro sa- crifício, por outro lado os que têm crido em Cristo são chamados para receberem a promessa da herança eterna. O particípio atributivo no perfeito passivo ratifica duas verdades: há um agente para o chamamento, que é Deus, e o perfeito pode indicar a presente condição dos que crêem. Moffatt (1924/1979, p. 127) lembra que para ser chamado era necessário receber a graça de Deus como recebera Abraão, condição

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Em 12,7 prosfe,rw possui um sentido diferente destes, mais no sentido de “tratar um assunto com”. Mesmo assim, Deus é o agente.

essa que, de fato, posiciona os que crêem em Cristo sob o benefício de Deus, visto que têm acesso ao santíssimo lugar (10,19).

Ainda assim, inquire-se: esse chamamento de Deus possui caráter univer- sal? O autor não parece preocupado em incluir outros beneficiários do chamamento divino, sem que isso o caracterize como averso a não-judeus. De fato, não há em Hebreus ocorrência de ta. e;qnh “gentios” e nas treze ocorrências de lao,j “povo”, esse vocábulo se refere aos judeus. A ausência de menções sobre benefícios de Deus aos gentios pode ser explicada pela própria limitação que o autor impõe à sua obra, preocupado que está em se dirigir a destinatários que conhecem e foram formados sob a orientação do sistema sacrificial levítico. Contudo, a despeito dessa caracterís- tica, a Epístola faz parte de uma tradição que inclui Timóteo (possivelmente o mes- mo apresentado em At 16,1, de pai grego e mãe judia-cristã) como conhecido de tal comunidade e inclui também possíveis não-judeus, como os italianos (13,23.24). Em decorrência, reconhece-se aqui a controvérsia sobre a autoria de Hb 13. Segue-se aqui a posição de Kümmel (1982, p. 521), que conclui as suas considerações sobre o texto de Hebreus afirmando que “não há, pois, razão para duvidar de que 1,1 - 13,25, em sua origem, formassem um só texto”. De modo que é possível que o autor não rejeitasse alguma inclusão dos gentios como participantes dos denominados “chamados”. Sobre eles também a ação do chamamento divino também poderia ser efetivada.

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