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Distribuição da População por Décimos da Distribuição de Renda Brasileira e Razão de Kuznets

Capítulo I – A pobreza e seus movimentos entre 1992 e

1. Considerações iniciais

1.3 Pobreza Absoluta

1.4.1. Distribuição da População por Décimos da Distribuição de Renda Brasileira e Razão de Kuznets

A abordagem mais básica para a análise da distribuição de renda parte do somatório do rendimento de todas as fontes recebidas por membros de cada família, dividido pelo número total desses membros do grupo familiar. O resultado desta divisão, que dá origem ao rendimento familiar per capita, é então ordenado em ordem ascendente e a população assim ordenada é dívida em grupos de igual tamanho, normalmente em décimos, com dez grupos contendo cada um 10% da população de referência, permitindo que se analise visualmente a concentração de renda e como determinados subgrupos populacionais de posicionam nessa distribuição geral de renda.

21

De acordo com o IPEA (2015), para o Gini, a queda foi de 9,7%, 1% ao ano; para o GE(0,01) a queda foi

consideravelmente maior (19,6% ou 2,2% ao ano); para o GE(1,01) de 18,7% (2% ao ano); e, finalmente, para o GE(2) a queda foi de 21,4% em relação a 2004 (2,4% ao ano).

A renda familiar per capita mínima e máxima de cada décimo pode indicar, por exemplo, se parcelas muito elevadas da população vivem com valores muito abaixo dos limites de corte para os estratos superiores, de modo que a amplitude geral da distribuição seja pouco representativa das condições de vida de ampla proporção da população. Claro que essa representação dos dados esclarece mais questões sobre a pobreza absoluta, como a proporção de pessoas vivendo abaixo de um limite determinado, delimitador dos décimos gerados, mas também produz algumas análises interessantes sobre a concentração de renda.

Em 2014, por exemplo, os décimos da distribuição de renda são determinados pelos valores mínimo e máximo expostos na Tabela 04, onde se pode notar que o primeiro décimo contém as duas linhas de pobreza do Brasil sem Miséria, definidas em R$ 77,00 para Pobreza Extrema e R$ 154,00 para Pobreza. O conceito ampliado de pobreza, limitando a renda familiar per capita a meio salário mínimo, posiciona a totalidade de seus integrantes até o terceiro décimo da distribuição. Portanto, tomando-se como referência esse limite monetário (½ SM = R$ 362,00), tem-se que quase 30% da população brasileira vive mensalmente com recursos iguais ou inferiores a esse teto.

Tabela 04: Valores Mínimo e Máximo da RFPC segundo Décimos da Distribuição de Renda Brasileira - Brasil - 2014

Fonte: PNAD/IBGE – 2014. Elaboração própria.

Por outro lado, nota-se que, entre o primeiro e o nono décimos, ou seja, para 90% da população, a amplitude da RFPC vai de R$ 0,00 a R$ 2.006,67 por mês; no décimo e último grupo (10% mais ricos), contudo, essa distância se expande expressivamente, indo de R$ 2.007,00 a R$ 331.200,00. Em 2014, a renda média familiar per capita (R$ 1.032,25 por mês) do país assume montante equivalente a pouco mais de treze vezes o valor da linha da extrema pobreza (R$ 77,00 por mês) e a quase sete vezes o valor da linha de pobreza definida pelo BSM

Décimos Mínimo Média Máximo

1 0,00 105,97 189,71 2 189,75 243,83 299,83 3 300,00 347,99 399,80 4 400,00 455,54 509,00 5 509,20 583,25 663,80 6 664,00 722,08 779,60 7 780,00 879,47 999,67 8 1.000,00 1.136,01 1.325,00 9 1.326,50 1.615,18 2.006,67 10 2.007,00 4.218,21 331.200,00 Brasil 0,00 1.032,25 331.200,00

(R$ 154,00 por mês). Essas observações já sugerem algum grau de concentração de renda no país, situação que fica ainda mais evidente quando se considera a questão regional e a dicotomia rural-urbana (gráficos 16 e 17).

As regiões Norte e Nordeste, que possuem os piores indicadores de pobreza absoluta, também registram indícios de maus resultados quando o foco é a pobreza relativa – especialmente quando o foco são as desigualdades regionais. As populações destas regiões estão substantivamente sobre-representadas nos décimos inferiores da distribuição nacional, o que indica que a ampla maioria vive com RFPC bastante reduzida, enquanto uma minoria percebe rendimento per capita bastante superior à média nacional, enquanto as demais estão sobre-representadas nos décimos superiores. Situação análoga ocorre na comparação rural- urbana (gráfico 18), visto que o primeiro grupo encontra-se também fortemente concentrado nos níveis mais baixos da distribuição brasileira, onde estão aqueles que normalmente integram o contingente de pessoas vivendo em situação de pobreza.

Esse resultado, quando associado às informações de dispersão de renda - nesse momento, considerando-se como referência apenas os extremos monetários entre o primeiro e o último décimo da distribuição de renda, constantes da Tabela 04 - aponta para a associação entre pobreza absoluta e desigualdade na distribuição de renda no Brasil, uma vez que no país a pobreza parece estar mais relacionada à má distribuição dos recursos existentes do que à sua insuficiência. Nessa linha, BARROS & FOGUEL (2000) argumentam que o grau de pobreza brasileiro seria determinado principalmente pela elevada desigualdade na distribuição dos

recursos, conclusão semelhante à obtida por ROCHA (2000).22

Na série histórica harmonizada 1992-2014 – que desconsidera as áreas rurais da Região Norte, salvo a de Tocantins – houve redução da concentração de pessoas nos décimos inferiores da distribuição, movimento puxado pelas regiões Nordeste, Sul e Centro-Oeste. Nas regiões Sudeste e Norte houve um aparente aumento dessa concentração indesejada, configurando uma suposta piora na posição de seus residentes na distribuição nacional de renda. No caso do Sudeste, a região mais rica e desenvolvida do país, essa aparente piora, que consiste no aumento

22 Segundo essa autora, os países nos quais há incidência persistente de pobreza absoluta poderiam ser classificados

em dois grupos: o primeiro, formado por aqueles onde a renda nacional seria insuficiente para garantir o mínimo considerado indispensável a todos os cidadãos (a renda per capita seria baixa e a pobreza absoluta inevitável, independentemente de sua distribuição); o segundo, por aqueles onde o produto nacional seria suficientemente elevado para garantir esse mínimo a todos, mas seria mal distribuído (a pobreza resultaria da elevada concentração de renda). O Brasil se enquadraria no segundo caso.

da concentração de indivíduos nos primeiros cinco décimos e queda nos cinco últimos, segue ritmo e padrão aparentemente contínuo desde 2012-2013.

Gráficos 16 e 17: Distribuição da População por Décimos da Distribuição de Renda, segundo Regiões Geográficas e Áreas Censitárias (Rural e Urbana) – Brasil – 2014

Fonte: PNAD/IBGE – 2014. Elaboração própria.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Norte 17,0% 15,1% 12,5% 11,2% 10,4% 8,3% 7,3% 6,3% 6,5% 5,4% Nordeste 19,4% 15,7% 12,9% 10,9% 10,1% 9,3% 6,8% 5,4% 4,9% 4,5% Sudeste 4,9% 6,5% 8,0% 8,5% 11,0% 10,4% 12,0% 12,5% 13,3% 12,9% Sul 3,9% 4,7% 6,7% 6,9% 9,8% 11,0% 12,9% 14,5% 15,9% 13,8% Centro-Oeste 4,3% 6,8% 8,0% 8,9% 11,0% 11,4% 11,8% 12,2% 12,8% 12,8% BRASIL 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Rural 24,3% 16,0% 11,6% 10,2% 9,2% 9,5% 6,9% 5,5% 4,5% 2,3% Urbana 7,2% 8,4% 9,2% 9,0% 10,8% 10,2% 10,9% 11,1% 11,8% 11,4% BRASIL 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0%

Gráfico 18: Distribuição da População por Décimos da Distribuição de Renda, segundo Regiões Geográficas e Áreas Censitárias – Brasil – 1992-2014

Fonte: PNAD/IBGE – 2014. Elaboração própria.

No Norte, em cenário que apenas se agravaria com a inclusão da totalidade de suas áreas

rurais23, os indicadores apontam para uma evolução mais errática, que dificulta a identificação

de uma tendência inequívoca de comportamento. Preliminarmente, contudo, pode-se supor que nesta última região os indicadores parecem menos alentadores que o indicador nacional. Entre 1992 e 2014, enquanto o último décimo da distribuição permaneceu com parcela constante da população (apesar das oscilações no interior da série), o primeiro registrou aumento de 1,7%

no seu peso sobre a população.24 Ao menos uma das explicações para os resultados no Norte e

23 Na série 2004-2014, incluindo a totalidade da população da região Norte, a mesma estabilidade observada no

último décimo é confrontada com um incremento de 3,9% na parcela da população situada no primeiro décimo. 24

Segundo GABRIEL (2013), por exemplo, haveria um desempenho – negativamente – diferenciado dos índices de concentração de renda da região Norte, comparativamente ao restante do país.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 N - 1992 12,2% 13,9% 11,6% 11,4% 10,6% 9,1% 8,6% 8,4% 7,8% 6,3% N - 2014 13,9% 13,9% 13,0% 12,1% 10,2% 8,7% 7,6% 7,0% 7,1% 6,3% NE - 1992 21,6% 17,4% 13,9% 11,1% 9,1% 7,4% 6,4% 5,0% 4,2% 3,9% NE - 2014 20,5% 15,6% 12,9% 10,9% 9,8% 9,2% 6,6% 5,3% 4,8% 4,4% SE - 1992 5,0% 6,1% 7,1% 8,4% 9,7% 10,9% 12,0% 13,0% 13,9% 14,0% SE - 2014 5,2% 6,5% 8,1% 9,8% 10,2% 10,4% 11,8% 12,5% 12,7% 12,7% S - 1992 5,5% 6,4% 8,5% 8,7% 10,5% 11,4% 11,8% 12,5% 12,9% 11,7% S - 2014 4,1% 4,7% 6,7% 8,1% 9,3% 10,9% 13,0% 14,5% 15,1% 13,6% CO - 1992 6,2% 8,9% 10,8% 10,8% 12,0% 11,6% 10,6% 10,3% 9,1% 9,6% CO - 2014 4,6% 6,9% 8,2% 9,9% 10,4% 11,3% 11,7% 12,1% 12,3% 12,7% BRASIL 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 10% 2,0% 5,0% 8,0% 11,0% 14,0% 17,0% 20,0% 23,0%

no Sudeste podem encontrar respaldo na evolução da RFPC real média, representada no gráfico 19. Sempre na comparação 2014/1992, nota-se que essa variável cresceu, em termos reais, em todos das Unidades da Federação e em todos os décimos da distribuição de renda. No entanto, justamente nessas regiões destacadas, Norte e Sudeste, a RFPC real cresceu menos ou na mesma medida que a média nacional, contrariamente ao que ocorreu nas demais regiões.

Gráfico 19: Evolução da RFPC real média entre 1992 e 2014, segundo Regiões Geográficas e Décimos da Distribuição do Rendimento Familiar per capita – Preços de

Set/2014 (INPC)

Fonte: PNAD/IBGE – Vários anos. Elaboração própria.

Obs.: Exclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins. Essa exclusão explica a diferença entre essas médias e aquelas apresentadas na Tabela 4.

Considerando essa ressalva, mudanças no rendimento familiar per capita são um indicativo bastante informativo, ainda que não suficiente, de alterações nas medidas de distribuição de renda, indicativo esse que revela melhorias importantes nas últimas décadas, conforme indicado no gráfico 20. A preços de setembro de 2014, a média da RFPC passou de

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1992 Norte 32,56 95,00 148,98 209,67 277,18 358,25 468,66 626,62 972,57 2.464,92 1992 Nordeste 35,26 95,35 149,48 208,68 273,55 357,10 475,46 631,41 972,64 2.598,08 1992 Sudeste 27,47 99,23 151,46 210,92 275,01 361,10 471,59 641,12 979,24 2.743,77 1992 Sul 26,27 99,72 152,79 212,17 274,40 359,90 471,04 635,48 983,10 2.765,00 1992 Centro-Oeste 28,43 99,48 150,25 209,23 273,13 359,51 469,34 633,83 980,97 3.176,55 1992 BRASIL 32,41 97,06 150,60 210,15 274,47 359,78 471,92 637,63 979,09 2.750,87 2004 Norte 40,92 117,13 171,36 231,85 302,32 396,02 503,23 686,34 1.058,56 2.698,05 2004 Nordeste 45,62 114,49 170,80 230,45 299,64 398,66 502,00 687,25 1.055,14 3.025,63 2004 Sudeste 33,59 117,29 172,97 232,34 303,92 398,16 506,33 688,77 1.055,28 2.961,63 2004 Sul 38,86 117,76 173,52 231,98 303,43 398,87 506,31 690,34 1.055,10 2.923,99 2004 Centro-Oeste 34,71 118,54 172,04 230,98 303,05 396,93 506,76 686,60 1.041,52 3.249,21 2004 BRASIL 41,64 115,91 171,94 231,51 302,49 398,17 505,44 688,60 1.054,37 2.976,54 2014 Norte 49,71 142,85 208,72 281,13 362,01 464,33 589,73 796,84 1.216,26 3.123,81 2014 Nordeste 57,96 141,94 206,95 280,02 360,69 463,13 579,61 791,02 1.205,78 3.505,90 2014 Sudeste 43,39 144,66 209,86 281,63 364,28 468,56 593,43 795,19 1.214,99 3.449,26 2014 Sul 50,00 144,20 210,10 281,21 363,20 467,82 592,17 795,31 1.209,71 3.225,15 2014 Centro-Oeste 47,95 143,86 208,49 280,51 363,96 464,58 590,87 793,40 1.213,79 3.722,30 2014 BRASIL 53,36 143,04 208,52 280,93 362,94 466,67 589,88 794,55 1.212,71 3.424,39 0,00 500,00 1.000,00 1.500,00 2.000,00 2.500,00 3.000,00 3.500,00 4.000,00

R$ 602,27 mensais em 1992 para R$ 1.043,63 mensais em 2014, um crescimento real de 73,3%, significando um incremento médio real de 2,5% ao ano. Outro ponto positivo, principalmente para a pobreza absoluta, é que a variação real da RFPC decresceu com o nível de renda per capita, ou melhor, as maiores variações positivas foram normalmente observadas nos décimos inferiores da distribuição, decrescendo a partir daí. Com isso, a razão entre a RFPC média do último e do primeiro décimos da distribuição se reduziu de 84,9 para 64,2, entre 1992 e 2014, apontando para uma redução da desigualdade da distribuição do rendimento familiar per capita.

Gráfico 20: Variação da RFPC real média entre 1992 e 2014, segundo Regiões Geográficas e Décimos da Distribuição do Rendimento Familiar per capita – Preços de

Set/2014 (INPC) – Em %

Fonte: PNAD/IBGE – Vários anos. Elaboração própria. Obs.: Exclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins.

Ressalte-se que os dados apresentados até aqui não configuram precisamente medidas de desigualdade. De todo modo, até aqui, os resultados gerais, somados aos limites monetários mínimos e máximos utilizados para a construção dos décimos, apontam para uma tendência geral de redução da pobreza, com menor proporção de pessoas na base da distribuição, e para uma melhora na distribuição de renda, com um deslocamento de pessoas para os décimos

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Norte 52,7% 50,4% 40,1% 34,1% 30,6% 29,6% 25,8% 27,2% 25,1% 26,7% Nordeste 64,4% 48,9% 38,4% 34,2% 31,9% 29,7% 21,9% 25,3% 24,0% 34,9% Sudeste 57,9% 45,8% 38,6% 33,5% 32,5% 29,8% 25,8% 24,0% 24,1% 25,7% Sul 90,3% 44,6% 37,5% 32,5% 32,4% 30,0% 25,7% 25,2% 23,1% 16,6% Centro-Oeste 68,6% 44,6% 38,8% 34,1% 33,3% 29,2% 25,9% 25,2% 23,7% 17,2% BRASIL 64,7% 47,4% 38,5% 33,7% 32,2% 29,7% 25,0% 24,6% 23,9% 24,5% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

superiores, onde a percepção de renda é maior, ainda que para essa última a evolução pareça ter sido menor a partir dos indicadores utilizados.

Um forte indício da desigualdade no país advém da comparação da distribuição da população e da distribuição da renda por décimos dessa última. O gráfico 21 revela que os décimos inferiores, especialmente os de 1 a 4, recebem parcelas bastante baixas da renda total, que inclui o rendimento familiar total de todas as fontes, e muito inferiores à participação dos mesmos da população brasileira – mais precisamente, tem-se que esses quase 40% da população recebem apenas 10,8% do rendimento de todas as fontes informado na PNAD de 2014.

Gráfico 21: Distribuição da População Brasileira versus Parcela da Renda Acumulada, segundo Décimos da Distribuição de Renda – Brasil – 2014 – Em %

Fonte: PNAD/IBGE – 2014. Elaboração própria. Obs.: Inclusive áreas rurais da Região Norte.

Sob essa ótica, da proporção da renda total apropriada por cada um dos décimos da distribuição de renda, a desigualdade no Brasil parece ter diminuído significativamente entre

1992 e 2014 (gráfico 22).25 Em 1992, os 10% mais ricos da população brasileira acumulavam

cerca de 46% do rendimento total de todas as fontes registrado na PNAD, percentual que pouco ultrapassou os 40% em 2014. Por outro lado, no primeiro ano do período considerado os 10%

25 De acordo com o IBGE, com base em dados de 2013, os 10% da população que possuem a maior renda familiar

per capita concentravam 41,2% da renda per capita total do país naquele ano, contra 43,6% em 2008 e 45,8% em 2009. Esses resultados, embora não cubram todo o período aqui considerado, confirmam as tendências e as grandezas identificadas. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Parcela da Renda (%) 1,0% 2,4% 3,3% 4,1% 5,8% 6,9% 8,4% 10,8% 16,1% 41,2% Parcela da População (%) 9,8% 9,6% 9,5% 9,2% 10,5% 10,1% 10,3% 10,3% 10,7% 10,0% 0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40% 45%

mais pobres se apropriavam de apenas 0,6% do rendimento total, parcela que chegou a 1% no ano final da série harmonizada – em termos relativos, o avanço foi bastante expressivo. Em termos absolutos, esse percentual final parece inexpressivo, porém, em se tratando de desigualdade, representa uma mudança substancial. No período 1992-2014, o único décimo a registrar queda na parcela apropriada da renda foi justamente o último; em todos os demais, o movimento foi de crescimento.

Gráfico 22: Distribuição da População Brasileira versus Parcela da Renda Acumulada, segundo Décimos da Distribuição de Renda – 1992 a 2014 – Em %

Fonte: PNAD/IBGE – Vários anos. Elaboração própria.

Obs.: Exclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins.

A razão entre essas proporções da renda nacional apropriada por diferentes grupos que é conhecida como Razão de Kuznets, consiste em uma das medidas mais comuns e intuitivas de mensuração da desigualdade. Mais claramente, a Razão de Kuznets pode ser entendida como a parcela da renda total recebida pelos estratos mais ricos da população, dividida pela parcela dessa renda percebida pelos estratos inferiores da distribuição. Essas parcelas, que podem ser definidas de acordo com a conveniência e o contexto da análise, são normalmente definidas em

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 10 46,1% 48,4% 48,2% 47,7% 47,9% 48,0% 47,6% 48,3% 47,8% 47,0% 45,8% 45,8% 45,1% 44,5% 43,4% 42,7% 41,7% 41,6% 41,6% 40,9% 9 16,8% 16,6% 16,5% 17,4% 17,2% 17,0% 17,1% 16,7% 17,2% 17,1% 16,9% 16,8% 16,9% 16,7% 16,8% 17,0% 16,5% 16,3% 16,2% 16,1% 8 10,8% 10,4% 10,8% 10,3% 10,7% 10,7% 10,7% 10,9% 10,0% 10,7% 10,8% 10,9% 10,9% 11,2% 11,1% 11,1% 11,4% 11,3% 11,1% 11,2% 7 7,9% 7,4% 7,3% 7,9% 7,4% 7,4% 7,3% 7,1% 7,4% 7,7% 7,3% 8,5% 7,8% 8,2% 7,9% 8,9% 8,4% 8,5% 8,5% 8,5% 6 5,9% 5,6% 6,1% 5,1% 5,7% 5,5% 5,6% 5,6% 5,8% 5,7% 6,4% 5,3% 6,2% 6,2% 6,8% 6,0% 7,0% 6,9% 7,0% 6,9% 5 4,5% 4,2% 3,4% 4,4% 3,9% 4,1% 4,2% 4,2% 4,4% 4,2% 4,6% 4,4% 4,5% 4,8% 4,8% 5,0% 5,2% 5,5% 5,3% 5,5% 4 3,3% 3,2% 3,2% 3,0% 2,9% 3,1% 3,2% 3,0% 3,1% 3,2% 3,3% 3,5% 3,6% 3,5% 3,7% 3,8% 3,9% 4,0% 4,2% 4,4% 3 2,4% 2,3% 2,4% 2,2% 2,2% 2,3% 2,4% 2,2% 2,3% 2,3% 2,5% 2,5% 2,6% 2,6% 2,8% 2,9% 3,0% 3,1% 3,1% 3,2% 2 1,6% 1,5% 1,4% 1,4% 1,5% 1,5% 1,4% 1,5% 1,5% 1,5% 1,6% 1,6% 1,8% 1,8% 1,9% 1,9% 2,1% 2,2% 2,1% 2,2% 1 0,6% 0,6% 0,6% 0,5% 0,5% 0,5% 0,5% 0,5% 0,5% 0,5% 0,6% 0,6% 0,7% 0,7% 0,8% 0,7% 0,8% 0,9% 0,8% 1,0% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

termos dos 20% mais pobres e mais ricos, ou dos 20% mais ricos e os 40% mais pobres (KABBA, 2012; HAUGHTON & KHANDKER, 2009).

Quanto maior a desigualdade, maior tenderá a ser a razão de Kuznets, que por sua vez

corresponde a segmentos da Curva de Lorenz,26 sendo particularmente útil quando não se dispõe

de dados completos acerca da distribuição de renda que se pretende analisar. Em outras palavras, essa medida mensura a desigualdade entre os extremos da distribuição, comparando tão somente a parcela da renda apropriada pelos mais ricos e pelos mais pobres.

A razão de Kuznets, como medida de desigualdade, cumpre algumas propriedades interessantes para esse fim, a saber: (i) o anonimato, pois essa medida independe de qualquer característica dos indivíduos que compõem a distribuição; (ii) a independência da escala utilizada, significando que a medida não varia em resposta a mudanças proporcionais uniformes. Assim, se a renda de cada indivíduo é multiplicada por uma constante, então o nível agregado de iniquidade deveria permanecer constante, já que essa medida não deve responder ao nível absoluto de renda; e, (iii) a independência populacional, entendida como a invariabilidade do indicador pela replicação dos membros da população ou da junção de duas populações idênticas, dado que a informação relevante é a proporção de indivíduos em cada

nível da distribuição27 (KABBA, 2012).

Em 2014, na série harmonizada, a proporção da renda apropriada pelos 20% mais ricos (57% do total) correspondia a quase 18 vezes a parcela apropriada pelos 20% mais pobres do país (3,2%), relação que chegava a 30 em 1992. Ainda mais contundentes são outras comparações, combinando diferentes proporções dos primeiros e últimos décimos da distribuição da RFPC. O exemplo mais impactante, no contexto do exercício proposto e apresentado no gráfico 23, consiste na comparação dos dois décimos extremos: os 10% mais ricos (U: 10%) ficam com quase 41% da renda total, enquanto os 10% (P: 10%) mais pobres acumulam apenas 1% - ou seja, os primeiros se apropriam de parcela aproximadamente 40

26 A Curva de Lorenz, que será abordada no tópico seguinte, é uma representação gráfica da distribuição relativa

de uma variável em um domínio determinado, onde, normalmente, o domínio é um conjunto de pessoas (uma população) e a variável cuja distribuição se estuda é renda dessas pessoas.

27 Por outro lado, a Razão de Kuznets não atende a uma importante propriedade, qual seja o Princípio de Pigou-

Dalton, que estabelece que uma transferência de renda de um indivíduo mais rico para um indivíduo mais pobre, desde que essa transferência não inverta a posição (social) entre os dois (ou seja, desde que a posição desses indivíduos no ranking distributivo), resulta em uma redução da desigualdade social (HOFFMANN, 2000). Isso significa que essa medida de desigualdade desconsidera os estratos intermediários da distribuição de renda, sendo sensível tão somente aos extremos da mesma. Isso também significa que o indicador desconsidera a totalidade da distribuição, o que impede o mesmo de atender a propriedade de decomposição aditiva. Isso porque a decomposição aditiva depende da definição da desigualdade entre os grupos que compõem a distribuição, da definição da desigualdade no interior de cada um desses grupos e, por fim, da identificação do modo pelo qual esses componentes interagem e produzem a desigualdade total (KABBA, 2012).

vezes maior, relação que chegava a 83,7 em 1992. Passada alguma oscilação - com tendência de incremento - na primeira metade da série, notam-se avanços consistentes nessas relações após 2003 para o conjunto do país.

Gráfico 23: Razão de Kuznets calculada para a Renda Familiar per capita, segundo Décimos de sua Distribuição - 1992 a 2014 -

Fonte: PNAD/IBGE – Vários anos. Elaboração própria.

Obs.: Exclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins.

Em relação à abertura urbano-rural, nota-se que a distribuição da RFPC na área urbana se mostra mais concentrada entre os mais ricos que a distribuição na área rural, em que pese nessa última a pobreza ser maior – em particular, a pobreza extrema. Em 2014, a dispersão na RFPC é acentuadamente maior no meio urbano, onde o último decil (R$ 331.200,00 por mês) assume valor máximo substantivamente maior que o último decil do meio rural (R$ 20.000.00 por mês), sendo que ambos partem de RFPC igual a zero (Tabela 5). Entre as regiões geográficas, a dispersão - tomada como a amplitude entre valores mínimos e máximos em cada região, tomada separadamente - é menor nas áreas Norte e Nordeste, que também registram, para todos os décimos, os menores valores médios para a RFPC, as únicas com valor inferior à média nacional. 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 U:10%-P:40% 5,8 6,4 6,3 6,6 6,7 6,5 6,3 6,7 6,4 6,2 5,7 5,5 5,2 5,2 4,7 4,6 4,2 4,1 4,1 3,8 U:20%-P:40% 7,9 8,6 8,4 9,0 9,1 8,8 8,6 9,1 8,7 8,5 7,8 7,6 7,2 7,2 6,6 6,4 5,9 5,7 5,7 5,3 U:10%-P:10% 83,7 85,1 78,5 88,2 91,6 87,9 87,2 102, 89,8 93,0 75,5 73,9 67,1 67,9 57,1 57,5 50,6 46,2 50,3 39,3 U:20%-P:20% 29,2 31,2 31,8 32,8 32,7 31,9 32,7 33,8 31,8 31,5 27,8 27,8 25,5 24,9 22,6 22,3 19,7 18,8 19,6 17,5 0 20 40 60 80 100 120

Tabela 5: Valores Mínimo e Máximo da RFPC segundo Décimos da Distribuição de Renda Brasileira, por Áreas Censitários e Regiões Geográficas - Brasil - 2014

Fonte: PNAD/IBGE – 2014. Elaboração própria.

Obs.: Inclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins.

Quaisquer que sejam os referenciais para o cálculo, a razão de Kuznets no meio rural se

mostra menos elevada, comparativamente ao resultado urbano (Tabela 5).28 A abertura por

regiões geográficas é importante e reveladora, pois, como bem argumenta HOFFMAN (1998), a desigualdade inter-regiões é um componente importante da desigualdade na distribuição da renda brasileira. A esse respeito, tem-se que a razão entre diferentes combinações de décimos superiores e inferiores da distribuição aponta para uma menor concentração de renda nas regiões Sul e Centro-Oeste (Gráfico 24). Mais precisamente, o Sudeste se destaca como a região com maior desigualdade, ao menos sob o critério da razão de Kuznets, enquanto o Sul apresenta a medida de desigualdade mais baixa do país.

A exemplo do que se observou para o indicador nacional, essa medida de desigualdade evolui satisfatoriamente no tempo em áreas urbanas e rurais, no sentido da redução da concentração da renda entre os mais ricos. Muito embora o indicador seja menos elevado nas áreas rurais, foi no meio urbano onde as maiores variações nesse indicador ocorreram, com quedas mais contundentes para todas as razões propostas. Esse comportamento pode ser também generalizado para as grandes regiões geográficas, onde, sem exceção, houve uma diminuição da desigualdade, ao menos quando a referência é a medida proposta por Kuznets. Ressalte-se que, muito embora a ordenação dessas regiões tenha oscilado um pouco ao longo no período 2004-2014, a estrutura da distribuição no interior dessas localidades se alterou positivamente, com aumento na participação dos décimos inferiores na renda familiar total.

28 Como as comparações urbano-rurais e regionais poderiam ficar comprometidas pela ausência das áreas rurais

da região norte (salvo de Tocantins), nessa seção optou-se pelo uso de uma série histórica mais curta, mas que compreendesse a totalidade da cobertura nacional.

Gráfico 24: Razão de Kuznets calculada para a Renda Familiar per capita, segundo Regiões Geográficas - Brasil - 2014 -

Fonte: PNAD/IBGE – 2014. Elaboração própria.

Obs.: Inclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins.

Dentre as cinco grandes regiões geográficas, há diferenças no ordenamento das mesmas conforme se altera o critério para a acumulação da renda nos primeiros e nos últimos décimos. Tomando-se os critérios mais focados nos extremos (U:10%-P: 10%; U:20%-P: 20%;), aquelas com os indicadores mais positivos e, portanto, menos elevados, são as regiões Centro-Oeste e Sul. Nos demais critérios (U:10%-P: 40%; U:20%-P: 40%;), o Nordeste e, novamente, o Sul apresentam os melhores desempenhos. Nessa comparação das proporções da renda apropriadas pelo último décimo da distribuição em cada região considerada, deve-se ter em mente que os montantes apropriados são distintos entre as regiões comparadas, tendo em vista os valores dos decis informados na Tabela 4. Nesse sentido, há regiões onde a renda é menos concentrada, o que indica que há menos desigualdade, mas também é mais baixa e implica maiores proporções da população vivendo com RFPC insuficiente pelos critérios normalmente adotados.

3,14,4 3,04,2 3,3 2,4 3,1 4,6 3,5 4,4 13,8 13,2 14,4 10,7 12,8 31,5 31,7 32,1 21,3 27,6 0,0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 30,0 35,0

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

Tabela 06: Distribuição e Razão de Kuznets calculada para a Renda Familiar per capita, segundo Décimos de sua Distribuição e Áreas Censitárias - 2004 a 2014 -

Fonte: PNAD/IBGE – Vários anos. Elaboração própria. Obs.: Inclusive áreas rurais da Região Norte, salvo de Tocantins.

Décimos 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 1 0,8% 0,9% 0,9% 0,7% 0,8% 0,8% - 0,9% 1,0% 0,8% 1,1% 2 2,3% 2,3% 2,2% 2,1% 2,2% 2,2% - 2,2% 2,3% 2,2% 2,4% 3 3,1% 2,9% 3,3% 3,4% 3,3% 3,4% - 3,3% 3,4% 3,2% 3,5% 4 4,2% 4,6% 4,4% 4,1% 4,3% 4,4% - 4,4% 4,5% 4,3% 4,6% 5 5,2% 5,4% 5,5% 5,3% 5,5% 5,7% - 5,7% 5,7% 5,5% 6,0% 6 6,7% 7,1% 7,2% 6,9% 7,3% 7,2% - 7,1% 7,4% 7,2% 7,7% 7 8,6% 10,2% 9,4% 9,2% 8,9% 9,6% - 9,6% 9,6% 9,1% 9,9% 8 12,1% 10,5% 12,0% 11,7% 12,8% 12,4% - 10,7% 10,6% 14,7% 12,9% 9 15,7% 16,7% 17,0% 16,6% 16,4% 17,2% - 18,4% 18,5% 14,6% 16,7% 10 41,2% 39,5% 38,2% 40,1% 38,4% 37,1% - 37,7% 37,1% 38,3% 35,3% Grupos 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 U:10%-P:40% 3,9 3,7 3,6 3,9 3,6 3,5 - 3,5 3,3 3,6 3,0 U:20%-P:40% 5,4 5,3 5,1 5,6 5,1 5,0 - 5,2 5,0 5,0 4,5 U:20%-P:20% 18,0 17,6 17,9 20,2 17,7 18,0 - 18,3 17,1 17,7 15,0 U:10%-P:10% 48,9 42,9 43,0 55,3 45,3 44,7 - 43,4 37,3 46,6 32,9 Décimos 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 1 0,6% 0,6% 0,7% 0,7% 0,8% 0,8% - 0,9% 0,9% 0,9% 1,1% 2 1,7% 1,7% 1,8% 1,8% 1,9% 2,0% - 2,1% 2,2% 2,2% 2,3% 3 2,6% 3,0% 2,4% 2,8% 2,8% 2,9% - 2,9% 3,1% 3,1% 3,2% 4 3,5% 2,7% 3,8% 3,3% 3,8% 4,0% - 4,3% 4,1% 4,2% 4,3% 5 4,4% 4,9% 4,6% 4,9% 5,0% 4,8% - 5,1% 5,4% 5,5% 5,3% 6 6,1% 5,9% 6,1% 6,4% 6,6% 6,7% - 6,9% 6,7% 6,8% 7,0% 7 7,9% 8,0% 7,9% 8,2% 8,1% 8,4% - 8,5% 8,5% 8,5% 8,6% 8 10,9% 10,9% 10,9% 11,2% 11,3% 11,3% - 11,4% 11,3% 11,3% 11,1% 9 17,2% 16,4% 17,0% 16,8% 16,9% 16,8% - 16,5% 16,3% 16,8% 16,2% 10 45,2% 45,8% 44,8% 44,0% 42,9% 42,5% - 41,4% 41,3% 40,8% 40,9% Grupos 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 U:10%-P:40% 5,5 5,7 5,2 5,1 4,6 4,4 - 4,1 4,0 4,0 3,8 U:20%-P:40% 7,5 7,7 7,1 7,1 6,4 6,2 - 5,7 5,6 5,6 5,3 U:20%-P:20% 27,7 26,9 25,0 24,9 21,9 21,7 - 19,4 18,4 19,1 17,0 U:10%-P:10% 77,6 73,0 63,7 66,4 53,6 54,9 - 48,4 44,4 47,9 38,2 Meio Rural Meio Urbano Razão de Kuznets Razão de Kuznets

Tabela 07: Distribuição e Razão de Kuznets calculada para a Renda Familiar per

capita, segundo Décimos de sua Distribuição e Áreas Censitárias- 2004 a 2014 -

Fonte: PNAD/IBGE – Vários anos. Elaboração própria.