Gideão W.W.F. Costa1, Marcelo de B. Cioffi2, Luiz A. C. Bertollo 2, 3, Wagner F. Molina1* 1 Departamento de Biologia Celular e Genética, Centro de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil 2 Departamento de Genética e Evolução, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil 3 Professor Sênior na Universidade Federal de São Carlos Resumo
Lutjanidae é uma família de peixes carnívoros, principalmente marinhos, distribuída no Atlântico, Índico e Pacífico. Para o litoral brasileiro são descritas 12 espécies sendo nove pertencente ao gênero Lutjanus, uma ao gêneros Ocyurus, uma a Rhomboplites e uma ao gênero Etelis. As relações filogenéticas das espécies do Atlântico Ocidental paulatinamente vem sendo melhor estabelecidas. Apesar da sua importância econômica e ecológica, os aspectos citogenéticos dos Lutjanidae ainda são incipientes. Aqui são apresentados dados de mapeamento cromossômico dos genes ribossomais 18S e 5S e da histona H3, através da hibridização fluorescente in situ (FISH), em espécies de Lutjaninae, sendo quatro espécies de
Lutjanus (L. synagris, L. analis, L. jocu e L. alexandrei) e em Ocyurus chrysurus. Nestas
espécies, os sítios DNAr 18S e 5S em geral são simples, sendo encontrados sítios múltiplos de DNAr 18S apenas em L. jocu e L. alexandrei. Em três espécies analisadas, os genes DNAhis H3 apresentam‐se em um único locus, ou dois em L. jocu. Em Ocyurus chrysurus, uma notável dispersão destas sequências em 22 pares cromossômicos. A elevada quantidade de sítios H3 DNAhis sugere uma possível associação com outras sequências repetitivas no genoma. De fato, clusters H3/DNAr 18S e H3/DNAr 5S, revelam regiões cromossômicas complexas, portadoras de sequências repetitivas multifuncionais. As implicações da expansão genômica de sequências das histonas H3 e sua funcionalidade são ainda desconhecidas e sugerem que estes genes possam ser envolvidos em processos evolutivos estocásticos. Palavras chave: família multigênica, DNAhis, DNA ribossomal, pargos, conservação evolutiva
Introdução
A família Lutjanidae é formada por predadores de médio a grande porte, que desempenham um papel importante no ecossistema marinho (España, 2003). Suas espécies estão distribuídas pelos oceanos Atlântico, Índico e Pacífico (Nelson, 2006), principalmente associadas a ambientes recifais, constituindo um importante recurso para a pesca artesanal (Resende et al., 2003). Devido ao seu valor econômico e importância alimentar, algumas espécies da família Lutjanidae vêm sofrendo sobrepesca, e projetos relacionados a aquicultura marinha de algumas espécies vêm sendo desenvolvidos, tanto para aumentar a oferta, como na produção de alevinos para restaurar estoques pesqueiros (Lorenzen et al., 2010; Saillant et al., 2013).
Composta por 17 gêneros e mais de 120 espécies é dividida em quatro subfamílias, sendo Lutjaninae a mais diversa, formada pelos gêneros monotípicos Hoplopagrus, Ocyurus e Rhomboplites, os gêneros Macolor e Pinjalo com duas espécies cada, e Lutjanus, o mais diverso, com 64 espécies (Nelson, 2006; Gold et al., 2011). Contudo, análises filogenéticas mais recentes baseadas em dados moleculares revelam uma sinonimização de Ocyurus com o gênero Lutjanus (Gold et al., 2011). No Brasil, são relatados quatro gêneros das subfamílias Etelinae e Lutjaninae, oito espécies do gênero Lutjanus, além de Ocyurus, Rhomboplites e
Etelis (Floeter et al., 2003; Moura & Lindeman, 2007).
Além dos aspectos taxonômicos, filogenéticos e evolutivos, as investigações cromossômicas em peixes apresentam importância prática para a aquicultura e melhoramento genético, principalmente no incremento do crescimento (Beardmore et al., 2001; Jankun et al., 2007), produção de espécimes ginogenéticos (Devlin & Nagahama, 2002; Piferrer et al., 2003; Chen et al., 2009), monossexos (Chen et al., 2009) e identificação física de loci de características quantitativas (QTLs) (Ning et al., 2007).
Neste aspecto, uma série de ferramentas genômicas e citogenéticas, tais como análise de sequências, microarrays e mapas genéticos vêm sendo utilizados em muitos peixes cultivados, voltados à identificação de genes envolvidos na resistência, crescimento e reprodução (Oleksiak, 2010). Adicionalmente, o mapeamento físico dos genes ribossomais nos cromossomos tem fornecido informações complementares em mapas de ligação genética (Martins et al., 2004; Freeman et al., 2007; Ghigliotti et al., 2012).
Apesar de suas múltiplas utilizações, os dados cromossômicos em Lutjanidae são ainda incipientes, praticamente restringindo‐se à organização convencional do cariótipo, com 2n=48 cromossomos, distribuição da heterocromatina e sítios ribossomais, evidenciando características Perciformes‐basais cariotípico, impede maiores considerações sobre suas relações filogenéticas e a dinâmica microestrutural dos cromossomos (Rocha & Molina, 2008).
Em grupos com padrões cariotípicos estruturalmente homogêneos, como os apresentados pelas espécies de Lutjanidae, o escrutínio da composição das porções heterocromáticas do genoma, pelo mapeamento da composição de genes e sequências repetitivas associadas a estas regiões, pode ser esclarecedor na compreensão da sua evolução cariotípica (Costa et al., 2013; Costa et al., 2014).
Entre as sequências repetitivas que têm sido mapeadas cromossomos de peixes marinhos estão os genes ribossomais 18S e 5S e as histonas H1, H2B‐H2A e H3 (Motta Neto
et al., 2011a; Motta Neto et al., 2011b; Lima‐Filho et al., 2012; Calado et al., 2014). Ambas as
famílias multigênicas são vitais para os eucariotos (Jordan et al., 2002; Roehrdanz et al., 2010).
Funcionalmente, o DNAhis (H1, H2A, H2B, H3 e H4) codifica uma família de pequenas proteínas básicas altamente conservadas, que desempenham um papel fundamental na organização estrutural da cromatina, essenciais no empacotamento do DNA no núcleo da célula, bem como na regulação da expressão gênica (Sellos et al., 1990; Csink & Henikoff, 1998; Chioda et al., 2002). Em alguns casos tem sido identificada uma expansão explosiva de sequências DNAhis H3 sugerindo que possam ter sua evolução eventualmente modulada por eventos estocásticos de dispersão no cariótipo (Costa et al., 2014).
Têm se acumulado evidências em peixes e em alguns outros organismos que as famílias multigênicas das histonas e dos genes ribossomais podem apresentar arranjos genômicos integrados (Andrews et al., 1987; Roehrdanz et al., 2010), cujo papel evolutivo pode estar interligado e precisa ser melhor investigado nos peixes.
No presente estudo estão sendo apresentados dados sobre a dinâmica evolutiva das sequências de DNA ribossomal 5S e 18S e das histonas H3, através do mapeamento cromossômico, nos cromossomos de Lutjanus analis, L. alexandrei, L. synagris, L. jocu e
Material e Métodos
Espécimes, preparações cromossômicas e bandamentos
Espécimes juvens de sexo indeterminado das espécies Lutjanus analis (10 exemplares), Lutjanus synagris (8 exemplares), Lutjanus jocu (6 exemplares), coletados no estuário do Rio Potengi, em Natal (5°45'37.08"S; 35°12'19.61"O) e Lutjanus alexandrei (10 exemplares) e Ocyurus chrysurus (5 exemplares), coletados na Praia de Carnaubinha (5°12'49.53"S; 35°26'2.58"O) no Estado do Rio Grande do Norte, Nordeste do Brasil, foram utilizados para as análises citogenéticas. Os espécimes foram previamente submetidos à estimulação mitótica in vivo, pela aplicação intramuscular de antígenos compostos atenuados, por um período de 24hs (Molina, 2001; Molina et al., 2010). Após este período os animais foram anestesiados com óleo de cravo (Eugenol) e sacrificados para remoção do tecido renal. Cromossomos metafásicos foram obtidos a partir de suspensões celulares, através da interrupção in vitro do ciclo mitótico, conforme a metodologia de Gold et al. (1990). Um volume de 80µl da suspensão celular foi gotejado em uma lâmina coberta com uma película de água destilada aquecida à 60°C. Os cromossomos foram corados com uma solução de Giemsa 5%, diluída em tampão fosfato (pH 6.8), por 8 minutos. Sondas da hibridização cromossômica Sondas de DNAr 5S e 18S foram obtidas por PCR a partir do DNA nuclear de Ocyurus chrysurus, utilizando os primers A 5’‐TAC GCC CGA TCT CGT CCG ATC‐3’ e B 5’‐CAG GCT GGT ATG GCC GTA AGC‐3’ (Pendás et al., 1994), e NS1 5’‐GTA GTC ATA TGC TTG TCT C‐3’ e NS8 5’‐ TCC GCA GGT TCA CCT ACG GA‐3’ (White et al., 1990), respectivamente. A primeira sonda continha uma cópia de DNAr 5S de 200pb e a segunda de DNAr 18S de 1400pb. A sonda de DNAr 5S foi marcada com biotina‐14‐dATP e a sonda de DNAr 18S com digoxigenina‐11‐ dUTP, ambas por nick translation, seguindo as recomendações do fabricante (Roche, Mannheim, Alemanha).
A amplificação de sonda do gene da histona H3, foi obtida a partir do DNA genômico de O. chrysurus, utilizando os primers H3F 5’‐ATG GCT CGT ACC AAG CAG ACV GC‐3’ e H3R
5’‐ATA TCC TTR GGC ATR ATR GTG AC‐3’, ambos desenhados a partir dos genes de histonas do molusco Mytilus edulis (Albig et al., 2003) e amplificado de acordo com (Giribert & Distel, 2003). A sonda de histona H3 foi marcada utilizando nick translation, com digoxigenina‐11‐ dUTP, seguindo a recomendações do fabricante (Roche, Mannheim, Alemanha). Hibridização in situ fluorescente A hibridização in situ por fluorescência (FISH), foi realizada seguindo o procedimento descrito por (Pinkel et al., 1986). Os cromossomos metafásicos foram tratados com RNAse (20µg/ml em 2×SSC) por 1 hora a 37°C e com pepsina (0,005% em HCl 10mM) a 37°C por 10 minutos, fixados com formaldeído a 1% por 10 minutos e em seguida desidratados em um série alcoólica (70%/85%/100%) por 5 minutos cada. As lâminas com os cromossomos metafásicos foram incubadas em 70% formamida/2×SSC a 72°C, por 5 minutos. A solução de hibridização, consistindo de 50% de formamida, 2×SSC, 10% de sulfato de dextrano e a sonda desnaturada (5ng/µl), com um volume final de 30µl, foi depositada sobre a lâmina e a hibridização realizada por 16h à 37°C. As lavagens pós‐hibridização foram efetuadas com 15% formamida/0,2×SSC a 42°C, por 20 minutos, seguidas de lavagens em 0,1×SSC a 60°C por 15 minutos e em Tween 20 0,5%/4×SSC por 5 minutos à temperatura ambiente. Os sinais de hibridização das sondas foram detectados usando anti‐digoxigenina rodamina conjugada (Vector) para as sondas DNAr 18S e DNAhis H3 e avidina‐FITC conjugado (Vector) para a sonda DNAr 5S. Os cromossomos foram contracorados com Vectashield/DAPI (1,5 µg/ml) (Vector).
Analises cariotípicas e idiogramas
O tipo cromossômico foi definido de acordo com a posição do centrômero (Levan et
al., 1964) e os cromossomos ordenados em ordem decrescente de tamanho. Idiogramas a
partir da cuidadosa mensuração dos pares portadores das sequências ribossomais (DNAr 18S e 5S) e histonas (H3) foram desenhados com o uso do software Photoshop CS5.
Resultados
Os padrões cariotípicos das cinco espécies de Lutjanidae analisadas foram concordantes com aqueles previamente definidos por Rocha & Molina (2008).
O mapeamento de sequências DNAr 18S identificou sítios simples em três espécies. Estes sítios ocupavam as posições terminais dos braços curtos do par 5, em L. analis, do par 23, em L. synagris, e do par 2, em O. chrysurus. Em L. jocu e L. alexandrei sítios múltiplos de DNAr 18S foram identificados nos pares 2 e 5 (Figuras 1 e 2). Em ambas as espécies estes sítios ocupam a porção terminal do braço curto do par 2, mas diferem quanto ao posicionamento no par 5 (em regiões terminais do braço curto em L. alexandrei e no longo em L. jocu). Sequências de DNA ribossomal 5S se apresentaram em um único locus nas cinco espécies de Lutjanidae. Foram mapeadas na posição terminal dos braços curtos do par 14 em L. analis, L. alexandrei e L. jocu e em mesma posição no par 21, em L. synagris e O.
chrysurus (Figuras 1 e 2).
Sinais de hibridização do DNAhis H3 foram mapeados em um único par em L. analis (braço curto do par 17), em L. synagris (braço curto do par 24) e em L. alexandrei (braço curto do par 1). Estas regiões gênicas apresentaram disposição multilocus em L. jocu (braço curto do par 3 e porção terminal do braço longo do par 13). Em O. chrysurus os sítios DNAhis H3 foram localizados na posição terminal de 22 pares cromossômicos, exceto os pares 11 e 24 (Figuras 1 e 2) e colocalizados com sítios de DNAr 18S e 5S.
Figura 1. Dual color FISH em cromossomos mitóticos metafásicos hibridizados com sondas DNAr 18S (vermelho), DNAr 5S (verde; coluna da esquerda), e hisDNA H3 (vermelho, coluna à direita). Cromossomos foram contracorados com DAPI (azul). Barra = 5µm.
Figura 2. Distribuição das famílias multigênicas 18S, 5S e DNAhis H3 ou sítios Ag‐RONs em relação aos agrupamentos filogenéticos e relógio molecular da divergências dos clados A, B e C (modificado de Gold et al. (2011)), que incluem as espécies analisadas de Lutjanidae. Os dados para as espécies com asteriscos foram obtidos de Rocha & Molina (2008); Nirchio et al. (2008). Discussão
Mapeamento de genes ribossomais 5S e 18S e diversificações populacionais através da barreira do Amazonas
A localização das famílias multigênicas 5S e 18S em cromossomos distintos é comum entre os vertebrados, indicando a evolução independente destes loci (De Lucchini et al., 1993; Suzuki et al., 1996; Martins & Wasko, 2004). De fato, nas espécies de Lutjanidae, até o momento esta é a condição mais comum, tanto pela frequência diferencial destas famílias de genes como pela posição independente em cromossomos diversos. Esta condição é
propícia para o uso de tais sítios como efetivos marcadores citotaxonômicos em Lutjanidae (Rocha & Molina, 2008). São pouco frequentes em peixes os arranjos colineares ou equilocais dos loci DNAr 5S e 45S (Pendás et al., 1994; Fujiwara et al., 1998; Calado et al., 2014), embora já tenha sido descrito para O. chrysurus no litoral da Venezuela (Nirchio et al., 2009). Por outro lado, são comuns níveis variados na distribuição cromossômica tanto de sítios 45S DNAr (Mantovani et al., 2005; Gornung, 2013), quanto de DNAr 5S (Affonso & Galetti Jr., 2005; Lima‐Filho et al., 2012; Lima‐Filho et al., 2014).
Os dados de mapeamento cromossômico dos genes ribossomais 18S nas cinco espécies analisadas, somados ao posicionamento em populações do Caribe de Rhomboplites
aurorubens, O. chrysurus, L. analis, L. griseus e L. synagris apoiam que a presença de um ou
dois sítios, localizados em cromossomos distintos é a condição mais frequente e, aparentemente, mais basal para esses genes (Nirchio et al., 2008; Nirchio et al., 2009). Ao contrário de L. jocu que apresenta sítios Ag‐RONs múltiplos (Rocha & Molina, 2008) concordantes com sítios DNAr 18S, em L. alexandrei foi identificada um sítio DNAr 18S no par 1, não identificado pela técnica da Ag‐RONs, sugerindo algum tipo de regulação gênica destas sequências.
Conhecidas em diversos organismos eucariontes as sequências de DNAr 5S são altamente conservadas, mesmo entre os táxons filogeneticamente não relacionados. Na maioria dos eucariotos essas sequências são normalmente detectados em áreas distintas do genoma, organizadas em um ou mais repetições em tandem, cujas diferenças observadas entre espécies estão relacionadas com as regiões espaçadoras não transcritas (NTS) podendo ser extremamente variáveis, devido às inserções/deleções, minissatélites e pseudogenes (Nelson & Honda, 1985; Leah et al., 1990; Alves‐Costa et al., 2008).
Em Lutjanidae, as sequências de DNAr 5S podem ser marcadores citotaxonômicos importantes, considerando as marcações diferenciais presentes nas espécies L. analis, L.
alexandrei e L. jacu (par 14) e em L. synagris e O. chrysurus (par 21). Análises de
mapeamento de sequências DNAr 5S em O. chrysurus, da Ilha Cubagua, na Venezuela, revelaram uma co‐localização com o DNAr 18S (Nirchio et al., 2009), bem como, a presença de dois cariomorfos em L. synagris, na Isla Margarita, Venezuela (Nirchio et al., 2008), sugerindo a presença de cromossomos sexuais diferenciados nos machos da espécie. Estas
diferenciações citogenéticas, podem ser atribuídas ao efeito da barreira do Amazonas (≈10m.a) proporcionando condições alopátricas capazes de culminar com diferenciações cariotípicas discerníveis, como identificado em espécies das famílias Haemulidae (Motta Neto et al., 2012) e Grammatidae (Molina et al., 2012).
As variações no NTS observadas entres as espécies têm sido úteis em estudos evolutivos e podem caracterizar marcadores espécie‐específicos da população (Suzuki et al., 1994; Pendás et al., 1995). Contudo, apesar das sequências de DNAr 5S serem utilizadas como marcadores filogenético e/ou populacionais, em interpretações filogenéticas é necessário alguma cautela, uma vez que o DNAr 5S pode mostrar uma organização complexa com sequências parálogas no genoma (Martins & Galetti Jr., 2001).
Mapeamento de DNAhis H3 em Lutjanidae
Em geral, os genes das histonas são bastante conservados entre diferentes espécies, mas com heterogeneidade quanto ao padrão da organização no genoma (Sellos et al., 1990; Cabrero et al., 2009; Eirín‐López et al., 2009). Embora a distribuição destes genes nos cromossomos dos peixes seja ainda pouco conhecida, em salmonídeos ocorre um único locus para o DNAhis principal, localizado em região pericentromérica (Connor et al., 1984). Da mesma forma, um locus simples de DNAhis H1 mostra‐se presente na região pericentromérica de algumas espécies de peixes dulcícolas e marinhos (Hashimoto et al., 2011; Lima‐Filho et al., 2012).
De fato, o número de clusters de histonas H3 em L. analis, L. synagris e L. alexandrei corrobora com a condição evolutiva conservada, representada pela presença de um único locus no genoma. Esta condição reforça o conservadorismo cromossômico que tem sido identificado nesta família de Perciformes (Rocha & Molina, 2008). Por outro lado, as espécies L. jocu e O. chrysurus apresentam variações conspícuas no número múltiplo de clusters da histona H3, contrastando com o conservadorismo evolutivo de um único locus. Assim, enquanto sítios H3 estão distribuídos em dois sítios terminais em L. jocu, estas sequências em O. chrysurus se mostram dispersas em quase todos os cromossomos desta espécie (exceto nos pares 11 e 24). Tal nível de dispersão é compatível com ação de
elementos de transposição, como identificado na espécie Rachycentron canadum (Costa et al., 2014). A dinâmica de sequências H3 e sítios ribossomais 5S em O. chrysurus e L. jocu indicam uma circunstância inversa à encontrada em vários outros grupos de organismos (Cabrero et al., 2009), onde o DNAr 5S se mostra mais dinâmico quanto à distribuição no cariótipo que o gene H3 que se apresenta bastante conservado. Tal situação foi igualmente observada em estudos com R. canadum (Cabrero et al., 2009; Costa et al., 2014). A ampla distribuição de genes histonas H3 no cariótipo de O. chrysurus, associadas às regiões heterocromáticas dos cromossomos, exceto nas regiões pericentroméricas do par 11 e 24, indicam que nem todas essas sequências se encontrem ativas.
A distribuição variada dos genes H3 em L. jocu (2 loci) e em O. chrysurus (22 loci) sugere que membros da família das histonas tenham evoluído em uma série de etapas sujeitas tanto a mecanismos de duplicação/seleção definidos como nascimento‐e‐morte (L.
jocu), similar ao observado para histonas H2B‐H2A em R. canadum, onde a presença de
múltiplos loci são compatíveis com a ocorrência de mecanismos de duplicação no genoma, mecanismos estes que podem possibilitar a diversificação e diferenciação de novos genes, inativação (pseudogenização) ou sua eliminação (González‐Romero et al., 2008; Eirín‐López et al., 2009; Costa et al., 2014), bem como evolução em concerto. Neste caso não podemos descartar o envolvimento de elementos transponíveis (ETs) no processo de dispersão, como observado em Rachycentron canadum (Cabrero et al., 2009; Costa et al., 2014), onde há uma íntima relação entre os retrotransposons Rex 1 e Rex 3 e sítios DNAhis H3 amplamente distribuídos no cariótipo (Costa et al., 2013, 2014). Co‐localização de DNAr e DNAhis
Sítios ribossomais com características heterocromáticas têm sido identificados em muitas espécies de Lutjanidae e Haemulidae (e.g. Rocha & Molina (2008); Motta Neto et al. (2011a); Motta Neto et al. (2011b)). Contudo, em peixes de forma geral, ainda pouco se conhece sobre a colocalização destes sítios com outros genes entre eles genes das histonas (Costa et al., 2014). Nas espécie analisadas, sequências DNAhis H3 se mostraram, em loci
simples em L. analis, L. synagris e L. alexandrei e em dois sítios em L. jocu, cujo do nível de resolução alcançado, demonstra condição não sintênica com os genes ribossomais 18S e 5S.
Todavia, em O. chrysurus, que exibe uma enorme expansão de sequências H3, ocorre tanto colocalização com os sítios DNAr 18S em posição pericentromérica no par 2, como com o sítio único de DNAr 5S em posição pericentromérica no par 21, ambos associados a regiões heterocromáticas destes cromossomos (Rocha & Molina, 2008).
Em peixes, intercalações regulares de genes de histonas e DNAr, precisamente genes H1 e DNAr 5S, já foram identificadas (Hashimoto et al., 2011), bem como a colocalização simultânea de histonas H2B‐H2A e H3 com sequências 18S e 5S (Costa et al., 2014). Outros grupos de eucariotos, como artrópodes, têm apresentado casos de associação de sequências de histonas e o DNAr 5S em uma mesma unidade em tandem ou em sítios proximamente localizados no cromossomo (Barzotti et al., 2000; Cabral‐De‐Mello et al., 2011; Oliveira et al., 2011; Costa et al., 2014). Em insetos, que apresentam um maior volume de dados sobre as histonas, acredita‐se que a associação do quinteto de histona com genes de RNAr possa representar o maior grupo de genes repetidos associados (Roehrdanz et al., 2010). Tais configurações poderiam proporcionar um controle transcricional comum destes genes (Andrews et al., 1987). Entretanto, a importância evolutiva e a extensão da ligação entre famílias de genes ribossômicos e histonas ainda é pouco conhecida.
A presença do arranjo DNAhis/DNAr em O. chrysurus ainda é uma questão aberta. Outros estudos poderão esclarecer se as sequências H3/DNAr 18S e H3/DNAr 5S nesta espécie são transcricionalmente ativas, proporcionando vantagens seletivas de regulação gênica e das condições sinérgicas de dispersão. Ou ainda, se a dispersão de sequências repetitivas H3, podem ter sido mediada em larga escala por elementos transponíveis.
Distribuição de genes ribossomais e relações filogenéticas em Lutjanidae
Dados citogenéticos se mostram preponderantemente mais informativos dentro de um contexto filogenético. Neste sentido, a distribuição de sítios 18S e 5S em Lutjanidae mostra alguns padrões comuns a clados formados pelas espécies analisadas.
A presença de sítios ribossomais em grande par cromossomo acrocêntrico tem sido considerada uma característica plesiomórfica entre os Perciformes (Galetti et al., 2000; Affonso et al., 2001; Affonso & Galetti Jr., 2005), sendo típica de Serranidae (Molina et al., 2002), Pomacanthidae, Chaetodontidae (Affonso et al., 2001), e Cichlidae (Feldberg & Bertollo, 1985). Tal condição tem sido também observada em Lutjanidae (presente estudo, Rocha & Molina, 2008; Nirchio et al. (2008); Nirchio et al. (2009)).
Uma hipótese filogenética detalhada foi proposta por Gold et al. (2011) para espécies de Lutjaninae do Atlântico, incluindo calibração molecular do tempo de divergência entre clados com as espécies aqui analisadas. A sobreposição dos dados citogenéticos e moleculares oferece um boa oportunidade de identificação de padrões comuns e diversificação temporal para as espécies.
Assim, dentro de um grupamento resumido das espécies analisadas foram nominados três clados (A, B, e C) (modificado de Gold et al. (2011)), onde o clado A agrupa os clados B e C tendo sua divergência estimada por aqueles autores em 20 m.a.
O clado B com uma estimativa de divergência de 7 m.a. foi aqui representado pelas espécies L. synagris, L. analis, O chrysurus e em condição mais basal por Rhomboplites
aurorubens, todas com dados de mapeamento de sequências 18S e 5S. Este clado tem sido o
mais controverso do ponto de vista filogenético. Diversos dados moleculares apontam a sinonimização do gênero Ocyurus com Lutjanus (Sarver et al., 1996), bem como a inclusão de
O. chrysurus neste clado (Gold et al., 2011).
As características morfológicas em Ocyurus, que permitem diferenciar do gênero
Lutjanus, seriam adaptações para explorar melhor o seu nicho (Domeier & Clarke, 1992;