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Deveres do proprietário de imóvel

2. PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL

2.1 Dever de preservação do meio ambiente

2.2.1 Deveres do proprietário de imóvel

Conforme já exposto neste estudo, a propriedade deve atender à sua função social (de acordo com a Constituição Federal) e, neste diapasão, esta função social significa, também, uma função ambiental. Desta forma, as propriedades urbanas ou rurais devem zelar por um dos princípios do Direito Ambiental: o princípio da função socioambiental da propriedade.

A observância do princípio da função social e ambiental da propriedade é obrigação propter rem que se prende ao titular do direito real do imóvel. Não importa, portanto, a alegação de que o atual proprietário do imóvel não é responsável pela ocorrência anterior do dano ambiental (MACHADO, 2014).

O exercício do direito à propriedade não mais deve ser considerado sob o ponto de vista individual: é preciso pensar na coletividade. Assim, o proprietário do imóvel possui alguns deveres perante a sociedade, no sentido de auxiliar na promoção da preservação ambiental e na diminuição da degradação dos recursos naturais, sob todas as suas formas.

Cabe ressaltar que “a função ambiental dinamiza o uso da propriedade, aperfeiçoando-a mediante estimulação do proprietário à preservação e recuperação dos bens ambientais sob seu domínio” (MACHADO, 2014). Significa, portanto, que o proprietário de um imóvel deve considerar o impacto de seu uso perante a

coletividade e o meio ambiente, bem comum a todos, como bem coloca o Código Civil, em seu artigo 1.228, §1º:

O direito de propriedade deve ser exercido conforme os fins econômicos e sociais e por forma a que restem preservados, de acordo com a lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, assim como evitada a poluição do ar e das águas (BRASIL, 2016).

Deste artigo, é possível perceber que o legislador elencou algumas áreas específicas, relacionadas à preservação do meio ambiente: fauna e flora, belezas naturais, equilíbrio do meio ambiente, ar e águas. Quando da utilização da propriedade, o proprietário deve atentar para que este uso não cause prejuízos ao meio ambiente, sob os aspectos citados no supracitado artigo, além de outros aspectos citados no ordenamento jurídico brasileiro.

Os municípios devem construir suas próprias bases relacionadas à função social da propriedade e, no caso da zona urbana, ao crescimento das cidades de maneira ordenada. Assim, o artigo 182 da Constituição Federal dispõe que:

A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (BRASIL, 2015).

Neste sentido, os municípios devem possuir seu próprio Plano Diretor, que se trata de um documento oficial elaborado com o intuito de promover o crescimento ordenado dos territórios municipais, tanto na área urbana quanto rural. Neste sentido, a Constituição Federal, no artigo 182, § 2º, coloca que “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”.

Sobre a propriedade rural, a função social também é colocada pela Constituição Federal, em seu artigo 186:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores

(BRASIL, 2015).

É possível perceber que a função socioambiental da propriedade rural contempla aspectos relacionados ao uso racional do imóvel, à utilização ad equada e conforme a lei da mão de obra, à utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente em que está inserida, entre outros aspectos que, embora não estejam explícitos neste dispositivo constitucional, devem ser observados pelos proprietários.

Um aspecto bastante relevante e que deve ser considerado pelos proprietários de imóveis refere-se às denominadas APPs (Áreas de Preservação Permanente). Cabe aos proprietários a sua preservação, conforme disposto no artigo 7º do Código Florestal: “A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado” (BRASIL, 2015). Para fins de delimitação do que é, de fato, uma APP, o Código Florestal elenca os fatores que caracterizam este tipo de área.

Outro fator também elencado pelo Código Florestal como dever dos proprietários refere-se à reserva legal, definida no artigo 3°, III, como:

Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa (BRASIL, 2015).

Desta forma, cabe ao proprietário a observância do manejo sustentável da propriedade rural, sendo responsável pela manutenção da vegetação nativa e pela conservação da biodiversidade natural existente na área em que o imóvel se encontra. Importante ressaltar que não existe previsão, no ordenamento jurídico brasileiro, de reserva legal relacionada aos imóveis da área urbana.

Em relação ao proprietário urbano, a legislação brasileira é bastante escassa. Não há grandes responsabilizações quanto ao uso dos imóveis urbanos, conforme bem coloca Cherubini (2014), que ressalta alguns aspectos importantes: a produção de resíduos sólidos e a possível poluição do solo através do mau uso de pátios ou terrenos, por exemplo.

Na área urbana, a produção de resíduos sólidos chega a proporções alarmantes. O descarte destes resíduos se dá em áreas específicas, denominadas aterros sanitários, mas que, em virtude de suas características, podem provocar grandes prejuízos ao meio ambiente nas áreas em que se encontram instalados. Desta forma, há que se ressaltar a relevância e urgência de políticas públicas ou legislações mais eficientes, no sentido de conscientizar a população (proprietários ou locatários de imóveis) quanto à necessidade de diminuição na produção de vários tipos de resíduos.

Está posto o desafio urgente: a sociedade deve agir na mudança radical de seus processos produtivos e de seus padrões de consumo. É preciso mudar os rumos do atual modelo de desenvolvimento e buscar um novo modelo civilizatório capaz de alcançar a utopia da sustentabilidade (CORRÊA; BACKES, 2006, p. 111).

O mau uso de pátios ou terrenos, por sua vez, implica em situações que envolvem desde a disposição de materiais que possam contaminar o solo quanto à inobservância de manutenção e limpeza em terrenos baldios, por exemplo. Sobre os terrenos baldios, muitos municípios adotam um Código de Posturas, que depende de uma fiscalização ativa e que, atualmente, demonstra-se deficitária em muitas situações.

A função social da propriedade implica, inclusive, na aplicação de sanções caso não seja essencialmente cumprida, conforme os dispositivos constantes na CF/88, no § 4º do artigo 182. Dentre as situações, a Constituição Federal coloca a possibilidade de desapropriação de imóvel urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, mediante indenização através de títulos da dívida pública. Outra situação a ser considerada é a possibilidade de usucapião urbano ou concessão de uso de imóveis que não estejam de acordo com as exigências do Plano Diretor.

A propriedade rural também pode ser desapropriada caso esteja em desacordo com os fins sociais, conforme dispõe o artigo 184 da CF/88. Percebe-se, portanto, que o proprietário do imóvel, tanto urbano quanto rural, deve atentar para este princípio da função social e, mais modernamente, função socioambiental da propriedade, sob pena de sofrer sanções específicas quanto ao seu direito de posse e propriedade, além de outras situações já mencionadas neste estudo, concernentes à necessidade de preservação do meio ambiente e reparação de eventuais danos causados.

Isto posto, concebe-se que:

Há de se estabelecer um equilíbrio de deveres para com os proprietários urbanos, cobrando-se também destes mais deveres de proteção ao meio ambiente. Do contrário, as limitações ao exercício de propriedade rural podem funcionar como fatores estimulantes do êxodo rural, com migração do pequeno agricultor para as áreas de vulnerabilidade na grande cidade. Porque, a continuar o quadro de fiscalização e punição atual, o grande produtor continuará explorando a propriedade rural, nem sempre com observância das limitações ambientais, confiante na impunidade e mais preocupado com o resultado da produção atual do que com a entrega do patrimônio ambiental às futuras gerações (CHERUBINI, 2014).

É preciso, portanto, que se instaure certa igualdade e equidade entre os deveres dos proprietários de imóveis urbanos e rurais. O cuidado com o meio ambiente e a sua preservação, tendo em vista as gerações vindouras, deve ser realizado por todos, individual e coletivamente, buscando-se a manutenção da qualidade de vida e a garantia de um futuro sustentável.

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