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Direito potestativo no Código de Defesa do Consumidor

3.1 DIREITO POTESTATIVO

3.1.3 Direito potestativo no Código de Defesa do Consumidor

Regulamentada no CDC, Lei 8.078/90, artigo 27, a prescrição não possui apenas uma interpretação, gerando debates tanto na doutrina como na jurisprudência.

De uma maneira geral, a contagem do prazo prescricional se inicia com a lesão ao direito subjetivo, mas, no CDC, há um destaque especial à essa matéria, com o fim de dar maior proteção aos consumidores. Diferentemente do Código Civil, o CDC determina que o prazo prescricional só começa a correr do conhecimento do dano e da autoria pelo consumidor.

Apesar das normas consumeristas buscarem sempre a proteção do consumidor, o STJ já decidiu que, independentemente do fato de a lesão se prolongar no tempo ou não, o prazo prescricional se conta do primeiro momento em que o consumidor toma ciência da lesão e da autoria, conforme REsp. 304.724 da lavra do Ministro Humberto Gomes de Barros:

A prescrição da ação de reparação por fato do produto é contada do conhecimento do dano e da autoria, nada importa a renovação da lesão no tempo, pois, ainda que a lesão seja contínua, a fluência da prescrição já se iniciou com o conhecimento do dano e da autoria. Tal entendimento não se coaduna com a proteção que deve ser conferida aos consumidores. Se a lesão se renova no tempo, cada ato lesivo se constitui uma nova violação ao direito e não uma só violação que se prolonga no tempo.

Dessa maneira é certo afirmar que a cada nova lesão, uma nova pretensão surge e um novo prazo prescricional se inicia e que entendimentos contrários violam os direitos de proteção do consumidor e o Instituto da Prescrição.

A prescrição e a decadência são temas de relevada importância para o âmbito jurídico, tendo em vista que além de trazerem amplas discussões, são responsáveis pela perda do direito pelo decurso do tempo, tendo em vista, que não é de interesse jurídico que um indivíduo seja detentor de um direito a vida toda (DINIZ, 2004).

A prescrição surgiu como uma medida de ordem pública para proporcionar segurança às relações jurídicas, que seriam comprometidas diante da instabilidade oriunda do fato de se possibilitar o exercício da ação por tempo indeterminado. Segundo as palavras de Maria Helena Diniz (2004, p. 202): ―Constitui-se como uma pena para o negligente, que deixa de exercer seu direito de ação, dentro de certo prazo, ante uma pretensão resistida".

A prescrição, portanto, é um importante meio para proporcionar uma maior estabilidade nas relações jurídicas e a perda do direito de ação pelo decurso do tempo, não dando início ao processo, extinguindo-se o direito após a perda do prazo regulamentado por lei, bem como sua capacidade defensiva, e, consequentemente, a falta de seu uso, durante um determinado espaço de tempo (VENOSA, 2009).

Para configurar uma prescrição é necessário que se apresentem quatro requisitos:

Quadro III – Requisitos da prescrição

Que exista uma ação exercitável (seu objeto)

em face da violação do direito que a ação objetiva remover;

Que ocorra a inércia do titular da ação pelo seu não-exercício (sua causa eficiente)

mantendo-se passivo diante do direito violado e permitindo que assim permaneça;

Que a inércia continue durante um determinado lapso temporal (seu fator operante)

haja vista que a norma jurídica objetiva punir a inércia prolongada;

Que não exista nenhum fato ou ato que a lei confere eficácia impeditiva

suspensiva ou interruptiva de curso prescricional, seu fator neutralizante Fonte: (DINIZ, 2004).

Já a decadência é ―a extinção do direito pela inação de seu titular que deixa escoar o prazo legal ou voluntariamente fixado para o seu exercício, segundo a mesma autora‖ (DINIZ, 2004).

Seu objeto é o direito a ser exercido, por meio do qual, seja por determinação estabelecida em lei ou pela vontade unilateral ou das partes envolvidas, fica subordinado a ser exercido em um determinado lapso temporal, sob risco de caducar e não ser mais levado a efeito. No caso de o titular do direito deixar de exercer determinado direito até o momento estabelecido para o término de seus efeitos, ocorre a decadência, perdendo assim o seu direito, de forma que o seu titular não mais poderá exercê-lo (DENARI, 2011).

Um diferencial bastante claro é o de que a prescrição extingue a ação, e a decadência extingue o direito, não havendo diferença entre os dois institutos, significando ambos o perecimento de direitos subjetivos em estágio mais ou menos avançado do respectivo processo de formação (DENARI, 2011).

Quadro IV – Breve comparativo entre prescrição e decadência

Prescrição Decadência

Extingue a pretensão Extingue o direito

Pode ser alegada a qualquer tempo pelas partes. Deve ser alegada de ofício pelo juiz

A decadência legal deve ser reconhecida de ofício pelo juiz

Não corre contra determinadas pessoas Corre contra todas as pessoas exceção dos absolutos incapazes

Sofre com causas de impedimento, suspensão ou interrupção

Não pode ser impedida, suspensa ou interrompida

Fonte: (DINIZ, 2004).

Os prazos prescricionais estão expressos no artigo 27 do CDC:

Art. 27 – Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.‖

O artigo trata da prescrição do direito de pleitear judicialmente a reparação pelos danos causados por um acidente de consumo, com responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, artigos 12 a 17, no que se refere ao direito de pleitear indenização por defeito gerando esse defeito um dano material, dano emergente e/ou lucros cessantes, e/ou moral, criando o direito do consumidor de receber indenização por estes danos (NUNES, 2009, p. 405).

O direito de reclamar dos vícios dos produtos e serviços e a pretensão de reparar eventuais danos deles decorrentes submetem-se aos prazos decadencial e prescricional do CDC. O prazo decadencial é aplicável aos vícios e o prazo prescricional à pretensão indenizatória decorrente de acidentes de consumo, na forma dos artigos 26 e 27, respectivamente (TJDFT, 2020).

Trecho de Acórdão de 2020 expressa sobre a prescrição e a decadência como:

A legislação consumerista diferencia a ocorrência da prescrição e da decadência nas diferentes hipóteses de responsabilidade do fornecedor: se decorrente de fato do serviço ou produto a pretensão indenizatória prescreverá em 5 (cinco) anos, contados do conhecimento do dano ou de sua autoria (artigo 27); se oriunda de vício do produto ou serviço o direito de reclamar decairá em 30 (trinta) ou 90 (noventa) dias, conforme se trate de produtos ou serviços não duráveis ou duráveis (artigo 26) (TJDFT, 2020).

Acórdão 1232687, 07039655520198070018, Relator: EUSTÁQUIO DE CASTRO, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 19/2/2020, publicado no DJE: 6/3/2020.

A conclusão pela aplicação do prazo previsto na lei especial não é alterada pelo Art. 7º, do CDC, sendo a maioria do entendimento para vinte anos (prazo vintenário) e os dispositivos previstos no Código não excluem outros que sejam provenientes de tratados ou convenções internacionais dos quais o Brasil seja signatário ou de legislação interna ordinária, regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, por analogia, consuetudinário e equidade (NUNES, 2009, p. 405).

Marques defende ainda a ―teoria do diálogo das fontes‖, que trata de:

No lugar de conflito de leis, a visualização da possibilidade de coordenação sistemática destas fontes: o diálogo das fontes. Uma coordenação flexível e útil (efet utile) das normas em conflito no sistema, a fim de restabelecer sua coerência. Muda-se, assim, o paradigma: da retirada simples (revogação) de uma das normas em conflito do sistema jurídico ou do ‗monólogo‘ de uma só norma, (à – sic – ‗comunicar‘ a solução justa), à convivência destas normas, ao ‗diálogo‘ das normas para alcançar a sua ‘ratio’, a finalidade visada ou ‗narrada‘ em ambas. Este atual e necessário ‗diálogo das fontes‘ permite e leva à aplicação simultânea, coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas convergentes, com finalidade de proteção efetiva.

Somada essa teoria ao Art. 7º, do CDC, firmou-se um acórdão do Superior Tribunal de Justiça, em que a Ministra Nancy Andrighi foi voto vencido, quando fez a defesa da aplicação do prazo maior sob esses fundamentos, sendo que seus pares entenderam não se justificar o afastamento do prazo prescricional menor, previsto na lei especial:

Sem qualquer desvalor à eminente e mui cara Ministra Nancy Andrighi, peço-lhe vênia para discordar do seu voto, pois dúvida não tenho quanto à total impossibilidade de conjugar o prazo prescricional vintenário do Art. 177 do CCiv1916 com as normas de proteção ao consumidor, previstas no CDC e na legislação que lhe é complementar.

Aliás, estou convicto de que as normas consumeristas somente têm aplicação no âmbito do assim chamado ‗microssistema‘ de proteção do consumidor. A integração, a esse microssistema, de normas oriundas de outros conjuntos normativos (microssistemas ou sistemas jurídicos) somente se dá, de ordinário, em duas hipóteses: (i) quando a norma consumerista for lacunosa; ou (ii) quando a norma consumerista expressamente exigir a integração.

(…) ao Poder Judiciário, que deve fazer cumprir o ordenamento jurídico estatal e também está a ele submetido, não é dado inserir, em dado conjunto normativo, normas heterotópicas, e, muito menos, construir um conjunto normativo ad hoc‖ (STJ. 2ª Seção. Resp. 489.895/SP. Rel. Min. Fernando Gonçalves, julg. 23/04/10 – voto do Ministro João Otávio Noronha).

Prevalece assim o entendimento do artigo 7º, do CDC, que não autoriza a aplicação do prazo maior, previsto na lei ordinária, quando existe prazo diverso previsto na lei específica, ainda que menor. Destaca direitos existentes em outras fontes, mas que não tenham sido previstos no Código, buscando evitar que quando haja omissão do CDC, algum direito se perdesse (DENARI, 2011).

A disciplina da prescrição pelo CDC não apresenta nenhuma lacuna que justifique a integração a partir do seu Art. 7º, já que a matéria foi inteiramente regulada pelo referido Código, sendo desnecessário recorrer a outras normas, incluindo-se o Código Civil revogado (NUNES, 2009, p. 405).

Importante definir que o fundamento legal utilizado na petição inicial é irrelevante para a definição da prescrição, da mesma maneira, não ajuda ao consumidor, para tentar escapar à prescrição, fundamentar sua ação no direito comum, abrindo mão dos benefícios previstos na lei consumerista na tentativa de afastar a incidência não apenas do Art. 27, do CDC, mas da lei especial por completo (DENARI, 2011).

O Código de Defesa do Consumidor é norma cogente, devendo ser assim aplicada independentemente da vontade das partes, sem que caiba ao autor da ação escolher os fundamentos legais, devendo apenas fazer a narração da ação e ao magistrado escolher os fundamentos legais.

Caso o juiz ache que se trata de acidente de consumo, deverá julgar então sob a ótica do CDC, inclusive sobre a prescrição, mesmo que o consumidor tenha fundamentado a sua ação em institutos previstos no direito comum, como a culpa do fornecedor do artigo 159, do Código Civil anterior (NUNES, 2009, p. 405).

Para ilustrar, segue entendimento do STJ, sobre uma demanda de um consumidor contra a transportadora de passageiros por danos decorrentes de acidentes rodoviários, decidindo que o prazo aplicável em tais hipóteses seria o de vinte anos previsto no Código Civil (Art. 177) e não o de cinco anos previsto no CDC (Art. 27) por entender que a questão envolvia culpa (Art. 159, do Código Civil) e não fato do serviço (Art. 14, do CDC, abrangido pela remissão expressa do seu Art. 27):

(…) I – A hipótese retratada nos autos, acidente com passageira de transporte coletivo, não diz com vício ou defeito de segurança do serviço. Não há como se possa enquadrar a imperícia, imprudência ou negligência do preposto da recorrida, fundamento da ação reparatória, nesse contexto. II – A responsabilidade do transportador é contratual e o direito que se persegue é de natureza pessoal, regido, portanto, pela norma do Art. 177 do Código Civil, não se aplicando o artigo 27 do CDC (…)‖ (STJ. 3ª Turma. Resp 234725. Rel. Min. Waldemar Zveiter, julg. 19/02/01).

(STJ. 3ª Turma. Resp 464193. Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, julg. 11/11/02).

Acredita-se que não foi expresso neste entendimento a melhor solução, já que versa sobre alegado acidente de serviço ação em que o passageiro do ônibus pretende receber indenização por conta de danos sofridos em um acidente, sendo que o defeito, segundo definição do §1º, dos arts. 12 e 14 do CDC seria a quebra da legítima expectativa de segurança do consumidor (GARCIA, 2008).

Observe-se que o Direito caduca e a pretensão prescreve, no caso específico do CDC, a decadência atinge o direito de reclamar, a prescrição afeta a pretensão à reparação pelos danos causados pelo fato do produto ou do serviço (NUNES, 2009, p. 405).

A maioria da doutrina se posiciona em uma linha de que não se deve considerar a decadência e a prescrição como institutos distintos, já que estes tratam do mesmo fenômeno jurídico, que é a perda do direito subjetivo devido ao decurso do tempo (GARCIA, 2008).

4 ESPECIFICAÇÕES DOS BENS ESSENCIAIS

Pode se tratar os bens essenciais como os quais precisamos para poder viver, como os alimentos que precisamos todos os dias. Dentro dos bens tangíveis, que são os tipos de bens que podem ser tocados, ou seja, que são concretos e, em casos mais abstratos, podem ser atos culturais, como por exemplo, patrimônios culturais ou imóveis e máquinas de uma empresa (NUNES, 2009).

As normas de defesa do consumidor caracterizam os produtos essenciais para proteger o consumidor quando adquire produtos que tenham caráter de serem essenciais, já que não se pode garantir o correto funcionamento de um produto, devendo ser assim protegido junto ao fornecedor, fazendo com que o fornecedor repare o produto de natureza essencial imediatamente, devolvendo a quantia paga pelo produto, ou ainda, o abatimento do valor do produto de acordo com o seu vício (BARBIERI, 2013).

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