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ESCOLA DO SEU PAPEL FUNDAMENTAL

9.1 MEDICALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO E INCLUSÃO ESCOLAR: DIÁLOGOS POSSÍVEIS

9.1.1 Educação inclusiva: breve histórico

Abenhaim (2005) faz um histórico a respeito do processo de inclusão escolar na educação. A autora aponta que esse processo nasce a partir da globalização, uma vez que ela traz consigo a necessidade de aproximação entre os povos dos mais diversos países. Porém, esse convívio entre diferentes povos e culturas trouxe um consequente aumento na dificuldade de lidar com a diversidade. Nesse contexto é que a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cidadania (UNESCO) elege a educação como um eixo articulador do desenvolvimento, capaz de minimizar esses conflitos. Nesse sentido, o órgão assume como prioridade as discussões a respeito da necessidade de universalização da educação básica e criação de uma política de educação para a paz (ABENHAIM, 2005).

Ainda segundo Abenhaim (2005), em 1990, como alguns países, dentre eles o Brasil, encontravam-se com dificuldade de acesso e permanência na educação básica, bem como a escola era de baixa qualidade, a UNESCO realizou a Conferência Mundial sobre Educação para Todos. Nessa conferência foram estabelecidas seis metas mundiais para a educação, dentre elas assegurar que todas as crianças, sobretudo as provenientes de “minorias étnicas”, tivessem acesso à educação primária universal de qualidade; atingir até o ano de 2015, 50% de melhorias nos níveis de alfabetização de adultos, sobretudo das mulheres, bem como no mesmo ano atingir a igualdade de gênero no acesso à educação de qualidade; melhorar todos os aspectos relacionados à qualidade da educação,

atingindo resultados reconhecíveis e mensuráveis, sobretudo na alfabetização e aritmética (ABENHAIM, 2005).

Baseada na Conferência Mundial sobre Educação para todos, a UNESCO convocou uma comissão internacional a fim de refletir sobre educar e aprender no século XXI (ABENHAIM, 2005). Tal Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, presidida por Jacques Delors, foi criada no ano de 1993 e orientou seus trabalhos em seis princípios fundamentais, são eles (DELORS et al., 1998, p.274- 275):

1) A educação é um direito fundamental da pessoa humana e possui um valor humano universal; a aprendizagem e a educação são fins em si mesmos, constituem objetivos a alcançar, tanto pelo indivíduo como pela sociedade; devem ser desenvolvidos e mantidos ao longo de toda a vida; 2) A educação formal e não-formal deve ser útil à sociedade, funcionando como instrumento que favoreça a criação, o progresso e a difusão do saber e da ciência, colocando o conhecimento e o ensino ao alcance de todos; 3) Qualquer política de educação deve se orientar pela tripla preocupação com equidade, pertinência e excelência; procurar associar, harmoniosamente, esses três objetivos é uma tarefa crucial para todos os que participam do planejamento da educação ou da prática educativa; 4) A renovação da educação e qualquer reforma correspondente devem se basear numa análise refletida e aprofundada das informações de que dispomos, a respeito das ideias e práticas que deram bons resultados, e na perfeita compreensão das exigências próprias de cada situação particular; devem ser decididas de comum acordo, mediante pactos apropriados entre as partes interessadas, num processo de médio prazo;

5) Se a grande variedade de situações econômicas, sociais e culturais exige, evidentemente, diversas formas de desenvolvimento da educação, todas devem levar em conta os valores e preocupações fundamentais sobre os quais já existe consenso no seio da comunidade internacional e no sistema das Nações Unidas: direitos humanos, tolerância e compreensão mútua, democracia, responsabilidade, universalidade, identidade cultural, busca da paz, preservação do meio ambiente, partilha do conhecimento, luta contra a pobreza, regulação demográfica, saúde;

6) A responsabilidade pela educação corresponde a toda a sociedade; todas as pessoas a quem diga respeito e todos os parceiros – além das instituições que têm essa missão específica – devem encontrar o devido lugar no processo educativo.

Com base nas ideias propostas para o alcance da educação para todos, houve um movimento mundial em favor das pessoas com necessidades educacionais especiais (ABENHAIM, 2005), a fim de que elas pudessem ter, também, seus direitos educacionais garantidos com a inclusão no sistema de ensino. A segregação em escolas ou classes especiais aprofundava os preconceitos e fortalecia a discriminação, deixando essas pessoas alheias ao processo educacional reconhecido como padrão pela sociedade (BARROS, 2009).

A partir dessas concepções e analisando as propostas de educação para todos, surge a necessidade de uma atenção especial para as causas relacionadas às pessoas com deficiência. Para dar conta dessa demanda, aconteceu, no ano de 1994, a Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais, na cidade de Salamanca, Espanha (BARROS, 2009). Tal conferência deu origem à Declaração de Salamanca, que ratifica o compromisso com as propostas da Educação para Todos de assegurar esse direito, independente das diferenças individuais (UNESCO, 1994). Essa declaração não se ateve apenas às pessoas com deficiência, mas a todas as pessoas com necessidades educacionais especiais, “propondo uma escola que possa lidar com as diferenças sem ser especializada” (BARROS, 2009, p.30). Os cinco proclames fundamentais dessa declaração são (UNESCO, 1994):

1) Cada criança tem o direito fundamental à educação e deve ter a oportunidade de conseguir e manter um nível aceitável de aprendizagem;

2) Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias;

3) Os sistemas de educação devem ser planejados e os programas educativos implementados tendo em vista a vasta diversidade destas características e necessidades;

4) As crianças e jovens com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas regulares, que a elas se devem adequar através duma pedagogia centrada na criança, capaz de ir ao encontro destas necessidades;

5) As escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios mais capazes para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos; além disso, proporcionam uma educação adequada à maioria das crianças e promovem a eficiência, numa óptima relação custo-qualidade, de todo o sistema educativo. A declaração proclama e incita a todos os governos dentre outras coisas, prioridades nas medidas políticas e orçamentárias para o desenvolvimento de sistemas educativos que possam incluir todas as crianças, independente das diferenças ou dificuldades individuais; adotar como lei ou política o princípio da educação inclusiva, admitindo todas as crianças nas escolas regulares; estabelecer mecanismos de planejamento, supervisão e avaliação educacional para crianças e adultos com necessidades educativas especiais, de modo descentralizado e participativo; garantir programas de formação de professores, tanto a nível inicial

como em serviço, que insiram as respostas às necessidades educativas especiais nas escolas inclusivas (UNESCO, 1994).

Essa seção não tem como intenção historicizar de forma aprofundada os caminhos da educação inclusiva; esse breve histórico realizado tem por intenção ajudar a compreender como declarações universais buscaram garantir o acesso de todas as pessoas às escolas regulares de ensino e auxiliar a pensar criticamente sobre como esse acesso tem se dado. Tendo situado o tema de forma breve, pode- se partir para as reflexões que o campo da pesquisa trouxe em relação à temática da inclusão.