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5.1 Caracterização das diferentes isoformas de S6Ks

Apesar das isoformas p70-S6K1 e p54-S6K2 serem proteínas homólogas, elas ainda apresentam diferenças significativas em suas estruturas, especialmente em seus domínios N- e C- terminal. Por muito tempo, acreditava-se que a isoforma canônica, p70-S6K1, apresentava funções sobrepostas às das isoformas de S6K2. Dessa forma, a literatura apresenta extensa informação sobre a S6K1, mas não de S6K2.

Os resultados obtidos e apresentados no artigo publicado na revista Proteomics (anexo I) forneceram dados que possibilitaram caracterizar e diferenciar as isoformas de S6Ks. Curiosamente, foi observado que S6K2 possui muito mais parceiros de interação do que S6K1, sendo que os parceiros de S6K2 apresentam, principalmente, funções na transcrição, biogênese de ribossomos, síntese protéica, replicação e reparo de DNA e splicing e processamento de RNA, enquanto S6K1 apresenta maior interação com proteínas de resposta ao estresse, citoesqueleto, metabolismo, remodelamento de cromatina e fosfatases. Além disso, também foi visto que S6K1 apresenta proteínas de interação com a localização predominantemente citosólica, enquanto S6K2 apresenta interação com proteínas mais nucleares. Tal fato corrobora com a localização dessas quinases, uma vez que através de imagens de fluorescência foi visto que S6K1 apresenta localização mais dispersa na célula, enquanto S6K2 tem uma localização robusta no núcleo e no nucléolo.

Algumas proteínas como PARP1, XRCC6, NCL, NPM1, SRSF1, PPM1A, PPM1B, HSPA4 apresentaram o score Saint probability (SP) extremamente elevado. Proteínas como XRCC6, MYH10, ILF3 e NAT10 receberam um score SP elevado e ainda possuem o sítio consenso de fosforilação das S6Ks (RXRXXT/S), dando mais evidências de que podem ser novos substratos das S6Ks. É importante ressaltar que a análise feita através do CRAPome auxilia a identificar as proteínas que possuem maior probabilidade de interação, entretanto, as proteínas com scores baixos não devem ser descartadas, pois mesmo a proteína rpS6, a qual é um dos principais substratos das S6Ks, recebeu um score pequeno. Recentemente, um estudo publicado na revista Nature identificou a proteína glutamyl-prolyl-tRNA synthetase (EPRS) como novo substrato de S6K1, evidenciando que sua fosforilação culminava em ganho de adiposidade em animais

(Arif et al., 2017). A proteína EPRS foi identificada em nossas análises, entretanto, apresentou um score SP baixo. Dessa forma, as análises por CRAPome podem ser utilizadas para identificar as proteínas com maior probabilidade de interação, porém, outras proteínas com SP baixo podem ser consideradas, principalmente se possuírem o sítio consenso de fosforilação das S6Ks, o que é caso das proteínas eIF2α e FXR1.

De forma geral, o estudo forneceu informações importantes para que outros trabalhos possam utilizar de base para caracterizar novas proteínas-alvo ou reguladoras de S6K1 e S6K2, e assim compreender os mecanismos pelos quais são reguladas ou regulam diversos processos biológicos. Uma discussão aprofundada desses dados é apresentada no anexo I.

5.2 Relação de eIF2α e S6Ks

A partir dos dados inicialmente apresentados no artigo publicado na revista

Proteomics (anexo I), decidimos estudar melhor a relação entre S6Ks e eIF2α,

levando ao modelo proposto na figura 21. Tal modelo sugere que as S6Ks podem fosforilar a proteína eIF2α no resíduo 58, levando a seu estado não-fosforilado no resíduo S52 ou inibindo a fosforilação do mesmo. Hipotetiza-se que isso possa ser um mecanismo para a retomada da síntese protéica em uma situação em que a célula está livre de agentes estressantes e necessita retomar a síntese protéica. Além disso, outros processos celulares poderiam ser regulados por essa interação, uma vez que eIF2α em seu estado fosforilado em S52 estimula a autofagia como um mecanismo de sobrevivência celular, as S6Ks, ao diminuírem tal fosforilação nesse resíduo, poderiam inibir a autofagia, mecanismo que já é conhecido por ter a regulação da via da mTOR/S6K.

Outros estudos suportam a hipótese proposta nesse trabalho. Recentemente, Ren et al (2017) demonstrou que a depleção de PTEN, levando a uma super-ativação de mTORC1 e S6Ks, reduz a fosforilação de eIF2α (S52), bem como a ativação de PTEN aumenta sua fosforilação no resíduo S52. PTEN é uma fosfatase conhecida por ser supressora de tumor, a qual atua como antagonista da via da mTOR (Lim et al., 2015, figura 1). Logo, a alteração na fosforilação de eIF2α (S52) poderia ser em parte mediada pelas S6Ks.

Muitos processos celulares, incluindo apoptose, autofagia, síntese de proteínas, metabolismo energético e inflamação, são controlados pela via da mTOR

e a via de estresse do retículo endoplasmático (ER), também conhecida como ulfolded protein response (UPR). Embora tais vias de sinalização tenham atraído ampla atenção na biologia celular e na descoberta de fármacos importantes, o cross-talk entre as duas vias emergiu apenas muito recentemente. É muito importante a compreensão das intersecções da via mTOR e UPR, uma vez que o cross-talk existente entre essas redes de sinalização são fundamentais para a homeostase celular (Appenzeller-Herzog e Hall, 2012).

Figura 21. Mecanismo proposto de regulação de eIF2α através das S6Ks. A) Em uma

condição de estresse celular, as quinases PKR, PERK, HRI e GCN2 fosforilam eIF2α no resíduo serina 52, culminando em inibição da síntese protéica, ativação da tradução de ATF4, o qual aumenta a expressão de CHOP, que estimula apoptose, e ATG7, que participa do processo de autofagia por converter LC3I em sua forma lipidada, LC3 II. B) As S6Ks são ativadas na presença de insulina, FGF2 e nutrientes levando à fosforilação de eIF2α no resíduo 58. Essa fosforilação tem caráter inibitório da fosforilação de eIF2α no resíduo 52, acarretando na ativação do processo de tradução de proteínas e inibição da apoptose e autofagia.

Estudos recentes têm mostrado a sinalização de mTOR durante o estresse celular, mas sua conexão com a fosforilação de eIF2α ainda não está clara. Um estudo mostrou que a depleção genética de mTORC2 em células de fibrosarcoma (HT1080), acompanhado da redução de atividade de mTORC1, Akt e S6K1, está associado com o aumento da fosforilação de PERK e eIF2α (S52). Entretanto, com

eIF2α P S52 S6Ks Insulina, FGF2 e nutrientes eIF2α P P S52 Síntese protéica ATF4 ATG7 LC3 I LC3 II Autofagia CHOP Apoptose ATF4 ATG7 LC3 I LC3 II CHOP Síntese protéica Autofagia Apoptose mTOR PKR PERK HRI GCN2 Estresse celular PKR PERK HRI GCN2 Estado normal A) B)

a reconstituição das células com a forma ativa de Akt houve a redução da fosforilação de PERK e eIF2α (Tenkerian, et al., 2015).

Outro estudo mostrou que a ativação da via da mTORC1 em células MCF7 desencadeou a diminuição da fosforilação de eIF2α (S52), bem como o nível de RNAm de ATF4. O modelo proposto nesse estudo é que mTORC1 estimula a fosforilação da subunidade beta (eIF2β) do complexo ternário através de mecanismos desconhecidos, de forma a atrair a fosfotase PP1 para próximo de eIF2α, causando sua desfosforilação no resíduo 52 (Gandin et al., 2015). Esse estudo mostra que a mTOR pode atuar indiretamente na desfosforilação de eIF2α no resíduo 52.

Todavia, em nosso estudo mostramos evidências de que a relação entre a via da mTOR e a fosforilação de eIF2α pode ser mediado de forma direta pelas as S6Ks, possivelmente através do mecanismo proposto (figura 21), que consiste na fosforilação de eIF2α no resíduo 58, levando à diminuição da fosforilação no resíduo 52, sugerindo que as S6Ks possam ser novas quinases de eIF2α.

De forma geral, o trabalho fornece evidencias da interação de eIF2α e as S6Ks, através dos ensaios de imunoprecipitação, indicando um possível novo mecanismo de regulação da eIF2α. Os resultados in silico evidenciam o sítio de fosforilação consenso das S6Ks na sequência de eIF2α, a alta conservação desse motivo em diversas espécies e um score positivo para essa fosforilação no resíduo 58. Além disso, foi visto a redução da fosforilação de eIF2α no resíduo 52 de maneira independente da via de mTOR, através do tratamento das células HEK293 com FGF2. A inibição farmacológica de S6Ks mostrou aumentar a fosforilação de eIF2α no resíduo 52. A forma constitutivamente ativa de S6K1 e S6K2 mostrou diminuir a fosforilação de eIF2α, bem como a expressão de um marcador de autofagia (ATG7) quando tratado somente com a forma constitutivamente ativa de S6K2. Além disso, a mutação sítio dirigida no resíduo S58 mostrou regular negativamente a fosforilação do resíduo 52 de eIF2α. Mais experimentos necessitam ser realizados para que sejam esclarecidos os efeitos dessa interação na síntese protéica, autofagia e apoptose.

Apesar dos tratamentos com salubrinal e ISRIB terem sido resultados que precisam ser repetidos e aprofundados (figura 18), foi visto que aparentemente a indução e inibição farmacológica da fosforilação de eIF2α afetou a fosforilação das S6Ks ou S6. O mecanismo do ISRIB, inibidor da fosforilação de eIF2α (S52), é

desconhecido. Portanto, são necessários experimentos que investiguem a possível atuação do ISRIB na via da mTOR/S6Ks.

5.3 Relação de PARP1 e S6Ks

Nos resultados obtidos até o momento, temos evidências que PARP1 pode ser uma nova proteína de interação da S6K2. Pavan et al (2016a) verificou a co- imunoprecipitação de PARP1 com S6K2, e de forma oposta, na figura 19, vemos que S6K2 co-imunoprecipitou com PARP1 endógena. Além disso, vimos que S6K2 pode ser “parilada”. Aparentemente, tal parilação pode ocorrer pela adição de poucos polímeros de ADP-ribose, o que fez com que seu peso molecular não se alterasse visivelmente. A modificação pós-traducional na S6K2 pode causar uma alteração em suas propriedades enzimáticas, alterando suas funções e seu envolvimento nos processos biológicos nos quais participa.

Já é descrito na literatura que PARP1 promove a “parilação” em diversas proteínas mediante a algum tipo de estresse celular, como por exemplo, infecção viral, estresse oxidativo, alteração na temperatura, entre outros agentes estressantes. Alguns dos alvos conhecidos da “parilação” mediada por PARP1 são FOXO1 (Sakamaki et al., 2009), estimulando a proliferação celular, p53, levando à repressão da transcrição gênica (Valenzuela et al., 2002), NF-kB, aumentando a transcrição gênica (Kameoka et al., 2000) e H1, auxiliando no processo de remodelamento de cromatina (Huletsky et al., 1989).

Grande parte dos alvos de PARP1 estão localizados no núcleo, uma vez que sua localização é predominantemente nuclear, assim como S6K2, que também apresenta uma localização robusta no núcleo, como visto em Pavan et al (2016). Este fato sugere que a “parilação” de S6K2 possa ocorrer no núcleo. Experimentos futuros podem ser realizados para verificar se a indução de estresse celular pode aumentar a “parilação” da S6K2 e se essa modificação pode representar uma alteração em sua atividade de quinase.

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