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3. MAPA MOVENTE, MULTIPLICIDADES EMERGENTES

3.2 Aspirando Um Modelo Industrial

3.2.3 Distribuição

As estratégias que Catarina Doolan e o Coletivo Caboré Audiovisual adotam na distribuição de seus curtas e médias-metragens apresentam muitas convergências. Reconhecendo que o retorno comercial para esses formatos se configura como residual, em geral através da comercialização para TV ou premiações em festivais, o curta-metragem é encarado como um formato de experimentação e currículo. “O curta é a escola, é onde você aprende não só técnica mas até o trabalho em coletivo, você vai aprimorando, porque é uma equipe menor”, comenta Babi.

Nas nossas condições, a gente vai muito para o curta não porque a gente se identifica só com essa linguagem, mas porque ele acaba sendo de fato esse degrau para esse próximo passo, que seria o longa. Apesar de achar que essa visão não é muito legal (...), mas ao mesmo tempo eu vejo que é o que a gente tem em mãos... [REAL, 2019]

Mesmo assim, no que se refere a distribuição do conteúdo, nota-se a prevalência de uma estratégia que segue a exibição escalonada nos sucessivos segmentos: festivais de cinema e televisão (fechada e aberta)127, aproximando-se de um de modelo de distribuição que visa os segmentos de mercado mais tradicionais. Essa lógica de distribuição baseia-se na restrição do acesso que confere valor ao produto, característica do modelo industrial, em contraponto à lógica de compartilhamento do que Migliorin (2011) denomina como cinema pós-industrial: “Na era pós-industrial, (...) quanto mais circulação, quanto mais pessoas envolvidas e invenção, mais conhecimento e mais valor”.

Desse modo, tanto Catarina quanto o Caboré seguem um modelo de distribuição de curtas e médias-metragens que enxerga como segmento primário a circulação em festivais e mostras de cinema128. Após esse circuito, investem em tentar comercializar o filme, através de licenciamento para TV aberta ou por assinatura. É só após o período de licenciamento - ou caso não tenham êxito na comercialização -, que disponibilizam o filme em plataformas como o youtube ou vimeo. O acesso gratuito ao filme através da internet acontece, em média, dois anos após o lançamento.

127 Para Ikeda (2018), a tendência entre os realizadores brasileiros em buscar segmentos de mercado mais tradicionais pode

sugerir uma incipiente exploração de possibilidades efetivas que as transformações nos modos de recepção podem oferecer para o audiovisual brasileiro independente.

128 Embora afirme que cada produto pode apresentar um modelo de negócio diferenciado, Catarina reconhece uma

tendência comum na distribuição de curtas-metragens. Esse modelo é descrito por Vitória Real da seguinte forma: “Eu acho que estratégia de distribuição a gente não tem muito pra onde correr, é inscrever em festival. Depois que passar aquela vida útil em festival, tentar licenciamento, e se não der certo, colocar pra ver online, de graça”.

Os festivais e mostras de cinema são vistos como estratégicos, como nos aponta Babi Baracho: “Os festivais ocupam um espaço dentro da distribuição do cinema brasileiro que é muito importante, eles formam público, existe grande intercâmbio de profissionais nos festivais. E a gente consegue acessar isso como? Através dos curtas, principalmente”. Desse modo, se, por um lado, a circulação em festivais e premiações conferem legitimidade e agregam valor ao filme, por outro potencializam não apenas um possível desempenho comercial, mas também a carreira dos profissionais envolvidos.

Se a distribuição é um dos elos da cadeia produtiva mais fragilizados em termos de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento da indústria cinematográfica no Brasil (IKEDA, 2015a), para os curtas-metragens a distribuição continua sendo uma experiência permeada de desafios. Enquanto no modelo industrial há a presença de empresas distribuidoras, na produção audiovisual no Rio Grande do Norte essa etapa é, em geral, assumida pelos próprios realizadores e produtores.

O acúmulo de função marca também a experiência de Catarina Doolan. Enquanto esteve à frente do Núcleo Audiovisual da Prisma Filmes, era Catarina quem assumia a responsabilidade de distribuição das produções, focando nos segmentos de festivais e comercialização para TV. Para ela, a sobrecarga se dá por, em geral, trabalhar com orçamentos insuficientes para pagar profissionais responsáveis para o desempenho da função. “Muitos financiamentos não permitem colocar custo com distribuição, então isso também é um agravante”, pontua Catarina, acrescentando que enxerga cada vez mais necessidade de investir em distribuição como estratégia para potencializar o desempenho comercial do filme.

Eu acho que a gente tá tão focado na produção que a gente esquece da distribuição mesmo. A gente pensa: ´Esse é um problema para a Catarina de depois´. Mas por que não é um problema pro Vlamir [Vlamir Cruz, realizador e produtor que atua com distribuição] depois? Por que eu não já penso nisso? ´Ah, eu não posso pensar nisso porque o meu financiamento não permite´, então realmente eu vou tentar um financiamento pra distribuir depois, mas em quanto tempo a gente vai conseguir a grana? Então assim, acho que a gente tem que amadurecer muito ainda, as experiências nos diferentes filmes vão trazendo essa perspectiva, esse know-how. No próximo eu vou fazer diferente, já vou amarrar na pré-produção a distribuição. [FERNANDES, 2019]

No caso do Coletivo Caboré Audiovisual, quem especializou-se na distribuição dos curtas e médias-metragens foi Babi Baracho, que assume a função até hoje e também integra a produtora Caboré Produtores Associados. Além dessas produções, ela destaca o diferencial da experiência com a websérie SEPTO, única produção que foi pensada primariamente para a web, através de veiculação gratuita.

Em 2016, (...) a gente entrou de cabeça e não entendia desse mercado. A gente não conhecia que a gente teria esse alcance, e muito menos que a gente podia monetizar e ter retorno com SEPTO. A gente não sabia onde

tava se metendo. Se a gente entendesse de youtube, de mercado, de monetização, de todas essas questões, se a gente entendesse minimamente sobre isso em 2016...[BARACHO, 2019]

De fato, SEPTO consiste em um ponto fora da curva na trajetória do Coletivo, majoritariamente focada em formatos mais tradicionais. Desde sua primeira temporada, a websérie foi distribuída através dos canais do Brasileiríssimos129 nas plataformas facebook e youtube, visando potencializar o alcance do público. Paralela à distribuição gratuita na internet, SEPTO circulou em festivais específicos para o formato, sendo também licenciada para uma plataforma de streaming LGBT. Embora o sucesso da websérie tenha sido significativa, a possibilidade de retorno através do youtube não se efetivou devido ao canal do Brasileiríssimos ser impossibilitado de monetizar os vídeos.

Ainda no que se refere a monetização, embora o Coletivo Caboré e Catarina Doolan reconheçam as potencialidades que o segmento de vídeo sob demanda (VoD) poderiam proporcionar aos produtores, esta modalidade ainda não é explorada. Assim, com exceção do formato websérie, a veiculação pela internet acaba sendo vista como última etapa do ciclo de distribuição, em geral em caráter não-oneroso.