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DIREITO À DIVERSIDADE: OS DESAFIOS DOS SISTEMAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS.

3 NOVO ORDENAMENTO POLÍTICO JURÍDICO DOS SISTEMAS MUNICIPAIS DE ENSINO A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PADRÃO DE GESTÃO

4 AS BASES EPISTEMOLÓGICAS DE CONSTRUÇÃO DE UM SISTEMA EDUCACIONAL INCLUSIVO

4.2 DIREITO À DIVERSIDADE: OS DESAFIOS DOS SISTEMAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS.

4.2.1 A diversidade como metáfora na educação contemporânea

A diversidade é, assim como a cidadania, uma cultura em que a educação é solicitada a tornar-se possível. As mudanças sociais e ideológicas da sociedade contemporânea fazem emergir a necessidade de novas leituras sobre o que é educar e quem é o sujeito da educação. A diversidade surge, então, como metáfora que age no sentido de orientar e organizar a prática educativa, dotando-a de conteúdos e de uma visão crítica para entender a cultura, a sociedade e os vínculos sociais que constroem.

Tal como foi colocado anteriormente sobre a cidadania, a diversidade também é uma cultura a ser construída e representa uma visão de como se deve pensar, planejar e organizar a educação para a melhoria da sociedade. O respeito e o reconhecimento da diversidade é um dos princípios fundamentais na construção de um sistema educacional inclusivo. Reconhecer o direito à diversidade em educação é dar respostas às diferentes necessidades educacionais que os sujeitos apresentam diante do fato educativo. A diversidade e a cidadania são princípios que devem estar presentes na construção de um projeto educacional inclusivo, impregnando a formulação e implementação das políticas traçadas para os sistemas de ensino.

O respeito à diversidade é uma forma de garantir que a cidadania seja exercida e os vínculos sociais fortalecidos. Trata-se de uma atitude política para com a diversidade gerada pelas diferenças de classe, gênero, etnia, opção sexual, capacidades, enfim, de atributos que fazem parte da identidade pessoal e definem a condição do sujeito na cultura e na sociedade. O desenvolvimento de atitudes de tolerância e respeito à diversidade tem a ver com o direito à educação, o direito à igualdade de oportunidades e o direito à participação na sociedade. Por isso mesmo, representa um grande desafio a ser enfrentado pelos sistemas de ensino ao lançar as suas bases político-pedagógicas.

A ênfase dada à diversidade é uma constatação que pode ser feita tanto nas proposições políticas como na preocupação científica, de maneira renovada, na década de 1990. Para Sacristán (2002), essa sensibilidade para com a diversidade não é algo novo em educação, como não o é na filosofia, na política e no pensamento ocidental. Segundo ele, pensadores como Aristóteles e Montaigne já demonstravam em algumas das suas obras a preocupação com a diversidade humana. Entretanto, observa esse mesmo autor, em nosso tempo a ênfase dada à questão da diversidade está relacionada com a crise das narrativas da modernidade e com a confusão produzida por tal crise em um dos instrumentos do capitalismo moderno: a educação oferecida pelos sistemas de ensino.

Segundo Sacristán, o problema da diversidade humana é a consequência dos processos de individuação:

A diversificação individualizadora, que dura toda a vida, transforma- se em finalidade reflexivamente pretendida no sistema educacional, seguindo a idéia da filosofia liberal que sustenta que o desenvolvimento da singularidade, autonomia e liberdade individuais é um principio para a realização do bem-estar (...) (2002, p. 224).

O problema apontado pelo autor reside no fato de que teremos sujeitos diversos e os queremos diversificados, porém, pretendendo-os a partir de instituições, currículos e métodos que carregam em si a pulsão homogeneizadora que historicamente marca a educação institucionalizada. A superação dessa dicotomia surge da compreensão de que diversidade, variedade, heterogeneidade e individualização expressam fatos e desejos e representam a própria manifestação da liberdade necessária e possível vivida em instituições coletivas – como a escola – ao lado de outros. Por isso mesmo, ela se constitui num sério desafio a ser encarado pelos sistemas de ensino, na construção de uma sociedade democrática e de uma educação inclusiva. A diversidade é para a educação uma narrativa, uma maneira de analisá-la, de tentar entender seus objetivos, de abordar os conteúdos do currículo, os métodos pedagógicos, a organização das instituições escolares, enfim, as bases político-pedagógicas da estrutura do sistema educacional.

Exigir diversidade é um chamado ao respeito pela condição da realidade humana e da cultura, faz parte de um programa defendido a partir da ótica liberal democrática, é uma pretensão das políticas de inclusão social e é resistência contra o domínio das totalidades únicas do pensamento moderno. (...) Estamos diante de um discurso confuso e contraditório, do ponto de vista epistemológico, que se projeta nas decisões que precisam ser tomadas sobre os objetivos, os conteúdos do currículo, as instituições escolares e as políticas educacionais. (SACRISTÁN, 2002, p. 226).

Assim, na discussão sobre a atenção à diversidade é de extrema relevância considerar a ambivalência que as caracterizam, antes de aceitar as suas orientações na organização, na estrutura e no funcionamento dos sistemas de ensino. Por isso, os desafios postos pela diversidade exigem uma revisão nos posicionamentos e nas práticas vigentes nos sistemas educacionais modernos. Disso decorre a necessidade de um esclarecimento acerca dos seus significados, para que seja possível sua adoção como política alternativa às praticas homogeneizadoras e segregativas que sempre estiveram presentes na educação. O autor supracitado chama a atenção para o fato de que a sobrecarga semântica atribuída a determinado conceito gera certa indistinção e imprecisão, tornando-o pouco útil na discussão dos problemas e gerando confusão na prática.

A diversidade é um termo ambíguo, possui uma multiplicidade de significados que os sistemas de ensino devem ter clareza para que possam evitar os riscos e potencializar as possibilidades desse conceito para o que de fato interessa: a aprendizagem do aluno. O conceito de diversidade aparece, tanto nas políticas como na produção científica, relacionado às estratégias usadas na educação especial, assim como às demandas dos movimentos e grupos sociais que lutam pelo reconhecimento e valorização da sua identidade.Também relaciona-se

(...) com a tendência descentralizadora dos estados modernos, como conseqüência da crise de legitimidade que sofrem e devido à sua entrada em um processo de esvaziamento de suas competências em contextos econômicos e políticos cada vez mais globalizados. É argumento dos “libertários” neoliberais contrários à escola pública. Relaciona-se com as aspirações dos povos e das pessoas à liberdade para exercer sua autodeterminação. É uma proposição que se liga à aspiração à democracia para administrar coletivamente realidades sociais que são plurais e para respeitar as liberdades básicas. É uma estratégia para adaptar o ensino aos estudantes (SACRISTÁN, 2002, p. 227).

Diante dessa abundância de significados, observa o autor citado, apropriar-se desse discurso de forma acrítica representa um grande perigo, pois os significados da diversidade são muito desiguais e os âmbitos práticos em que se realiza são bastante diferentes, gerando desafios, possibilidades e consequências distintas em cada um deles. Nesse sentido, é de fundamental importância saber o que está sendo defendido quando da formulação e implementação de políticas educacionais em atenção à diversidade.

O sistema de ensino que busca se ancorar nas novas relações que estabelecem entre cultura, sociedade e educação, para a ressignificação da práxis educativa com um enfoque inclusivo, encontra no paradigma da diversidade uma consistente argumentação. O respeito e a garantia do direito à diversidade pelos sistemas de ensino pressupõem que o reconhecimento da heterogeneidade cultural e social determina a condição de indivíduos e coletividades, fazendo com que esse direito seja reclamado à educação. A compreensão de que os indivíduos diferem entre si em termos de procedência social, capacidades, interesses, nas formas de ser e de conviver e, em iguais condições, devem exercer sua liberdade e agir com autonomia, deve ser um ponto de referência essencial para a educação. É necessário pensar os processos educativos que se desenvolvem com indivíduos e coletividades, diversificando tais processos em contraposição à homogeneização das práticas dominantes.

Apoiar-se na diversidade para a construção de um sistema educacional inclusivo implica o enfrentamento da desigualdade de capitais econômicos, sociais e culturais que leva os sujeitos a dar diferentes respostas diante do fato educativo. Essa desigualdade leva a diferentes rações em relação aos padrões de comportamento e níveis de rendimento exigidos pela normalização que a escola impõe. Por isso, o sistema educacional deve garantir em cada escola e em cada sala de aula o direito à diversidade como uma forma para corrigir tais desigualdades. O direito à diversidade e o respeito à mesma introduzem novas formas de interpretar a liberdade, a justiça e a equidade no espaço escolar, daí a necessidade de inseri-la na discussão sobre a cultura da cidadania que, como vem sendo defendido dede o início deste capítulo, alicerça a construção de um sistema educacional inclusivo.

Com base no direito à diversidade e à cidadania, a política e gestão da educação municipal deve se voltar para a consolidação de um projeto político-educacional que busque dar respostas às necessidades educacionais especiais que emergem no contexto escolar. Os sistemas de ensino devem partir do princípio de que as formas e os meios que os sujeitos utilizam para se apropriar da cultura os diferenciam e os distinguem, no entanto não devem se constituir em mecanismos para reforçar as desigualdades; pelo contrário, a diversidade com que se manifestam deve compor um arranjo educativo, que garanta o seu reconhecimento e sua potencialização.

A garantia do direito à diversidade constitui-se num compromisso ético, político e pedagógico que um novo padrão de gestão, com foco na aprendizagem, precisa adotar. Para atender às exigências da cultura da cidadania, os sistemas de ensino devem assumir esse compromisso na formulação e implementação das políticas educacionais com vistas à ressignificação da práxis educativa, para que a escola possa cumprir sua renovada função social, ou seja, educar na e para a diversidade.

4.3 O ORDENAMENTO POLÍTICO-JURÍDICO DA CONSTRUÇÃO DE

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