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4 RESULTADOS

4.2 UMA VISÃO COMPARATIVA DOS CASOS

4.2.6 Dimensão ambiental do desenvolvimento

Como a Fazenda Progresso ainda não integra programas que promovem a dimensão social do desenvolvimento, essa organização também não realiza ações que promovem a dimensão ambiental do desenvolvimento. Nesse sentido, três aspectos estreitamente associados ao meio ambiente ganham importância nas atividades da Fazenda Progresso: o uso de sementes transgênicas, a monocultura e o uso de agrotóxicos. Buscando melhoria na adequação às condições de solo e clima locais, essa empresa desenvolve sementes transgênicas para o cultivo de soja, que são comercializadas para outros estabelecimentos produtores. Essas atividades revelam o posicionamento favorável da organização com relação ao uso desse tipo de semente, muito embora, a Fazenda Progresso não realizasse o desenvolvimento e comercialização de sementes transgênicas específicas para cultivos de algodão até o encerramento deste estudo. O uso de sementes transgênicas tem implicações negativas na dimensão ambiental, pois tendem a homogeneizar os produtos, diminuindo a diversidade em suas características e a biodiversidade local.

A agricultura empresarial, como a realizada pela Fazenda Progresso, é caracterizada pelo sistema de monocultura, que causa impactos negativos ao meio ambiente, uma vez que reduzem os ecossistemas naturais e a sua biodiversidade a sistemas carentes em diversidade biológica. No caso da Fazenda Progresso, a monocultura extensiva ocupa áreas do cerrado nordestino. Isso incorre em implicações negativas ao meio ambiente, pois a monocultura nos sistemas de agricultura empresarial é um meio de obter produtividade e as vantagens da economia de escala. As decisões produtivas nos sistemas de agricultura empresarial são guiadas buscando elevar a produtividade dos cultivos, fazendo uso de produtos agroquímicos e de processos danosos à dimensão

ambiental do desenvolvimento. Os efeitos prejudiciais ao meio ambiente decorrentes do uso de agrotóxicos nos cultivos têm sido acentuados pelo aumento no uso desses produtos (PORTO; SOARES, 2012). Em contrapartida, o sistema de produção no caso da APASPI é baseado nos fundamentos da agroecologia, que são contrários ao uso de agrotóxicos e prezam pela conservação dos ecossistemas. Os fundamentos da agroecologia são respeitados em maior ou menor grau na prática da agricultura orgânica dependendo do contexto em que acontece (ASSIS; ROMEIRO, 2002). A APASPI prioriza que o processo implementado na produção de algodão seja o mais próximo possível dos princípios da agroecologia, promovendo benefícios na dimensão ambiental do desenvolvimento.

Recentemente, a cotonicultura empresarial está despertando interesses em algumas questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável na cadeia produtiva do algodão. Esses interesses têm sido difundidos no âmbito da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (ABRAPA) e nas organizações que a compõem em nível estadual como a Associação Piauiense de Produtores de Algodão (APIPA), que abriga a Fazenda Progresso.A necessidade de aproximar a cotonicultura empresarial dos preceitos da sustentabilidade é apontada em uma análise recente da ABRAPA sobre os fatores críticos da cadeia produtiva do algodão no país. Nesse sentido, a ABRAPA tem dado suporte, nos últimos anos, para que seus associados sejam licenciados pelo programa Better Cotton Initiative (BCI). Esse programa é resultado de um movimento protagonizado por organizações interessadas em estabelecer padrões de sustentabilidade para o cultivo de grãos (DAVIRON; VAGNERON, 2011).

Em 2012, a ABRAPA criou o programa Algodão Brasileiro Responsável (ABR) com a finalidade de estimular a produção de algodão nos padrões de sustentabilidade determinados pelo BCI, que promovem a dimensão ambiental do desenvolvimento ao assegurar a destinação adequado dos resíduos da produção, a preservação dos cursos de água e das reservas legais, a recuperação das áreas degradadas, a utilização de práticas de manejo e o cumprimento da legislação ambiental. Os principais compradores de algodão no comércio internacional têm exigido que seus fornecedores sejam licenciados pela BCI, assegurando que o produto adquirido foi produzido de maneira a promover as dimensões social e ambiental do desenvolvimento, além da dimensão econômica. Os compradores em circuitos de comércio justo também fazem exigências relacionadas à certificação dos produtos na cotonicultura orgânica. Essas empresas determinam que o produto seja certificado como orgânico por

um processo de auditoria, restringindo os agricultores familiares na implementação de um sistema participativo de certificação orgânica para seus produtos (JALFIM et al., 2013).No nível internacional, os sistemas de certificação participativa começaram a ser discutidos pela Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica (IFOAM) a partir de 2004, enquanto que a certificação por auditoria é uma prática defendida desde a década de 1980 (CASTRO, 2013). Apesar de não ser reconhecida nos mercados de circuitos longos, tais como os circuitos de comércio justo, a certificação participativa é um avanço institucional que promove a dimensão ambiental do desenvolvimento no território nacional.

O reconhecimento da certificação participativa da APASPI no território nacional foi alcançado na relação com o MAPA, que fez o credenciamento da organização como um OPAC. Tendo em vista a importância dos benefícios ambientais a partir do reconhecimento da produção orgânica na agricultura familiar organizada em uma gestão participativa, a relação estabelecida entre a APASPI e o MAPA promove implicações positivas na dimensão ambiental do desenvolvimento. Enquanto que a busca de efeitos positivos no meio ambiente é um elemento intrínseco do ideal proposto pelo movimento da agricultura agroecológica, do qual a APASPI faz parte, acredita-se que a implementação de programas de sustentabilidade na cotonicultora empresarial, como a BCI e o ABR, seja uma reação às críticas dos movimentos alternativos direcionadas aos sistemas de agricultura empresarial, destacando o seu poder de causar danos ao meio ambiente. Contudo, os critérios de desempenho ambiental que são utilizados pelo BCI e o ABR não mitigam causas conhecidas dos danos ambientais provocados pela agricultura empresarial, como a prática da monocultura extensiva, o uso de agrotóxicos e a transgenia de sementes. Essas lacunas práticas refletem a fase embrionária dos programas de sustentabilidade na cotonicultura empresarial, que é um fenômeno recente e ainda não tem a adesão de uma parte significativa dos produtores. A Fazenda Progresso está situada entre os produtores brasileiros que ainda não integram as iniciativas de sustentabilidade na cotonicultura empresarial.

De maneira resumida, a dimensão ambiental do desenvolvimento regional é promovida pela agricultura orgânica em sistema de produção familiar devido ao interesse destes em conservar a biodiversidade local, evitando o uso de substâncias e processos produtivos danosos ao meio ambiente. Nesse contexto, a certificação participativa surge como um instrumento estimulador da produção orgânica, mas esse tipo de certificação não é reconhecido nos circuitos de comércio justo, limitando

o potencial da agricultura orgânica de base familiar de promover implicações positivas na dimensão ambiental do desenvolvimento. Assim, semelhante ao notado na dimensão social, a APASPI pode intensificar os benefícios ambientais da cotonicultura orgânica se priorizar a comercialização no território nacional, onde a certificação participativa é reconhecida. No caso da cotonicultura empresarial, a Fazenda Progresso ainda não está integrada nas iniciativas do BCI e ABR, que têm promovido a dimensão ambiental do desenvolvimento. Além disso, esses programas ainda não são capazes de resolver questões importantes que associam danos ambientais à agricultura empresarial.