• Nenhum resultado encontrado

Do lugar da experiência à objectivação de um problema a estudar

Parte II – Opções e procedimentos metodológicos

2. Do lugar da experiência à objectivação de um problema a estudar

Com a Lei n.º 5/97, de 10 de Fevereiro, a educação pré-escolar foi definida como «a pri- meira etapa da educação básica no processo de educação ao longo da vida, sendo com- plementar da acção educativa da família, com a qual deve estabelecer estreita coopera- ção, favorecendo a formação e o desenvolvimento equilibrado da criança, tendo em vista a sua plena inserção na sociedade como ser autónomo, livre e solidário».

Para este efeito, o ponto 1 do artigo 12º determina que os estabelecimentos de educação pré-escolar devem adoptar um horário adequado para o desenvolvimento das actividades pedagógicas e prevê períodos específicos para actividades educativas, de animação e de apoio às famílias, tendo em conta as suas necessidades.

Aqui se fundamenta a componente de apoio à família (CAF) e a medida designada de Prolongamento de Horário, resultado de um Protocolo de Cooperação entre os Ministé- rios da Educação, do Trabalho e da Solidariedade Social e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.

Os jardins-de-infância da rede pública passaram desde então a organizar a sua presta- ção de serviço em duas componentes, uma de cariz educativo e outra de cariz assisten- cial, de apoio à família, sob a tutela dos dois ministérios. Importa salientar que uma das condições para que possa existir a componente sócio-educativa na rede pública é que o poder local assegure a dotação do respectivo pessoal auxiliar.

Com esta mudança as crianças que frequentam os jardins-de-infância da rede pública passaram também a permanecer dentro das instituições cerca de 12 horas diárias. Des- tas foi estabelecido que 5 horas têm um carácter educativo, sob a responsabilidade pedagógica directa de uma Educadora de Infância. A questão é que as restantes 7 horas são asseguradas pelo Pessoal Auxiliar a quem é apenas exigido que tenha como forma- ção de base, a escolaridade obrigatória.

Embora a legislação em vigor, defina que ao Auxiliar de Acção Educativa «incumbe gene- ricamente, no desenvolvimento do projecto educativo da escola, assegurar uma estreita colaboração no processo educativo e da segurança das crianças[» e o «apoio ao edu- cador no desenvolvimento curricular, assegurando um ambiente educativo acolhedor e de promoção do bem-estar» (Portaria n.º 63/2001 de 30 de Janeiro), este grupo profissional passou desde então a ter a seu cargo, a responsabilidade de cuidado e de educação das

crianças, que para mais é simultâneo ao tempo de limpeza e higienização da sala de actividades.

Embora não possuam qualquer tipo de formação de base para o desempenho destas funções, tem cabido às Auxiliares o acolhimento e responsabilidade de “guarda” das crianças, até às 9.00h, momento em que se iniciam as funções educativas, com a Edu- cadora de Infância. Cabe-lhes também garantir a hora de almoço, das 12.00h às 13.30h, com outra Auxiliar, com quem se mantém até ao inicio das actividades educativas. Com o início destas actividades, cabe à Auxiliar que iniciou as funções no período da manhã a higienização do espaço onde foi servida a refeição. A Auxiliar que iniciou as suas funções à hora de almoço, passa a dar o apoio necessário na sala de actividades e assegura as actividades da componente sócio-educativa a partir das 15.30h e até às 18.00h. Depois de atender aos pais que vêm buscar os seus filhos, cabe-lhe todo um conjunto de activi- dades de limpeza e higienização da sala de actividades.

Dada a complexidade desta temática, pouco enunciada e problematizada no universo da educação de infância, optamos por a definir como problema e objecto da nossa investi- gação as vivências do pessoal auxiliar que diariamente desempenha as suas funções no jardim-de-infância, mobilizando experiências de vida, valores, crenças, afectividade, con- vicções como base de orientação das suas comunicações e condutas.

2.1. A delimitação do campo de investigação

A maioria dos estudos sobre a educação infantil e a educação pré-escolar têm concen- trado o seu foco de atenção na componente educativa/lectiva. Neste estudo pretendemos atender à componente sócio-educativa desenvolvida quer na rede pública quer na rede privada.

O que nos interessará saber é como o pessoal Auxiliar e as próprias Educadoras de Infância percepcionam e problematizam o papel que as Auxiliares desempenham nestas duas componentes através da sua implicação quotidiana em actividades de apoio à acção pedagógica das Educadoras de Infância, na prestação de cuidados de alimentação e higiene das crianças, bem como a sua segurança em tempos de transição, acrescidos da responsabilidade de encaminhamento e apoio ao grupo nas actividades de animação sócio-educativa (sob a orientação de profissionais contratados pelas autarquias) além da ocupação das crianças nos momentos de acolhimento e saída das crianças que implicam

o atendimento aos pais, no desempenho simultâneo de tarefas da limpeza e conservação do espaço e do material.

Com este conhecimento pretendemos contribuir para a discussão do impacto de uma das implicações mais visíveis das políticas de expansão da rede de Educação Pré-escolar, implementadas a partir de 1997 em Portugal, que consistiu no reconhecimento e diferen- ciação da função educativa e da função social dos Jardins de Infância tanto da rede pública quanto da rede privada.

2.2. A definição de algumas questões de partida

o Qual a especificidade do papel desempenhado pelas Auxiliares no tempo, espaço e actividades designadas como educativas ou sócio-educativas?

o O tipo e qualidade do relacionamento, das Auxiliares com as crianças, é igual nas duas componentes?

o Que condições diferenciam a actividade das auxiliares que integram a rede públi- ca e rede privada de educação pré-escolar?

o A formação experiencial das Auxiliares pode preencher de alguma forma, as lacu- nas de uma formação profissional orientada para a compreensão da infância e da educação?

o Sobre que bases deveria ser pensada a formação de bases destes agentes edu- cativos?

Para responder a estas questões nos propusemos desenvolver um estudo multicasos, que nos permitisse apreender algumas afinidades e diferenças entre a realidade vivida por este grupo profissional, em jardins-de-infância da rede pública e privada.

Optamos por enriquecer o ponto de vista deste grupo de actores sociais pela escuta das Educadoras de Infância, cujo perfil profissional tende a servir de matriz de referência nos processos de formação que pretendem promover a qualidade da experiência das crian- ças na componente educativa e na componente social de apoio à família.