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2.22.1 A discussão moral é impossível

Uma das críticas ao emotivismo é que, se fosse verdadeiro, toda a discussão moral seria impossível. O mais parecido com uma discussão moral a que poderíamos chegar seria uma situação em que duas pessoas expressassem as suas emoções uma à outra: o equivalente à situação em que uma grita «Abaixo!» e a outra «Viva!» Mas, alega esta crítica, existem debates sérios de temas morais; logo, o emotivismo é falso.

Contudo, um emotivista não veria esta crítica como uma ameaça à teoria. Usam-se muitos tipos diferentes de argumentos nos chamados debates morais. Por exemplo, ao discutir a questão

ética prática de saber se o aborto voluntário é ou não moralmente aceitável, o que está em questão pode ser em parte uma questão factual. O que está a ser discutido pode ser a questão de saber com quantas semanas um feto seria capaz de sobreviver fora do útero. Esta seria uma questão científica e não ética. Ou então, algumas pessoas, aparentemente empenhadas num debate ético, podem estar preocupadas com a definição de termos éticos como «bem moral», «mal moral», «responsabilidade», etc.: o emotivista admitiria que tal debate poderia ter significado. Só os verdadeiros juízos morais, como «E errado matar pessoas», são meramente expressões da emoção.

Assim, um emotivista concordaria que existe de facto algum debate com significado acerca de questões morais: a discussão só se torna uma expressão sem significado da emoção quando os intervenientes proferem verdadeiros juízos morais. Consequênciasperigosas

Uma segunda crítica ao emotivismo é que, mesmo que seja verdadeiro, terá provavelmente consequências perigosas. Se toda a gente acabasse por acreditar que uma frase como «O assassínio é mau» era equivalente a afirmar «Assassínio — puh!», então, defende esta crítica, a sociedade entraria em colapso.

Uma perspectiva, como a kantiana, de que os juízos morais se aplicam a toda a gente — de que são impessoais — oferece boas razões para que as pessoas obedeçam a um código moral aceite de maneira geral. Mas, se tudo o que estamos a fazer quando proferimos u m juízo moral é exprimir as nossas emoções, não parece ser muito importante quais os juízos morais que escolhemos : poderíamos igualmente dizer «Torturar crianças é moralmente bom», se isso correspondesse ao nosso sentimento; e ninguém pode empreender uma discussão moral significativa connosco acerca deste juízo: o melhor que alguém pode fazer é exprimir os seus próprios sentimentos morais no que respeita à questão.

Contudo, isto não é verdadeiramente um argumento contra o emotivismo, uma vez que não põe a teoria em causa directamente: indica apenas os perigos para a sociedade que a aceitação generalizada do emotivismo acarretaria, o que é outra questão.

2.23 C

ONCLUSÃO

Como pode ver-se desta breve discussão, a filosofia moral é uma vasta e complicada área da filosofia. Os filósofos americanos e britânicos do pós-guerra concentraram-se sobretudo em questões metaéticas. Contudo, têm recentemente voltado progressivamente as suas atenções para problemas éticos práticos, como a moralidade da eutanásia, do aborto, da investigação com embriões, das experiências com animais e de muitos outros temas. Apesar de a filosofia não oferecer respostas fáceis a estas ou quaisquer outras questões morais, fornece um vocabulário e um enquadramento no qual essas questões podem ser discutidas racionalmente.

2.24 L

EITURA COMPLEMENTAR

The Moral Philosophers, de Richard Norman (Oxford, Clarendon Press, 1983), é uma excelente introdução à história da ética: inclui sugestões detalhadas de leitura.

A melhor introdução ao utilitarismo é Utilitarianism and Its Critics, organizado por Jonathan Glover (Nova Iorque, Macmillan, 1990). Inclui excertos dos textos mais importantes de Bentham e Mill, assim como textos mais recentes sobre o utilitarismo e as suas variantes. Parte do material é bastante avançado, mas as introduções de Glover a cada secção são muito úteis.

(Londres, Penguin, 1977) e Practical Ethics, de Peter Singer (Cambridge, Cambridge University Press, 2.a ed., 1993), são ambos interessantes e acessíveis. Applied Ethics ( O x f o r d , Oxford University Press, 1986), organizado por Peter Singer, é uma excelente selecção de ensaios.

Ethics: Inventing Right and Wrong, de J. L. Mackie (Londres, Penguin, 1977), e Contemporary Moral Philosophy, de G. J. Warnock (Londres, Macmillan, 1967), são livros introdutórios sobre filosofia moral cuja leitura é compensadora, apesar de nenhum dos dois ser fácil.

3 P

OLÍTICA

O que é a igualdade? O que é a liberdade? Serão estes objectivos que valham a pena? Como podem atingir-se? Que justificação pode dar-se para as restrições impostas pelo estado aos que violam a lei? Existem algumas circunstâncias nas quais d e v a m o s violar a lei? Estas são questões importantes para todas as pessoas. Os filósofos políticos têm tentado clarificá-las e responder-lhes. A filosofia política é um tema vasto, cruzando-se com a ética, a economia, a ciência política e a história das ideias. Os filósofos políticos escrevem geralmente em resposta às situações políticas nas quais se encontram. Nesta área, mais do que na maior parte das outras, o conhecimento do contexto histórico é importante para compreender os argumentos de um filósofo. Neste pequeno livro não há espaço, obviamente, para dar u m a imagem histórica. Para os que se interessarem pela história das ideias, a lista de leituras complementares, no final do capítulo, deverá ser útil.

Neste capítulo concentrar-me-ei nos conceitos políticos centrais de igualdade, democracia, liberdade, castigo e desobediência civil; e examinarei as questões filosóficas a que dão origem.

3.1 I

GUALDADE

A igualdade é muitas vezes apresentada como um objectivo político, um ideal que vale a pena tentar alcançar. Os que argumentam a favor de uma qualquer forma de igualdade são conhecidos como igualitaristas. A motivação para alcançar esta igualdade é habitualmente moral: pode basear-se na crença cristã de que somos todos iguais aos olhos de Deus, numa crença kantiana na racionalidade da igualdade de respeito de todas as pessoas ou, talvez, numa crença utilitarista de que tratar todas as pessoas como iguais é a melhor forma de maximizar a felicidade. Os igualitaristas defendem que os governantes devem procurar passar do reconhecimento da igualdade moral para a criação efectiva de algum tipo de igualdade nas vidas daqueles que governam.

Mas como devemos entender a «igualdade»? E claro que os seres humanos nunca poderiam ser iguais em todos os aspectos. As pessoas diferem em inteligência, beleza, valor atlético, altura, cor do cabelo, local de nascimento, sentido da moda e em muitos outros aspectos. Seria ridículo defender que as pessoas devem ser absolutamente iguais em todos os aspectos. A completa uniformidade é pouco apelativa. Os igualitaristas não propõem um mundo povoado por clones. No entanto, apesar dos absurdos óbvios de interpretar a igualdade como completa uniformidade, alguns adver sários do igualitarismo insistem em descrevê-lo desta forma. Este é um exemplo da falácia do homem de palha: cria-se um alvo fácil apenas para o deitar abaixo. Eles pensam que refutam o igualitarismo ao apontar aspectos importantes que diferenciam as pessoas ou fazendo notar que, mesmo que uma quase uniformidade fosse alcançada, as pessoas recuariam muito rapidamente para qualquer coisa semelhante à sua situação anterior. Contudo, tal ataque só tem êxito contra uma caricatura da teoria, deixando incólume a maior parte das versões de igualitarismo.

Assim, a igualdade é sempre relativa a certos aspectos, e não a todos os aspectos. Assim, quando alguém afirma ser um igualitarista, é importante descobrir em que sentido o é. Por outras palavras, o termo «igualdade», no contexto político, não quer dizer praticamente nada a não ser que exista uma explicação sobre o que devia ser partilhado de forma mais igualitária e por quem. Algumas das coisas que os igualitaristas muitas vezes defendem que devem ser igualitariamente, ou mais igualitariamente, distribuídas são o dinheiro, o acesso ao emprego e o poder político. Apesar de os gostos das pessoas diferirem consideravelmente, todas estas coisas podem contribuir significativamente para uma vida aprazível e que valha a pena. Distribuir estes bens de forma mais igualitária é uma maneira de conceder igualdade de respeito a todos os seres humanos.

3.2 D

ISTRIBUIÇÃOIGUALITÁRIA DODINHEIRO

Um igualitarista radical poderia defender que o dinheiro deveria ser igualitariamente distribuído por todos os seres humanos adultos, recebendo toda a gente exactamente os mesmos proventos. Na maior parte das sociedades, o dinheiro é necessário para as pessoas viverem; sem ele não podem obter comida, abrigo ou roupas. A redistribuição poderia justificar-se, por exemplo, numa base utilitarista, como a forma que mais provavelmente maximizaria a felicidade e minimizaria o sofrimento.

3.3 C

RÍTICASÀDISTRIBUIÇÃO IGUALITÁRIA DODINHEIRO