• Nenhum resultado encontrado

Educação Popular: alternativa de enfrentamento do turismo sexual

CAPÍTULO II EDUCAÇÃO POPULAR COM PAULO FREIRE

2.2 Educação Popular: alternativa de enfrentamento do turismo sexual

Uma das possibilidades e características da Educação Popular como alternativa permite a ampliação de sua viabilidade para se trabalhar com crianças e adolescentes inseridos no contexto do turismo sexual. Esta ampliação sendo escolar ou extraescolar, pública e alternativamente civil (BRANDÃO, 2006), imbuída da participação, abrange grupos ou comunidades as mais diversas. Daí sua indicação para o trabalho com populações vulneráveis nos locais de atuação, seja no campo ou na cidade.

A capacidade de reinvenção para dizer o novo será possível a partir de reflexões diversas calcadas na práxis de movimentos, de contestação que na dinamicidade da reconstrução avança na capacidade de pensar e refletir para agir. Nesta perspectiva, Mejía (2003) propõe pensar a Educação Popular nas suas práticas em que se requerem processos educativos que possibilitem novas formas de luta social. Contudo, convoca um reencontro que a Educação Popular e os movimentos sociais podem provocar, levando a inserção dos grupos excluídos na sociedade civil a partir da sua “base de legitimidade como prática social [...] que a unidade da cidadania coletiva é possível pela existência do movimento e do seu caráter educativo” (MEJÍA, 2003, p. 83).

Afirma que “um dos fenômenos mais interessantes gerados pela educação popular é a forma como liberta o fato pedagógico tirando-o da esfera escolar e colocando-o nos diferentes processos de socialização” (MEJÍA, 2003, p. 83). Nesse sentido, a Educação Popular pode permitir contemplar os processos de aprendizado postos, visualizar novas práticas ampliando a concepção de educação no resgate da “recuperação do local e da territorialidade, a vida cotidiana das pessoas” (MEJÍA, 2003, p. 84), que na sua diversidade cultural encontram o desafio do respeito à sua liberdade de expressão.

Por conseguinte, a condição de recriação das experiências vividas requer contato respeitoso do saber do outro. O saber da comunidade, como saber que surge das vivências inseridas na cultura local, circula num movimento transgeracional e temporal regido por concepções e práticas pedagógicas próprias. É nessa cultura que o trabalho de abordagem inicial se insere. Em situação de exploração, nem sempre se percebem inseridos no contexto de explorados. A proposta da Educação Popular com Paulo Freire, sendo politicamente humana, na construção do processo de libertação, convoca a curiosidade para pensar a condição posta, na dúvida, na incerteza, na pergunta.

Na experiência de um educador no meio adverso coloca as vicissitudes da vida como aprendizado, para mediar, no diálogo humano, as diversas maneiras da aula ideal, como oportunidade de construir, desconstruir o conhecimento.

Uma das razões para que a educação popular seja um conceito tão difícil de dominar, analisar e descrever, ao menos na sua versão libertadora, talvez possa ser sua postura democrática ipso facto contra a natureza das sociedades hierárquicas e classistas como a nossa. Paulo Freire assumiu, como bom budista, que os seres humanos podem ser livres, se eles somente deixarem de lado a tendência ao sofrimento e à desilusão. A meu ver, ele era um educador intelectual e espiritualmente astuto que delineou preceitos inexequíveis dentro de uma pedagogia democrática que dependia, ao menos no Brasil, de uma revolução que nunca chegou. [...] Uma herança duradoura da capacidade colonial virada imperialista é a dialética mestre/escravo que Freire tão nitidamente esclarece na Pedagogia do Oprimido (LOWNDS, 2002, p. 356).

Desse modo, a Educação Popular no diferencial da sua especificidade dialógica predispõe a capacidade em lidar com as contingências, o inusitado exigindo elementos que sustentem a reinvenção. Ao externar a palavra sobre sua condição no mundo, assume-se a sua própria possibilidade de reinventá-la. Isto implica no pensar criticamente, portanto, no gerar algo novo. Em Melo Neto (2011, p. 109) o diálogo vai se constituindo na “própria historicização do mundo, expressão da intersubjetividade, ao conscientizar o dialogante como autor de sua própria história”.

Sendo a essência da sua ação pedagógica, o diálogo como via de acesso a crianças e adolescentes em situação de exploração sexual no contexto do turismo abre caminhos de intervenção na leitura do mundo em que estão inseridos. A dialética entre o silêncio exigido na ambiência do esmagamento do ser, diante da rede de exploradores, constituída para o circuito do turismo acontecer por um lado e a possibilidade de falar sobre o que sufoca e emudece por outro lado, rompe com a barreira da opressão. A capacidade de pensar, ao sair da condição de espectador, despertar para a realidade que o cerca, aprendendo a dizer não, se faz empoderamento. Mesmo que essa negativa ainda não tenha o poder da mudança imediata, pelo movimento de cessar a exploração, mas a mudança de posição subjetiva se faz no processo e o caminho para a libertação se inicia.

A alternativa de enfrentamento do turismo sexual infantojuvenil pela educação popular é reiterada, na concepção de sua transcendência, ao avançar no além do instituído. Diante da sua amplitude e complexidade, o turismo sexual atinge os espaços educacionais ao provocar a evasão e o desinteresse pela facilidade, envolvimento e acesso ao mercado do capital. Assim,

Educação Popular por Educação Popular, nós a entendemos como um processo educativo protagonizado por diferentes sujeitos (individuais e coletivos), normalmente pertencentes ou aliados à base da sociedade, cuja experiência pode se dar em espaços educativos formais e não formais, numa dinâmica de formação contínua e numa perspectiva emancipatória e transformadora da realidade vigente, a partir da transformação cotidiana dos próprios protagonistas, que, graças ao exercício de sua dimensão docente e discente, se empenham no desenvolvimento integral de suas potencialidades subjetivas, étnicas, de gênero, de idade/geração, de classe, na relação com a Natureza e com o Sagrado, aspirando a construir uma sociedade economicamente justa, politicamente solidária e culturalmente plural (CALADO, 2003, p. 120-121).

Com esse entendimento percebe-se que o envolvimento de protagonistas da base da sociedade, na possibilidade de sua potencialização, oportuniza a intervenção nos movimentos e organizações os quais são partícipes fazendo a mediação nas raízes do tecido social. O enfrentamento será possível na articulação em rede à medida que as mudanças começam a acontecer nas situações cotidianas em âmbito local.

2.3 Educação Libertadora no processo de enfrentamento do turismo sexual