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ECONOMIA SOLIDÁRIA ENTRE TRANSFORMAÇÕES E NOVOS SENTIDOS DO TRABALHO

1.2 Economia solidária: como estratégia para o desenvolvimento local?

Silva (2007) afirma que desde a crise do fordismo e do processo reestruturação produtiva coloca-se a discussão do desenvolvimento local, principalmente, nas décadas de 1970 e 1980, devido à descentralização da administração do Estado, porém é a partir de 1990 que o conceito entra definitivamente na pauta das políticas públicas, como reflexão sobre novas formas de crescimento econômico visando atingir o âmbito local,

devido às experiências que se mostram capazes de gerar mais e melhores oportunidades, no caso da Itália, onde se originou essa perspectiva tendo sua base produtiva na micro e pequena empresa.

Cocco, Urani, Galvão e Silva (2002) ressalvam que há um interesse de muitos estudiosos e formuladores de políticas públicas sobre o desenvolvimento local, consolidado na região central do nordeste da Itália, nas décadas de 1950 e 1960 – a chamada Terceira Itália19, cuja experiência de redes de pequenas e médias empresas trouxe alternativas concretas de intervenção de poderes públicos locais, que contemplaram também comunidades de baixa renda circunscritas em seus territórios.

Silva (2007) argumenta que a vantagem da acepção do desenvolvimento local dá-se pela dimensão territorial, como objeto de políticas públicas, devido se tornarem transversais e não mais setoriais. Isso permite uma mobilização do conjunto da sociedade, não apenas dos agentes considerados “produtivos”, pois além de possibilitarem o estabelecimento de redes de cooperação horizontal fortalecem as dinâmicas da democracia local.

Para Eid e Pimentel (2008) o termo local, é interpretado como sinônimo de lugar e pode contemplar uma variedade de significados com pelo menos três dimensões: “a) econômica, pela localização das atividades econômicas e sociais, b) sociológica, pelo espaço cotidiano de interação social, c) antropológico e cultural, pela identificação do sujeito com o espaço habitado” (p. 4).

Nesse sentido, Jesus (2003) reforça que a identificação de uma iniciativa de desenvolvimento local se constata quando os recursos e valores locais estão sob o controle de instituições e de pessoas do local, resultando em benefícios para as pessoas e meio ambiente. Tal processo é definido por Cocco apud Silva (2007) como mecanismo de mobilização produtiva dos territórios e das instituições locais.

Assim sendo, a década de 1990, foi cenário do crescimento da ES, contribuindo para o aumento de organizações sócio-produtivas sob um movimento endógeno, de base associativista e coletiva, como estratégia de luta e resistência dos (as) trabalhadores (as) frente ao processo de precarização do trabalho e do emprego assalariado.

Por conseguinte, um dos maiores desafios da economia solidária é sair da esfera apenas da estratégia de resistência, para uma nova estratégia de desenvolvimento. Tão

19 De acordo com Cocco, Urani, Galvão e Silva (2002) esse termo foi empregado pela primeira vez por

Bagnasco no final dos anos 1970, como desdobramento do tradicional dualismo italiano entre o Norte desenvolvido que se encontrava em crise (primeira Itália) e o Sul atrasado (segunda Itália). (p. 13)

logo, pode ser ainda um instrumento capaz de dar respostas no âmbito local, regional e global, devido sua participação em redes de cooperação sociais, econômicas e políticas.

Assim, há a necessidade de debater um desenvolvimento que não tenha uma abordagem centralizadora e mecânica (pensada de cima para baixo), mas ao contrário que seja um “processo de desenvolvimento iniciado na localidade e/ou região de baixo” (JESUS, 2003, p.73). Isso é defendido por Wautier (2003) ao afirmar que economia solidária acentua um projeto de desenvolvimento local assentado na pluralidade de atividade econômica sob formas de serviços diversos, destinados, principalmente, mas não exclusivamente, às populações excluídas em uma determinada localidade.

De acordo com Oliveira (2006), o debate do desenvolvimento local está conectado a um movimento em diversas partes do mundo, em busca de melhores condições de vida, associadas à desconstrução da noção de desenvolvimento estritamente econômico (pela qual se baseia a maioria dos países) levando as sociedades a repensarem sobre quais outros caminhos podem ser traçados, de modo a romper, ou ao menos amenizar, as desigualdades sociais que assolam parte significativa da população mundial, especialmente, nas regiões periféricas. Assim, representantes públicos e órgãos de fomento, por sua vez, passaram, a partir do crescimento sobre esse debate, a apoiar e a incentivar práticas voltadas ao associativismo e a cooperação entre empresas, governos e grupos de pessoas.

No entanto, em consonância com Buarque (1999), para compreender esse movimento torna-se necessário a análise do desenvolvimento, como um processo endógeno registrado em pequenas unidades territoriais e agrupamentos humanos capazes de promover o dinamismo econômico e a melhoria da qualidade de vida da população. “(...) ese crecimiento debe estar fundado en el fortalecimiento de las capacidades productivas proprias, lo que comienza con la reproducción de las condiciones productivas – satisfación de las necesidades básicas” (VIDAL & GUILLÉN, 2007, p. 31), [...] de forma a melhorar os indicadores de bem-estar econômico e social (pobreza, desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia), (VASCONCELOS E GARCIA apud OLIVEIRA, 2004, p. 16).

O desenvolvimento local segundo Jesus (2003) a partir da participação não apenas das pessoas, mas também das instituições, visa transformações na economia e na sociedade local, oportunizando trabalho e renda, de forma a superar as dificuldades, melhorando as condições de vida da população local.

Para Singer (2002b) a concepção de desenvolvimento está centrada em um processo de fomento de novas forças produtivas e de instauração de novas relações de produção, de modo a promover um processo sustentável de crescimento econômico, que preserve a natureza e redistribua os frutos do crescimento a favor dos que se encontram marginalizados da produção social e da fruição dos resultados da mesma.

Assim sendo, o desenvolvimento local deve investir também no campo social e ambiental para que o resultado alcançado seja muito mais duradouro e pleno, configurando-o de acordo com uma sustentabilidade ampliada abrangendo diferentes setores da vida cotidiana, como o político-institucional (democracia participativa, ampliação da esfera pública); o socioeconômico (eqüidade, inclusão social, novos padrões de produção-circulação-consumo); o ambiental (preservação e recuperação da biodiversidade); e ainda o cultural (sociodiversidade, primado de relações não- discriminatórias). Portanto, é esta a idéia de desenvolvimento que deve ser almejada pelas sociedades, uma vez que “un desarrollo humano debe estar centrado en las personas y debe responder a las necesidades de todos los grupos sociales” (BENERÍA, 2005, p. 180).

Nesse contexto, as discussões supracitadas fundamentam os eixos acerca de um novo desenvolvimento, no âmbito local, regional e global. Para tal, a economia solidária por ser um movimento de resistência e mobilização dos(as) trabalhadores (as) com princípios de igualdade, equidade, sustentabilidade e construção de uma “outra economia” pode se constituir como uma estratégia possível para avançar em um desenvolvimento para todos os grupos sociais como sugere Benería (2005).

Assim, este deve apresentar-se de forma mais ampla, como um “crescimento econômico acompanhado da melhoria na qualidade de vida, ou seja, [em que a mulher e o homem sejam pensados como a centralidade] de forma a melhorar os indicadores de bem-estar economico e social (pobreza, desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia) (VASCONCELOS e GARCIA apud OLIVEIRA, 2004, p. 16).

Entende-se que o fortalecimento de empreendimentos solidários nos quais a (o) trabalhadora (o) é tido como sujeito e finalidade da atividade econômica pode contribuir para pensar em sustentabilidade e desenvolvimento, à medida que se deseja para além do acesso aos recursos monetários, a melhoria das condições de vida das pessoas sob condições de igualdade.

Neste sentido, busca-se no capítulo seguinte entender a trajetória de lutas das mulheres, de um modo geral, para em seguida aproximar ao movimento sócio-produtivo no contexto da economia solidária.

CAPÍTULO II

QUANDO AS MULHERES ENTRAM EM CENA: LUTAS,