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2.2 Dimensões de análise da indicação geográfica

2.2.3 Dimensão organizacional

Sendo o ambiente institucional as “regras do jogo”, as organizações são os “jogadores”. Assim, torrefadoras, cooperativas, associações de cafeicultores e empresas exportadoras são os jogadores do ambiente institucional no SAG do café. Sob a ótica neo-institucional, as organizações definem as suas estratégias em função das “regras do jogo” (Barra et al., 2006). Exercem, contudo, influências que as modificam. O ambiente institucional é composto basicamente pelas políticas públicas e pelas normas legais e administrativas que regulamentam a indicação geográfica.

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desregulamentação do setor na década de 1990 fez com que alguns atores da cadeia produtiva do café deixassem de ser meros articuladores passivos do processo para se tornarem peças fundamentais nas negociações do produto, cobrindo a lacuna deixada pelo Estado. Estes atores são as associações de interesse privado (AIPs), que visavam garantir a consolidação de uma nova estratégia de diferenciação e segmentação, bem como garantir a melhoria da qualidade. Segundo Farina et al. (1997, p. 129), as AIPs são:

Associações que não se confundem nem com o Estado nem com o mercado (...) podem assumir a função de provedora de produtos e serviços que desfrutam características de bens públicos, geram fortes externalidades ou envolvem informação imperfeita e que são do interesse especifico de um setor, nesse caso denominados bens coletivos.

No contexto do setor produtivo do café diferenciado pelos atributos da origem da produção no Brasil, as associações de cafeicultores podem ser consideradas AIPs que atuam no suporte organizacional de mercados de produtos diferenciados. Estas associações de cafeicultores são agentes importantes no SAG do café de origem certificada, pois são um elo essencial entre o cafeicultor e o mercado. Estas associações de cafeicultores representam agentes coletivos de mudança institucional, uma vez que buscam influenciar as instituições em favor de seus interesses por meio de ações de lobby e representação de seus associados no mercado de cafés especiais (Zylbersztajn & Farina, 1998; Barra et al., 2006).

As AIPs podem ser importantes agentes coordenadores do canal de distribuição de cafés diferenciados e ser considerados agentes de confiança, gerando estabilidade ao ambiente institucional e, consequentemente, diminuindo os custos de transação. A partir do momento que os produtores rurais se unem

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com objetivos comuns, os custos podem ser divididos, como, por exemplo, as atividades de marketing conjunto, orientadas para o desenvolvimento de negócios no mercado de produtos diferenciados. Ao atuarem em conjunto, maximizam os efeitos e a possibilidade de sucesso e minimizam os custos envolvidos na transação (Barra et al., 2006). Assim, algumas AIPs de cafeicultores passaram a ser os elos-chave do SAG do café, pois assumiram o controle de qualidade do produto e articulação com os demais elos da cadeia produtiva.

A coordenação de uma cadeia produtiva é construída por seus membros que se unem em estruturas de governança mais adequadas a depender das características das transações entre os elos da cadeia (Farina et al., 1997). A lógica de mercado das cadeias produtivas de produtos diferenciados difere da de produtos commoditizados pelo fato de nas primeiras existirem elos que aumentam a confiança no sistema, tendo em vista que os produtos carregam atributos bastante específicos (Figura 3).

A organização de produtores rurais por meio de AIPs visa ser um meio capaz de lidar com os condicionantes dos comportamentos dos agentes, das transações e do ambiente institucional (Barra et al., 2006). A transação de produtos agrícolas diferenciados tem como característica uma alta especificidade de ativos, o que impõe sérias restrições ao produtor agrícola para lidar com a estrutura de mercado (Zylbersztajn, 1995). Logo, a coordenação por meio de AIPs incrementa o poder de barganha do produtor e lhe oferece a possibilidade de um melhor posicionamento competitivo no mercado. As AIPs são organizações de apoio, assessoria, mas não fazem as transações – tudo é comercializado pelos cafeicultores individualmente ou por meio de suas cooperativas.

25 T o rr e d a d o re s D is tr ib u id o re s P ro d u to re s d e in s u m o s C o n s u m id o re s Associação de cafeicultores

Relações horizontais Relações verticais Relações da AIP

Governo Certificadoras Associações

FIGURA 3 Diagrama da cadeia produtiva de cafés diferenciados. Fonte: Barra et al. (2006, p. 13)

Essa figura mostra a relação da AIP com seus membros (relação horizontal), bem como o seu papel de envolver os seus membros em ações coordenadas com os demais elos da cadeia (relações verticais) e outras organizações do ambiente organizacional (governo e outras associações internacionais de café). A AIP, ao construir e participar dessa rede, fortalece e dá maior credibilidade ao café dos seus associados.

O desenho e a definição do ambiente institucional e organizacional interferem na operação do sistema, podendo ser considerados um vetor de parâmetros de deslocamento que afetam a estrutura de governança mais eficiente (Farina et al., 1997). O ambiente institucional que provê as normas e as políticas públicas são especialmente importantes na cadeia produtiva do café com IG reconhecida. Quanto às organizações de cafeicultores, sua existência é imprescindível, do ponto de vista legal, pois, segundo as normas do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), na Instrução Normativa 75/2000 estabelece, no artigo 5°, que:

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Podem requerer registro de indicações geográficas, na qualidade de substitutos processuais, as associações, os institutos e as pessoas jurídicas representativas da coletividade legitimada ao uso exclusivo do nome geográfico e estabelecidas no respectivo território. (Brasil, 2000)

A presença do Estado, em parceria com a sociedade civil organizada, no reconhecimento das IGs não implica uma intervenção estatal de caráter macroeconômico e regulatório, mas uma intervenção setorial que possibilita a melhoria da competitividade de setores econômicos.