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2 O LUGAR (OU NÃO LUGAR) DA ESCRITORA NA CRÍTICA

2.1 APESAR DAS REFERÊNCIAS, A EXCLUSÃO DE CARMEN

2.1.3 Dos anos de 1970 até nossos dias

Já na década de 1990, Afrânio Coutinho e José Galante de Sousa organizam a Enciclopédia de Literatura Brasileira,46 na qual o verbete sobre Carmen Dolores já é bem significativo se considerarmos o silêncio dos outros críticos universitários. No verbete, percebemos um esforço para apresentar informações mais completas sobre dados biográficos, quais foram suas obras, datadas corretamente, informando, inclusive, o prefácio de Coelho Netto no livro Um drama na roça. Informa, também, sua colaboração no Correio da Manhã e em O Paiz, bem como o uso de vários pseudônimos (COUTINHO et. al., 1995, p. 526). No entanto, alguns equívocos são cometidos, pois ela não foi poetisa; Almas complexas é de 1933 (póstumo), e não de 1907; Um

drama na roça é um livro de contos, e não um romance; e Lendas Brasileiras é de 1908, e não de 1914, como consta, também,

erroneamente, na reedição do livro, em 2006, pela Sá Editora.

O que nos chama a atenção, nesse ponto, é outro aspecto que ressalta da comparação: os autores dessa Enciclopédia, assim como o fizeram outros críticos e historiadores que se referiram a ela durante o século XX, atribuíram os dados autorais ao pseudônimo Carmen Dolores, enquanto que, em relação à Celuta Moreira Gomes, organizadora dos dois volumes da obra O conto brasileiro e sua crítica.

Bibliografia (1841-1974), publicado em 1977, procede de forma

inversa, quer dizer, no volume I, inclui o verbete “Carmen Dolores, pseudônimo” e remete o leitor ao verbete “Melo, Emilia Moncorvo Bandeira de”, presente no volume II (GOMES, 1977, p. 121).47 Essa predileção pelo nome civil da escritora, aparentemente neutra, parece- nos intencional, no sentido de reconhecer que foi Emilia a grande criadora das figuras autorais ficcionais nomeadas por pseudônimos.

Contudo, Gomes e Aguiar (1969, p. 37), no verbete dedicado à Emilia, apresentam dados recorrentes em outras obras: “Almas complexas. Rio de Janeiro: Calvino Filho, ed.1934. [...] Publicado sob o pseudônimo de Carmen Dolores. Contista naturalista”. E, mais adiante, sobre Um drama na roça, as autoras dizem: “contém 26 trabalhos.

46 Utilizamos, nesta pesquisa, a reedição de 1995. No volume 2, consta o verbete dedicado à Emilia, que remete a Carmen Dolores constantemente no volume 1.

47 Esse segundo foi organizado por Celuta Moreira Gomes e Thereza da Silva Aguiar, publicado nos Anais da Biblioteca Nacional, em 1969, intitulado Bibliografia do conto brasileiro (1841-1967).

Publicado sob o pseudônimo de Carmen Dolores”. Além disso, elas apresentam citação do prefácio de Coelho Neto como forma de elogiar a obra da autora. Sobre Gradações, informam apenas: “[...] publicado sob o pseudônimo de Carmen Dolores, apud Roberto Simões – Faria Neves Sobrinho e o conto naturalista. Leitura. Abr. 1961, p. 30”. O que percebemos nos apontamentos sucintos é que as fontes de consulta são secundárias e não há, de fato, um juízo de valor sobre as obras, só o reconhecimento da existência da escritora, o uso de um pseudônimo e algumas de suas obras. Nesse sentido, Coutinho et. al. (1995), apesar dos equívocos, foi mais abrangente no reconhecimento.

Quem também se vale de fontes secundárias e repete as principais informações biográficas e literárias sobre Carmen Dolores, inclusive o desencontro de informações sobre seu local de nascimento (São Paulo e Rio de Janeiro) e mantém o equívoco da data do falecimento em 13 de agosto de 1911, foi o dicionarista Raimundo de Menezes, no seu

Dicionário Literário Brasileiro (1ª edição de 1969), com prefácio de

Antonio Candido. Na segunda edição (1978),48acrescenta uma apresentação de José Aderaldo Castello. Como fonte de consulta, Meneses (1978) usa os livros de Lucia Miguel-Pereira; Brito Broca; Luiz Correia de Melo; Raimundo Magalhães Junior; Gilberto Amado; Victor Orban e J. S. Ribeiro Filho; a maioria já apresentados anteriormente. O dicionarista, integrante da Academia Paulista de Letras, também reproduz os traços críticos já apontados por Lucia Miguel-Pereira, Brito Broca e Gilberto Amado. Além disso, diz que ela “deixou numerosos contos, em jornais e revistas, não reunidos em livro” (MENESES, 1978, p. 428), todavia, não diz onde, nem comenta nada sobre esses possíveis textos.

Procedimento muito semelhante, no sentido de repetir as mesmas informações equivocadas sobre a autora e sua obra, é a de Ruth Rocha, organizadora da Grande Enciclopédia Larousse Cultural (1988).49 A enciclopedista apresenta o confuso verbete: “DOLORES (Emilia Moncorvo Bandeira de Melo, dita Carmen), escritora brasileira (São Paulo SP, 1852. Rio de Janeiro RJ, 1910)” (ROCHA, 1988, p. 1987). Além de citar as obras sem data e sem especificação do gênero textual, reforça o equívoco do local de nascimento como sendo São Paulo.

48 Utilizamos, nesta pesquisa, para consulta, a 2ª edição, de 1978.

49 Essa é uma obra abrangente, construída coletivamente, com colaboração de editoriais de todas as áreas do saber, sendo que, sobre literatura, teatro e dança tem a colaboração de Maria Adelaide Amaral.

Ao chegarmos, nesta pesquisa, quase no final do século XX, quando essa Enciclopédia é publicada, e temos tantas obras anteriores fazendo referência aos parcos dados biográficos e à sua produção literária, apesar do silêncio de outra parcela, como interpretar tais atitudes de “pouco interesse” pelas fontes primárias que poderiam resolver esses equívocos? Só nos resta compreender o fato como uma questão cultural de exclusão ou de falta de valorização da produção de autoria feminina. Não basta trazer seus nomes à tona e citar “mais ou menos” suas obras; é preciso dar um contorno mais definido aos seus rostos, entender de onde vieram, quais foram as suas condições de produção e recepção e, além disso, estudar suas obras a partir de critérios metodológicos que estejam em consonância com essas condições biográficas e culturais.

Nessa perspectiva, Temístocles Linhares, no seu estudo História

Crítica do Romance Brasileiro – 1728-1981 (1987), foi um pouco mais

investigativo do que Rocha (1988) e sua equipe, apesar de seus poucos dados biográficos só aparecerem em nota de rodapé. Ao discorrer sobre a produção brasileira em prosa, Linhares (1987, p. 347-349) diz que “não podemos esquecer o nome de Carmen Dolores (pseudônimo de Emilia Moncorvo Bandeira de Melo)” como “autora de dois romances: Um drama na roça, com prefácio de Coelho Neto, publicado em 1908, e A luta, publicado em 1911”. Apesar de ainda se equivocar, apresentando o primeiro como romance; sobre o último, no entanto, o autor diz: “Este, porém, era um livro bem feminino, representando a sua experiência vivida e as reivindicações que se impunham às mulheres, entre as quais figurava o divórcio, pelo qual se bateu sempre sem esmorecimentos”. Não vemos o foco da narrativa dessa perspectiva, pois o romance em si não aborda a questão do divórcio, somente a separação temporária da protagonista. Além disso, sobre o divórcio, ela escreveu crônicas no jornal. O jornalismo de Carmen Dolores também é destacado por Linhares (1987), mas a ênfase recai sobre sua necessidade financeira: “fazendo jornalismo, colaborou assiduamente em O País e a necessidade do pão de cada dia a obrigou a intensificar essa atividade”. Refere-se ainda à primeira crônica que Gilberto Amado dedicou a Carmen Dolores, na qual ele teria destacado traços de sua personalidade, mas a fonte de consulta é de Brito Broca (1960, p. 252-253): “a paixão pela vida, a bravura dos entusiasmos, a violência das sensações; exaltação deslumbrada, essa robusta ventura de viver, mercê da qual se reconhece que este mundo mau é um excelente mundo”. Até esse ponto, parece- nos que o crítico se valeu de fontes secundárias, cometendo as mesmas falhas dos anteriores, que sequer leram os romances e contos para poder

interpretá-los. Um único ponto de inovação talvez seja a comparação entre a urdidura do romance A luta e a urdidura do romance Casa de

pensão, de Aluísio Azevedo, que “fixava a vida, no alto do Santa

Teresa, no Rio de Janeiro, numa dessas casas, mais pensão do que hotel [...]” (LINHARES, 1987, p. 349) e comenta a trajetória das personagens, do ambiente, das questões morais naquela sociedade.

No livro De Anchieta a Euclides: breve história da literatura

brasileira (1ª edição de 1977),50 José Guilherme Merchior, ao se referir ao período literário em que Carmen Dolores atuou, ressalta a “pluralidade de estilos” e observa que “por ‘segundo oitocentos’ entendemos [...] o período cultural que se estende até o âmbito histórico da grande guerra de 1914-1918, pois só então se pode falar, do ponto de vista espiritual, de fim do século XIX” (MERQUIOR, 1979, p. 102). Para o historiador, “o prestígio das letras [na virada do século] engendrou em reforço da consciência do escritor” MERQUIOR (1979, p. 108), porém, entre os escritores contemplados por ele, só estão os canônicos. Não incluindo Carmen Dolores entre eles, o historiador persiste no silenciamento político sobre a literatura de autoria feminina, numa época em que a crítica feminista já trazia à tona obras e autoras jogadas no limbo da história da literatura.

Atitude semelhante, até por ser companheira de “discussões metodológicas” de José Guilherme Merquior, tem a historiadora italiana Luciana Stegagno-Picchio,51 com sua História da Literatura Brasileira.52 Para Ramos (2003, p. 461), essa obra “é um guia histórico

50 O modelo de historiografia adotado por José Guilherme Merchior, em seu livro De Anchieta a Euclides: breve história da literatura brasileira (a 1ª edição é de 1977 e usamos, aqui, a de 1979), parece com o de Alfredo Bosi, no sentido de fazer a análise individual de autores e obras de modo restrito, indicando, na maior parte das vezes, apenas seus aspectos gerais. Merquior dá destaque aos autores e aos conjuntos de suas obras e segue o mesmo “costume” de iniciar sua obra com um capítulo sobre “O espírito da Colonização”. (MERQUIOR, 1979, p. 12)

51 Em nota, os editores apresentam a autora como “uma estrangeira, absolutamente inteirada de nossa trajetória cultural e literária” e ressaltam que suas fontes não eram “exclusivamente livrescas”, pois tinha um “contato pessoal e direto com todos os grandes nomes que ilustram a cultura nacional” da segunda metade do século XX. (STEGAGNO-PICCHIO, 1997, p. 9-10) 52A primeira edição italiana é de 1972, sendo que a edição em português, reformulada, usada aqui para consulta, saiu em 1997.Essa é uma obra ensaística que, como esclarece a nota editorial do livro, permite ler a história da divulgação da literatura brasileira na Europa. Seguindo um critério estilístico,

para a inteligência dos fatos históricos isolados e, do outro lado, uma tentativa de balanço, sob o ângulo sincrônico da atual visão estética e de gosto”, pois a autora, ao abordar o modernismo, “procura mostrar materiais ‘incomuns’, como aqueles relativos não só aos gêneros literários geralmente recusados pelas histórias literárias: a ficção, a pintura, a música popular, as ciências sociais” – elementos que comporiam esse “estilo brasileiro”. Dessa perspectiva, concordamos com Ramos (2003), quando afirma que há na obra da autora “o desejo de reescrever as histórias da literatura e ir além delas” (RAMOS, 2003, p. 465).

No entanto, esse desejo de renovação, essa percepção da existência de várias histórias da literatura já não observamos no capítulo em que a autora contempla a produção literária da Primeira República, intitulado “A Prosa do Parnaso ao Crepúsculo: instinto de nacionalidade e literatura regionalista”. Nele, Stegagno-Picchio (1997, p. 379-380) reconhece a “pluralidade cultural” e “disparidade social”, assim como a intensidade dos “laços” entre o Brasil e Europa e a complexidade dos “fatos culturais brasileiros compreendidos entre o início do século e a Semana de Arte Moderna”, assim como o fazem outros historiadores brasileiros, já citados neste capítulo. Nos trechos “dedicados à prosa brasileira do Naturalismo ao Modernismo, do fim do século XIX a 1922”, a estudiosa reagrupou autores e obras pelo “critério temático”, alocando em um grupo os “narradores regionalistas” e, em outro, os “investigadores do eu”. Apesar de incluir alguns nomes que, normalmente, não constam no cânone, entre eles não estão as mulheres que, efetivamente, produziram literatura nesse período, principalmente, aquelas que desenvolveram a investigação do eu.

Também entre os cronistas do período do “sorriso da sociedade” cita apenas – fundamentada em Lucia Miguel-Pereira – Carlos de Laet

procura “reconhecer autonomia e individualidade estética tanto às

personalidades literárias isoladas como à estrutura onde elas operam e à qual, com sua presença, dão vida” (STEGAGNO-PICCHIO, 1997, p. 17). A historiadora procura encontrar um “estilo local” (brasileiro), “[...] sempre em relação com os acontecimentos sociopolíticos externos, mais descrito, porém em suas constantes expressivas [...]” (STEGAGNO-PICCHIO, 1997, p. 17-24), como forma de superar a dicotomia entre literatura colonial e literatura autônoma. A estrutura segue o critério de apresentar os nomes de autores, os títulos das obras e trechos escolhidos, buscando informações em “todas as fontes possíveis”, distribuídos em dezessete capítulos que contemplam os diversos “momentos” da literatura nacional.

(1847-1927); Olavo Bilac; João do Rio (Paulo Barreto); Lima Barreto; Antonio Torres; Gilberto Amado e Coelho Neto (STEGAGNO- PICCHIO, 1997), excluindo Carmen Dolores, Julia Lopes de Almeida e Délia, por exemplo.

Vendo uma mulher historiadora, no final do século XX, perpetuar a exclusão das escritoras, só nos resta recorrer à crítica feminista para contemplar o resgate já efetuado da obra de Carmen Dolores. É o que faremos a seguir.

2.2 CARMEN DOLORES E O RESGATE DA CRÍTICA FEMINISTA BRASILEIRA

É importante, para reverter o cânone, mostrar o que aconteceu, quando o objeto começou a falar. Para isso, além do resgate, da publicação de textos, é preciso reviver essas mulheres, trazendo seus textos de volta aos leitores, criticando-os, contextualizando-os, comparando-os, entre si ou com escritores homens, contribuindo para recolocá-las no seu lugar na História.

(Zahidé Lupinacci Muzart)

Depois de aproximadamente quarenta anos de pesquisas acadêmicas arqueológicas visando à recuperação da história silenciada da produção literária de autoria feminina, desenvolvida pela crítica literária feminista brasileira,53 já temos luzes que permitem a

53 Em diversas publicações, algumas de nossas críticas feministas já esclareceram como se deu, no Brasil, esse esforço coletivo de pesquisadoras atuantes no Grupo de Trabalho “A Mulher na Literatura”, no âmbito da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística, desde a década de 1980. Pertencentes a várias instituições brasileiras, trabalharam em projetos coletivos e individuais seguindo três linhas mestras de estudos na área: Literatura e Feminismo, Literatura e Feminino e Literatura e Mulher. (Cf. HOLLANDA, 1994, p. 454-455) Na primeira, estão os projetos de resgate da história silenciada da produção de autoria feminina, a análise dos paradigmas patriarcais e logocêntricos da literatura canônica e a reescritura de nossa história literária. Como afirma Duarte (2013, p. 64), “desde os primeiros estudos, tornou-se evidente a intenção de promover o resgate da história das mulheres, de recuperar obras, divulgar escritoras, rever, criticamente, o que havia sido escrito sobre elas,e, ainda, reavaliar conceitos estéticos e questionar os critérios da crítica instituída, responsáveis pela chamada ‘boa literatura’”. Os diversos núcleos universitários de estudos da mulher na literatura, que surgiram

visibilidade sobre o que as mulheres do século XIX produziram. Assim como o número surpreendente de resultados de pesquisas, publicadas em livros, antologias, dicionários e periódicos já nos possibilita pensar em (re)construção de histórias da literatura que emergem dos escombros vasculhados. Hoje, não pensamos, aqui, na possibilidade de inclusão dessas escritoras na História da Literatura canônica, mas, sim, na construção de múltiplas histórias da literatura, configuradas pelo lugar que, de fato, a produção de autoria feminina ocupou na cultura e na sociedade brasileira, ou seja, o espaço da exclusão.

a partir de uma demanda política de caráter feminista, vêm divulgando os

resultados de suas pesquisas, ao longo das três últimas décadas, em livros, periódicos especializados, anais e boletins dos encontros, dissertações e teses, bem como estão fazendo dos Seminários, Simpósios, Colóquios, Congressos e outros eventos científicos nacionais e internacionais um espaço de diálogo e de participação acadêmica e política na construção de novos paradigmas para a historiografia literária brasileira. Dessa forma, a linha de pesquisa, que vem reivindicando “a visibilidade da mulher como produtora e sujeito de discursos e saberes culturais” (DUARTE, 2013, p. 66), já se tornou respeitada, produtiva e legítima no meio acadêmico. Pois, de acordo com Schmidt (1995, p. 183), “[...] estão surgindo outros nomes, silenciados na historiografia oficial e cuja emergência tem desencadeado uma verdadeira desarticulação da visão canônica de nosso passado literário, especialmente no que se refere aos pressupostos holísticos de verdade, significado e valor que a tradição dominante elevou à categoria de universais atemporais e que sustentaram, até hoje, a sua configuração”. Além disso, a participação de Zahidé Lupinacci Muzart no livro Histórias da literatura, organizado pela Prof.ª Maria Eunice Moreira (2003), como a própria autora diz: “é um passo à frente na aceitação das teorias feministas pela academia, pois elas se constroem na prática e são resultados de ação política, de engajamento”. Cabe, ainda, lembrar outra importante ação feminista, dentro dessa linha de pesquisa arqueológica, que é o resgate e reedição de obras raras de autoria feminina e edição de livros de ensaios críticos feministas, como bem explica Muzart (2011, p. 627) no seu texto sobre a criação da Editora Mulheres, em 1995, no qual discorre sobre a recuperação da produção da mulher brasileira do século XIX e as várias séries publicadas regularmente. Muzart (2011) ainda descreve a caminhada das editoras, marcada por trabalho árduo, esforço coletivo e prazer com os resultados. Contudo, Zahidé Muzart (2004) complementa que não basta apenas recuperar a memória feminina do esquecimento, mas, principalmente, colocar seus textos em circulação para que eles possam ser lidos, avaliados e inseridos na historiografia literária. (Confira também: ARAÚJO , Maria da Conceição Pinheiro. Lilithes, do século XX, abrem a caixa de Pandora das Sherazades, do século XIX. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/ viewFile/637/466>. Acesso em: 21 mai. 2014).

Como afirmou Schmidt (1995, p. 182), “esse quadro de recuperação instaura, sem dúvida, um recorte diferencial na maneira como lemos a nossa cultura, a nossa tradição e a nós mesmos”. O que não significa, por outro lado, que o trabalho de recuperação já esteja concluído. Se os nomes, apontamentos biográficos e títulos de obras já constam em antologias e dicionários, ainda há muito o que estudar e avaliar nas obras, a partir de referenciais teóricos adequados às condições de produção das intelectuais do século XIX, início do século XX e de recepção na contemporaneidade.

Nessa busca pela fortuna crítica de Carmen Dolores, constatamos que algumas feministas brasileiras, que se ocuparam com sua obra, levadas pela preocupação com a lógica da exclusão da mulher, presente na construção da História da Literatura oficial, aprenderam bem a lição de Zahidé Muzart descrita na epígrafe, para recolocá-la no lugar que lhe pertence. Entre as inúmeras escritoras do século XIX recuperadas do esquecimento, Carmen Dolores, além de constar em antologias e dicionários de escritoras do século XIX, já teve suas obras avaliadas em textos críticos publicados em livros, em artigos publicados em periódicos científicos, assim como em dissertações e teses de pós- graduação.

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