Nesta seção descreveremos os resultados que achamos interessantes no nosso estudo do artigo (NEEMAN,1996). Veremos que a dualidade de Serre sai facilmente como um corolário da representabildade de Brown e do Teorema 3 do artigo (VERDIER, 1968). É importante notar a diferença de abordagem entre os dois artigos, no primeiro vimos uma abordagem voltada para métodos finitos, utilizando de uma base de objetos excepcionais, e no segundo utilizamos muito mais métodos de existência, sem construir exatamente os objetos.
Começamos vendo como o funtor Rf˚se comporta com coprodutos, uma vez que
ele deverá possuir uma adjunta a direita é necessário que ele comute com tais construções. Em seguida estudamos os complexos perfeitos e sua compacidade. Finalizamos a seção com uma demonstração do Teorema de Dualidade de Serre para variedades suaves. Lema 3.2.1. Seja X um esquema quasi-compacto e separado e Y um esquema. Seja f : X Ñ Y um morfismo separado. Seja Rf˚ : DpQCohpXqq Ñ DpQCohpY qq o funtor
derivado da imagem direta. Então Rf˚ preserva coprodutos.
Demonstração. Seja tTλuλPΛuma coleção arbitrária de objetos em DpQCohpXqq. Sabemos do Exemplo 2.2.9 que a categoria DpQCohpXqq possui coprodutos arbitrários e com isso vemos que existe o objeto ž
λ Tλ em DpQCohpXqq, o objeto ž λ Rf˚pTλq em DpQCohpY qq e o morfismo g : ž λ Rf˚pTλq Ñ Rf˚p ž λ
Tλq, induzido pela propriedade universal do
coproduto e a funtorialidade de Rf˚. Precisamos mostrar que g é um isomorfismo. Mas
ser um isomorfismo é uma propriedade local em Y e portanto podemos assumir que Y é um esquema local.
Portanto X “ Yni“1Ui onde Ui são abertos afins em X. Faremos a demonstração usando indução. Suponha que X “ Ui, nesse caso f é um morfismo de esquemas fi :
Ui “ SpecpSq Ñ Y “ SpecpRq que corresponde a um morfismo de anéis h : R Ñ S. Sabemos do Corolário 2.1.13 que QCohpXq é anti-equivalente à categoria M odS, portanto
DpQCohpXqq é anti-equivalente à DpSq :“ DpM odSq. Desta forma, se considerarmos
DpQCohpXqq “ DpSq então Rf˚ “ Rh e vemos que RhpX‚q “ hpI‚q “ I‚, visto como
um R-módulo. Claramente Rh preserva coprodutos.
Agora suponha que X “ Yni“1Ui com i ą 1, seja U “ U1 e V “ Yni“2Ui, então
U X V “ Yni“2pU1X Uiq onde U1X Ui são afins, pela Proposição 2.1.21. Portanto ambos V e U X V são uniões de n ´ 1 abertos afins. Pela indução temos que o teorema vale para
f |V, f |U XV e f |U. Sejam iU : U Ñ X, iV : V Ñ X e iU XV : U X V Ñ X as respectivas inclusões. Então se Z é um objeto de DpQCohpXqq então temos o triângulo distinguido
Z Ñ RpiUq˚i˚UZ ‘ RpiVq˚i˚VZ Ñ RpiU XVq˚i˚U XVZ Ñ Zr1s
Aplicando o funtor aditivo e exato Rf˚ a este triângulo obtemos o triângulo
distinguido
Rf˚Z Ñ Rpf˚qpRpiUq˚i˚UZq ‘ Rf˚pRpiVq˚i˚VZq Ñ Rpf˚qpRpiU XVq˚i˚U XVZq Ñ
RpfastqpZqr1s
Mas sabemos pelo Lema 2.2.26 que Rf˚RpiWq˚ “ Rpf |Wq˚, para todo aberto
indução. Os funtores i˚
U, i
˚
V e i
˚
U XV comutam com coprodutos porque possuem uma adjunta a direita ( Proposição 1.1.9 ). Com isso desenvolvemos o morfismo de triângulos
š λRpf˚qTλ // α š λrRpf˚qpRpiUq˚i˚UTλq ‘ Rf˚pRpiVq˚i˚VTλqs // β š λrRpf˚qpRpiU XVq˚i˚U XVTλqs γ Rpf˚qp š λTλq //Rpf˚qpRpiUq˚i˚U š λTλq ‘ Rf˚pRpiVq˚i˚V š λTλq //Rpf˚qpRpiU XVq˚i˚U XV š λTλq e como β e γ são isomorfismos concluimos que α também é um isomorfismo.
Corolário 3.2.2. Mantendo a notação do Lema 3.2.1, agora com Y “ SpecpZq, isto
é, o objeto final da categoria de esquemas. Então Rnf˚pF q “ H
n
pX, F q para todo feixe
quasicoerente F sobre X. E portanto HnpX, ´q preserva coprodutos se X é quasi-compacto
e separado.
O próximo para utilizarmos a Representabilidade de Brown para demonstrar que Rf˚ possui uma adjunta a esquerda é mostrar que DpQCohpXqq é compactamente
gerado. Isso não será mostrado aqui. Mas temos uma forma de descrever os objetos compactos dentro de DpQCohpXqq, estes serão os objetos perfeitos. Dizemos que um objeto C em DpQCohpXqq é perfeito se, C é localmente isomorfo a um complexo limitado de OX-módulos projetivos finitamente gerados.
Lema 3.2.3. Seja X um esquema quasi-compacto e separado. Então os objetos perfeitos
são compactos.
Demonstração. Sejaž
λ
Xλ um coproduto em DpQCohpXqq e C um objeto perfeito. Então
RHompC,ž
λ
Xλq é um objeto de DpQCohpXqq, porque C é localmente isomorfo a um
complexo limitado de OX-módulos finitamente gerados projetivos. Precisamos mostrar que
φC : RHompC, ž λ Xλq Ñ ž λ RHompC, Xλq
é um isomorfismo. Como isso pode ser verificado localmente podemos assumir que X “ SpecpAq é afim e C é um complexo de OX-módulos projetivos finitamente gerados. Se C “ OXrms, para algum inteiro m, então φC é um isomorfismo. Porque, nesse caso, ž λ RHompC, Xλq “ ž λ HompC, Iλq “ ž λ Iλr´ms “ RHompC, ž λ Iλq, onde Iλ é
uma resolução injetiva de Xλ. Da mesma forma, para C “ OnXrms, para dois inteiros n e
m, é fácil ver que φC é um isomorfismo. Se φC é um isomorfismo e C “ C1‘ C2, então
φC1 e φC2 são isomorfismos. Portanto φC é um isomorfismos sempre que C “ ˜M rns para
algum A-módulo projetivo finitamente gerado. Agora se
C Ñ C1
Ñ C2 Ñ Cr1s
é um triângulo distinguido em DpQCohpXqq onde φC1rks e φC2rks são iso-
morfismos para todo inteiro k, então aplicando os funtores exatos RHomp´,ž λ
Xλq
e ž λ
RHomp´, Xλq obtemos que φCrks é um isomorfismo para todo k inteiro. Concluimos assim que a categoria dos objetos C tais que φCrks é um isomorfismo para todo k inteiro é triangulada. Portanto contêm complexos de OX-módulos projetivos finitamente gerados.
Agora se C é um complexo perfeito então φC é um isomorfismo. Mas
HomDpQCohpXqpC, ž λ Xλq “ H0RHompC, ž λ Xλq “ H0pžRHompC, Xλq “ ž λ H0pRHompC, Xλq “ ž λ HompC, Xλq. concluindo o resultado do teorema.
Teorema 3.2.4. Seja X um esquema quasi-compacto e separado. Então a categoria
DpQCohpXqq é compactamente gerada e a classe dos objetos compactos é exatamente a classe dos objetos perfeitos.
O teorema anterior pode ser visto juntando a Proposição 2.5 e o Corolário 2.3 de (NEEMAN, 1996).
Agora que vimos que a categoria DpQCohpXqq é compactamente gerada es- tamos prontos para demonstrar a existência da adjunta a direita de Rf˚, denotado po
f!.
Teorema 3.2.5. Seja S uma categoria triangulada compactamente gerada, T uma catego-
ria triangulada e F : S Ñ T um funtor triangulado. Se F pž
λ Xλq “ ž λ F pXλq para todo coproduto ž λ
Xλ em S. Então F possui uma adjunta a direita.
Demonstração. Seja T um objeto de T e o funtor homológico em S, H : s ÞÑ HompF psq, T q.
Então H preserva coprodutos e pelo Teorema 1.2.23 obtemos, para todo objeto T em T , um objeto GpT q em S tal que
HompF psq, T q “ Homps, GpT qq
e é fácil ver que isso determina um funtor sobre T e que este funtor é a adjunta a direita de F .
Exemplo 3.2.6. Seja f : X Ñ Y um morfismo separado de esquemas quasi-compactos e separados. Então Rf˚ : DpQCohpXqq Ñ DpQCohpY qq possui uma adjunta a direita.
A principio não há motivos para que uma adjunta a direita preserve coprodutos arbitrariamente. Mas no caso de f! para f : X Ñ Y suficientemente regular temos que essa condição é satisfeita e isso nos permite expressar f! de maneira conveniente.
Teorema 3.2.7. Seja S uma categoria triangulada compactamente gerada, e T uma
categoria triangulada qualquer. Seja também F : S Ñ T um funtor triangulado que preserva coprodutos, e G : T Ñ S a sua adjunta a direita. E seja S uma classe de objetos gerando compactamente S. Então G : T Ñ S preserva coprodutos se e somente se a imagem de qualquer objeto em S por F é um objeto compacto em T .
Exemplo 3.2.8. No artigo (KIEHL, 1972) é mostrado que se f : X Ñ Y é um morfismo pseudo-coerente e próprio de esquemas separados e quasi-compactos. E se f tem dimensão- Tor finita, então Rf˚ : DpQCohpXqq Ñ DpQCohpXqq leva objetos perfeitos em objetos
perfeitos. E portanto f! comuta com coprodutos.
Não precisamos entrar na definição de morfismos pseudo-coerentes. Só precisa- mos do Lema 36.49.9 do (Stacks Project Authors, 2017) para mostrar que essa classe de morfismos, no contexto mais concreto, é uma classe simples.
Lema 3.2.9. Seja f : X Ñ Y um morfismo de esquemas. Se S é localmente Noetheriano,
então f é pseudo-coerente se e somente se f é localmente de tipo finito.
O seguinte teorema não será demonstrado porque é extremamente técnico, utiliza da definição de funtor derivado do produto tensorial para o caso não limitado e de OX-módulos, que escolhemos evitar por também ser bastante técnico e não muito intrutivo. A demonstração pode ser encontrada no Teorema 5.4 de (NEEMAN,1996).
Teorema 3.2.10. Seja f : X Ñ Y um morfismo de esquemas. Suponha que Rf˚ possui
uma adjunta a direita f! que comuta com coprodutos. Suponha que Y é quasi-compacto e separado. Então temos um isomorfismo natural, tal que se Y é um objeto de DpQCohpY qq então
f!pY q » pLf˚pY qq bOX f
!
pOYq
O seguinte teorema é uma reprodução do Teorema 3 do artigo (VERDIER,
1968) como descrito nas notas (LIPMAN, 2009). Infelizmente não foi possível encontrar uma cópia desse artigo e por isso não colocaremos a demonstração. Mas podemos encontrar na literatura varias menções a esse teorema.
Teorema 3.2.11. Seja f : X Ñ Y um morfismo suave de dimensão relativa d. Existe um
isomorfismo natural
f˚A‚
para todo complexo A‚ de feixes quasicoerentes.
Combinando os dois teoremas anteriores obtemos que f!pOYq “ ΩdX{Yrds.
Corolário 3.2.12. Seja f : X Ñ Y um morfismo suave de dimensão relativa d. Então
Rf˚ : DbpCohpXqq Ñ DbpCohpXqq possui uma adjunta a direita
f!: DbpCohpXqq Ñ DbpCohpXqq.
Teorema 3.2.13. [Dualiadade de Serre] Seja X um esquema projetivo suave de
dimensão n sobre um corpo k. Então existe um feixe ωX tal que temos um isomorfismo
natural
ExtipF , ωXq » Hn´ipX, F q˚
para todo feixe coerente F sobre X.
Demonstração. Como X é suave vemos que o morfismo f : X Ñ Specpkq é um morfismo
de esquemas suave de dimensão relativa n. Mas o esquema X é noetheriano e quasi- compacto e assim podemos definir Rf˚ : DbpCohpXqq Ñ DbpCohpSpecpkqqq. Pelo corolário
3.2.12 o funtor Rf˚ : DbpCohpXqq Ñ DpCohpSpecpkqqq possui uma adjunta a direita
f! : DbpCohpSpecpkqqq Ñ DbpCohpXqq. Nesse caso f!pOSpecpkqq “ Ωnrns “ ωX, o feixe canônico de X sobre k e temos o isomorfismo natural
HomDbpCohpXqqpF ris, f!pOSpecpkqq “ HomDbpCohpSpecpkqqqpRf˚F ris, OSpecpkqq
para todo feixe coerente F sobre X. Mas CohpSpecpkqq é equivalente a V ectF. Mas DpV ectFq “
ź
iPZ
V ectF, isto é, todo complexo de espaços vetoriais é isomorfo a
um complexo de espaços vetoriais onde os diferenciais são nulos. É importante no- tar também que por Specpkq só ter um ponto então, utilizando da Proposição 2.2.27,
Rif˚F “ pHipX, F qq„ e utilizando da identificação CohpSpecpkqq “ V ectF obtemos
Rif˚F “ H
i
pX, F q e OSpecpkq “ k.
Como o complexo OSpecpkq está concentrado no indice 0 então os morfismos de um complexo A‚ em Db
pCohpXqq “ DbpV ectFq em OSpecpkq são morfismos de H0pA‚q em OSpecpkq. Concluimos que
HomDbpCohpSpecpkqqpRf˚F ris, OSpecpkqq “ HomkpH0pRf˚F risq, kq “ HomkpRif˚F , kq
“ pHipX, F qq˚
HomDbpCohpXqqpF ris, f!pOSpecpkqq “ HomDbpCohpXqqpF , ωXrn ´ isq “ Extn´ipF , ωXrn ´ isq
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