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e) Entrevista Beth Carmona

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Entrevista: 26/12/2006

Beth Carmona - Diretora presidente da TVE Rede Brasil e Presidente do MIDIATIVA - Centro Brasileiro de Mídia para Crianças e Adolescentes.

1 - Que fatores sócio-políticos contribuíram para a formação do Midiativa?

Basicamente começei a me interessar por tv e criança na década de 80 e o estímulo veio de alguns seminários do Instituto Gheti, em SP, onde veio uma pessoa importante falar sobre televisão infantil e foi uma coisa muito marcante para mim, ainda não trabalhava em tv, mas em rádio. Isso ficou na minha cabeça, depois eu comecei a trabalhar com pesquisa de comunicação, trabalhei no antigo IDAF, centro de pesquisa e documentação de SP, fui dar aula, quando entrei na TV cultura em 1987 eu já tinha isso dentro de mim e quando passei para da divulgação para programação e depois para diretoria, fui me sintonizando com certo movimentos, inclusive, internacionais que discutiam pensavam na questão da mídia de qualidade, para criança. Não se fala tanto de qualidade, mas de uma televisão infantil diferenciada, cuidadosa, com respeito. Isso era um pensamento que na televisão alemã existia desde o princípio. Eu me aproximei muito da Fundaçao Privanesce (premio jovem em frances), uma fundação internacional na Bavária e há mais de 40 anos ela reúne anualmente profissionais ligados a TV e criança, num festival que vota os melhor programas mundiais. Neste lugar, em Munique, se reúne a nata da TV infantil com esse pensamento. Fui uma das primeiras da América Latina que se aproximou deste grupo e criei um grupo próprio, o Midiativa, principalmente reunindo a Amércia Latina, porque aos poucos foram aparecendo outros países e hojte eu tenho um grupo que coordeno que se chama ALA (Aliança Latino Americana). È um movimento que vem há muito tempo, na diretoria da TV cultura e na programação fui me interessando sobre o assunto. Quando me tornei diretora a questão

infantil começou a se pensar no programa Ratim bum, depois no Mundo da Lua e depois o Castelo Ratimbum, e eu já estava totalmente completamente integrada nesse movimento internacional que me alimentava de pensamento, programas, idéias para trazer para a TV Cultura. Fomos entrando um pouco no grupo, que existe até hoje e uma pesquisa que eu fiz foi que tipo de movimentos existiam em outros países para se inspirar e trazer para o Brasil? Pesquisei o Children´s Television Center (EUA) o Australian Children Television Foundation, na Austrália, por exemplo, e baseada nos princípios de todos montamos o Midiativa.

2 - Qual infra-estrutura tem e com que freqüência se reúnem?

Nasceu com uma diretoria e um pequeno grupo de sócios fundadores, não tinha uma sede no começo, e hoje temos espaço doado pelo Instituo Laramara (Ong) e a partir daí fiz relações com esses centros e a Fundação Prejanesce para ser depositária do material para fins didáticos, de treinamento. Hoje, na sede do Midiativa, temos uma coleção de fitas e cds e dvs que vem do mundo inteiro, usada para treinamento, temos informações, livros, disponíveis para qualquer pessoa interessada no tema. O Midiativa tem material suficiente para publicação, vários projetos e pesquisas que trazem o sustento do grupo. A diretoria se reúne de uma ou duas vezes por ano, mantemos um grupo mínimo de duas pessoas na sede da Ong, que alimenta o site e realizamos projetos por encomenda.

3- Tem apoiadores e financiadores? Existem publicações?

Temos a possibilidade de publicação, mas ainda não conseguimos financiamento. Na verdade realizamos duas pesquisas importantes, mas não publicamos.

4 -Qual a importância do trabalho realizado pelo Midiativa para melhorar a qualidade da televisão? O que tem sido feito?

O Midiativa, desde o princípio, há seis anos, pensamos na qualidade. E trabalhamos querendo explicitar esse pensamento de qualidade. O que é má qualidade todo mundo sabe. Fica fácil criticar e apontar. Agora o que é qualidade para cada pessoa? Que é uma questão subjetiva. E como se constrói a qualidade para o país, para a sociedade, para uma realidade? Desde o inicio nosso posicionamento é pela busca da qualidade e não pelo ataque à baixaria. Trabalhamos no complementar o oposto que a Campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania. Acho legítima, interessante, participei algumas vezes como apoio, mas o Midiativa trabalha ao contrário, no sentido de formação, porque qualidade não é uma coisa que nasce da geração espontânea, tem que ser construída e a qualidade para um determinado país não é a mesma coisa que para outro. Na Europa a questão da qualidade é diferente de como está posta aqui, porque a realidade de televisão educativa e pública lá é bem diferente da nossa. Eles podem até começar a conhecer um pouco da baixaria de alguns anos para cá,

quando a TV privada entrou, mas a predominância ali ainda é a TV pública. Qualidade de televisão e baixaria são conceitos internacionalmente variáveis, diferente e difícieis de se entender. A proposta do Midiativa é construir com os produtores, pais, telespectadores e Ministério da Justiça, que faz classificação. O Midiativa tem certas metodologias de discussão e debate sobre busca da qualidade, que hoje são feitos dentro de escolas, já fizemos discussão com classificadores do Ministério da Justiça. Acreditamos que essa questão não muda só por um lado, nós trabalhamos com anunciantes, canais de televisão. O tema é bem complexo, por isso que qualquer campanha nesse sentido tem que tomar muito cuidado porque é muito fácil isso se vincular aos movimentos tradicionais, religiosos, enfim.

5-Qual a relação do Midiativa com o setor governamental responsável por essa área (televisão)?

Não temos relação com o Ministério das Comunicações, porque ele não é o responsável pelo conteúdo da televisão, mas nós temos com o Ministério da Justiça que faz classificação. Pela legislação hoje o Ministério das Comunicações cuida só das outorgas, quem controla o conteúdo é o Ministério da Justiça. Nossa relação com o Ministério da Justiça é de dar respaldo para os classificadores fazerem seu trabalho.

6 - E com os Ministérios Público, das Comunicações e da Educação? Não, ainda não aconteceu.

7- Como avalia a participação da sociedade pela qualidade da televisão? Crescendo aos poucos. Estou nessa discussão há quase 20 anos, então quando acontece essas coisas sobre debate da violência, quando alguma coisa passa do limite na televisão e alguém escreve um artigo...eu já vi isso acontecer pelo menos cinco vezes: tem um exagero, a imprensa vai lá e faz um artigo, todo mundo discute e pronto. O assunto morre, passa cinco anos, acontece tudo de novo. Tudo é um processo, em função da redemocratização e da volta do debate, a gente começa a ver acontecer as coisas.

8-Você considera o Midiativa como um grupo de pressão para conscientizar sobre os problemas da televisão? qual a importância desses grupos de pressão? Eu acho que é um grupo de pressão, mas anted de tudo é um grupo de formação de pensamento. È um grupo que tem conteúdo, debate, discussão, vejo muita gente despreparada no debate. Falta muito preparo. È o que eu falo, é fácil dizer quando alguém tira a roupa, fala um palavrão, ou mostra um suicídio às 19h, todo mundo consegue reconhecer. Mas existem coisas muito mais sutis, mais perniciosas, como a questão da publicidade e merchandising dentro da programação infantil. Tem, no ponto de vista da violência, numa sociedade desigual como o Brasil há uma violência maior, porque forma uma mente, afeta uma mente entre desigualdade entre pobres e

ricos, entre quem pode e quem não pode, esses modelos e esteriótipos, enfim. Quando você propõe uma formação e uma programação que, por exemplo, ás vezes a televisão de uma maneira geral, na ficção, tende a mostrar uma família feliz, aquela que é a certa. Mas se mostrar outros modelos de famílias que também são felizes, você pode estar abrindo uma discussão que pode ser interessante: você pode mostrar gente separada, uma mãe solteira, um pai que tem dificuldade de se rebaixar na frente dos filhos. Enfim, você tem uma série de maneiras de mostrar temas importantes e abrir esse tema para discussão, sem necessariamente estar mostrando esse esteriótipo do bem e do mal. Acho que é esse exercício que falta.

9-O que seria na sua opinião a TV ideal? Em que medida a TV tem papel na formação da consciência crítica nacional? Eu acho que tem toda possibilidade e papel fundamental. Ela vai ajudar na medida em que puder mostrar variedade, diversidade, hoje fazemos trabalho na TVE e para nós a diversidade de opiniões é a coisa mais importante em qualquer temática. Temos até um programa que se chama Espaço Público, que diariamente discute as principais temáticas da política e da economia a partir de várias visões. A pluralidade de idéia é um ponto chave, porque é através dessa troca de informações e idéias que a pessoa tem a possibilidade de formar sua opinião, ouvir outros pensamentos e até mudar seu ponto de vista a partir de uma outra idéia e não de uma idéia única. Então, quando a gente fala de programação infantil a gente tem que não entenda a criança como uma massa, nesse mundo criança você trem pré-escola, criança de oito a onze anos, depois tem de doze a catorze, depois de quinze a dezessete, quer dizer, tem várias tendências e você, em princípio, como emissora aberta ou pública, você tem que necessariamente estar oferecendo suporte seja estético ou informativo, variado para todas as faixas.Por exemplo, quando se mostra animação, a maior variedade de animações, cores, temas, personagens, que se puder, enfim, esse é um pouco do debate que o Midiativa faz. A TV ideal para cada país é uma. Pro Brasil tem muita gente que acha que o que a gente tem está bom. Que a TV Globo está entre as melhores televisões do mundo e, sem dúvida, no ponto de vista estético e padrão, ela responde bem no contexto do mercado internacional. Mas a boa televisão e a televisão que a sociedade precisa nesse momento no Brasil é uma TV mais plural, mais diversa, uma TV que possa ouvir mais vozes, que tenha diversidade.

10-A Academia tem contribuído, sugerido, sido convidada a integrar os grupos de discussão sobre qualidade da TV? Eu acho que a Academia está mais integrada do que sempre, mas ainda está muito distante. Nem posso generalizar a Academia, porque ás vezes em cada estado você vê diferença. Eu que viajo muito percebo bem isso, por exemplo, no rio de janeiro eu sinto que a academia está mais integrada com a sociedade do que em São Paulo.

Acho que na Bahia e Rio Grande do Sul também. Parece que esses estados com sociedades menores ou grupos mais organizados, conseguem influir mais, embora, a USP agora no debate da televisão digital, por exemplo, teve um papel importante. Por exemplo, eu estive na Colômbia recentemente e vi a universidade nesse assunto TV e criança, até por causa do Martín-Barbero, ou TV e vida social, tem alguns teóricos importantes na América Latina onde o pensamento é um pouco mais avançado que no Brasil. Aqui nós temos o Arlindo Machado, que é muito reconhecido dentro deste tema e ás vezes aqui ele não tem tanta voz.

11- A mobilização social pode influenciar numa televisão de qualidade? Como? Pode é só ela exigir.

12-A classificação indicativa resolve o problema da qualidade? Por que? Não, nada sozinho resolve, é um conjunto.

13-Como fazer valer o cumprimento dos códigos de ética das emissoras? O código de ética é quase uma repetição do que está na Constituição. Eu de novo falo, por isso que fiz o Midiativa, é um trabalho conjunto, não pode deixar na mão de um só. Não é só o código, são os profissionais que trabalham lá dentro, não é só o dono da emissora. Infelizmente a formação é triste porque o nosso estudante às vezes sai da faculdade e tem que atuar num meio, onde ás vezes ele aprende um jeito de fazer e não aprende mais nada. Então se ele não tem pelo menos uma passagem por uma TV educativa ele não consegue enxergar a televisão feita de outro jeito. A formação dos produtores jornalistas, público, governantes, grupos de pressão, é tudo um movimento conjunto, não dá para dizer que um lado só resolve. Então leva tempo e nem sempre se consegue.

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