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Antes de se iniciar a análise das matizes do tema eficiência, - fundamental para fornecer os subsídios necessários à identificação de uma atividade com esse atributo -, é importante fazer uma contextualização histórica sobre as fases do desenvolvimento da Administração Pública brasileira, até chegar ao movimento gerencialista, liderado por Bresser Pereira, que culminou na inserção do Princípio da Eficiência no texto da Constituição Federal de 1988.

A Administração Pública brasileira se originou sob forte influência da Administração portuguesa, que apresenta traços históricos bem característicos, como o patrimonialismo, a ordem estamental e a burocratização.

Segundo Raymundo Faoro, a face patrimonialista da nação portuguesa - presente desde a sua origem - podia ser observada através da análise da configuração de um Estado em que a propriedade pública e a individual do príncipe confundiam-se, dificultando, assim, a distinção entre o patrimônio pessoal da Coroa e o estatal.

Além disso, o patrimonialismo da nação lusitana, intrinsecamente ligado ao potencial que essa nação detinha para conquistar novos continentes com o intuito de alargar o seu alcance comercial, consistiu em fator determinante para que os negócios da Coroa fossem tratados como empresa, com um núcleo de cidadãos responsável pelo gerenciamento dessa atividade. Nesse contexto, surge uma nova categoria social, que, seguindo divisão proposta por Max Weber, Faoro identifica como estamento, produto do amadurecimento do Estado patrimonial e da necessidade de direção dos negócios da Coroa.

Entende-se por estamento a forma de estratificação social, e não econômica, com camadas mais fechadas do que as classes sociais, onde os seus membros pensam e agem

conscientes de pertencer a um dado grupo, teoricamente qualificado para o exercício do poder.

Na visão de Faoro, o estamento burocrático estava presente na realidade patrimonialista portuguesa, através da atuação de um grupo privilegiado de funcionários que comandavam a economia juntamente com o rei. Essa camada social exercia grande parcela do poder, controlando as questões comerciais e financeiras do Estado Português, sendo movida por interesses materiais e sociais exclusivos. Sob a influência dessa ordem estamental, na Administração Pública portuguesa, herdada pela brasileira:

o Estado organiza o comércio, incrementa a indústria, assegura a apropriação da terra, estabiliza os preços, determina salários, tudo para o (dito) enriquecimento da nação e o proveito do grupo que a dirige. (FAORO, 2001, p. 81)

Esta, portanto, seria a gênese da Administração Pública brasileira, que informou soberanamente a sua atuação até a década de 1930, quando, na Era Vargas, buscou-se inaugurar uma nova diretriz de Administração Pública, fortemente influenciada pelo modelo burocrático de Weber. A Revolução de 1930 foi, assim, um marco histórico para a Administração Pública brasileira.

Saliente-se que a Reforma Administrativa do Estado Novo estava voltada para a administração de pessoal, de material e do orçamento e buscava a revisão das estruturas administrativas, bem como a racionalização dos métodos de trabalho, com ênfase na gestão dos meios. Segundo Costa (2008, p. 846):

A reforma administrativa do Estado Novo foi, portanto, o primeiro esforço sistemático de superação do patrimonialismo. Foi uma ação deliberada e ambiciosa no sentido da burocratização do Estado brasileiro, que buscava introduzir no aparelho administrativo do país a centralização, a impessoalidade, a hierarquia, o sistema de mérito, a separação entre o público e o privado.

Em outras palavras, foi a primeira grande tentativa de inserção de uma burocracia profissional, nos moldes weberianos, calcada na racionalidade e na eficiência.

Importa registrar que um dos destaques dessa década, na área de pessoal, foi a criação do DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público), organizado em 1938, e cuja missão foi definir e executar a política para o pessoal civil, sendo responsável por implementar mudanças, recrutar e selecionar servidores, elaborar orçamentos, treinar pessoal, racionalizar e normatizar os contratos e a gestão dos estoques de material, dentre outras funções, sendo relativamente bem sucedido até o início da redemocratização em 1945.

Em 1º de abril de 1964 ocorria no Brasil o Golpe Militar. Dentre as reformas de base que sucederam esse momento histórico, destaca-se, no âmbito da Administração Pública, a edição do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, que consistiu em uma espécie de lei orgânica da Administração Pública, inovando ao trazer princípios, conceitos e o disciplinamento de novas estruturas e providências nessa seara.

Nos termos do referido Decreto-Lei, a Administração Pública deveria se nortear pelos princípios do planejamento, da coordenação, da descentralização, da delegação de competência e do controle. O citado diploma normativo tratou também de diferenciar a Administração Direta da Indireta. Trouxe, ainda, em seu bojo, normas para aquisição e contratação de bens e serviços, além de disciplinar outras questões de natureza administrativa e alusivas ao Poder Executivo.

Entretanto, a reforma de maior repercussão ocorrida na Administração Pública nacional se deu com o movimento ocorrido na década de 1990, mais precisamente no ano de 1995, e ao qual se atribuiu o nome de “gerencialismo”.

Ao analisar as referências apontadas por Bresser Pereira em suas publicações sobre o tema, percebe-se que a construção de sua proposta sofreu grande influência da obra “Reinventando o governo”, de Osborne e Gaebler (1992), e ainda das experiências, à época em andamento na Inglaterra e no Reino Unido, dirigidas à formatação de novos modelos de Administração Pública.

Conforme afirmam Pereira e Spink (1998, p. 22), a Reforma surgiu em resposta

(...) à crise do Estado, como modo de enfrentar a crise fiscal, como estratégia para reduzir o custo e tornar mais eficiente a administração dos imensos serviços que

cabiam ao Estado e como um instrumento de proteção do patrimônio público contra os interesses do rent-seeking ou da corrupção aberta.

Segundo Bresser Pereira (2008, p. 394), o modelo de gerência pública em questão:

É um modelo estrutural porque não se limita a estratégias de gestão mas envolve mais do que mudanças organizacionais: implica mudanças na estrutura do Estado, porque envolve todo tipo de parcerias público-privadas, porque os serviços sociais e científicos que a sociedade exige que o Estado forneça são terceirizados para organizações não-estatais. É um modelo de gerência que é também um modelo de ‘governança’ porque envolve outros atores, além do próprio governo, no processo de governar.

(...)

O modelo estrutural de gerência pública inclui um aspecto organizacional ou estrutural e um aspecto gerencial ou de responsabilização. De um lado está o problema de como estruturar ou organizar os serviços do Estado, o que deve fazer o núcleo estratégico do Estado, o que deve ser delegado para as agências e que serviços devem ser terceirizados; esse é o aspecto estrutural. Do outro lado, está a questão de como administrar todo o sistema – uma questão de processo ou de gerência mais do que de estrutura.

A Reforma, assim, pretendeu retirar o foco do processo, característico do modelo burocrático, para dirigi-lo aos resultados, ou seja, para o atendimento das demandas dos cidadãos, destinatários da atividade pública. Para tanto, pressupôs que os agentes públicos são merecedores de grau limitado de confiança. Buscou ainda promover uma redefinição do papel do Estado, identificando as atividades que lhe são exclusivas e as que não o são, e incentivando a criatividade e a inovação.

Ao refletir sobre o modelo gerencial, Carvalho (2008, p. 185) acentua:

No Brasil, ao argumento de que a burocracia restou corrompida pelas influências patrimonialistas privadas, entendeu-se ser o modelo gerencial capaz de afastar condutas viciadas como o nepotismo, fisiologia e clientenlismo, concretizando, enfim, a eficiência estatal. No novo modelo, identifica-se uma concentração nos resultados e não nos meios empregados, motivo porque reduz a importância do procedimento e ganha espaço o controle dos objetivos inicialmente fixados. Além da preocupação em obter redução dos custos, tem-se um cuidadoso controle financeiro e de produtividade exercido em contrapartida à autonomia na gestão dos recursos reconhecida a quem exerce a atividade administrativa.

O objetivo geral é, portanto, transitar de uma Administração Pública burocrática, considerada ‘lenta, cara, auto-referida, pouco ou nada orientada para o atendimento das demandas dos cidadãos’, para a gerencial. Esta é inspirada na descentralização política e administrativa, no controle a posteriori dos processos administrativos, afastado o controle rígido, numa Administração voltada para o atendimento do cidadão, em vez de auto-referida, e na redução dos níveis hierárquicos, em vez de piramidais.

É nessa perspectiva gerencial, que se busca investigar se o Edital Eficiente pode ser considerado ferramenta hábil a otimizar a fase interna da licitação, possuindo, de fato, o atributo da eficiência.