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1.2 PERSPECTIVAS DE AÇÃO A PARTIR DE TRÊS DISCIPLINAS: FILOSOFIA,

1.2.4 OS DURKHEIMIANOS NA RSH

Vemos, então, que apesar de uma recusa inicial em participarem do projeto da RSH, os sociólogos durkheimianos acabaram frequentando esse periódico. Tal relação se deveu por conta do interesse que Berr tinha nesses sociólogos, explicitando tanto de forma elogiosa, pelo método sociológico, quanto com críticas sobre alguns aspectos teóricos da obra desses pesquisadores. Encontramos duas formas de relacionamentos entre estes pesquisadores. Uma primeira, de aspecto familiar15. Henri Berr se casou com Cécile Halphen, pertencente a uma rica família de homens de negócios e engenheiros. O cunhado de Berr, Jacques Halphen, engenheiro ligado ao mundo intelectual, casou-se com a filha de Émile Durkheim, Marie Belle. Assim, Berr e Durkheim possuíam uma relação familiar, ainda que longínqua, com eventuais menções em cartas (GEMELLI, 1987; MERLLIÉ, 2017).

Porém, sabemos que os durkheimianos foram convidados a participar do projeto de Henri Berr. Em um primeiro momento, eles ficaram reticentes com o convite, cogitando mesmo a recusa. Émile Durkheim enviou uma missiva para Henri Hubert negando a colaboração e criticando a abordagem que Henri Berr fazia da sociologia. Contudo, em 1900, em outra carta, desta vez para Célestin Bouglé, comentou que aceitou o convite. Assim, notamos como Durkheim, e os durkheimianos, após um primeiro momento de recusa na participação do projeto de Henri Berr, aceitaram-na, ainda que desconfiados da síntese histórica e de seu criador. Contudo, até que ponto houve essa colaboração?

Em uma análise quantitativa é possível notar o quanto houve de envolvimento da equipe com a RSH, além de vermos quais membros contribuíram com o periódico. O historiador francês Christophe Prochasson (1996), em um artigo sobre a relação entre os sociólogos durkheimianos e a RSH, acertou ao apontar essa inconstância na participação dos sociólogos. Contudo, errou em diminuir e não contabilizar a total presença daqueles na revista de história. Ele contabilizou somente 4 resenhas – de Hubert, Durkheim e Bourgin – e somente dois artigos – de _______________

Durkheim e Simiand (PROCHASSON, 1996). Entretanto, em uma análise quantitativa dessa participação, podemos constatar outros dados, conforme o Gráfico 1.

Gráfico 1 - PUBLICAÇÕES DOS SOCIÓLOGOS DURKHEIMIANOS NA RSH (1900 – 1914)

Fonte: o autor (2019).

Entre 1900 e 1914, período analisado, os membros da Escola Sociológica Francesa que publicaram no periódico de Berr foram: Henri Beuchat, Célestin Bouglé, Hubert Bourgin, Georges Bourgin, Georges Davy, Paul Fauconnet, Henri Hubert, Paul Huvelin, Jean-Paul Lafitte, Isidore Lévy, Albert Milhaud, Dominique Parodi, Gaston Richard16, François Simiand e Émile Durkheim. Estes contribuíram com 140 textos, sendo: 24 artigos, 94 resenhas e 22 comentários. Contudo, a participação esteve longe de ser igualitária, já que a maior parte deles publicou poucos textos, como o próprio Durkheim, com somente dois. Um era um novo prefácio à segunda edição do livro As Regras do Método Sociológico, intitulado De la

méthode objective en sociologie (DURKHEIM, 1901), e o outro foi uma resenha de

uma página sobre o livro Précis de sociologie, de Georges Palante (DURKHEIM, 1902). O durkheimiano mais prolífico foi Georges Bourgin, com 5 artigos, 15 _______________

16 Gaston Richard rompeu com a Escola Sociológica Francesa em 1907. Assim, seus textos publicados na RSH após isso, não entraram na contagem. Cf. Pickering (1979).

comentários e 80 resenhas. Ele estudou na École de Chartes, onde formou-se arquivista, também foi membro da École française de Rome e trabalhou, durante grande parte de sua vida, no Archives Nationales, entre 1904 e 1944. Além disso, foi cofundador e diretor do Institut français d'histoire sociale (FRANÇOIS, 1959).

A maior parte das publicações destes pesquisadores estava relacionada à suas áreas de origem, ou seja, às disciplinas em que haviam feito suas formações universitárias e/ou realizado o concurso de agrégation. No próprio caso de Georges Bourgin, seus artigos versavam principalmente sobre o período do Risorgimento na Itália. Da mesma forma que suas resenhas eram, em sua maioria, sobre três grandes temas, a saber, a história de Roma, história econômica e política da Itália e, também, sobre a Comuna de Paris. Estes temas estão próximos de sua atuação política, já que participou de movimentos socialistas e cooperativistas junto de outros durkheimianos, como Marcel Mauss e seu irmão Hubert Bourgin (FOURNIER, 2006). Outro exemplo dessas publicações híbridas entre área de origem com a Sociologia é o de Paul Huvelin, doutor em Direito e professor de História do Direito Romano na Faculdade de Direito de Lille (1901 – 1924), o qual publicou artigos sobre a história do direito comercial (AUDREN, 2001).

Nesse sentido, é importante ressaltar que o grupo durkheimiano marcou presença ao longo dos anos na Revue de synthèse historique, ainda que de forma relativamente baixa em termos quantitativos, tendo anos, como o de 1904, com apenas uma contribuição. Contudo, houve também textos significativos ali publicados, como o artigo, em duas partes, de François Simiand (1903), intitulado

Méthode Historique et Science Sociale – Étude critique d’après les ouvrages récents de M. Lacombe et M. Seignobos, o qual gerou debates que repercutiram em outros

espaços, como na Société Française de Philosophie. Além deste, outros textos dos sociólogos durkheimianos foram comentados por Henri Berr em dois momentos: um primeiro com o artigo Les progrès de la Sociologie religieuse; e o segundo em seu livro A Síntese em História (BERR, 1906; BERR 1946 [1911]). Tais textos não ficaram sem respostas, o primeiro foi comentado por Marcel Mauss e Henri Hubert na Introdução do livro Mélanges d’histoire des religions e a obra de Berr foi resenhada por Émile Durkheim (1911) em l’Année sociologique.

A proposta teórico-metodológica de Henri Berr17 – a síntese histórica – tentou apresentar de que forma outras ciências poderiam auxiliar a História na sua realização de uma síntese científica (BERR, 1946 [1911]). Assim, ele procurou indicar quais aspectos teóricos da obra dos sociólogos durkheimianos eram passíveis de serem aproveitados e que poderia contribuir para a História, mas também apontou onde eles exageravam em seus textos, principalmente na questão da relação entre o indivíduo e a sociedade. Ao longo de seu livro, Berr discorreu acerca dos textos de diversos sociólogos durkheimianos, mas também com outros pesquisadores de outras áreas, como a Filosofia, a Psicologia, a Geografia, entre outras. Tal ideia, da síntese histórica, teve uma importância crucial em sua vida, influenciando também seus empreendimentos futuros. Ela foi apresentada de forma mais extensa, pela primeira vez, em 1911, com a publicação da obra A Síntese em

História (1946 [1911]).