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5.1. AGRICULTURA FAMILIAR

Ao longo deste trabalho ficou evidente a relevância das políticas públicas para o sucesso das experiências familiares, todavia deve-se destacar que a sua ausência, assim como a elaboração de políticas que não levam em consideração as limitações desse grupo, representam barreiras para se ter uma agricultura familiar mais consolidada e capaz de garantir a sobrevivência digna aos pequenos produtores rurais.

A experiência da COOPAPI mostra a relevância das políticas voltadas para agricultura familiar. Como exemplo dessas o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), Programa de Aquisição de Alimentos - PAA e Programa Nacional da Alimentação Escolar (PNAE), que dá oportunidade as famílias cooperadas, o acesso direto ao crédito, aos mercados locais e regionais e realizando a venda direta aos consumidores através das feiras de agricultura familiar em nível local, estadual e nacional. A exclusão da COOPAPI na compra do PAA representou um grande prejuízo a cooperativa, como ficou evidente na tabela na 9.

A COOPAPI também tem prejuízos pela ausência de políticas públicas crucias para o desenvolvimento da sua principal atividade, a produção de mel. A necessidade de assistência técnica para o desenvolvimento de técnicas que garantam uma produção de mel mais resistência a seca, além da construção de colmeias em tamanho padrão e a condução dos criadores para obtenção do Selo de Inspeção Federal. As principais organizações que ainda garantem a essa experiência assistência técnica são as organizações de ensino superior, como o IFRN, UFERSA e a UFRN.

A COOAFARN, desde sua criação, recebeu financiamento público para consolidação das suas atividades, isso vai desde do financiamento da Fundação Banco do Brasil para criação das cooperativas e associações responsáveis por constituir a Cooperativa Central, até o financiamento direto da CONAB para construção da estrutura produtiva necessária para torna- la uma agroindústria familiar. Os agricultores que a compõem são beneficiários diretos do PRONAF. A cooperativa vende parte de seus produtos industrializados para o PNAE. A cooperativa foi beneficiada com a construção do Centro de Comercialização Mercado da Terra, que colabora com a construção dos circuitos regionais e se apresenta como mais uma forma de comercialização para esses agricultores.

Assim como a COOPAPI, esses agricultores enfrentam problemas decorrentes da falta de uma assistência técnica efetiva, que possa colaborar com o desenvolvimento de novas atividades que visem garantir a agregação de valor aos produtos da cooperativa. Além de adequar a agroindústria da cooperativa para alcançar a certificação para os seus demais produtos.

Tem-se que destacar que diferente de boa parte das cooperativas que optam por trabalhar com produtos orgânicos, a COOAFARN escolheu esse caminho por incentivo dos seus próprios cooperados, que encontraram orientação no mercado e foram capazes de adentrar em novos nichos de mercado, o que garantiu maior valor agregado a sua produção.

As experiências nos assentamentos em Mossoró e Baraúnas refletem o peso de uma política pública ainda ineficiente, o processo de reforma agrária em nosso país. Esses agricultores, em sua maioria, convivem com uma produção agrícola ainda baseada em milho, feijão e mandioca, cultivos que ao longo desse trabalho, mostraram-se pouco adaptados ao semiárido. Quando arriscam em novos produtos, se deparam com o alto custo desses novos cultivos, com destaque para o melão. A pecuária ainda muito rudimentar e incapaz de por si só garantir a sobrevivência desses agricultores. O acesso as linhas de crédito do Pronaf não se mostram suficientes para garantir condições produtivas mínimas. A completa ausência de assistência técnica, seja por meio do estado ou por outras organizações, fazem com esses agricultores não consigam mudar essa trajetória.

As políticas de cunho social, tais como bolsa família, aposentadoria rural e até a garantia safra, as responsáveis por assegurar uma condição mínima para esses agricultores. A partir do triste cenário que nos deparamos nessas comunidades, faz-se necessário repensar as políticas públicas para o rural. As famílias que apresentaram melhores condições de vida, são aquelas em que a pluriatividade estava inserida, dado esse fato, não se pode prosseguir na construção de políticas públicas para esse público, sem levar em consideração as outras formas de se obter renda e consequentemente, uma vida mais digna.

O caso que foi ilustrado de Baraúnas, nesse trabalho, descreve as formas como Da Paz encontrou um meio de sobrevivência para sua família. Contando não apenas com a criação de tilápia e mel, ela tinha em sua casa pessoas beneficiadas do bolsa família, marido aposentado e a filha trabalhando na cidade. Além da gestão junto a um grupo de mulheres de um banco solidário, iniciativa responsável por assegurar a compra de um medicamento ou outra emergência entre elas.

As experiências em Currais novos apresentaram formas de sobrevivência no semiárido, que sem dúvidas, estavam pautadas nas políticas públicas, ainda que no discurso dos

agricultores não fosse algo tão aparente. A criação de bovinos no sítio Santa Isabel, foi fomentada pelas ações públicas. Apesar do proprietário mostrar-se bastante independente, atualmente, em relação as principais políticas de crédito e comercialização, já foi beneficiado por todas elas. O agricultor ao longo da conversa, evidenciou a relevância da política luz para todos, que garantiu não só a ele, mas aos seus vizinhos, condição mínima de sobrevivência no campo. O proprietário é beneficiário da política de tarifa verde, com a qual reduz significativamente os seus gastos com energia elétrica. Além das políticas acima, o sítio Santa Isabel está cadastrado em no “Projeto Talentos do Brasil Rural”, o que rende a família mais uma fonte de renda.

Em relação as políticas de crédito, atualmente não acessa nenhuma linha, seja do Pronaf ou do Agroamigo. Todavia, o agricultor já foi beneficiado pelas duas linhas de crédito, o que teve um papel fundamental para construção da infraestrutura do seu sítio. Apesar de não vender para o mercado institucional, o agricultor já participou do programa do leite do governo do estado. O Sebrae apresentou um papel crucial para consolidação da criação de bovinos do agricultor, através da consultoria que visa garantir a qualidade do produto, por meio de testes específicos que medem a quantidade de gordura e a densidade do leite. Além da assessoria para comercialização, visando capacitar os produtos para relações com o comprador e a precificação.

Deve-se ainda destacar que a família do proprietário apresenta um caráter pluriativo, em que sua esposa e filho desempenham funções fora da agricultura. Sua esposa é funcionária do município e o seu filho é químico e são essências para complemento da renda familiar.

A política sanitária aparece para o agricultor como uma barreira a construção de uma agroindústria familiar. Ele apresenta ao longo da conversa, que dado os altos custos para adequar a sua fazenda as normas de produção, ele opta por não trabalhar com produtos de maior valor agregado, que dependem diretamente processamento e beneficiamento, como manteiga, queijo, leite para o mercado formal etc.

Além da valorização por alimentos que possam ser mais seguros, a crescente preocupação com a preservação do meio ambiente através da utilização sustentável dos recursos naturais e relações comerciais socialmente justas, vêm levando ao questionamento do modelo agrícola fundamentado na “Revolução Verde”, baseado na utilização intensiva de produtos químicos, adensamento de criações animais e industrialização da produção. Essas preocupações têm ampliado a demanda da sociedade por produtos diferenciados, que apresentem atributos de qualidade específicos como ausência de resíduos químicos, além de atributos ambientais e sociais, definidos à partir do seu processo produtivo.

A experiência do Sítio Cruz trouxe um relato pautado na agricultura orgânica, que surgiu a partir do programa de ações do Programa Pais do Sebrae, que nada mais é do que uma tecnologia social que trata de uma nova alternativa de trabalho e renda para a agricultura familiar. Pode ser usado por todos os produtores rurais que queiram melhorar a qualidade de produção, visando possibilitar o cultivo de diversas hortaliças, frutas, cereais e plantas medicinais e fitoterápicas mais saudáveis para o consumo das famílias e para comercialização (SEBRAE, 2016)

A agricultura orgânica apresentou e ainda oferece grandes desafios para esses agricultores, que vão desde dos custos durante o processo de conversão do sistema convencional para o orgânico e custos de certificação; falta de assistência técnica da rede pública; dificuldades de acesso ao crédito bancário e investimentos em tecnologia; e escassez de pesquisa científica em agricultura orgânica. Sob esse contexto o papel do Sebrae foi fundamental para que esses agricultores optassem pela produção de orgânicos. Através do programa eles puderam conhecer as técnicas adequadas para o cultivo, além de aprimorar os meios de comercialização dos seus produtos.

Deve-se ainda destacar a atuação do IFRN, prestando assistência técnica a esses agricultores, o que é fundamental para o sucesso deles, dada a ausência da ATER. Esses agricultores ainda não são beneficiários do programa Tarifa Verde e no momento comercializam apenas em feiras livres, dado que a ausência da certificação de orgânicos os impedem de obter o acréscimo de até 30% para produtos orgânicos no mercado institucional e de adentrar nas redes de supermercado. Esses agricultores são beneficiados pelo crédito do Pronaf, com o qual construíram um poço em sua área de cultivo.

O processo de certificação de produtos orgânicos ainda é um grande desafio para os agricultores familiares que buscam sobreviver nesse nicho. O cultivo de orgânicos apesar de mostrar-se mais barato, dado a não necessidade de insumos externos, demanda mais tempo para que se obtenha o produto e mais trabalho para livrá-lo de eventuais pragas. Caso o agricultora não obtenha o selo, tornasse difícil dar continuidade a produção, já que ele dificilmente irá se apropriar da agregação de valor por se ter um produto livre veneno.

Existem agricultores familiares consolidados, que possuem certificação da sua produção, contam com assistência técnica e dessa maneira conseguem adentrar no mercado com mais facilidade, como a Cooperativa Central da Agricultura Familiar do Rio Grande do Norte. Por outro lado há inúmeros produtores familiares, que não contam com assistência técnica, nem recursos para o processo de transição da agricultura tradicional para orgânica e ainda não possuem condições de arcar com os custos para a certificação nem de cumprir todos

os requisitos. Esses são excluídos dos supermercados, não podem vender para o mercado institucional recebendo o bônus de produção orgânica e o que resta são os circuitos regionais. O sítio Cruz enfrenta sérios problemas no que desrespeito a certificação, apesar de já terem dado entrada, não sabiam se quer explicar quais eram as barreiras que estavam enfrentando para obtenção do selo. Afirmaram que o procedimento é bastante burocrático e isso dificulta o acesso a certificação.

A experiência da Associação de Mulheres do Quandú contou com a atuação das políticas públicas, principalmente a partir de 2013 em que elas foram selecionadas com recursos de projetos da CONAB e BNDES, com parceria com o IFRN construíram uma agroindústria familiar, para que as mulheres pudessem comercializar os seus produtos, com maior valor agregado e cumprir com as exigências da política sanitária. Até o terreno em que a sede da associação foi construída, foi doado pela Prefeitura. Atualmente, o grupo foi contemplado por um edital do RN Sustentável e aguardam o recurso para concluir a agroindústria.

O Pronaf é acessado individualmente pelas mulheres do grupo, assim como o bolsa família. Com a linha de crédito, elas desenvolvem outras atividades agropecuárias além da associação, com destaque para o cultivo individual de hortaliças. As políticas de comercialização são fundamentais para o grupo, que acessam ao PNAE e à doação simultânea. Vale ressaltar que essas mulheres apresentaram a presença de uma líder, que foi não só para a formação e persistência do grupo, assim como torna-lo apto a concorrer os editais com linhas de crédito específicas para agricultura familiar.

Vale destacar que um problema comum a associação é aos demais citados neste trabalho, é a política sanitária, que as impedem de comercializar os seus produtos processados. Isso explica a luta persistente por concluir a construção da agroindústria, que será essencial para garantir que elas usufruam do valor agregado gerado pelo processamento e beneficiamento dos seus produtos.

5.2. AGRICULTURA EMPRESARIAL

Ao se discutir acerca das empresas agrícolas ilustradas neste trabalho, faz-se necessário levar em consideração que a empresa Agrícola Famosa e a Copyfruit atuam no mercado nacional e internacional de melão, enquanto que a Hortaviva oferece seus produtos apenas para Natal. A partir disso, tem-se que os problemas enfrentados por cada uma delas, corresponde a realidades bastante distintas.

As empresas que atuam no mercado do melão estão cercadas pela ausência de uma infraestrutura mínima, o que faz necessário para exportar os seus produtos, buscar portos vizinhos, dado que no estado não há nenhum porto com uma estrutura mínima para escoar a produção. Nos municípios vizinhos tem-se o Pecém e Mucuripe (Ceará) e, quando necessário, de Suape (Pernambuco).

O cultivo de frutas irrigadas no Polo de Desenvolvimento Integrado Assu-Mossoró é feito com base na intensa exploração dos recursos naturais, especialmente das águas retiradas do Rio Açu e dos aquíferos Jandaíra e Açu, por meio de centenas de poços artesianos perfurados, sobretudo no Vale do Apodi-Mossoró. No que concerne aos aspectos econômicos e sociais, é preciso acentuar que os recursos gerados pela atividade fruticultora concentram-se nas mãos das empresas de grande e médio portes e dos produtores rurais capitalizados, com reduzida externalidade positiva para a maioria da população dos municípios onde as frutas são produzidas.

A exportação de melão se depara com controle fitossanitário, que constitui uma barreira não tarifária, imposta pelos países importadores de acordo com os seus interesses, tais medidas têm forçado aos países produtores a adequarem-se às rígidas normas de controle entomológicas, de limites máximos de resíduos de contaminação nos produtos vegetais e animais. Aos países produtores cabe provar que atendem tais normas e requisitos através do cumprimento das certificações exigidas pelos mercados consumidores. Apesar da alta responsabilidade que a produção de melão representa para economia do Rio Grande do Norte, existe uma completa ausência do estado no que desrespeito a oferecer técnicos qualificados que possam auxiliar esses agricultores no processo de obtenção das certificações, o que justifica a agricultura familiar encontrar grandes desafios para adentrar no mercado internacional.

No entanto, essas empresas constituem o Comitê Executivo de Fitossanidade do Rio Grande do Norte (Coex), uma entidade associativa que possui 168 produtores vinculados. As empresas vinculadas ao Coex representam 95% da produção do agropolo e 90% das exportações do melão. Juridicamente, os produtores são independentes, mas trabalham em conjunto visando a interesses comuns do setor, especialmente no que se refere às questões fitossanitárias. (COEX, 2007). Este Comitê organiza a Feira Internacional da Fruticultura Tropical Irrigada (Expofruit), que se realiza todos os anos na cidade de Mossoró, mobilizando produtores, compradores, entidades públicas e privadas interessadas no desenvolvimento e fortalecimento da fruticultura e proporcionando a realização de negócios durante o evento.

A região dispõe das redes regulares de ensino superior, sendo contemplada com a Universidade Federal do Semiárido (Ufersa), o Instituto Federal de Educação do Rio Grande

do Norte (IFRN), a Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (Uern). Deve-se destacar o papel dos cursos da área de ciências agrárias da Ufersa, os quais vêm contribuindo com profissionais habilitados na área de agronomia e carreiras afins. Além dessas instituições, focando a formação do trabalhador na fruticultura, entidades como o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) desenvolvem trabalhos de qualificação da mão de obra na região, capacitando e certificando seus trabalhadores na atividade agrícola, especialmente no que se refere às demandas diretas dos produtores.

O crédito é um recurso indispensável para o sucesso do cultivo de melão. As instituições de maior peso são o BNDES, BB e BN. O estado teve e tem um papel essencial para a oferta de crédito rural, com base no anuário estatístico de crédito rural, disponibilizado pelo Sistema Financeiro Nacional do Banco Central do Brasil, é possível observar a responsabilidade da política de crédito para o êxito do cultivo do melão. O Rio Grande do Norte se destaca por ter sido o estado com o maior recebimento de recursos destinados ao cultivo irrigado de melão nas atividades de custeio, totalizando um montante de 34.263.754,47, perdendo apenas para o estado da Bahia, que tomou 38.1888.745,42 (BANCO CENTRAL/CRERURAL,2011).

A política cambial tem se mostrado uma fiel aliada dessas empresas de exportação de melão analisadas neste trabalho. No período de valorização cambial sempre mostrou-se um desafio aos exportadores. Com a moeda valorizada, ou seja, o real valorizado diante do dólar, tem-se uma queda nas exportações, dado que o produto chegará no consumidor lá fora bem mais caro. No entanto, a política de desvalorização do real em relação ao dólar tem garantido aos produtores mais competitividade no mercado internacional, o que tem contribuído com a expansão do produto no mercado europeu.

No caso da empresa de orgânicos, a Hortaviva, tem-se uma completa aversão do proprietário as políticas públicas, sendo bastante enfático em relação a sua independência em relação as elas. No entanto, alguns fatos merecem destaque. O proprietário cita a ação do Sebrae como determinante para a sua entrada no cultivo de orgânicos, por meio do projeto “Como tornar o seu sítio criativo”. Ainda recebe assessoria da instituição, apesar de não contar com nenhuma assistência técnica dos órgãos do estado.

O proprietário ainda é beneficiado pela infraestrutura do estado, tendo em vista que sua produção acontece em Nísia Floresta e ele escoa a produção por estradas públicas. Ainda tem acesso a política de tarifa verde, a qual obtém descontos expressivos na energia elétrica. É necessário destacar que apesar de sua empresa ter sido uma das pioneiras no Nordeste, devido

à ausência de apoio do estado, seja com assistência técnica ou melhor infraestrutura, sua empresa perdeu o papel de destaque para as demais que emergiram dos municípios vizinhos.

A complexa política sanitária se apresenta como uma barreira até mesmo para agricultores consolidados, como o caso da Hortaviva. Apesar de o empresário contar com uma vasta produção de alimentos processados e beneficiados, esses ainda não são devidamente certificados e não podem adentrar nas redes de supermercado da cidade.