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Documentos de Suporte à Prática Supervisiva

Parte II – Apresentação e Desenvolvimento do Estudo

Capítulo 3 Descrição, Análise e Interpretação dos Resultados

3.2 Descrição e Análise de Documentos

3.2.3 Documentos de Suporte à Prática Supervisiva

De entre os vários documentos que podem apoiar o supervisor ou professor-tutor a

sistematizar os dados observados na aula de um estagiário, selecionaram-se, para análise no presente estudo, duas grelhas de observação, por serem comummente utilizadas, pelos referidos agentes educativos. Ambas as grelhas foram recolhidas em EFP, sendo que uma foi emanada do Ministério da Educação (grelha 1) e a outra foi elaborada numa EFP (grelha 2 ), com o objetivo de

introduzir adaptações, de acordo com a metodologia de ensino indicada pelo Plano Mestre de

Formação de Professores em Angola, a abordagem por competências/pedagogia de integração (MED,s/db).

As grelhas foram analisadas de modo comparativo, a fim de se constatar que

competências pretendem ser verificadas e consequentemente adquiridas, antes do estagiário integrar a vida ativa como professor, não esquecendo que durante o período de estágio pedagógico

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(décima terceira classe), “supervisores, professores e alunos são parceiros de aprendizagem e de transformação das condições de qualidade da educação” (Vieira et alii, 2006:11).

Do ponto de vista formal, as grelhas apresentam-se estruturadas de modo distinto, não permitindo, a grelha 1, verificar imediatamente quem é observado, já que o cabeçalho apenas contempla aspetos relativos à localização espácio-temporal (“escola”, “município”, “período”, por exemplo) e à disciplina. Este fator é colmatado na grelha 2 com a redefinição do cabeçalho, consequente integração do nome do estagiário, e com a deslocação de quem faz a observação, do fundo da página para um lugar cimeiro, ficando o final da página reservado para as assinaturas do estagiário e dos júris ou tutor, e não se fazendo, neste caso, distinção, quando ambos participam na observação.

Ambas as grelhas se dividem em “categorias de comportamento” (Damas & De Ketele, 1985: 89). No entanto, a grelha 1 apresenta uma estrutura mais coincidente com o alinhamento de uma aula (planificação, “introdução/motivação”, desenvolvimento, conclusão), intercalada com outros comportamentos que ocorrem ao longo da atividade letiva, como são a “avaliação”, as “metodologias utilizadas”, o “manuseamento do material” e a “atitude do docente”. Já a grelha 2 tem uma estrutura tripartida dos saberes que o docente deve dominar (saber, saber-fazer, saber- ser/estar), divididos pelos critérios mínimos (CM) e pelo critério de aperfeiçoamento (CA), como os designam as novas orientações metodológicas em fase experimental em algumas EFP, no que se refere à Abordagem por Competências (Roegiers, s/d: 25).

De entre as várias categorias, destaca-se a denominada “atitude do docente”, por nela não ser totalmente compreensível a inclusão do item “criatividade”, uma vez que não se relaciona com os restantes que a compõem (“relações humana com os alunos” e “sentido de auto-crítica”), mas com a planificação da aula, em particular na relação estabelecida entre os conteúdos e os meios de ensino, porque “teaching is more than an array of strategies and skills to be called upon or changed from lesson to lesson or day to day. Teaching is the use of appropriate methods designed to encourage learning.” (Loughran & Russell, 1997: 60-1).

Na grelha 2, a categoria relativa ao comportamento do professor na sala de aula torna-se mais ampla, valorizando o fator ação-reação (“adaptação a situações imprevistas”, “relação afectiva professor/alunos”), a linguagem verbal (tom e projeção de voz) e a linguagem-não verbal (“movimentação”), pois

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“Teachers often amplify an explanation with gesture, pointing a finger or spreading their arms, to make a point more clearly or emphatically. Another important element can be the movement, when the teachers walk towards somebody or away from a group. Body language generally signals important messages (…).” (Wragg, 1999: 12-4)

Todavia, ambas as grelhas integram, na atitude/comportamento do docente, o item “sentido de autocrítica” (que se mantém na grelha 2, mas com uma nova nomenclatura: “auto- avaliação do estagiário”), o qual se considera que faz parte de um momento de pós-observação, já que este apenas se desenvolve com a ajuda do supervisor e/ou do professor-tutor “a reflectir, a interpretar, a ver a realidade por detrás de números, categorias, incidentes e descrições” (Alarcão & Tavares, 2003: 98), em suma com o incentivar da “reflexão sobre a acção” (Alarcão & Tavares, 2003: 35).

Ainda que a categoria comportamental seja considerada no modus faciendi do professor

em formação, a categoria mais valorizada é a metodológica, isto é, a interligação entre o saber e o saber-fazer, como se verifica nos critérios de valoração da grelha 2 (é-lhe atribuída o dobro da cotação).

Os critérios de valoração/avaliação definidos para ambas as grelhas contemplam a avaliação qualitativa e a quantitativa, sendo mais claro, na grelha 2, a forma de calcular a classificação a atribuir em cada aula observada.

Contudo, nenhuma das grelhas prevê a não observação de uma das categorias ou itens, admitindo, deste modo, que todos os comportamentos definidos ocorrerão numa aula, o que é corroborado pela ausência de um espaço para observações/sugestões.

A articulação entre categorias definidas de modo “exaustivo-exclusivo” (“cada

comportamento observado pode e deve ser anotado sobre um ítem e um só de cada vez”, Damas & De Ketele, 1985: 85) atribui quer à grelha 1 quer à grelha 2 um caráter objetivo e que orientará a análise da aula no momento de pós-observação. Estas grelhas de caráter fechado exigem do observador um grau de inferência baixo, o que, como refere Estrela (2008:56), permite “substituir a crítica, que pressupõe um maior ou menor envolvimento afectivo e emocional de quem a fez, por um “feedback” que se pretende objectivo, orientado para aspectos específicos e neutro do ponto de vista afectivo”.

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Em suma, quer da análise da grelha 1 quer da análise da grelha 2, é possível concluir que observar implica olhar, anotar, compreender, analisar. Implica ainda o envolvimento de duas (ou mais) pessoas num processo educativo que visa o aperfeiçoamento do modo de ensinar, porque “teaching is a relationship” (Loughran & Russell, 1997: 58), estabelecida entre quem ensina e quem aprende. Isto também significa que quem observa deve desenvolver competências que implicam “uma prática organizada e sistemática” (Vieira, 1993: 96), que possibilite um preenchimento objetivo das grelhas de observação.

As grelhas analisadas contemplam aspetos relativos ao comportamento pessoal e profissional do docente, à interação verbal e não-verbal, ao modo de gerir e ensinar conteúdos letivos. Tendo a reestruturação da grelha 1 permitido a redefinição de categorias menos compreensíveis e a sua organização em competências, que o professor-estagiário deverá atingir, isto é, o saber (conhecimento científico), o saber-fazer (planificação e execução de uma aula) e o saber-ser/estar (comportamento/atitude). Porém, se se considerar a aplicação destas grelhas numa aula de língua, há aspetos que não são contemplados como são por exemplo, a adequação linguística, a focalização na competência da oralidade ou da análise de texto e que são de suma importância, uma vez que a aula de língua é “meio e fim de aprendizagem” (Sousa, 1993: 12). Conclui-se, assim, que as duas grelhas são de caráter genérico, não se centrando numa área curricular em particular.

É de salientar ainda que a utilização de qualquer uma das grelhas analisadas, ao longo do processo de estágio, direciona e condiciona o olhar do supervisor para as categorias comportamentais definidas, o que resultará num preenchimento e num analisar da atividade letiva demasiado mecanicista. Em particular, no caso do supervisor ou do professor-tutor não possuir prática de observação, contrariando o que está na base da elaboração de um instrumento de registo e avaliação: “uma pedagogia autocorrectiva ou de auto-aperfeiçoamento, ao mesmo tempo que permitem controlar a evolução sofrida pelo professor no período de formação” (Estrela, 2008: 57).

Após a contextualização do sistema de educação de Angola (subsistema de formação de

professores) e analisados os possíveis documentos, que um supervisor e/ou professor-tutor pode consultar e utilizar, passar-se-á, na secção seguinte, à interpretação dos resultados que constituem o corpus do presente estudo.

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