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Do decadentismo ao anarquismo

No documento SHERLOCK HOLMES NO BRASIL: : Elysio (páginas 51-63)

“O Dr Antônio das Letras”

1.3. Do decadentismo ao anarquismo

Publicada pela livraria Garnier no ano de 1909, a obra Five o’clock foi um marco na carreira de Elysio de Carvalho. Considerado recentemente como um dos textos chaves para compreensão da recepção do decadentismo no Brasil, o livro

130SEVCENKO, Nicolau. Literatura como Missão: Tensões Sociais e Criação Cultural na Primeira República, p.

131 BROCA, Brito. A vida literária no Brasil de 1900, p. 173.

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escrito em formato de diário sobressaiu-se por permitir a análise da reverberação de um idioleto decadentista na Belle Époque carioca132. A decadência foi um super- signo da literatura finissecular marcante em autores franceses da década de 1880 e ingleses da década seguinte envolvidos em um programa de interpretação da crise da modernidade, cujas reverberações textuais tiveram notável importância em autores como João do Rio e Elysio de Carvalho133. Intitulado pelo próprio autor como um “diário de esteta”, Five o’clock converge em seu texto entrevistas, citações, poemas de autorias diversas em meio a reflexões estéticas e sobre o modus

vivendi das metrópoles cosmopolitas.

O narrador que circula em meio a festas em salões, partidas de bridge e sessões de chá promovidas por rapazes cultos e distintos, faz emergir através de um

texto-frame uma série de crônicas mundanas que trazem o universo urbano da

modernidade como palco de análise e de uma escrita ficcional. Não por acaso, segundo o narrador de Five o’clock, “os cafés concertos, como a vida febril dos bastidores e dos circos, são um esplêndido livro a escrever, assombroso de pitoresco e poderosíssimo de emoção”134. Os cortes característicos do texto, estruturado em um formato de diário, refletiam um “temperamento etnográfico”, segundo a expressão de Julia O’Donnell135, na figura do narrador dandy, atravessado pelas experiências urbanas do início do século XX. A modernidade metropolitana apresentava um registro da experiência subjetiva, caracterizado pelos choques físicos e perceptivos do ambiente urbano. Com o tráfego de automóveis, painéis publicitários, sinais de trânsito, o surgimento do telefone e as formas de sociabilidade noturnas, o ritmo de vida tornou-se mais frenético nas metrópoles,

132 SALGADO, Marcus Rogério Tavares Sampaio. A vida vertiginosa dos signos: recepção do idioleto decadista na belle époque tropical, p. 124.

133 SALGADO, Marcus Rogério Tavares Sampaio. A vida vertiginosa dos signos: recepção do idioleto decadista na belle époque tropical, p. 6.

134 CARVALHO, Elysio de. Five o’clock, p. 78

135 Em sua dissertação de mestrado, Julia O’Donnell defende como João do Rio apresentava um

“temperamento etnográfico” em suas crônicas ao desenvolver “uma sofisticada reflexão do modus vivendi do carioca nas primeiras décadas.” O distanciamento com que este se portava diante do que observa, assim como um aguçado senso de percepção das relações sincrônicas, permitia que este autor oferecesse uma visão dos aspectos mais sensíveis da urbanização do espaço da cidade e de seus habitantes. Sobre o temperamento etnográfico presente na obra de João do Rio ver: O’DONNELL, Julia Galli. No olho da rua: a etnografia urbana de João do Rio. Rio de Janeiro, Dissertação de Mestrado, UFRJ/Museu Nacional, 2007, p. 14-15.

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bombardeando os habitantes com uma nova intensidade de estímulos sensoriais urbanos.136

Não por acaso, a figura do narrador, caracterizado com um dandy, apresentava sintomas de nevrose contraídas ao ser abandonado por sua amada. Sofrendo pela perda de Sydonia, o narrador expressa “uma necessidade desenfreada de escravidão, um desejo violento de dar-me todo inteiro, (...) numa infinita prostração, todo impregnado da magia do amor, como sob a ação de um poderoso veneno, sem remédio”137. O advento da modernidade gerou um registro de experiência subjetiva distinto, marcado por um bombardeio de estímulos envolvendo um “aumento radical da estimulação nervosa”.138 A ideia de um esgotamento emocional e de uma instabilidade anímica marcou inúmeros texto literários do final do ´século XIX, sobretudo os enredos que envolviam histórias de paixões não correspondidas. Tais personagens de femmes fatalles estiveram presentes em textos decadentistas de Rollinat (“Dame em cire”, de Les Névrose), René Maizeroy (Yette, manequim), Jean Lorrain (Monsieur de Phocas) e Jules Bois (La eternelle popupelle), escritores de forte presença no Rio de Janeiro139.

A exaustão nervosa também seria uma característica marcante da figura do artista decadentista, cuja arte procurava encantar o público através de uma escrita hiperestésica. Não por acaso, a figura do escritor Ruben Darío surge como personagem do seu livro Five o’clock, portador de uma terrível moléstia. Em um encontro, o escritor nicaraguense teria revelado que iria mal, “muito mal... sempre muito mal... Vivo atormentado por nevralgias violentas que me vêm sempre acompanhadas de ataques misteriosos que ninguém explica e que tornam minha existência impossível.140 Poeta, jornalista e diplomata nascido na Nicarágua, Ruben Darío (1867-1916) foi considerado como um dos precursores do modernismo hispano-americano. O zelo e o detalhismo formal marcantes em seus escritos poéticos atrelavam-se a um ideal estético crítico à insensibilidade da sociedade moderna diante da criação artística. Tal perspectiva junto a uma postura de

136 SIMMEL, George. A metrópole e a vida mental. In: VELHO, Otávio. (org) O fenômeno urbano. 137 CARVALHO, Elysio de. Five o’clock, p. 13-14.

138 SINGER, Ben. “Modernidade, hiperestímulos e início do sensacionalismo popular. In: Charney,

Leo; SCHWARTZ, Vanessa (Eds.). Cinema and the Invention of Modern Life, p. 98.

139 SALGADO, Marcus Rogério Tavares Sampaio. A vida vertiginosa dos signos: recepção do idioleto decadista na belle époque tropical, p.125

140 CARVALHO, Elysio de. Five o’clock, p. 24.

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insubordinação intelectual à política e ao Estado – resultou em uma visão da obra dariana como uma arte alienada e descomprometida com a realidade. No entanto, a melancolia, elemento marcante em suas poesias, apresentava-se não apenas como tema, mas como resultado e criação do fazer poético, sendo a arte a única alternativa possível para enfrentar a massificação e o utilitarismo próprios do final do século XIX e início do século XX141.

A aproximação de Elysio de Carvalho com Ruben Darío antecedia a publicação de Five o’clock. Em 1906, o literato brasileiro já havia publicado um livro em sua homenagem que ganhara o título do próprio escritor, Ruben Darío. A obra, que conta com vários artigos sobre Nietzsche, Max Stirner, Max Nordau e Guglielmo Ferrero, evidenciava um esforço do escritor de inserção nos campos intelectuais hispano-americanos. Em agradecimento a um livro enviado por Elysio de Carvalho, Ruben Darío escreveu-lhe uma carta não somente elogiando sua obra – afirmando que este já possuía um “lugar definido e inegável entre os pensadores de seu país” – mas também sugeriu que o literato alagoano enviasse seu livro à Universidade de Salamanca:

Tu libro es una obra maestra. Como dice [José] Verissimo, tienes ya um lugar definido e innegable entre los pensadores de tu país. Yo te envío un fuerte abrazo, y me regocijo con tu triunfo. ¿Cuándo vienes a Europa? Yo parto para Nicaragua dentro de unos 20 días, o un mes. Estaré allá 4 meses. Manda tu libro a Martínez Sierra de “Renacimiento”. A Pedro y Andrés Gonzalez Blanco, (al Ateneo); á Unamuno en la Universidad de Salamanca.

De nuevo, un abrazo de tu Rubén Darío.142

O encontro com Ruben Darío, narrado no livro Five o´clock, colocava em evidência uma das principais influências que mais tarde marcaram a trajetória de Elysio de Carvalho: o escritor Oscar Wilde. Em uma conversa entre os dois literatos, a obra de Wilde aparece como uma leitura comum aos escritores sendo objeto de debate entre estes. A aproximação de Elysio de Carvalho com a obra do autor inglês ocorria desde o início de sua carreira, fazendo-se presente nas suas

141 Sobre a trajetória e obra de Ruben Darío, ver: SÁNCHEZ, Darío Gómez. A melancólica esperança de Ruben Darío. ZANETTI, Suzana. The modernist intellectual as artist: Rubén Darío. 142 Carta de Rubén Dário a Elysio de Carvalho. Paris, 30 de setembro de 1907. Disponível em:

http://alfama.sim.ucm.es/3DGreco/modprint.php?name=print&pag=26&search=rub%E9n. Acesso em 01 de julho de 2010. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 1512190/CA

primeiras publicações. Já em 1899, o escritor brasileiro publicou uma tradução em prosa da poesia The Ballad of Reandig Gaol, escrita por Wilde enquanto este se encontrava na prisão de Bershire. Impresso pela tipografia Aldina, a brochura vendida pelo preço de 3$000, também era enviada para aqueles que assinavam o periódico Brazil Moderno, dirigido e fundado por Elysio de Carvalho143. Desta forma, em meio a um público leitor incipiente, o literato alagoano criava estratégias de difusão de sua obra entre aqueles letrados que já seguiam seus escritos publicados na imprensa.

A admiração por Oscar Wilde transparece no texto de Elysio de Carvalho, que o considera como um “princípe da arte, do paradoxo e do dandismo”144. Para Coutinho, seria essencialmente em torno da teatralidade da personagem do dandy que convergiria a escrita de Elysio de Carvalho com seu amigo e literato, Paulo Barreto, mais conhecido como João do Rio145. A proximidade entre os escritores já aparecia na primeira página de Five o’clock, na qual o escritor alagoano publicara uma dedicatória:

O artista bizarro, atormentado e cintilante, admirável como Jean Lorrain e paradoxal como Oscar Wilde – seus mestres voluptuosos, requintado, perturbante e decadente, nostálgico como um lírico e impulsivo como um bárbaro (...) que se tornou o historiógrafo estranho da alma encantadora das ruas, o melancólico analista da escola de vícios, o psicólogo sutil, e às vezes cruel das religiões, das crenças e dos cultos da nossa sociedade146.

O registro deixado ao amigo neste livro evidenciava a profícua relação que existia entre estes escritores. Se, por um lado, a dedicatória pretendia reiterar os laços de amizade que envolviam os literatos, por outro, este pequeno texto projetava a obra de Elysio de Carvalho no lastro de produção de crônicas mundanas de inspiração decadentista, produzidas pelo já renomado escritor Joao do Rio. Em 1904, Paulo Barreto já havia publicado em brochura uma série de crônicas no jornal

Gazeta de Notícias, intitulada “As religiões do Rio”, que tiveram ampla

receptividade entre público leitor da capital federal. Quatro anos despois, a livraria

143 A ORBE, 01 de setembro de 1899, p. 2. 144 CARVALHO, Elysio de. Five o’clock., p. 40.

145 Sobre a teatralidade da personagem do dandy na obra de João do Rio de Elysio de Carvalho, ver:

COUTINHO, Edmundo Bourças. Five o’clock: teatro decadentista e parcerias na Belle Époque.

Ipotesi: revista de Estudos Literários, p. 79 -92. 146 CARVALHO, Elysio de. Five o’clock, p. 10.

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Garnier publicou um conjunto de crônicas escritas pelo literato entre os anos de 1904 e 1907, intitulada como A Alma encantadora das ruas, livro que até hoje é uma das obras mais conhecidas do escritor. A rua, que se tornava uma personagem nos escritos de Paulo Barreto, também viria a ser um objeto de análise nos textos de Five o’clock.

Saímos e tomamos por várias complicadas ruas até cair na Avenida do Caes, toda pontuada de luzes, vendo do outro lado uma macha luminosa que para os céus subia, do outeiro de Montmartre. Recordar é viver, e esses instantes foram dos melhores da minha vida. Foi um recordar sem fim dos tempos do Rio. – E os almoços do atelier de Guaratiba, que terminavam sempre com fantástico cake-walk dançado em torno daquele bravo piano que resistia como um herói às várias punhadas valentes de toda uma legião de borboleta147

Numa amálgama criada entre Paris e Rio de Janeiro, a rua como o espaço citadino emergia nas páginas deste livro com um sentido que extrapolava sua dimensão espacial. Assim como nas crônicas de João do Rio, a cidade mostrava-se antes de mais nada como um lugar de experimentação intersubjetiva, produtora de sentimentos, cujos cenários e personagens compunham um quadro sincrônico e recíproco de construção simbólica148. Logo, seria justamente nas ruas das cidades que emergiriam comportamentos mais sombrios que evidenciavam um lado perverso da modernidade. A prostituição, o uso abusivo de substâncias psicotrópicas e os excessos sexuais surgiam nas crônicas de Five o’clock, construindo representações sobre os demi-monde que cresciam nas metrópoles. Tais práticas perniciosas eram encarnadas pela personagem da cantora Ida d’Harcout, cujo comportamento de femme fatale e uma forte atração pelo vício resultaram na formação de uma personalidade histérica, nevrosada, marcada pela luxúria e pelas perversões sexuais. Segundo o narrador do livro, Ida d’Harcourt evocava “visões intensas, perturbadoras, tenebrosas do amor, da dor e do vício, sobretudo do vício” e era possuidora de “todas as grotescas vaidades e todas as úlceras secretas desta era de decadência e de nevrose”.149A representação da femme fatale, nas personagens de Ida d’Harcourt e Sydonia enuncia um dos signos principais da literatura finissecular: a decadência. Se, por um lado, as contínuas invenções

147CARVALHO, Elysio de. Five o’clock., p.90.

148 O’DONNELL, Julia Galli. No olho da rua: a etnografia urbana de João do Rio, p. 104. 149Ibid., p. 82. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 1512190/CA

tecnológicas que ocorriam desde o final do século XIX pareciam conduzir a um horizonte de infinito progresso humano, por outro, a modernidade mostrava uma face obscura, marcada pela pobreza, pelas práticas criminais, pelos vícios e excessos carnais. O tom otimista que acompanhava o crescimento econômico e urbano das metrópoles em pouco tempo chocava-se com a crescente degradação de homens e mulheres que se amontoavam nos bairros pobres das metrópoles.150

Para Elysio de Carvalho essas questões estavam ligadas à temática de “reforma social”, que chegava primeiramente ao escritor através da leitura das obras de Émile Zola, responsáveis por revelarem “uma triste ideia da sociedade atual”, “os crimes e os vícios da burguesia”, além do “sofrimento dos pobres e os tormentos das classes proletárias, vítimas da torpe exploração do homem pelo homem”. O nome do literato francês ganhou destaque na entrevista dada a João do Rio, mostrando-se como um ponto de conexão entre uma terceira atuação marcante em sua trajetória: o anarquismo. A partir desta virada que o intelectual se dedicaria aos estudos de Bakunin e Proudhon, considerados por Elysio, como “a única doutrina que oferece possível solução a questão social”151.

Embora estes anos fossem marcados por um auge dos sindicatos e greves anarquistas, não seria a partir da experiência operária que Elysio de Carvalho se engajaria no movimento. Assinalando como a obra de Émile Zola lhe despertou “o desejo duma arte mais sã, mais humana”152, o escritor propôs-se a escrever no ano de 1905 um artigo em defesa da criação de uma “arte social”. Publicado primeiramente no Almanaque Garnier, tal texto veio compor seu livro As Modernas

Correntes Estéticas na Literatura Brasileira, impresso dois anos depois pela

Livraria Garnier em formato de brochura.153

150 BRESCIANI, Maria Stella Martins. Londres e Paris no século XIX: o espetáculo da pobreza,

p.23.

151 CARVALHO, Elysio de. História d’um cérebro, p. 7 152 Ibid., p. 7

153 O livro As Modernas Correntes Estéticas na Literatura Brasileira apresenta uma primeira parte

dividida em ensaios de crítica literária sobre vida e obra de alguns artistas que compunham o momento literário brasileiro do início do século XX. Em seguida, a obra constitui-se como um conjunto de artigos de Elysio de Carvalho que versavam desde a relação entre arte e história até a própria formação intelectual do escritor alagoano. O artigo que corresponde a sua formação intelectual trata-se de uma terceira publicação de um mesmo texto que fora primeiramente publicado no jornal Gazeta de Notícias na série ‘O Momento Literário’, escrito por João do Rio, e posteriormente e, em formato de brochura como História d’um cérebro, pela tipografia Besnard Frères. As repetidas publicações de textos em distintos veículos impressos – que podem ser consideradas como formas de autoplágio - será uma marca de Elysio de Carvalho ao longo de sua carreira como escritor e funcionário de polícia.

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Neste texto, Elysio de Carvalho versou sobre a relação entre indivíduo e sociedade pensando algo próximo de um “esquema literário do anarquismo”154.A partir de um ponto de vista mais sociológico, indivíduo e sociedade são concebidos como dois entes dialógicos, pois o primeiro não seria “um ser isolado, encerrado em seu mecanismo autônomo, mas profundamente penetrado das influências de outrem (...) determinado pelas ideias e pelos sentimentos dos homens da sociedade em que vive, uma partícula do grande todo vivo”155 A arte caberia a missão de conciliar a soberania estética, na natureza e na ordem social, uma vez que por excelência esta teria “sua origem e seu fim na sociedade real” e trazia em si “como se fosse sua própria alma, uma sociedade ideal”. No entanto, por mais que o processo artístico seja aqui apresentado como um fenômeno de natureza social, esta teria como objetivo “engrandecer a vida individual”, como forma de promover a “comunhão entre todos os seres do universo”156. Será justamente na valoração do lugar do indivíduo nas teorias anarquistas que residirá a singularidade dos escritos produzidos por Elysio de Carvalho. Diferente das propostas que circulavam nos meio anarcossindicalistas, o escritor alagoano se aproximava-se mais de uma interpretação de um anarquismo individualista, sobretudo, em seus artigos publicados na imprensa operária, como veremos a seguir.

Com o objetivo de mobilizar os trabalhadores da capital federal, grupos anarquistas atuavam extensivamente na publicação de jornais e na realização de palestras. Esforços coletivos – ou mesmo individuais – resultaram na criação de periódicos que muitas vezes tiveram curta duração157. Foi o caso da Voz da

Trabalhador, periódico criado pelo Congresso Operário, no ano de 1906 e que

contou com cerca de setenta números editados. A aproximação de Elysio de Carvalho de um anarquismo individualista não impediu que o escritor se articulasse com os grupos presentes na imprensa operária que atuavam nas metrópoles brasileira. Já desde 1902, o literato alagoano contribuía com artigos para a revista

Asgarda, vindo anos depois a publicar seus escritos nas folhas O Trabalhador

154 PRADO, Antonio Arnoni. Itinerário de uma falsa vanguarda: os dissidentes, a Semana de 22 e o Integralismo, p. 46.

155 CARVALHO, Elysio de. Arte Social. In: As modernas correntes estéticas na Literatura Brasileira, p. 241.

156 Ibid., p. 243.

157 BADARÓ, Marcelo Mattos. Trabalhadores e sindicatos no Brasil, p.50.

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(1903) e o Amigo do Povo (1902-1904)158. No ano de 1903, o literato tornou-se diretor do quinzenário A Greve, criado pelo Círculo Libertário Internacional, e no ano de 1904, da revista Kultur.

Nesta última folha, Elysio de Carvalho explicitou sua perspectiva anarquista através da análise da obra o Único e sua Propriedade, escrita pelo filósofo alemão, Max Stirner, principal pensador do anarquismo individualista.159 Para Elysio de Carvalho, a destruição do Estado seria um único caminho possível para que os homens pudessem satisfizer plenamente seus desejos individuais. Tal tendência tinha justamente o intuito de libertar o indivíduo, uma vez que este é “a medida de todos os valores, a única coisa que tem existência real”. Desta forma, o literato defendia a “eliminação do Estado e todos os seus atributos” que pudessem impedir o desenvolvimento pleno dos indivíduos, somente sendo possível uma vida comum na medida em que esta correspondesse a um “equilíbrio completo, inalterável dos interesses individuais”160. Nesse sentido, o movimento anarquista e a crítica à própria existência do Estado tinham como princípio a preservação dos desejos egoísticos, mesmo na criação de associações coletivas.

Junto ao individualismo de Stirner, Elysio de Carvalho elegeu Nietzsche como um dos responsáveis pela sua “educação revolucionária” e “emancipação intelectual”161. Em texto sobre Guglielmo Ferrero, o escritor reflete a luz dos estudos de Nietzsche a necessidade da participação de um segmento dirigente na sociedade para condução das modificações profundas da história da humanidade. Recuperando o conceito de superhomem, o escritor alagoano dissertou como seria através de “nossas faculdades mais nobres que adivinharemos o que no passado é

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