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JESUS É ETERNO

No documento Download/Open (páginas 133-135)

Em Hebreus, assim como há declarações sobre a eternidade de Deus, de igual modo há declarações sobre a eternidade do Filho. Em 2.4.1, na análise de aivw,n e aivw,nioj, apresentou-se as diversas implicações dessas expressões de cunho tem- poral. Aquelas implicações estão sendo assumidas aqui, pois aparentemente o autor concebe a pessoa de Jesus como também possuidora dessa condição eternal, que pode ser uma maneira de evidenciar a divindade do Filho.

Ao atribuir a Jesus as palavras de Sl 40,6-8, assume o autor que Jesus já está em atividade muito antes de sua encarnação (10,5-7). A primeira declaração sobre essa eternidade atribuída a Jesus se encontra em 1,8, na citação de Sl 45,6.7, onde o autor credita as palavras sobre a eternidade do trono de Deus como se refe- rindo ao Filho (~O qro,noj sou( o` qeo,j( eivj to.n aivw/na tou/ aivw/noj “o teu trono, ó Deus, é para todo o sempre”). O contexto do Salmo aponta essa entronização para o rei de Israel, ali chamado de אלוהים “Elohim”. Mas, em Hebreus, o autor aponta para o Filho essa entronização, que se trata de uma entronização celestial e não terrena, sob duas fortes ênfases: o Filho tem um trono e assume-se aqui que o` qeo,j é um vocativo ao Filho creditado. Conquanto o` qeo,j possa ser usado em diferentes situações (Jo 10,34.35), o autor vincula a designação ao Filho. Mas deve-se notar que o aspecto da divindade é secundário no texto. A essência é a declaração de eternidade do tro- no. Essa eternidade não seria possível ao rei de Israel, mas é possível ao Filho. Desta forma, tanto Deus como o Filho são eternos, conforme as implicações de aivw,nioj no tópico 2.4.1.

Não apenas o trono do Filho, invocado como Deus, subsiste pelos séculos dos séculos. O autor também cita Sl 102,25-27 em 1,10-12. Viu-se que 1,10 aponta para a condição do Filho como criador. 1,11 faz declaração sobre a eternidade do Filho no uso da expressão su. de. diame,neij “tu, porém, permaneces”. Guthrie (1984, p. 73) vê nessa declaração uma possível alusão à imutabilidade do Filho. É possível que diame,nw seja melhor compreendido em termos temporais, em contraste com kai. pa,ntej w`j i`ma,tion palaiwqh,sontai “todos eles envelhecerão qual veste”. Mas esse aspecto temporal pode ser associado ao aspecto da estabilidade inabalável de Je-

sus. Neste mesmo Salmo, a citação termina com a declaração sobre a permanência constante e eterna de Jesus: su. de. o` auvto.j ei= kai. ta. e;th sou ouvk evklei,yousin “tu, po- rém, és o mesmo, e os teus anos jamais terão fim” (1,12).

De fato, pode-se pensar que essa concepção sobre a eternidade do Filho é uma das preocupações mais fortes do autor. Porque é eterno, as obras de Jesus são igualmente eternas (5,9; 9,12.15), dentre as quais pode-se também incluir a diaqh,khj aivwni,ou “aliança eterna” (13,20). O Filho é constituído sacerdote para sempre (eivj to.n aivw/na) segundo a ordem de Melquisedeque (5,6; 6,20; 7,17.21.24); é também sacer- dote para sempre (eivj to.n aivw/na) aperfeiçoado (7,28). Porém, é possível que as duas declarações que mais evidenciam a eternidade de Jesus, excluindo-se as citações do Antigo Testamento, sejam as de 9,14 e 13,8. Em 9,14 o autor afirma: po,sw| ma/llon to. ai-ma tou/ cristou/( o]j dia. pneu,matoj aivwni,ou e`auto.n prosh,negken a;mwmon tw/| qew/| “muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, a si mesmo se ofereceu sem má- cula a Deus”. Destaca-se aqui que dia. pneu,matoj aivwni,ou “pelo Espírito eterno” é des- provido de artigo e, conforme salienta Guthrie (1984, p. 177-178) “deve primariamen- te referir-se ao espírito de Jesus em comparação com a Sua carne”, sem que se desconsidere a possibilidade de ser uma referência ao Espírito Santo. Mesmo que gramaticalmente haja indefinição sobre a quem dia. pneu,matoj aivwni,ou se refere, al- guns estudiosos o ligam ao espírito eterno de Jesus. Neste caso, o sacrifício de Cris- to transcende a dimensão temporária do sacrifício levítico, podendo-se ver o con- traste entre carne (9,13) e espírito. Bruce (apud LIGHTFOOT, 1981, p. 208) afirma que “o ato realizado por Jesus ao oferecer-se a Si mesmo pode, como evento histó- rico, tornar-se antiquado com o passar dos séculos; mas o espírito em que foi reali- zado esse ato jamais se tornará uma coisa do passado”.

De igual modo, em 13,8 há uma ratificação da condição de Jesus: VIhsou/j Cristo.j evcqe.j kai. sh,meron o` auvto.j kai. eivj tou.j aivw/naj “Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre”. A fórmula evcqe.j kai. sh,meron “ontem e hoje” ocorre no Antigo Testamento (cf. Ex 5,14; 2Sm 15,20; 1Mac 9,44) com a idéia geral de continu- idade. A idéia “eternamente” se encontra no Novo Testamento (cf. Mt 6,13; Lc 1,33; Rm 1,25, 9,5, 11,36, 16,27; 2Co 11,31; Fl 4,20; Jd 25; Hb 13,21) como expressão comum para a designação divina. Attridge (1989, p. 392-393) afirma que “a combi- nação dessas expressões adverbiais numa fórmula tripartite é paralela a expressões para a completude do tempo encontradas em várias tradições religiosas da antigui-

dade”, mas acrescenta que em Hebreus, dentro da perspectiva de imitação posta em 13,7,

a ênfase é claramente sobre a eterna “semelhança” de Cristo. Porque Jesus Cristo é uma parte integral do eterno domínio divino que está inalterado, ele é agora, para os destinatários cristãos, o firme fundamento para as suas vi- das e doutrinas comunitárias.

Sendo assim, a declaração que expressa a eternidade e permanência de Jesus é, à semelhança do que se concebe sobre Deus, uma concepção de eterni- dade, com necessárias implicações concretas na vida da comunidade de fé.

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