As representações sociais dos professores indicaram uma centralidade em torno da
culpabilização da família, em função de muitas utilizarem em seu cotidiano drogas lícitas, como
o álcool ou remédios, bem como anabolizantes, além de drogas ilícitas, como a cocaína e o
crack, o que estabelece um modelo negativo para o jovem. A família é culpada também por não
cumprir seu papel de educar, colocando o trabalho como justificativa para a falta de atenção
com os filhos. A escola também é culpada por não investir em programas de conscientização
direcionados tanto para os alunos como para a comunidade em geral. O modelo da sociedade
atual é permissivo e facilitador do consumo e deveria ter legislações mais rígidas de controlo
sobre o uso e abuso de drogas pelos jovens e políticas de combate ao tráfico mais eficazes.
A análise mostrou que os professores identificam características típicas da fase da
adolescência como fatores que contribuem para o início do consumo de drogas. A vontade de
se inserir em determinados grupos, bem como a busca de popularidade e status, fazem com o
que o jovem se projete no mundo das drogas. Nesse sentido, acreditam que a falta de atenção
por parte da família gera uma carência no jovem, o qual tenta se prender a alguma coisa que
preencha seu vazio interno. O jovem vê a droga como uma válvula de escape dos seus
problemas, permitindo-lhe a fuga da realidade por alguns momentos, realidade marcada pelo
abandono dos jovens, num modelo de sociedade que é negativado por eles, na medida em que
é permissivo e facilitador do consumo. Os jovens consomem drogas buscando uma forma de
alívio de contra as pressões sociais e as baixas expectativas sobre o seu futuro. A falta de
atenção e apoio das famílias tem como consequência a fluidez e provisoriedade de referenciais
que deveriam ser sólidos, o que gera o medo e a insegurança nos filhos. Os professores acham
que a droga é utilizada hoje pelos jovens como fator de inserção social, por ser moda e
considerarem o consumo de drogas como algo normal, o que conduz à dependência. O jovem
utiliza a droga para relaxar e desinibir-se, de modo a afirmar sua identidade no grupo.
Os professores acreditam que o meio no qual o jovem está inserido desperta nele a
mais facilitado e o jovem que não consome é visto com estranheza pelos outros. Os educadores
associam a dificuldade do jovem em resistir às drogas, à falta de apoio e da imposição de
limites, pela família. No âmbito familiar, é importante que o sujeito se sinta acolhido e apoiado.
Para tanto, faz-se necessário que a família participe de ações escolares, bem como, de projetos
políticos pedagógicos, a fim de que haja uma interação da família com a escola. Em
contrapartida, não obstante o necessário envolvimento com a esfera escolar, os professore
pensam que a educação deveria ser iniciada em casa e continuada no âmbito escolar e
queixam-se da intensa transferência desse dever exclusivamente para a escola. Tal
transferência se dá, muitas vezes, pela falta de tempo dos pais, que têm necessidade de
trabalhar fora. Ainda assim, essa necessidade dos pais não pode ser utilizada como justificativa
para o abandono dos filhos, uma vez que o abandono pode acarretar sérios prejuízos à
formação moral dos mesmos. Nesse sentido, a família possui o ônus de conscientizar o jovem
sobre os problemas das drogas e, aliado a isso, constantemente informá-lo sobre as qualidades
de certas ou erradas de suas condutas, a fim de ensiná-los sobre os limites necessários ao seu
comportamento. Nesse panorama, é preciso que a família encontre tempo hábil destinado ao
lazer e ao entretenimento com seus filhos, visto que tal interação também contribuiu de maneira
contundente para sua formação. Assim, o seio familiar será responsável por criar uma base
sólida na educação do jovem, transmitindo, a todo momento, os valores culturais necessários
para o seu desenvolvimento.
Por outro lado, é preciso atentar para as falhas da família. Em grande parte das vezes,
o assunto drogas não é abordado pelos pais pelo fato de estes não quererem despertar a
curiosidade do jovem acerca do assunto. Todavia, tais questões poderão entrar na vida do
jovem através de convívios fora de casa. Assim, ao evitar tal assunto a família se distancia do
indivíduo e, por muitas vezes, acaba perdendo o controlo sobre ele. Querendo eximir-se da
responsabilidade de educar, a família a delega para a escola e depois culpa os professores. Em
contrapartida, a escola Culpa a família por atrapalhar o trabalho da escola, quando esta utiliza
como meio educativo a punição. Quer dizer, os pais não deixam a escola educar seus filhos.
Os valores que são transmitidos no âmbito escolar muitas vezes não encontram reforço
em casa, dificultando o estabelecimento de referenciais para orientar os alunos no seu
desenvolvimento moral. E a família, tentando amenizar a situação, substitui a sua falta por
presentes, subvertendo o sistema de valores, quando faz o amor familiar se vivenciado através
de bens materiais. Uma vez que não existe uma relação sólida entre a família e a escola, a falta
do apoio familiar não pode ser ‘tratado’ pela escola, e o jovem acaba por se tornar agressivo,
tanto em casa quanto na escola. Tendo em vista a negligência por parte da família sobre o
consumo de drogas, o jovem dependente não encontra apoio na família e, por conseguinte, há
uma rutura entre as partes.
Os professores destacam alguns benefícios trazidos pelo consumo de drogas, porém
numa situação de controlo médico. Algumas drogas, como a maconha, podem ser usadas no
tratamento de combate ao câncer, assim como os anabolizantes que podem ser utilizados no
desenvolvimento da musculatura corporal. Na medida em que se considera válido o consumo
controlado por médico, o grupo admite para o consumo controlado, tanto as drogas lícitas como
as ilícitas. Isso pode apontar para uma mudança nas representações em função de informações
oriundas da média, como por exemplo a consideração do álcool como droga que leva a
acidentes de carro e o tabaco que leva ao câncer, divulgado amplamente, derivando em
campanhas de saúde e leis recentes, como a proibição de dirigir alcoolizado e a lei anti
consumo do tabaco em locais públicos cobertos.
drogas com maior poder nocivo ou menos nocivo ao organismo. No primeiro caso estariam
falando do crack, enquanto que no segundo da maconha. A droga prejudica tanto internamente,
debilitando a saúde, como na aparência externa do usuário. É apontado o prejuízo social, nos
relacionamentos interpessoais, e moral, associados a comportamentos ilegais ou de
degradação pessoal. Acreditam que é preciso resgatar os valores associados à família, de modo
que o jovem volte sua atenção para ela, evitando, assim, um isolamento e uma permanência
exacerbada em ambientes impróprios para uma vivência saudável. Frequentar as ruas, bailes
funks, entrar em redes sociais faz parte da vida de qualquer adolescente, porém os professores
sinalizam com a necessidade de que isso ocorra de forma controlada pela família, impondo-se
limites. O quadro abaixo resume as representações sociais dos professores.
Quadro 24. Representações sociais de professores sobre as drogas
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORES SOBRE AS DROGAS
O PAPEL DA FAMÍLIA NA PREVENÇÃO
AÇÕES PREVENTIVAS DA ESCOLA E PROFESSOR
CONCEPÇÕES SOBRE AS DROGAS
NEGATIVA
USAR DROGA É CRIME / VICIA BANDIDAGEM / VIOLÊNCIA
É O MAL DA SOCIEDADE
POSITIVA
DROGAS SÓ COM CONTROLE MÉDICO
A MACONHA É BENÉFICA PARA O CÂNCER,
CAUSAS DO CONSUMO
CURIOSIDADE / PARECER MADURO / BAIXA AUTO-ESTIMA FUGA DA REALIDADE, / VÁLVULA
DE ESCAPE
PREJUÍZOS FÍSICOS E PSICOLÓGICOS
A PESSOA FICA FEIA E SEM ALMA IMPEDE O DESENVOLVIMENTO E
A APRENDIZAGEM AS DROGAS ILÍCITAS SÃO MAIS
DEVASTADORAS
DROGAS MAIS CONSUMIDAS
ÁLCOOL, MACONHA, COCAÍNA
DROGAS MAIS NOCIVAS
CRACK,, ÁLCOOL, COCAINA
FAMÍLIA X ALUNO
FALTA DE LIMITES E ATENÇÃO DA FAMÍLIA > BAIXA AUTOESTIMA
DOS FILHOS ABANDONO DOS FILHOS NÃO FALA SOBRE DROGAS PARA NÃO DESPERTAR A CURIOSIDADE
O ALUNO FICA AGRESSIVO A FAMÍLIA É NEGLIGENTE SOBRE
O CONSUMO DO ALUNO O AMOR E A ATENÇÃO SÃO SUBSTITUÍDOS POR PRESENTES
FAMÍLIA X ESCOLA
A FAMÍLIA ESTÁ TRANSFERINDO A TAREFA DE EDUCAR PARA A
ESCOLA
PARTICIPAR MAIS DAS AÇÕES DA ESCOLA
PARTICIPAR DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, A FAMÍLIA CULPA O PROFESSOR
A ESCOLA NÃO PODE CONTAR COM A FAMÍLIA À FAMÍLIA NÃO PARTICIPA DAS
EXPECTATIVAS DO FILHO O JOVEM APRENDE VALORES NA
ESCOLA, MAS DESAPRENDE TUDO EM CASA
IDEAL
TRAÇAR POLÍTICA DE CONSCIENTIZAR SOBRE DROGAS / PROMOVER DEBATES DAR APOIO AO PROFESSOR PARA LIDAR
COM AS DROGAS / INVESTIR NO PROFESSOR
CRIAR ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO DE ACORDO COM O CASO SER A EXTENSÃO DA FAMÍLIA E DA
COMUNIDADE
O PROFESSOR É IMPORTANTE PARA O ALUNO
REAL
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO ESTÁ DESATUALIZADO
FALTA PLANEJAMENTO SE FECHA À COMUNIDADE / FALTA
APOIO AO ALUNO E À FAMILIA
NÃO OFERECENENHUM AUXILIO À
USUÁRIOS
DESVALORIZA E DESRESPEITA O PROFESSOR
O PROFESSOR NÃO PARTICIPA DA ELABORAÇÃO DO PPP O PROFESSOR NÃO ESTÁ PREPARADO
PARA LIDAR COM DROGAS
OS PROFESSORES VÊEM OSALUNOS
A conceção sobre drogas, contida na lógica dos discursos dos professores pode ser
interpretada nos elementos das representações sociais seguintes:
SOCIEDADE PERMISSIVA (PERDA DE VALORES HUMANOS)> FALTA DE ATENÇÃO, APOIO E LIMITE DA FAMÍLIA> INSEGURANÇA, MEDO E DESESPERANÇA NO FUTURO/ NECESSIDADE DE AFIRMAÇÃO E RECONHECIMENTO SOCIAL DO JOVEM> CONSUMO> DEPENDÊNCIA> BANDIDAGEM> COMPORTAMENTO DESTRUTIVO.
Em relação ao papel da família na prevenção podemos interpretar a lógica do discurso
dos professores nos seguintes elementos das representações sociais:
DAR ATENÇÃO, AMOR E LIMITE> PASSAR VALORES> PARTICIPAR DA EDUCAÇÃO DOS FILHOS> FORTALECIMENTO DA AUTO-ESTIMA E DAS EXPECTATIVAS DE FUTURO DOS FILHOS> PREVENÇÃO DO CONSUMO.
Em relação ao papel da escola e dos professores na prevenção podemos interpretar a
lógica do discurso dos professores relacionada ao que seria o ideal, que centra-se em ações da
escola, e do real, que se dirige a falhas da escola em lidar com problemas relacionado ao
consumo de drogas na escola.
IDEAL
ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO NA ESCOLA> ESCOLA COMO ESPAÇO PARA A FAMÍLIA E A COMUNIDADE> APOIO AO ALUNO E AO PROFESSOR> INVESTIMENTO NO PROFESSOR> O PROFESSOR É IMPORTANTE PARA O ALUNO> PREPARAR PROFESSORES PARA LIDAR COM DROGAS>
MAIOR RIGOR DAS POLÍTICAS PÚBLICAS COM O USUÁRIO. REAL
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DESATUALIZADO> FALTA DE PLANEJAMENTO DA ESCOLA> DESRESPEITO AO PROFESSOR> ALUNOS USUÁRIOS = MARGINAIS.