• Nenhum resultado encontrado

Os prefácios de suas obras em novas edições

2 O LUGAR (OU NÃO LUGAR) DA ESCRITORA NA CRÍTICA

2.1 APESAR DAS REFERÊNCIAS, A EXCLUSÃO DE CARMEN

2.2.5 Os prefácios de suas obras em novas edições

O resgate dos livros publicados pela autora, hoje raros, e a sua reedição foi outra forma encontrada pela crítica feminista brasileira para reconhecer todo o empreendimento laboral desta feminista do entresséculos XIX e XX e, concomitantemente, para dar a possibilidade, ao público leitor contemporâneo, de conhecer a sua obra literária. Da nossa perspectiva, essa é uma tarefa essencial para, de fato, podermos incluí-la na historiografia literária. Pois, para não ficar apenas no que já se tornou senso comum, de que só há literatura se essa for lida, recorremos ao que afirma Compagnon (2009, p. 56), ao discorrer sobre os poderes da literatura no período clássico, romântico, moderno e pós- moderno: “É tempo de se fazer novamente o elogio da literatura, de protegê-la da depreciação na escola e no mundo”. Obviamente, o trabalho de crítica é necessário, mas, paralelamente, é preciso disponibilizar esse texto literário ao público leitor contemporâneo.

Quatro das obras de Carmen Dolores já foram contempladas em reedições: Gradações - páginas soltas, em 1989; A luta, em 2001;

Lendas Brasileiras, em 2006 e Almas complexas, em 2014. Essas

iniciativas também são resultado do empreendimento em pesquisas arqueológicas executado, principalmente, por Maria Angélica Lopes e Eliane Vasconcellos, pois as primeiras edições raramente eram encontradas. Além disso, o livro Carmen Dolores – Crônicas de 1905 –

1910, de 1998, organizado por Eliane Vasconcellos, também resultou de

um trabalho de resgate e seleção de algumas crônicas escritas pela autora e publicadas em O Paiz.

O primeiro livro de contos de Carmen Dolores foi reeditado, em 1989, por meio do projeto “Coleção Resgate”, do Instituto Nacional do

Livro, com introdução, atualização e notas de Maria Angélica Guimarães Lopes, como uma forma de homenagear a “escritora de valor”, que foi “famosa em sua época, traduzida para o inglês [...] hoje [...] desapareceu da história da literatura brasileira” (LOPES, 1989, p.9).

Fundamentada em Raimundo de Magalhães Junior, a pesquisadora resgata dados biográficos e opiniões sobre a intelectual que se destacou no meio literário e conseguiu equiparação de renda com seus colegas do sexo masculino. Comenta, ainda, os três pontos de vista em que Carmen Dolores pode ser vista: “jornalismo, literatura de ficção e feminismo” (LOPES, 1989, p.9). Quanto ao seu modo de ser jornalista, lembra sua participação nos principais jornais da capital federal, mas registra erroneamente o período de atuação na coluna “A Semana” como sendo a partir de 1908, e não entre 1905 e 1910.

Situando a perspectiva e forma de abordagem da escritora dentro da estética naturalista e o estilo ao parnasianismo/simbolismo, avalia os contos de Gradações como “estudos de personagens femininas, muito ao gosto da época, unidos pelo fio da análise psicológica e tom e estilo intimistas” (LOPES, 1989, p.13), construídos com sutileza, plasticidade, ironia, firmeza, finura e compaixão, de modo que, só isso, “deveria garantir-lhe um lugar obrigatório na literatura brasileira” (LOPES, 1998, p.14). Lopes reconhece, assim, o valor dessa obra ficcional e, ao mesmo tempo, sua exclusão da historiografia literária, mesmo sabendo que, na época da publicação dessa primeira obra, a escritora “ainda não adquirira fama de jornalista ou contista”.

Para Lopes (1989, p.15-16), em todos os contos as protagonistas são “superiores: finas, inteligentes e instruídas”; três são viúvas; todas estão “dominadas” pelo excesso de paixão, fascinadas por um “homem inteligente, brilhante e festejado” socialmente, mas contraditório e que provoca seu sofrimento “entrecortado por momentos de indescritível felicidade”. E conclui sua avaliação crítica do livro, afirmando:

Por recriar com minúcia as evoluções da paixão amorosa, sentimento popularizado na ficção há mais de dois séculos e conhecido da maioria de leitores tanto da época como da nossa, Gradações impõe-se como livro de interesse indiscutível. Bem escrito e incisivo, oferece-nos, além do mais, valor documental, ‘impressões’ de uma sociedade cujo ar nos faz respirar (LOPES, 1989, p.16). No mesmo ano em que trabalha na reedição desse livro de contos, Maria Angélica Lopes publica um artigo na Revista Letras de Hoje, intitulado “Desafio materno: a luta de Carmen Dolores”. O texto, que

avalia criticamente o romance A luta, transformou-se, posteriormente, no prefácio da reedição deste livro, publicado pela Editora Mulheres, em 2001. Nesse texto introdutório, Maria Angélica Lopes (2001, p. 6) inclui Carmen Dolores entre as “escritoras famosas da virada do século passado” e diz que a própria autora considerou esse romance a obra de maior importância, mas que não chegou a ver seu livro publicado em vida. Retomando a fortuna crítica da autora, Lopes (2001) concorda com Lúcia Miguel-Pereira quanto à filiação da obra a um realismo/naturalismo tardio e o fato de Carmen Dolores seguir os modelos literários de Zola, Balzac, Eça de Queiroz e Aluísio Azevedo. Acrescenta que ela escolheu focar a classe média e baixa, criou personagens tipo, estabeleceu uma correspondência entre o cenário e a alma das personagens. Lopes (2001, p.6) justifica sua interpretação pela referência que a própria Carmen Dolores faz aos autores em suas crônicas de O Paiz, mas diz que a autora não se refere a Flaubert, mesmo com a alusão direta à “Bovary da rua das Marrecas”.

Já quanto ao físico das personagens atuarem como significante de sua têmpera moral, encontra em todos os integrantes do grupo familiar formado pelo casamento de Celina e Alfredo Galvão, incluindo os hóspedes de D. Adozinda, a caracterização entre a aparência facial repelente e a hipocrisia e lubricidade de Cel. Juvenato; entre as carnes fartas, a beleza e os impulsos sexuais e leviandade de D. Adozinda e Olga; o olhar sonso e ambíguo de Celina e sua semelhança com Capitu sob os olhos de Bentinho; a fraqueza e a timidez associadas ao domínio pela paixão de Alfredo; e, em contraste, a figura sóbria e triste de D. Margarida associada à dignidade.

Para Lopes (2001, p.12), “é obra de valor, a ultrapassar de muito a literatura frívola e elegante do “sorriso da sociedade”, a caracterizar a nossa Belle Époque. E a pesquisadora complementa: “o romance é um estudo de caracteres a estruturar a intriga. Inscreve-se aí a questão vital de Taine [...] o caráter é hereditário ou fruto do meio?”. E, é essa questão que marca a intriga e faz o leitor seguir o narrador por todo o livro. Na interpretação da pesquisadora, a luta entre o bem e o mal “segue o catecismo católico vigente em sua compreensão popular, no qual a inocência da jovem representa o bem e a curiosidade o mal” (LOPES, 2001, p. 12).

Apesar da extensa e minuciosa análise da obra, ressaltando a ambivalência e flexibilidade da autora, oscilando entre a “modernidade feminina” e o “passadismo patriarcal”, principalmente no que diz respeito às questões da mulher na sociedade, ao casamento e ao divórcio, Lopes (2001, p.14-18) continua repetindo equívocos

biográficos, como a data de falecimento, em “17 de agosto de 1910” e, em nota de rodapé, “(1852-1911)”. É preciso ressaltar que essa publicação é posterior ao livro de crônicas reunidas por Eliane Vasconcellos, no qual esses equívocos já haviam sido esclarecidos.

Mais à frente explica o erro de R. de Meneses e cita, para tal, o obituário de 17 de agosto de 1910 de O Paiz. Ainda sobre a biografia, afirma que ela “pertenceu à alta burguesia e aristocracia, ingressou no jornalismo primeiro por gosto, mas, depois, viúva, por necessidade”. Repete as mesmas lutas, empreendidas por Carmen Dolores, já referidas por tantos outros críticos anteriores, e ressalta a “inteligência, paixão e arcabouço retórico”, assim como a fina observação e a coragem da escritora. (LOPES, 2001, p. 15)

Em 1998, Eliane Vasconcellos deu a sua contribuição no trabalho de resgate e publicação póstuma da obra de Carmen Dolores com a edição do livro Carmen Dolores: crônicas 1905-1910. Vasconcellos (1998) selecionou 37, entre as mais de 270 crônicas publicadas pela escritora na coluna “A Semana”, do jornal O Paiz, entre os anos de 1905 e 1910.

Interessa-nos, aqui, o texto crítico relevante que ela escreve como introdução, não só pelo número de informações, mas pelo esclarecimento de equívocos sobre os dados biográficos repetidos inúmeras vezes ao longo dos anos, como já mostramos anteriormente. No entanto, como vários outros autores, também reafirma sua atuação na poesia.

A organizadora começa contextualizando o período em que a cronista colaborou em jornais cariocas e explica o trabalho incansável da autora nos seus últimos tempos de produção, dizendo que ela “tinha consciência de que para os homens as mulheres eram frágeis e, assim, tinha de dar o exemplo contrário” (VASCONCELLOS, 1998, p.12).

Como indicações de caminhos para os futuros pesquisadores, Vasconcellos (1998) comenta as publicações de Gradações; Um drama

na roça e a crítica elogiosa de Coelho Neto; as publicações póstumas de Almas complexas, Ao esvoaçar da ideia e A luta. Resgata, da fortuna

crítica, a opinião preconceituosa do Frei Pedro Sinzig, já comentada neste capítulo. Informa, ainda, sobre as diversas encenações da peça

Desencontro e as conferências A sociedade e A cidade e o Campo, lidas

no Instituto Nacional de Música. Informa sobre as obras traduzidas para o inglês e o francês como o conto “As lágrimas de Tia Zezé”, que figurou no livro Mille nouvelles, publicado em 1911, além de na antologia Brazilian Tales, de Isaac Goldberg.

Consciente de seu papel na edição desse livro, Vasconcellos (1998, p.18) é ainda mais direta na sugestão de uma futura pesquisa:

Uma visão crítica do trabalho intelectual de Carmen Dolores deveria examinar toda a sua produção: contos, romance, o livro de lendas e principalmente o livro de crônicas e a sua colaboração de cronista que ficou inédita nos jornais, uma parte da qual constitui a coletânea que acabamos de organizar.

Ressalta que seria importante pesquisar mais sobre a obra de ficção, “uma vez que a história e a crítica literária [...] deixaram de lado a sua produção” (VASCONCELLOS, 1998, p. 18). Além disso, como argumento para defender essa importância, lembra ainda que Carmen Dolores inicia sua produção de contos impetrando neles uma perspectiva feminina, em um período em que esse gênero começou a se expandir pelo Brasil, “[...] refletindo o positivismo realista que dominou vários setores da nossa cultura no início do século” (VASCONCELLOS, 1998, p.19).

Mais especificamente sobre as crônicas que ela arrolou no livro, afirma que os textos oscilam “entre um estilo elevado, cheio às vezes de citações estrangeiras, e um coloquialismo facilmente assimilável pelo leitor comum”, como frutos de sua “boa formação cultural, os seus conhecimentos das literaturas brasileira e estrangeira (notadamente a francesa, a espanhola, a italiana e a anglo-americana) e, também, um sólido conhecimento gramatical [...]” (VASCONCELLOS, 1998, p.19).

Cabe enfatizar que Vasconcellos (1998) reconhece Carmen Dolores como iniciadora do gênero crônica de uma ótica feminina na literatura brasileira, continuando a grande contribuição de Machado de Assis. Conforme a pesquisadora, a cronista

abria assim para os leitores, no fluxo de sua linguagem também dividida entre o literário e o mero registro jornalístico, toda uma vertente de conhecimento dos vários níveis sociais, em que a mulher tinha sempre um tratamento que a situava no âmbito mesmo das possíveis discussões sobre o feminismo. É por aí que se chega à linguagem, aos temas e às técnicas de que Carmen Dolores se valia na escrita de suas crônicas (VASCONCELLOS, 1998, p.19).

A organizadora do livro conclui a análise reafirmando o reconhecimento que Carmen Dolores teve como cronista a partir do seu

trabalho intelectual sério e a serviço das causas sociais e, principalmente, as femininas na sociedade de seu tempo.

Já na reedição de Lendas Brasileiras, em 2006, Eliane Vasconcellos apresenta uma “Cronologia” de Carmen Dolores, na qual ainda não desfaz a dúvida sobre local de nascimento da escritora, apresentando os dois locais, bem como permanece o equívoco da data de falecimento. Considerando que, em textos anteriores da pesquisadora, esses equívocos já haviam sido esclarecidos, é difícil entender as razões da não importância à biografia.

Nessa reedição consta um ensaio de Rosa Maria de Carvalho Gens: “Mulheres escrevem para crianças (1890-1930)”, no qual resgata a marca da autoria feminina na produção de literatura para crianças, explicando o fato pela construção social da criança e da mulher dentro daquele contexto. Já que a tarefa de educar crianças era da mulher, narrar histórias era algo natural para as mulheres, independentemente de sua função: mãe, criada, ama de leite, etc. Ela ressalta também que essas narrativas, com a função de educar, desempenhavam a “tarefa de produzir indivíduos autorregulados que se adaptem à estrutura social dominante”, portanto, “tratam de erigir modos de agir, pensar e sentir” (GENS, 2006, p.155).

Carmen Dolores, assim como Julia Lopes de Almeida e Chrysanthème, desempenhou essa tarefa com histórias de fundo moral, mas não sem ressaltar a figura da mulher como “portadora da sabedoria”, da “falta de harmonia entre beleza e pobreza” feminina, a figura da mulher como “portadora de emoção e sentimento” (GENS, 2006, p.158).

Em 2014, concomitante a esta pesquisa de tese, organizamos a reedição do livro de contos Almas complexas, o qual também foi editado pela Editora Mulheres, como forma de possibilitar ao público leitor contemporâneo o acesso a essa obra rara de Carmen Dolores. Nessa edição, acrescentamos um ensaio introdutório, apontamentos biográficos resumidos, listas de obras e bibliografia sobre a obra de Carmen Dolores.78

Diante de tantas informações equivocadas sobre sua biografia, repetidas ao longo de um século, ou mesmo diante do descaso em relação ao trabalho intelectual e literário desenvolvido por ela, que o levantamento fortuna crítica de Carmen Dolores nos permitiu alcançar, entendemos que é tempo de esclarecer os equívocos que ainda

78 Confira HELLMANN, Risolete. Introdução. In: DOLORES, Carmen. Almas complexas. Florianópolis: Mulheres, 2014.

permanecem, conhecer melhor essa mulher do século XIX que, ousadamente, mergulhou no mundo das letras e deixou traços pessoais e autorais marcados no cenário do seu tempo.

Para isso, é imprescindível escavar fontes primárias, muitas vezes raras, quando não em processo de deterioração, sob os escombros do tempo. São esses resultados que o leitor pode encontrar no próximo capítulo.

3 EMILIA E CARMEN DOLORES: UMA HISTÓRIA DE VIDA E A HISTÓRIA DE UMA AUTORA

Há, porém, uma outra homenagem a prestar a essa escritora: a de lhe enfeixarem as crônicas melhores em um volume bem editado, bem cuidado e em que figurem o seu retrato e a sua biografia. Será a única maneira de não deixar morrer com ela a maior e a melhor parte de sua obra. (Julia Lopes de Almeida)

Não creias nos meus retratos, nenhum deles me revela, ai, não me julgues assim! Minha cara verdadeira fugiu às penas do corpo, ficou isenta da vida. (Gilka Machado)

O desejo de Julia Lopes de Almeida, na epígrafe acima, expresso em uma crônica dedicada à Carmen Dolores, logo após seu falecimento, já foi lembrado por Eliane Vasconcellos (1998) na introdução do livro

Carmen Dolores: crônicas - 1905 a 1910. Contudo, o retomamos aqui,

não apenas para lhe render uma homenagem, mas, também, para conhecer melhor a escritora que nos deixou uma obra muito mais intensa do que extensa, considerando o curto tempo que teve para tornar sua voz pública e, a partir desse reconhecimento do perfil dessa escritora, poder estabelecer uma articulação entre vida e obra.

Neste capítulo, portanto, procuramos traçar esse perfil, filtrando os fatos sobre a vida e a obra através do nosso olhar feminista e usando de liberdade criativa, que nos concede certa flexibilidade ficcional sobre nosso objeto de análise. Afinal, nesse trabalho de recuperação da história pessoal, tivemos que seguir as pegadas da escritora inscritas na memória cultural brasileira da segunda metade do século XIX e primeira década do século XX. “E quem segue pegadas, também deixa as suas”, já nos disse Cury (1995, p.54).

Dessa forma, na primeira parte, relatamos fatos e traços biográficos de Emilia Moncorvo Bandeira de Mello desde seu nascimento até o falecimento. Contudo, ao traçar o perfil de uma mulher do século XIX, como Emilia, foi preciso recorrer às inscrições arquivadas na memória de nossa cultura e resgatar pequenos detalhes de sua vida, de sua subjetividade, e colocá-los em diálogo com o sujeito da

enunciação de suas obras, Carmen Dolores, observando de que forma esses dados se hibridizam, de que forma a vida atravessa a ficção.

Para Souza (2011, p.21),

[...] os laços biográficos são criados a partir da relação metafórica existente entre obra e vida. O importante nessa relação é considerar os acontecimentos como moeda de troca da ficção, uma vez que não se trata de converter o ficcional em real, mas em considerá-los como cara e coroa dessa moeda ficcional. Consiste ainda na liberdade de montar perfis literários que envolvem relações entre escritores [...] afinidades eletivas resultantes das associações inventadas pelo crítico ou escritor. Esses perfis exercem, em geral, papel importante na elucidação de propostas literárias, questões teóricas e contextuais.

É nesse sentido que a vida, a experiência de Emilia, como uma mulher da elite carioca durante o período do Império, branca, culta, uma senhora da sociedade respeitada pela posição social que o pai e o marido ocupavam e que, depois de viúva, ousou expressar publicamente suas ideias, pode resultar no que Arfuch (2010, p.15) denominou de uma “cartografia da [sua] trajetória individual sempre em busca de seus acentos coletivos”.

Assim, na segunda parte deste capítulo, nossa narração da trajetória individual da mulher, da senhora da sociedade aristocrática do Rio de Janeiro do século XIX, se encaminha para a trajetória da escritora de narrativas ficcionais, da intelectual conferencista, da cronista que assinava sua produção literária e jornalística com pseudônimos – fato que, metonimicamente, busca inseri-la não só na história intelectual da mulher brasileira, mas, também, como uma voz feminina representativa na literatura brasileira que ficou à margem da história literária oficial.

Além disso, como forma de contribuição no trabalho já realizado pela crítica feminista, buscamos em periódicos e outros documentos culturais brasileiros a crítica impressionista veiculada nesses meios desde o final do século XIX, também denominada por Lima (1999, p.99) de “crítica de rodapé, veiculada pelos jornais e caracterizada pelo autodidatismo e amadorismo dos intelectuais que a assinavam”.79

79 Usamos, aqui, a reedição de Alceu Amoroso Lima (1999, p. 99). Como na França, a crítica impressionista brasileira (1900 -1920) também nasceu na imprensa, como reação ao naturalismo crítico de Silvio Romero, José Veríssimo

Corroborando esse ponto de vista, Samuel (1988, p.94) afirma ser essa prática

[...] uma tendência crítica centrada na subjetividade do leitor, a quem cabia transmitir as impressões que mais profundamente marcaram a sua sensibilidade, em contato com obras-primas de todas as épocas. Sem limitações de ordem metodológica, o crítico devia agir livremente, seguindo os impulsos de suas descobertas pessoais e, muitas vezes, fixava-se em si próprio, num processo de auto-projeção, que mantinha a obra em segundo plano, servindo apenas como cenário para que nele atuassem seu espírito e suas reações (SAMUEL, 1988, p. 94).

Mesmo não seguindo padrões estéticos, normas sobre o que é ou não literatura, essa forma crítica, exercida pelos cronistas dos 1900, tem assegurado o seu valor numa pesquisa arqueológica como a nossa, pois comprova o reconhecimento da autora em sua época e coloca em evidência os traços de uma mulher de letras do século XIX.

3.1 TRAÇOS BIOGRÁFICOS DE UMA MULHER DO SÉCULO XIX

Documentos relacionados