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Educação: Princípios e Reflexões

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CAPÍTULO III: CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO

3.3 LIMITES E POSSIBILIDADES DA PROPOSTA EDUCATIVA DE

3.3.1 Educação: Princípios e Reflexões

Desde os primórdios tem-se presente a evolução do pensamento e, consequentemente da educação na história da humanidade. Assim, as concepções e reflexões sobre educação corroboradas durante a feitura da presente tese serão expostas a partir de conjecturas da época da redação do terceiro Evangelho e, contracenadas com os princípios de ensino validados na sociedade contemporânea. A hodierna suspeição é que essas ideias de educação, sobretudo, as de iniciativa popular e/ou contracorrente sinalizam limites e possibilidades quando de suas análises e prováveis aplicações na atualidade.

Na época da redação do terceiro Evangelho, os judeus questionavam sobre a sabedoria de Jesus, porque sabiam que ele não havia frequentado nenhuma escola formal importante da época. Até mesmo os seus conterrâneos, após ouvir seus ensinamentos na sinagoga ficaram impressionados com relação à fonte dos conhecimentos de Jesus: “Todos na sinagoga olhavam-no, atentos [...]

testemunhavam a seu respeito, e admiravam-se das palavras cheias de graça que saíam de sua boca” (Lc 4,20,22). Logo, o que se conjectura é que Jesus tinha capacidade para ensinar, apesar, de lhe faltar o devido reconhecimento das escolas oficiais da época (GRENIER, 1998).

Em outros termos, a indução é que Jesus aprendeu primeiramente com os seus pais. Veja: “Escuta, meu filho, a disciplina do teu pai, não desprezes a instrução da tua mãe” (Pr 1,8), sob cujos ensinamentos “Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e diante dos homens” (Lc 2,52). Nessa direção, Wilson (1989, p.280) revela-nos que até hoje, uma criança de família tradicional judaica, quando faz uma oração pelos pais, ela se refere a eles dizendo: “meu pai, meu mestre; minha mãe, minha mestra”.

O conteúdo desses ensinos na visão de Lee (1988, p.123) não se refere a algo caracteristicamente cognitivo, embora também fosse, “mas é muito mais uma iniciação no mundo da significação”. E, Heschel (1953) complementa a ideia ao aduzir-nos que a proposta educativa para os judeus daquela época como hoje, é vista como ensino de adoração a Deus que é o princípio de toda a sabedoria. Nesse sentido, a proximidade entre um estudante e seu mestre, não era diferente da convivência entre pai e filho. Por isso, Jesus não teria ficado surpreso quando lhe foi apresentado o conteúdo do homem sábio: “Escutai, filhos, a instrução de um pai, ficai atentos para conhecerdes a inteligência” (Pr 4,1).

Entender as terminologias sabedoria e conhecimento a partir de suas origens é passo importante que favorece a interpretação dos princípios educativos em análise. No judaísmo, por exemplo, o sábio é aquele(a) que sabe fazer os serviços cotidianos e, por isso, torna-se pessoa habilidosa numa determinada atividade. Talvez, Jesus tenha pensado uma educação a partir da sabedoria popular porque suspeitava que as pessoas excluídas, notadamente, do ensino oficial judaico, podiam entender e aprender com maior facilidade, sendo que os ditados populares revelam com maior clareza o jeito de pensar e agir dos indivíduos no dia a dia.

E, ao analisar a atividade de Jesus, a reflexão que se faz é que seus pais considerando a cultura daquele tempo, de fato, contribuíram com seu ensino. Haja vista, os registros que os evangelhos nos apresentam quando Jesus exemplificava seus ensinamentos com explicações de cenas domésticas que deve ter

experimentado de perto. Para citar algumas, tem-se: Ele observou o grão moído (Lc 17,35), a preparação do pão (Lc 13,21), o reparo de roupas (Lc 5,36), o varrer a casa (Lc 15,8) e as candeias acesas (Lc 8,16; 15,8) (GRENIER, 1998).

Possivelmente, no contexto da redação do Evangelho de Lucas, Jesus agora formado, ao propor seu ensino a partir das experiências diárias, fortalecia a ideia de que as coisas externas ao ser humano eram supérfluas e que o importante era a busca da verdade para viverem a autonomia e o livre-arbítrio em sua práxis sociocultural e política. E ainda, que as aparências tão valorizadas pela sociedade dominante, eram meras ilusões que alienavam os sujeitos e, por isso, tolhiam o direito de viverem os fundamentos da virtude.

Talvez, por apreciar princípios contrários aos predeterminados pela sociedade judaica, Jesus é considerado um excluído em Israel e, por isso, não reconheça o modelo de educação oficial e busque alternativas contracorrentes através do uso de provérbios de iniciativa popular e, propõe um ensino que desalienasse as pessoas, notadamente, as que viviam nos entre-lugares sociais. Nessa premissa, a proposta de ensino de Jesus narrada em Lc 4,18-19 pode ser uma suspeição possível e que calhe à conjectura apresentada. Veja:

18O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção para evangelizar os pobres;

enviou-me para proclamar a liberação dos presos e aos cegos a recuperação da vista,

para restituir a liberdade aos oprimidos

19e para proclamar um ano de graça do Senhor.

Essas intenções constatam que Jesus se aproxima dos pobres, dos cativos e dos alienados. Não faz opção pela sociedade dos dominadores. Durante sua atividade educativa, ajuda os que vivem à margem dessa mesma sociedade, a entenderem os processos de liberdade, os valores sociais necessários, os processos de independência e a viverem suas próprias autonomias.

Ademais, e comparando os princípios de sabedoria enquanto dom de Deus e qualidade do homem, os intérpretes da Bíblia têm corroborado que a sabedoria enquanto algo sobrenatural ocorre através de um processo natural, que vai se revelando nos pensamentos que ajustam a vida dos sujeitos e, aqueles(as) que defendem a aquisição da sabedoria como condição apenas do ser humano, admitem

que só se adquire conhecimento através da experiência cotidiana. Logo, tanto uma como a outra, são unânimes em orientar a postura crítica a partir do cotidiano para se adquirir sabedoria.

Hoje, como já exposto no início desta seção, as transformações estruturais estão agindo nas identidades pessoais, desagregando o indivíduo em suas ideias fundantes sobre questões como “gênero, classe, etnia, nacionalidade” (HALL, 2006, p.9) entre outras. Talvez, esse movimento próprio da contemporaneidade, esteja desconstruindo a ideia que se tem dos seres humanos enquanto sujeitos holísticos. A suspeição é que as identidades das pessoas foram se colapsando a partir da ideia de homem/mulher que se teve desde o Século das Luzes, depois a ideia de um ser social e, por último, a concepção do sujeito contemporâneo. Inicialmente, os sujeitos eram reconhecidos como pessoa humana em sua sapiência, convicção e individualidade, posteriormente, surge a premissa do ‘eu’ e do ‘nós’. Talvez aqui esteja o início do colapso, porque o sujeito do iluminismo faz imbricagens com ambientes externos e, partir desse contato, inicia-se as diversas secessões práticas. O discurso do eu dissolve-se.

Essa nova realidade traz, igualmente, novas concepções que propõem novos princípios educativos para a contemporaneidade. E, é nesse cenário com sujeitos de identidades descentradas que o sistema de ensino da atualidade deve propor discussões sobre as novas ideias que surgem. Contudo, não há um receituário, há somente reflexões que devem nortear as ações dos professores(as) em um dado momento educativo. E, num contínuo movimento crítico sugerir a retroalimentação do processo de ensino promovendo fluxos de imbricagens permanentes. Pois, o que era já não é mais. E o tempo que surge é impactado, frequentemente, pelas novas ideias, pelas novas compreensões das coisas.

Além disso, e fazendo memória das ideias de Marx e Engels (1973) corroboradas por Bauman (2009), também narradas neste capítulo, a ideia de contemporaneidade traz consigo instabilidades socioculturais, políticas e econômicas que abalam o sistema educativo ocasionando incertezas provocadas pelo fluxo corrente das novidades. Assim, os princípios que surgem com a velocidade da transformação da sociedade contemporânea são, inicialmente, incógnitas, pois os

hábitos que surgem não se solidificam. Nessa lógica, as relações definidas são diluídas e todas as novas relações decaem antes de estabilizar-se.

Se desde os primórdios da humanidade acolheu-se o pensar criticamente nos princípios educativos para implementar um ensino de qualidade, agora, a sugestão é mais cogente ainda, pois, para Giddens (1990) os hábitos sociais são regularmente analisados e aperfeiçoados de acordo com as novas informações auferidas no dia a dia. E, por isso, as reflexividades observadas na contemporaneidade são mais densas do que em outros períodos analisados. No atual cenário, as relações sociais expedem-nos para diferentes caminhos com percepções em contínuo fluxo de deslocamento. Nesse viés, ensina-se um aluno(a) sem identidade firme, essencial ou inalterável.

Pensando nesses princípios, redefinir os papéis educativos entre pais e educadores(as) no atual contexto é temática que carece reflexão. Pois, do ponto de vista pedagógico, é sugestivo que os pais sejam os primeiros educadores(as) dos filhos(as). No entanto, tanto pais, filhos(as)/alunos(as) como os professores(as) estão com identidades descentradas e, por isso, cada dia são transformados(as) em seus modos de compreender e agir no mundo. É também frequente na atual conjuntura o número crescente de famílias que optam por entregar seus filhos(as) à escola, e/ou aos conselhos tutelares para que os mesmos os(as) ensinem/eduquem, e elas exercendo a liberdade individual, sugerida pela mentalidade líquida, possam escolher uma vida livre sem maiores compromissos (AMADO, 2009).

Essa realidade sugere conexões importantes entre professor(a), aluno(a) e comunidade escolar. Pois, essa imbricagem racional entre os atores(as) educativos pode favorecer novos conhecimentos e, consequente, conscientização dos envolvidos(as) na aprendizagem, porque se trata de procedimentos que podem libertar o sistema educativo em suas nuanças e, por conseguinte, preconizar um processo dialógico que viabilize novas posturas tanto das famílias como de educadores(as).

E, para implementar tais ideias, o professor(a) contemporâneo precisa de autonomia no olhar. Posturas inquietantes de alternativas fora do trilho dogmático sempre imposto pela educação dominante através do contato com outros princípios, outras reflexões que favoreçam um ambiente de indagações entre aluno(a) e

professor(a). Por isso, a proposta da pedagogia de Jesus como inspiração para a educação na atualidade.

Por fim, e em se tratando de princípios educativos é discussão que não se esgota por aqui, pois, há uma infinidade de novas ideais, novos princípios que surgem a cada instante. Decerto, o presente texto cessa com defasagem, visto a velocidade das novidades atribuídas pela sociedade contemporânea.

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