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4 Economia da mídia: os newsgames e suas estratégias econômicas

4.2 Economia da atenção

A informação não faz mais parte de um pacote fechado, no qual a atenção era concentrada, formando oligopólios de atenção. Antes, eram as empresas de mídia que tinham o poder de produção e distribuição de conteúdo; entretanto, a partir do advento da internet, começa o deslocamento para uma era de convergência e informações abundantes, em que o público desempenha um papel importante como produtor e disseminador de informação. Por um lado, segundo Jenkins (2009), essa convergência é uma oportunidade de expansão aos conglomerados de mídia, tendo em vista que um conteúdo bem-sucedido pode se espalhar por outros suportes. Por outro lado, ela “representa um risco, já que a maioria dessas empresas teme uma fragmentação ou uma erosão em seus mercados” (JENKINS, 2009, p. 47), já que cada vez que ocorre o deslocamento do espectador de uma mídia para outra existe o risco de ele não voltar mais. Tão importante para o sucesso ou o fracasso de uma empresa de mídia, a atenção é definida por Davenport e Beck (2001, p. 20, tradução nossa) da seguinte maneira: “a atenção está focada em um engajamento mental sobre determinada peça de informação”. Para os autores, existe uma relação causal entre a consciência, a atenção e a ação (figura 34), pois para fazer uma compra, por exemplo, você precisa ter dado algum grau de atenção a um item; a atenção então é um elo na cadeia de tomada de decisão.

Figura 34: Modelo do processo de atenção.

Fonte: Elaborada pela autora, com base em Davenport e Beck (2001, p. 21, tradução nossa).

Os autores acreditam que o processo de atenção começa na consciência quando itens são apresentados ao indivíduo, então depois de descoberto ocorre o processo de decisão entre prestar atenção ou não. A atenção ocorre entre uma fase de estreitamento relativamente

inconsciente (geralmente, as pessoas selecionam a maior parte das entradas sensoriais – há a consciência de muitos itens, mas não se presta atenção em todos eles) –, e uma fase de decisão (na qual decidimos agir com atenção para obter informações).

Em 2016, os indivíduos acessam conteúdos jornalísticos por meio e canais que não são veículos de comunicação, mas que têm a atenção de seus usuários com suas tomadas de decisões, como é o caso de Google, Facebook, Twitter, YouTube etc. Rocha (informação verbal) também concorda dizendo que “o jornalismo perdeu muito dinheiro para a internet”, e não foi para concorrentes diretos, mas “para grupos de comunicação, como o Google e o Facebook, que são empresas de tecnologia a princípio, mas que têm ganhado grande parte dessa receita publicitária que estava nos jornais”. Ressalta-se esse argumento ao evidenciar que apenas o Facebook detém 1,4 bilhão de usuários, com uma média por pessoa de 15 horas por mês conectada ao serviço123. Essas plataformas servem para encontrar e distribuir conteúdo e representam os novos oligopólios de atenção. Boa parte das pessoas usa plataformas digitais, incluindo as redes sociais, como primeira fonte para encontrar conteúdo jornalístico e atualização diária. O Facebook é o rádio de John Cheever; é o jornal lido exaustivamente no trem; é a TV na sala de uma família dos anos 1950 (BEGUOCI, 2015), acarretando dificuldades econômicas para os conglomerados de mídia tradicionais. Antes a publicidade fazia sentido nos veículos de comunicação e sustentava todo o sistema, pois era deles a concentração da atenção de boa parte da população de um país. Lévy (2004, p. 183) explica que

após ter sido durante séculos uma economia de subsistência, depois, durante algumas dezenas de anos, uma economia da informação e do conhecimento, a economia se desloca agora em direção às ideias e – anda além – em direção à atenção. A economia recoloca cada vez mais rápida a cadeia ontológica em direção ao virtual, em direção ao que cria a existência. Pois a atenção, ou a consciência é existencializante. Dessa forma, surge o conceito de economia da atenção, que é entendida por Crawford (2015) como parte da gestão da informação e trata da atenção humana como commodities escassas, aplicando a teoria

123 Disponível em: <http://www.statisticbrain.com/facebook-statistics>. Acesso em: 28 set. 2015.

econômica para solucionar problemas de gerenciamento de informação. Foi na década de 1970 que Simon (1971, p. 40-41, tradução nossa) começou a articular esse conceito:

Em um mundo rico em informações, a riqueza de informações significa uma carência de outra coisa: a escassez de tudo que a informação consome. Quais informações consome é bastante óbvio: consome a atenção de seus destinatários. Daí uma riqueza de informações cria uma pobreza de atenção e uma necessidade de atribuir essa atenção de forma eficiente entre as superabundâncias de fontes de informação que podem consumi-la.

Todas as economias caracterizam-se por ter produtores/consumidores e oferta/procura, sendo assim a economia da atenção também se enquadra nessas características mercadológicas. Entretanto, “somos produtores de informação em busca da atenção dos consumidores, mas também somos consumidores de informação, dispondo apenas de uma quantidade limitada de atenção para oferecer” (DAVENPORT; BECK, 2001, p. 13, tradução nossa). Os autores acreditam que se uma determinada empresa não consegue superar o déficit de atenção de seus consumidores ou usuários, ela estará fada ao fracasso, pois não é mais suficiente ser competente e sólida no mercado, “também é fundamental agitar as células cerebrais e aquecer os corações do público almejado” (DAVENPORT; BECK, 2001, p. 9, tradução nossa). Lévy (2001) pondera que a atenção torna-se o bem mais desejado do ciberespaço, e precisa ser conquistada constantemente – com trocas de ideias, experiências e informações - por um capital financeiro que estabeleça relação a longo prazo. Por conseguinte, inicia na economia virtual um processo de equivalência entre o dinheiro e a atenção, tão fundamental aos veículos de mídia.

[...] não somente a atenção do público traz dinheiro aos vendedores, mas, o que é ainda mais importante, as opções de compra e de investimento do público manifestam a orientação de sua atenção. E é essa atenção, principalmente manifestada por decisões de consumo, que orienta a economia (LÉVY, 2001, p. 115).

Silva R. P. V. (2014) exemplifica a utilização da atenção como moeda corrente citando os jogos MMOGs (Massively Multiplayer Online Game – jogo on-line de múltiplos jogadores, em tradução livre), que, de acordo com Novak (2012), são aqueles em que os usuários estão em rede e jogam de maneira compartilhada. Esse tipo de game, segundo Silva R. P. V. (2014), começou adotando o modelo comercial econômico com assinaturas mensais (P2P), mas depois convergiu para os jogos gratuitos ou quase, com microtransações ou micropagamentos dentro do ambiente de jogo, adotando o modelo Free-to-Play (F2P). Essas microtransações são utilizadas, por exemplo, para acelerar o desenvolvimento durante a narrativa do jogo ou, ainda, para ampliar o poder do jogador diante dos seus oponentes.

Esse é o modelo econômico dos jogos Free-to- Play, que estão conquistando a atenção do público, com um mundo virtual, uma narrativa envolvente, a criação de comunidades de conhecimento e a possibilidade de compra de itens, para melhorar a performance do jogador. São jogos gratuitos, mas utilizam a atenção dos jogadores como moeda corrente. Quanto mais atenção os jogadores dedicarem ao game, mais dispostos eles estarão a consumir. Com essa disposição, os games Free-to-Play ou F2P estão faturando milhões de dólares e tornando a indústria de games MMOGs rentável para grandes empresas (SILVA R. P. V., 2014, p. 1.132). Beguoci (2015) afirma que o valor do jornalismo está atrelado não mais ao meio em si, mas à disposição das pessoas em consumi-lo, recomendá-lo, compartilhá-lo e pagá-lo. Ou seja, ao lado da questão tecnológica, existe a questão de utilidade e valor intrínseco. Para o autor, o jornalismo tem um caminho interdisciplinar, que necessita de antropólogos para dizer como as pessoas consomem e usam informação; precisa de programadores e designers que ajudem a pensar nas melhores formas de entregar informações relevantes; e de pessoas, profissões e formações ainda indefinidas, que ajudarão a pensar em como aumentar drasticamente o impacto daquilo que é produzido no jornalismo. O desafio, para o autor, é muito maior do que decidir se introduz ou não paywalls (cobrança por conteúdo), por exemplo.

4.3 Experiências de consumo contemporâneo: entretenimento