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Duração razoável: equilíbrio entre a veracidade e celeridade possíveis

2. D IREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO

2.5. Duração razoável: equilíbrio entre a veracidade e celeridade possíveis

A Constituição Federal preceitua que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são

assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação73. O direito então ressalvado é o de obter uma prestação jurisdicional ou administrativa dentro do tempo exato. Isto é, nem além, nem aquém do que se faça necessário para um pronunciamento útil e acertado.

A referência à celeridade não é autônoma, não constitui direito próprio. É apenas um dos pesos utilizados na dosagem do tempo razoável. O outro, que pende do lado oposto, é o devido processo legal. A prestação célere não deve ser a meta da jurisdição, mas sim a prestação o mais célere possível que não venha a comprometer o devido processo legal e o acerto da decisão.

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O direito a um processo com duração razoável está intimamente vinculado ao direito ao devido processo legal. Não se confunde com o direito ao processo célere. Se a rapidez fosse o único valor albergado na expressão “duração razoável”, a realização desse direito não encontraria maiores dificuldades: bastaria se exigir que na petição inicial o autor expusesse todos os argumentos e provas possíveis, ante os quais o juiz sentenciaria.

71 No caso do Estado de Alagoas a matéria está disciplinada pela Lei Estadual nº 6.161/00-AL, que reproduz integralmente as disposições da Lei Federal nº 9.784/99.

72 Curso de direito administrativo, p. 398. 73 Art. 5º LXXVIII, CF/88.

A duração do processo seria mínima (mas a própria expressão processo pressupõe uma série de atos, um desenrolar minimamente “demorado”). Entretanto, é certo que esta solução traria inconvenientes. Em primeiro lugar, o autor tardaria em ajuizar sua ação, eis que antes de fazê-lo teria de realizar perícias, colacionar testemunhos e outras provas, o que poderia frustrar mesmo a busca de seu direito (pela prescrição)74. Ademais, e mais grave, a decisão assim proferida, se favorável ao autor, não poderia ser imposta à outra “parte”, sob pena de malferimento do devido processo legal. Também muito longe estaria da justiça, ou da verdade dos fatos, uma sentença que se pautasse exclusivamente nas alegações e provas trazidas por uma das partes75. Daí se vê, de maneira simplificada, que o contraditório é garantia processual que não se pode suprimir, ainda que em favor da celeridade.

Poder-se-ia, então, reformular o modelo ideal de processo. Ouvidos autor e réu, o juiz decidiria imediatamente. Mas se houver questão de fato, é preciso que o juiz firme seu convencimento a respeito do ocorrido. Não se exige que o juiz conheça efetivamente a verdade dos fatos, mas é preciso ao menos que se convença da grande probabilidade de uma dada versão. Isso remete à produção de provas.

Nem sempre os fatos podem ser comprovados através de documentos. Nesses casos, as provas que têm de se realizar em juízo, pois do contrário, se cada parte trouxesse seu próprio laudo, seu próprio termo de depoimento de testemunhas, nenhuma dessas peças seria imparcial, e não serviriam de muito para o convencimento do juiz. Ademais, há circunstâncias que devem ser pessoalmente colhidas pelo juiz, o que mais uma vez aponta para a produção intraprocessual das provas.

74 O mandado de segurança é um exemplo de remédio jurídico processual em que, para privilegiar a celeridade, a fase instrutória é suprimida. Isso não traz maiores problemas porque, quando não seja possível constituir previamente as provas (pelo menos não em tempo hábil para impetrar o mandado de segurança), as pessoas ainda poderão se valer de ação ordinária para exercer sua pretensão.

Outro caso particular é a execução fiscal. Em prol do andamento célere, e ante a presunção de certeza, liquidez e exigibilidade do título executivo, seu procedimento não admite dilação probatória intraprocessual. Entretanto, é possível ampla instrução no processo acessório (embargos).

75 Contudo, se as alegações iniciais do autor, que deveriam produzir um mínimo de convencimento da procedência de seu pedido, são imprestáveis para tanto, por se tratar de matéria exclusivamente de direito e reiteradamente rejeitada, nada justificaria o desenvolvimento regular do processo, com a citação da parte contrária, uma vez que esta nada poderia dizer que afastasse uma sentença de improcedência. É por isso que a Lei nº 11.277/2006 fez incluir no CPC o art. 285-A, que prevê o julgamento antecipadíssimo da lide. Esta previsão está em plena conformidade com o disposto no art. 5º, LXXVIII, CF/88, pois a citação do demandado, na situação descrita no art. 285-A, configuraria dilação desnecessária.

A decisão judicial (ou administrativa) não é ato mecânico, automático, nem tampouco arbitrário, e por estas razões tem de ser sempre fundamentada. Então, se a decisão for flagrantemente contrária à fundamentação, ou se não for inteligível a fundamentação ou o dispositivo, e se nada for decidido quanto a um dos pedidos? Essas situações, em que há prestação jurisdicional deficiente (arbitrária, confusa) ou insuficiente (omissa quanto a alguma questão), requerem algum mecanismo de correção, algum recurso. Vê-se, pois, que os embargos de declaração, ou outro recurso com função semelhante, são imprescindíveis. A menos que se negue o direito de acesso à justiça, ou de prestação judiciária eficiente.

A justiça ou acerto da prestação jurisdicional não é apenas considerada caso a caso, pois é igualmente injusto ver-se que duas situações idênticas são julgadas de maneira diversa, apenas porque submetidas a órgãos distintos. Além disso, enquanto o julgador é passível de erro, um membro colegiado está menos sujeito a falhar. Vê-se aí a necessidade dos recursos de apelação, embargos infringentes e quejandos.

A defesa da uniformidade da interpretação das normas constitucionais e o respeito mesmo à Constituição e às leis federais justificam os recursos extraordinário e especial.

Embargos de declaração, apelação, embargos infringentes, recurso extraordinário e recurso especial esgotariam assim os recursos necessários e indispensáveis ao devido processo legal, sendo os outros excessivos e causadores de dilação indesejada ao curso natural dos processos.

Entretanto, a despeito disso as partes podem continuar inconformadas com as decisões, considerando o sistema recursal insuficiente para satisfazer seus anseios, e lançam mão de remédio jurídico processual autônomo, o mandado de segurança, como sucedâneo de algum recurso. A banalização do mandado de segurança causa mais atraso na prestação jurisdicional do que a previsão do recuso próprio. É que o mandado de segurança irá gerar novo processo, com todas as suas formalidades (e seus recursos), tomando mais tempo dos órgãos julgadores, diminuindo o tempo disponível para análise e julgamento das ações principais.

A previsão dos recursos de agravo retido, de instrumento e regimental é uma maneira de otimizar a prestação jurisdicional, quando se considera a atividade jurisdicional com um todo, em lugar de cada processo isoladamente.

O problema é que esse sistema recursal, inteiramente necessário ao atendimento do direito das partes (das que têm o bom direito material, como das que apenas têm o direito à prestação jurisdicional), sempre poderá ser utilizado dolosamente pelas partes que pretendam tirar proveito da morosidade, ou pretendam se utilizar do processo como meio de ameaça ou pressão sobre a parte oposta, que não disponha de tempo ou condições econômicas de suportar a demora. Mas não é por isso que se devem ampliar as presunções e preclusões, que limitam a aproximação da verdade, ou reduzir as possibilidades de recurso, o que permite a manutenção de decisões equivocadas, distantes da realidade fática e jurídica. Suprimir as garantias processuais apenas para evitar o abuso do direito processual seria inverter os princípios da boa-fé e da presunção de inocência, privando todos de suas garantias como punição por alguns que se utilizam abusivamente do processo, o que não se admite.

A saída mais razoável para coibir o abuso de direito processual está nas penalidades processuais, que serão objeto do item 4.2.4.

3. REFLEXOS IMEDIATOS DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO EXPLÍCITA DO DIREITO À