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do Avanço da Soja na Amazônia Legal

No documento A geopolítica da soja na Amazônia. (páginas 176-182)

Elaborando a Árvore Causal

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Richard Pasquis2

Introdução

E

m 2002, os índices de desmatamento na Floresta Tropical da Ama- zônia Legal atingiram a cifra de 25.500 km², que repre senta a se- gunda taxa de desfl orestamento mais elevada desde o início dos anos 1990. Ainda que as causas do desfl orestamento sejam bastante variadas, há amplo reconhecimento de que a expansão da fronteira agrícola, conduzida pela criação de gado e pela produção de soja, é fator determinante nesse processo (Fearnside, 1997; Kaimowitz & Smith, 1999). Sintomaticamente, em 2003, a safra de soja brasileira tam- bém atingiu níveis recordes, com aumento de produção, em relação ao ano anterior, de 40 para 50 milhões de toneladas (CONAB, 2003). O signifi cativo impacto de grandes extensões ocupadas com mo- noculturas comercias vem preocupando pesquisadores e cientis- tas, pois já se constata que este tipo de uso do território provo- ca elevada perda de diversidade cultural e biológica (Buschbacher, 2000; CEBRAC, 2002).

1A árvore causal, como elemento do método de Marco Lógico, apresenta as diferentes causas que

favorecem o avanço da soja na Amazônia Legal ( Anexo).

2Esse trabalho é o resultado de uma pesquisa de equipe baseado numa ampla revisão bibliográfi ca,

pesquisa internet, consultas e sistematização de vários documentos e seminários co-organizados pelo WWF, CDS-UnB e CIRAD, com a colaboração de varias entidades como a SDS do MMA, o GTA, ICV, IPAM etc.

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O avanço da soja, que se seguiu aos programas de reforma agrária e, posterior expansão da pecuária bovina extensiva, é, sem dúvida, uma das últimas etapas da política de ocupação da região (Homma, 1999). A sua progressão é favorecida, em parte, pelo processo de pecuarização que, além de limpar as terras de sua vegetação nativa, proporciona concentração fundiária, propícia à mecanização. Esse avanço é ainda dinamizado pela globalização da economia, que fa- vorece a explosão de produções agrícolas altamente capitalizadas, e vem sempre acompanhado por medidas e inves timentos públicos ou privados (Bertrand, 2001) que incrementam a pressão dessa pro- dução sobre os ecossistemas fl orestais da região (Cunha, 1994). A intervenção reguladora do Estado é um imperativo, já que a sus- tentabilidade não pode ser assegurada se as decisões são deixadas a cargo das forças do mercado (Bursztyn, 2001). O papel do Estado na Amazônia Legal é o de representar o interesse público, formulando políticas e adequan do seus mecanismos para sua melhor implemen- tação. É necessário, portanto, abordagens inovadoras que conside- rem o papel que cabe a cada instância social, isto é, ao Estado, ao Mercado e à Sociedade Civil, bem como às pos síveis parcerias e articulações entre elas (Oliveira, 2003).

A soja na Amazônia Legal por quê

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?

A dinâmica de ocupação do espaço nacional está fortemente relaci- onada a ciclos de exportação econômica, por sua vez ligados a pa- drões pre datórios de uso do solo e de recursos naturais. Ao longo dos últimos quatro séculos, essa ocupação ocorreu por meio de grandes produções agropecuárias, como a cana de açúcar, a pecuária e o café. Foi assim que a maior parte da mata atlântica desapareceu do litoral.

3Bertrand et Pasquis (coord), 2004.

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A dinâmica da soja não é senão um evento separado da dinâmica econômica brasileira e da cultura “desbravadora” de boa parte dos produto res do sul, uma manifestação de uma tendência histórica. Porém, o ciclo da soja demonstra ter um poder de transforma- ção das dinâmicas regionais mui to maior que as outras produções agropecuárias. Se a isso forem acrescenta das as recentes mudanças no contexto internacional, fi ca evidente que não se pode analisar o processo da sojicultura com os mesmos critérios que as antigas culturas: perenes e com baixa capacidade migratória.

A soja “do Norte” não é uma simples extensão ge- ográfi ca da soja do Sul. Apresenta características diferentes (grandes extensões, produtividade etc.), além de um contexto global diferenciado. A ocupa ção pela soja não é uma repetição do que aconteceu com o café ou a cana de açúcar.

Em geral, é possível afi rmar que os padrões de ocupação do es paço mantêm relação com os ciclos dos produtos de maior peso na pauta de exportação, por meio da expansão da fronteira de recursos e da incor poração de terras de cultivo (Pasquis, 2001). No caso da soja, trata-se de uma cultura que apresenta um dos maiores progressos no Brasil nos últi mos 20 anos, o que dá a impressão de uma expan- são descontrolada4 (Fig. 1).

4Expansão descontrolada ou controlada? Sob a ótica de um modelo de desenvolvimento susten-

tável (que contempla no mesmo nível aspectos econômicos, sociais e ambientais), é descontrolada, porém pode ser bastante controlada e direcionada sob a ótica exclusiva do crescimento econômico. De fato, os atores privados têm um projeto de expansão bem delineado e coerente com os recursos disponíveis na Região Amazônica (em termos de solo, clima, topografi a etc.). Assim, esses atores, que são os protagonistas da expansão, lidam com um processo cujos rumos podem ser vistos relativa- mente bem e que são fruto não do descontrole, mas de sua intenção compartilhada e traduzida em ações concretas.

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Fig. 1. As principais causas da expansão descontrolada da soja na Amazônia Legal.

A soja avançou mais de dois mil quilômetros em direção ao norte. Im- pulsionada pelo incremento da demanda, principalmente internacional, a lavoura da soja começou a se expandir com mais vigor no Brasil ape- nas na segunda metade dos anos 1970 (Duarte & Huff, 2002) (Fig. 2). Em 1990, o Estado do Mato Grosso já era o 3º produtor do País, com cerca de 1,6 milhão de hectares plantados. No mesmo ano, as áreas de con centração da soja já formavam um contínuo bastante expressivo no cerrado da parte central do País. Ao longo da década de 1990, a expansão da soja no Brasil continuou com altos e baixos e em 2000 as zonas novas já predomina vam (Muller, 2000) (Fig. 3). Em 2003, o Mato Grosso passou a ser o 2º estado produtor, com 2,9 milhões de hectares, logo depois do Rio Grande do Sul (com 3,0 milhões de hectares). Porém, já é anunciado o 1º estado produtor (Famato, 2003).

Mesmo que a demanda por soja continue crescendo, o Brasil terá con- dições de atendê-la. Isto porque na Amazônia Legal existem condições favoráveis para a expansão da lavoura, tanto em áreas de cerrado ou de transição cerrado-fl oresta, como em zonas de campo, ou ainda em ter- ras desmatadas e degradadas por projetos pecuários (Rezende, 2002).

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Fig. 2. O deslocamento da soja ao norte.

Fonte: elaboração CEBRAC sobre mapa do USDA (2002).

Fig. 3. Evolução da produção de soja no Brasil no Mato Grosso.

Fonte: Famato (2003).

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Para facilitar essa expansão e incorporar potencialmente à produ- ção mais de 20% de seu território, o governo brasileiro investiu no pacote tecnológico da “revolução verde” adaptado pela Embrapa ao Cerrado, jun tamente com crédito farto e melhoria de infra-estrutu- ra de transportes (Muller, 2000).

O crescente emprego de tecnologia e o desenvolvimento, princi- palmente pela EMBRAPA e empresas de sementes do setor privado, de variedades de soja adaptadas a diferentes ecossistemas do País, permitiu um aumento continuado do rendimento dessa lavoura5 (EMBRAPA, 1999) (Fig. 4).

Fig. 4. Evolução do cultivo da soja em Mato Grosso.Fonte: Famato (2003).

5A média para a região na safra de 2000/2001 foi de 2.845 kg/ha, bem acima da média nacional; e na

safra 2003, o rendimento de Mato Grosso (3.050 kg/ha) foi o mais alto do País. A adoção de tecnologia para elevar a produtividade e reduzir custos vem sendo essencial para contrapor o elevado custo de transporte da soja nas zonas novas.

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O contexto internacional e suas conseqüências

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