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Educação de Adultos: Década de 90

Capítulo I Educação de Adultos: Contextualização Histórica

2. A Educação de Adultos em Portugal

2.3 Educação de Adultos: Década de 90

Assiste-se, em meados da década de 1990, a uma acentuada crise e desinstitucionalização. Em 1993, a DGEE é extinta23 e transformada no Núcleo de Educação Recorrente e Extraescolar do Departamento de Educação Básica (Guimarães, 2011). Após as eleições legislativas, o governo do Partido Socialista apresenta um “Pacto Educativo para o Futuro” em que a educação e a formação dos cidadãos ao longo da vida representam uma “condição necessária para o desenvolvimento económico e social”, implicando um especial destaque à educação permanente e de adultos (Melo, Lima & Almeida, 2002, p. 114). Neste contexto, o Programa Eleitoral do Partido Socialista (1995) e o Pacto Educativo para o Futuro (1996) procuraram remobilizar a educação de adultos no discurso político, adotando as políticas pós-reformistas e abandonando as lógicas reformistas tradicionais. Prometeu-se uma política de desenvolvimento assente na promoção da educação extraescolar, na educação para o desenvolvimento e no apoio ao associativismo (Lima, 2005; Guimarães, 2009).

É, principalmente a partir de 1996 / 1997 que a Educação e Formação de Adultos em Portugal sofre um grande impulso. A participação de Portugal na Conferência de Hamburgo foi fundamental e em 1996, é criada uma comissão de trabalho, designada por Grupo de Missão para o Desenvolvimento da Educação e Formação de Adultos24. Por decisão conjunta do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (MTSS), este Grupo de Trabalho tinha como responsabilidade a elaboração de um documento estratégico para o desenvolvimento da Educação de Adultos em Portugal. Este documento estratégico, por sua vez, recuperou os princípios da educação popular que estavam contidos no PNAEBA e foi publicado em 1998 (Lima, 2006). O documento estratégico intitulado “Uma Aposta Educativa na Participação de Todos” apresentou as seguintes propostas:

23 Decreto-Lei nº 133/93, de 26 de Abril

24 Através da Resolução n.º 92/98, de 14 de Julho, este grupo era constituído por: Alberto Melo (Coordenador); Ana Benavente; Ana Queirós, Augusto Santos Silva, Lucília Salgado, Luís Rothes e Mário Ribeiro.

i. A criação de uma oferta pública de educação de adultos, da qual seja retirada o ensino recorrente para jovens entre os 15 e os 18 anos, integrando esta oferta num sistema autónomo e descentralizado, pressupondo a existência de Unidades Locais de Educação de Adultos (ULEA);

ii. O lançamento de um programa de desenvolvimento da educação de adultos, gerido por um organismo a ser criado;

iii. A constituição de um «sistema nacional de balanço de competências pessoais e de validação dos adquiridos profissionais ou de aprendizagem»;

iv. A criação de um estabelecimento de ensino dirigido unicamente para a aprendizagem de adultos organizado em dispositivos de ensino à distância e de um serviço central de «Credenciação e Registo das entidades intervenientes em Educação de Adultos». (Melo et al., 1998, p. 61)

No que concerne aos seus objetivos, destaca-se o lançamento e a execução do Programa S@ber+ (Programa para o Desenvolvimento e Expansão da Educação de Adultos, 1999-2006). Tendo como ponto de partida, a situação da população adulta portuguesa no que concerne aos níveis de escolaridade, qualificações e competências de literacia, este Grupo de Missão tinha sob a sua responsabilidade a criação da Agência Nacional de Educação de Adultos (ANEFA25). A criação da ANEFA, em 1999, foi central para o desenvolvimento da política nacional. Esta ficou responsável de preparar um “quadro regulamentar mais favorável para o desenvolvimento de um sistema coerente, flexível e autónomo da educação de adultos construídos em parceria aberta e criativa entre o Estado e a Sociedade Civil” (Amorim & Fragoso, 2010, p. 61). Relativamente ao Grupo de Missão, o mesmo foi extinto passando as suas responsabilidades para a ANEFA (Veloso, 2011). Tutelada pelo Ministério da Educação, a ANEFA tinha como missões:

i. Preparar um quadro legislativo e regulamentar mais propício ao desenvolvimento de um sistema de EA coerente, flexível, autónomo e assente numa parceria aberta e criativa entre o Estado e a Sociedade Civil, designadamente o sector social solidário; ii. Garantir a alfabetização e a literacia básica;

iii. Promover direta ou indiretamente a educação nas suas diferentes vertentes como técnica, cientifica, cívica e artística, numa perspetiva de educação e formação ao longo da vida;

iv. Estimular o surgimento das associações locais de animação, educação e desenvolvimento local. (Melo et al., 1998, pp. 59-60)

Com o intuito de reforçar a educação e formação ao longo da vida, a ANEFA destaca a implementação de um Sistema Nacional de Reconhecimento e Validação e Certificação de Competências (SRVCC) que os adultos adquiriram em diferentes contextos. Destaca, de igual modo, o planeamento e a construção de Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (Centros de RVCC). Propôs, deste modo, a criação gradual de uma Rede Nacional de Centros de RVCC, fomentando uma partilha de boas práticas entre os diversos Centros espalhados pelo país (Ambrósio, 2007). A valorização dos saberes e competências adquiridas através da experiência de vida possibilita aos adultos a obtenção da certificação das suas competências e, também, o aumento das suas qualificações (Nico, 2011).

Em 2001, foi criado em Portugal o sistema nacional de reconhecimento, validação e certificação de competências (RVCC). Este sistema tinha como pressuposto que os adultos adquiriam experiências através de diversos contextos - formais, não formais e informais. Esta aprendizagem experiencial poderia ser certificada com um diploma ou uma qualificação profissional (Guimarães, 2011). Propostos pelo Grupo de Missão, os Cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA) foram criados pela ANEFA. Promovidos por diferentes entidades (associações, autarquias ou empresas), os cursos EFA dirigem-se a adultos com idade superior ou igual a 18 anos, sem escolaridade básica, sem qualificação profissional e, de preferência, desempregados (Veloso, 2011). De acordo com a Carta de Qualidade26, a rede de Centros constitui-se como um espaço privilegiado de comunicação e de cooperação no âmbito do reconhecimento, validação e certificação de competências dos cidadãos portugueses, tendo como objetivo a coesão social e o desenvolvimento das pessoas (ANEFA, 2001).

Importa ainda referir que a ANEFA concebe o Referencial de Competências-Chave (RCC) de Educação e Formação de Adultos (Lima & Guimarães, 2011). Assente nas

26 Entendemos por Carta de Qualidade como um “instrumento que cria exigência, que clarifica estratégias de acção e níveis de serviço e que contribuirá para a valorização dos processos de trabalho, para a mobilização das equipas e para a eficácia do financiamento” (Gomes & Simões, 2007, p. 5).

exigências da vida, da sociedade e da economia, o RCC assume-se como documento orientador de todo o processo do CNO, uma vez que assenta na organização das quatro áreas nucleares, consideradas necessárias para a formação da pessoa no mundo atual, possibilitando assim o reconhecimento de competências adquiridas ao longo da vida (Alonso et al., 2002). De acordo com a Comissão Europeia (2005, citado em Nico, 2011), no período 2002-2004, Portugal apresentava níveis de literacia muito baixos e, provavelmente, níveis de certificação ainda mais baixos. Quanto a isto, Candeias e Simões (1999) referem que os baixos níveis de literacia da população portuguesa são um reflexo deste “marginal” modo de aprendizagem e significa que a capacidade de interpretar e intervir no mundo é limitada. Na realidade, as pessoas aprendem no “trabalho, na vida social, na vida cívica e nunca veem creditados esses saberes. Tudo aquilo que as pessoas vão acumulando como saber não lhes é creditado para efeitos de certificação, de obtenção de diplomas” (ANEFA, 2002, pp. 9-10).

Pese embora as diferentes limitações, existiu no período de 1995 a 2002, uma vontade política em revalorizar a educação de adultos, através da criação de um organismo responsável por este sector (Veloso, 2011). Contudo, esta valorização parece ter acabado no tempo do XV Governo Constitucional, pois, em 2002, a ANEFA foi extinta e substituída pela Direção-Geral de Formação Vocacional (DGFV27). Lima (2006) refere que a extinção da ANEFA é “quase uma fatalidade relativamente a uma mudança de governo e a um programa político que não entende a educação de adultos [como] uma prioridade e entende a formação profissional [como] a chave de todos os problemas” (p. 5). A DGFV parece traduzir uma preocupação maior com a formação dirigida para a qualificação do que com a educação de adultos propriamente dita. Pois, na realidade, a expressão educação de adultos tornou-se “escassa” e foi substituída por “formação vocacional”, “qualificação de recursos humanos”, “formação profissional” e “qualificações ao longo da vida”. Em termos de objetivos da DGFV, destaca-se a qualificação escolar e profissional da população portuguesa em termos de competitividade da economia global. Neste caso, assistimos à subordinação da Educação de Adultos ao sistema de formação vocacional.

27

“A criação da DGFV deu-se como consequência da reestruturação orgânica do Ministério da Educação, pelo Decreto-Lei n.º208/2002, de 17 de Outubro (Veloso, 2011) ”.

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