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Distinção entre Regra Jurídica, Principíos, Postulados e Norma Jurídica Concreta

O direito tem sua origem na sociedade. Trata-se de um fenômeno social, com a finalidade de regular condutas intersubjetivas. E nesta óptica, é formado por um conjunto de normas gerais e abstratas elaboradas por um poder soberano que tem como principal escopo disciplinar e organizar a vida em sociedade.

Considerando que o direito estabelece condutas de ordem intersubjetiva, o mesmo deve ser vertido em linguagem, pois somente assim podem ser exteriorizados seus comandos normativos. Dessa forma a investigação dessas linguagens permite a melhor compreensão do fenômeno jurídico. Marcelo Neves Miranda187, ao abordar os planos de investigação da linguagem, propõe três aspectos: a sintaxe, a semântica e a programática. Ao mesmo tempo, a dogmática amplia a

187 “[...] no seu aspecto sintático interessam especificamente as interconexões entre os signos normativos, pondo-se

entre parênteses os seus significados específicos e os objetos ou situações objetivas a que se referem, como também os emitentes e destinatários da mensagem normativa. A dimensão semântica diz respeito à relação entre o signo normativo e sua significação (aspecto conotativo), ou à relação entre o signo normativo e os objetos ou situações objetivas a que se refere (aspecto denotativo). A pragmática evidencia o relacionamento dos signos normativos com seus utentes, ou seja, os emitentes e destinatários das mensagens, revelando o aspecto discursivo-dialógico da linguagem jurídica”. (NEVES, Marcelo - Teoria da Inconstitucionalidade das Leis. São Paulo: Saraiva, p. 21).

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linguagem do jurista e capacita-lhe o discurso na medida em que lhe incorpora novos e expressivos recursos.

Destarte, o estudo da linguagem dos enunciados que revestem o direito positivo é cogente para alocar a jurisprudência como fonte do direito, motivo pelo qual é necessária a distinção entre regras jurídicas, princípios e postulados normativos.

Ao apreciar a questão, Ana Paula de Barcellos188 aponta como critério de diferenciação entre regras e princípios o fato de que tanto as regras quanto as normas, apenas descrevem determinado comportamento, sem se preocuparem com a finalidade dessas condutas. Já os princípios são normas que estabelecem maneiras diferentes, estados ideais e objetivos que devem ser atingidos. Aponta, também, como distinção, os efeitos, afirmando que as regras normatizadas trazem em si os efeitos que pretendem produzir, enquanto os princípios descrevem efeitos relativamente indeterminados, como a promoção de fins ideais, valores ou metas políticas, ou mesmo metas valorativas ou políticas.

Ao mesmo tempo, averiguamos que, em caso de conflito entre regras, uma deve prevalecer sobre a outra. O que não ocorre em relação aos princípios, visto que um cede em relação ao outro.189 No mesmo sentido aduz Marcelo Campos Galupo190, ao afirmar que o conflito entre regras ocorre de forma abstrata, enquanto o conflito entre princípios ocorre no caso concreto.

Além disso, temos os postulados como espécie normativa. Nesse sentido, Humberto Ávila191 professa que seriam normas de segundo grau que não impõem um fim ou um comportamento específico, mas estruturam o dever de realizá-lo. Ou seja, são descrições estruturantes da aplicação de outras normas cuja função é otimizar e efetivar princípios e regras. Importante observamos mais uma vez que os postulados não se confundem com os princípios nem com as regras, porque não buscam um “fim” nem estabelecem uma “conduta”.

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BARCELLOS, Ana Paula de – Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. P. 169.

189 “Não importa a forma como sejam fundamentados, não é possível que dois juízos concretos de dever-ser

contraditórios entre si sejam válidos. Em um determinado caso, se se constata a aplicabilidade de duas regras com conseqüências jurídicas concretas contraditórias entre si, e essa contradição não pode ser eliminada por meio da introdução de uma cláusula de exceção, então pelo menos uma das regras deve ser declarada inválida. (...) Se dois princípios colidem - o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido -, um dos princípios terá de ceder. Isso não significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face de outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta”. (ALEXY, Robert – Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros Editores, 2008. p. 90/94)

190

“Exatamente por isso a solução do conflito entre princípios difere da solução do conflito entre regras: é que este último tem existência em abstrato, enquanto o conflito entre princípios só tem existência, e portanto solução, no caso concreto”. (GALUPPO, Marcelo Campos – Os princípios jurídicos no Estado Democrático de Direito: ensaio sobre

o seu modo de aplicação. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 36, nº 143, julho/setembro 1999, p. 196) 191

ÁVILA, Teoria dos Princípios – Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos. 12ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011. p. 88/89.

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Efetuada a distinção entre regras, princípios e postulados, é necessário diferenciar normas gerais e abstratas.

A norma jurídica geral é dirigida a um conjunto de sujeitos indeterminados, ou seja, é espécie normativa que regula a conduta de pessoas indeterminadas, sem individualizar o sujeito da relação jurídica à qual se pretende estabelecer. A partir do momento em que a norma jurídica geral é individualizada, a norma extraída passa a ser individual e criam-se relações jurídicas.

E nesse particular, quando se extrai do plano fático a norma jurídica concreta, esta, a depender da situação, passa a ser relevante não apenas para aquele caso concreto específico, mas para muitos outros, em razão da multiplicidade de situações análogas, ensejando o que se denomina de precedente.

A jurisprudência passa a concretizar a norma jurídica concreta, sendo irrelevante a existência das regras, princípios e postulados, pois naquela situação versada já há uma tese jurídica firmada para solução de conflitos de mesma ordem, com coerência, igualdade e segurança.

Diante dessa sistemática, a existência de um precedente consolidado nos tribunais passa a atuar como fonte criadora do direito, motivo pelo qual é relevante para todo o sistema jurídico, de qualquer natureza.