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Vivemos num mundo globalizado que cada vez mais exige o uso dessas línguas em situações reais. Nessa globalização existe também uma tensão entre o que é global e o que é local. As distâncias espaciais e temporais têm se encurtado, as fronteiras, desaparecido e o ILE se estabelecido como chave para o progresso e para a mobilidade social dentro e além das fronteiras nacionais também aqui no Brasil. Devido também a tal projeção no panorama da globalização é que a Língua Inglesa está no centro da Linguística Aplicada contemporânea (KUMARAVADIVELU, 2006).

Contudo, a mesma globalização que pode propiciar mobilidade social, em contrapartida ameaça culturas locais. A consciência desses fatores reforçou nosso esforço em elaborar atividades privilegiando a interculturalidade, em que se incluiu a apreciação da cultura nativa dos aprendizes e de outras culturas. Considerando que os alunos podem necessitar da proficiência nessa língua tanto dentro quanto fora do Brasil, é interessante que possam não só se comunicar, mas interagir com maior eficiência, estando aptos a apreciar outras culturas, portando-se de maneira ética e crítica, conscientes também de seus deveres e obrigações.

Percebemos que o trabalho com jokes, porém, pode ser arriscado para esses sujeitos, que em nossa pesquisa voltada para o Ensino Médio regular são adolescentes em sua maioria. Muitas jokes conduzem discursos estereotipados, preconceituosos, subversivos, mesmo proibidos, até opostos ao que os sujeitos atingidos pelas jokes acham de si (POSSENTI, 2002). Portanto, o fato de a proteção dos sujeitos envolvidos na pesquisa contra quaisquer danos ser uma questão ética central (BOGDAN; BIKLEN, 1994) é mais um motivo de não usar jokes como pretexto para o ensino de estrutura linguística em que não se propicia uma reflexão sobre os significados veiculados pelas jokes. Também não consideraríamos satisfatório empreender toda uma pesquisa qualitativa sobre elementos de estrutura linguística em jokes em Inglês e simplesmente alegar que proporcionaríamos, em posterior aplicação das

atividades em sala de aula, alguns momentos de discussão sobre posicionamentos preconceituosos e contrários à ética, pois entraríamos em conflito com nossos objetivos. Por isso também optamos por um tratamento discursivo da linguagem em nossa pesquisa, em vez de tratar apenas de estruturas e deixar a negociação com estereótipos aberta para cada aprendiz isoladamente. Ora, se a formação dos aprendizes enquanto cidadãos é central, então é necessário trabalharmos com as jokes levando em consideração não só a decodificação de signos, mas os discursos em que as jokes se constituem, os quais elas também veiculam. É necessário, portanto, questionar na elaboração das atividades o que algumas jokes dizem, com o intuito de proporcionar que os aprendizes considerem o plano cultural e o discursivo.

2.2CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA – INTERESSES, QUESTIONAMENTO E DADOS

Limitados pelos prazos comuns a um curso em nível de mestrado e, como já dito, impulsionados pela curiosidade e interesse de empreender uma pesquisa que proporcione maior inteligibilidade sobre um contexto de ensino-aprendizagem de ILE responsivo (I) a discussões teóricas em voga na área de ensino-aprendizagem de LEs, (II) a indicações governamentais sobre a formação dos aprendizes no Ensino Médio, (III) a exigências de um mundo globalizado e (IV) a algumas das necessidades pessoais e profissionais dos aprendizes, buscamos construir possibilidades utilizando um gênero textual.

Escolhemos as jokes por se tratar de um gênero comum, bastante acessível aos aprendizes, por serem textos construídos sobre valores culturais, como estereótipos e preconceitos. Também nos instigou inicialmente certa leveza do gênero, que veicula humor e ludicidade. Novamente limitados por prazos necessários, decidimos não trabalhar com o lúdico e nos limitar ao humor como característica atrelada à interação com jokes.

Para compreender melhor algumas discussões teóricas em nossa área de atuação profissional, procedemos a uma revisão de textos sobre abordagens, métodos e metodologias de ensino-aprendizagem de LE. Para familiarizarmo-nos com o gênero já escolhido, procedemos a uma breve reflexão sobre noções que consideramos chave em alguns trabalhos teóricos, como Chiaro (1992) e Possenti (1998, 2010). Adotamos uma perspectiva cultural para guiar nosso olhar sobre as jokes, considerando indicações governamentais sobre o espaço da cultura na Educação e, mais especificamente, no ensino-aprendizagem de LEs no Ensino Médio.

No decorrer desse percurso investigativo, lançamos mão de nosso corpus e definimos o tipo de pesquisa a empreender segundo nossos questionamentos que se condensam na seguinte pergunta: como explorar os aspectos culturais de jokes com vistas à elaboração de atividades de ILE que objetivem o desenvolvimento da competência intercultural e a interação? Apesar de utilizarmos o termo “explorar” não procedemos a uma pesquisa exploratória, diagnóstica. Por “explorar” queremos dizer utilizar os aspectos culturais das jokes como recursos para o ensino-aprendizagem de ILE. Para tanto, precisamos empreender uma análise de jokes, que implica na identificação e descrição de possíveis aspectos culturais nesses textos, descrição essa que passa por um viés linguístico.

Depois de ler um número considerável de exemplares, chegamos finalmente a um conjunto de cinco jokes. Tais textos são nossos dados primários, pois foram coletados da realidade em primeira mão, de alguns sítios de piada na Internet, não de outra pesquisa ou documento teórico (CHAROUX, 2006). Esses dados primários são uma amostra não- probabilística intencional de jokes. Podemos considerá-la não-probabilística, pois não promovemos nenhum sorteio com probabilidade definida. Procedemos a várias seleções, até chegarmos a uma amostragem com tamanho adequado ao estudo. Vale salientar que não buscamos, contudo, um ideal de aleatoriedade, apesar de a primeira seleção ter se aproximado disso mais que as posteriores. Percebeu-se uma recorrência de implícitos e ambiguidades, comuns ao gênero, e então recorremos à Análise do Discurso de linha francesa e à Linguística.

A amostra é intencional, pois uma característica predefinida na seleção é não ter um conteúdo sexual. Essa preocupação se deu por questões pessoais e profissionais do pesquisador e em virtude de os aprendizes vislumbrados serem em grande parte, adolescentes, menores de idade e não termos embasamento teórico nem tempo hábil para poder suscitar uma discussão sobre um traço tão delicado. Outra característica que buscamos para a amostragem e que passamos a priorizar no decorrer das seleções de piadas foi a considerável relevância de fenômenos como pressupostos, subentendidos e ambiguidade para cada joke. Destacamos que optamos por coletar a atual amostra da Internet pela facilidade de acesso.

O outro conjunto de dados que compõe nosso corpus, como já anunciado, são a LDB (1996), os PCNEM (2000), os PCN+EM (2002) e as OCEM (2006). Esses são dados secundários, pois são produtos de pesquisa e seu conteúdo não foi compilado neste trabalho em primeira mão (CHAROUX, 2006).

Em suma, nosso corpus é constituído por dados primários, as jokes, que são documentos pessoais de publicação aberta, pois são postadas por particulares e estão acessíveis a qualquer parte interessada (FLICK, 2009), e os direcionamentos governamentais para a Educação no Brasil, que são documentos oficiais (autoria atribuída ao Governo Federal), públicos (não são de posse de determinado(s) indivíduo(s) ou grupo de indivíduos) e de publicação aberta (acessíveis a qualquer parte interessada) (id.).

A análise das jokes terá como fim a identificação e descrição de aspectos culturais, com vistas à utilização desses aspectos nas atividades. Como entrada para tal análise, utilizaremos as categorias da Análise do Discurso aqui já trabalhadas – pressupostos, subentendidos, ambiguidade (categoria amplamente trabalhada pela Semântica), cena enunciativa e algumas competências.

Para o estudo dos documentos oficiais não utilizamos nenhum mecanismo de análise em especial, pois são dados secundários sobre os quais queremos refletir a título de direcionamentos à elaboração de atividades, mas não são o centro de nosso objeto. Por isso a leitura destes documentos se dará sem preocupações com categorizações, implícitos e relações implícitas de correntes teóricas e relações de poder subjacentes. Nosso olhar sobre estes textos será um olhar de professor reflexivo que pesquisa para sua sala de aula.

Dadas as considerações acima, é possível concluir que, quanto ao tipo de questão de pesquisa que buscamos responder, nossa investigação é predominantemente descritiva, com resultados que apontam para como se apresentam aspectos culturais das jokes e como tais aspectos podem alimentar atividades de ensino-aprendizagem de ILE, levando em consideração o que dizem alguns documentos oficiais para a educação e discussões teóricas da área que falam à atualidade. Estamos assim, como sugerem Bogdan e Biklen (1992), utilizando uma abordagem qualitativa e o caráter qualitativo transborda as fronteiras da pesquisa acadêmica e atinge o fazer profissional como uma maneira qualitativa de pensar e de coletar dados. Tais autores sugerem que os professores questionem-se frequentemente sobre seu ambiente de trabalho, seu fazer profissional, suas relações pessoais e profissionais e as diferentes pessoas a sua volta, de maneira que possam compreender tais pessoas da forma como elas se veem. Damos um grande passo em rumo a tal sugestão ao darmos oportunidades de os aprendizes externarem sua visão de mundo e a de suas comunidades, diante das visões de mundo remetidas pelas jokes. Com esse olhar qualitativo refletiremos sobre alguns direcionamentos dos documentos oficiais supracitados sobre a perspectiva da cultura no ensino-aprendizagem de ILE, o que teve implicações na elaboração das atividades.

Desejamos assim, modalizar entre idealizações de documentos oficiais que se pretendem a uma generalidade – pois se dirigem às escolas em todos os contextos do país, daí o aparecimento de idealizações como parâmetros a ser alcançados por todos – e o “mundo real” (BOGDAN; BIKLEN 1992 p. 216).

Em uma visão qualitativa, percebemos que nem todos os padrões que se apresentam são leis, nem mesmo todos os que são estabelecidos pelos documentos oficiais, e, portanto, os tais são adaptáveis. Por outro lado, o “mundo real” também pode ser mudado, como apontam os autores:

[...] muitos professores tomam o “mundo real” como algo dado e inalterável, como que existindo quase acima da influência deles. Muitos veem suas situações como inegociáveis. Neste framework, as pessoas não sentem que participam ativamente na molduragem e criação do significado. A realidade é construída por pessoas enquanto vão vivendo suas vidas diárias. As pessoas podem ser ativas em emoldurar e mudar o “mundo real”. Elas podem mudar e afetar outras. Professores e seus estudantes definem o mundo real juntos enquanto interagem cada dia em suas salas de aula. Enquanto o que é possível é negociado dentro das limitações de coisas como hierarquia escolar, disponibilidade de recursos e compreensões culturais de senso comum, [a maneira] como professores e estudantes definem um ao outro e como são os ambientes educacionais se torna transacional31(BOGDAN; BIKLEN, 1992, p. 216).

Além dessa perspectiva de mudança da realidade, o olhar qualitativo pode auxiliar- nos, enquanto professor de ILE que tem contato direto com aprendizes, a ser mais efetivo e a incorporar a prática qualitativa no currículo e no fazer dos aprendizes (id.).