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Educação Profissional para Pessoas com Deficiência

3.1 CRIAÇÃO DOS INSTITUTOS FEDERAIS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO

3.1.1 Educação Profissional para Pessoas com Deficiência

A Educação Profissional de pessoas com deficiência, no Brasil, ocorreu na segunda metade do século XIX, com a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, e do Imperial Instituto dos Meninos Surdos, em 1857, respectivamente denominados, na atualidade, de Instituto Benjamin Constant (IBC) e Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). No antigo Imperial Instituto dos Meninos Cegos, além da educação formal, o aluno com deficiência, segundo suas capacidades individuais, recebia, em oficinas voltadas basicamente para o exercício manual, o treinamento para atividades profissionais elementares, tais como a confecção de vassouras e de objetos de vimes, empalhação, colchoaria, estofaria, encadernação e afinação de piano. No Imperial Instituto dos Meninos Surdos, cuja finalidade consistia na educação literária, o aprendizado profissional, também de caráter manual, era destinado ao ofício da encadernação e da sapataria (COUTINHO, 2002).

A formação profissional oferecida nessas Instituições, desvinculada do sistema formal de ensino, tinha cunho assistencialista, pois se caracterizava por um ensino destinado aos menos favorecidos socialmente, com vagas gratuitas limitadas a um número reduzido de aprendizes, em especial meninos comprovadamente carentes, mas tornando-se ilimitadas para aqueles que pudessem pagar (JANUZZI, 2004). Posteriormente, de acordo com a referida autora, no início do século XX, com a constituição de uma rede de escolas profissionalizantes, a Educação Profissional passou a ser regulamentada, mas os cursos oferecidos pelo IBC e pelo INES não foram equiparados aos cursos profissionalizantes do sistema regular de ensino, excluindo-se, dessa forma, as pessoas com deficiência da formação para o trabalho.

Sobre isso, Januzzi (2004) destaca que as Escolas de Artífices e Aprendizes (cf. subseção 3.1), ainda que destinadas, preferencialmente, aos desfavorecidos socialmente, não admitiam aqueles que apresentassem deficiências que os inabilitassem para o aprendizado do ofício. Esse critério de seleção foi definido no Decreto nº. 7.566, 23 de setembro de 1909, confirmando-se, nos decretos n.os 9.070, de 25 de outubro de 1911, e 13.064, de 12 de junho de 1918, que “a condição de não possuir defeito para ser admitido no curso deveria ser comprovada com certidões e atestados emitidos por autoridades competentes” (SILVA, 2011, p. 29). O conceito de incapacitado, inicialmente, era fixado pelos médicos, passando, em seguida, a ser definido pelos psicólogos, ao indivíduo com defeitos físicos, o que acabava por levar à sua exclusão do acesso à escola ou à garantia de acesso apenas em espaços restritos.

No ano de 1935, foi fundado, em Belo Horizonte, o Instituto Pestalozzi, composto de vários departamentos, dentre os quais o Centro de Orientação Profissional para aquelas pessoas consideradas como anormais e deficientes, de acordo com os padrões da época. Esse Centro, enquanto responsável pela identificação e capacidades profissionais dessas pessoas, desenvolvia cursos iniciais de profissionalização em “jardinagem, tecelagem, cartonagem, marcenaria, sapataria, serviços domésticos” (CASSEMIRO, 1996, apud SILVA, 2011, p. 36). Diante da demanda por esse tipo de atendimento, que se destinava igualmente aos menores desajustados, a Sociedade Pestalozzi planejou uma oficina pedagógica e produtiva no formato de uma granja, construída em área rural, com a finalidade de preparar esses menores e as crianças tidas como excepcionais para o trabalho, além de se constituir um espaço para tal.

Nesse contexto, o trabalho era considerado como meio de estimular o desenvolvimento mental e a adaptação das crianças com deficiência, assim como os menores desajustados, à sociedade. A formação profissional era vista, portanto, sob a perspectiva terapêutica, como parte de um processo clínico de reabilitação moral e física. Mais adiante, em 1942, com a reforma introduzida pelas leis orgânicas de ensino, os cursos de formação profissional, incluídos no sistema educacional, tinham como proposta capacitar o aluno para o setor agrícola, industrial, comercial e a formação de professores. Mas, a exemplo do que ocorreu nas Escolas de Aprendizes e Artífices, no que se refere a barrar o acesso das pessoas com deficiência, foram ampliados os critérios seletivos, passando a se “excluir a priori aqueles considerados incapacitados física e/ou mentalmente para o desenvolvimento de trabalhos escolares em todos os níveis e modalidades do ensino profissional” (SILVA, 2011, p. 39). Os critérios voltados à Educação Profissional eram apresentados da seguinte forma:

 As leis orgânicas do ensino industrial e do ensino agrícola estabelecem como critério para admissão do aluno aos cursos dessas áreas profissionais a capacidade física e aptidão mental para os trabalhos escolares que devem ser realizados.

 A lei orgânica do ensino comercial exige para a admissão ao curso, a comprovação, por meio de exames, da aptidão intelectual do aluno para os estudos a serem feitos.

 A lei orgânica do ensino normal estabelece como critério para acesso aos cursos, além da sanidade física e mental, a ausência de defeito físico ou distúrbio funcional que contraindique o exercício da função docente (SILVA, 2011, p- 39-40).

Desse modo, o aluno com deficiência, considerado aprioristicamente como incapacitado físico e/ou intelectual, era excluído dessa modalidade de ensino pela própria legislação educacional. Todavia, na década de 50, a Organização Internacional do Trabalho

(OIT) recomenda a adaptação e readaptação profissional dos inválidos (termo atribuído aos indivíduos cujas possibilidades de obter e reter emprego adequado foram substancialmente reduzidas devido a uma diminuição na sua capacidade física ou mental). De acordo com o referido documento a formação desses indivíduos deveria seguir os “princípios e métodos de orientação vocacional, treinamento profissional e a colocação no mercado do trabalho” (DAKUZAKU, 2004, p. 43), formação esta a ser desenvolvida junto com os outros trabalhadores e nas mesmas condições, desde que fossem viáveis em observâncias às suas condições médicas e pedagógicas. Mas, no Brasil, a regulamentação desses trabalhos de reabilitação mostrou-se inútil no que se refere ao desenvolvimento de atividades capazes de integrar o indivíduo com deficiência ao mercado formal de trabalho, sendo-lhe reservada, quando muito, a assistência e a educação por meio da institucionalização.

Nesse sentido, com a organização da Educação Especial como um ramo paralelo ao ensino regular, na década de 50, sob a responsabilidade de organizações da sociedade civil, surgem as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), assim eram denominadas as pessoas com deficiência, as quais recebiam, nessas associações, atendimento na área de educação, no âmbito de programas de reabilitação que, dentre outras ações, desenvolviam atividades de treinamento profissional, incrementadas através de oficinas. Como um projeto experimental, a APAE fundou, em 1958, no Rio de Janeiro, o Centro de Aprendizagem Ocupacional “com o objetivo de desenvolver atividades de carpintaria com cinco adolescentes excepcionais” (SILVA, 2011, p. 41). Além de educar para o trabalho, a instituição garantia, ao mesmo tempo, o emprego por meio de seus centros de colocação.

A ideia para a criação das chamadas oficinas pedagógicas pré-profissionalizantes ou profissionalizantes, de acordo com Aranha (2001), era oferecer às pessoas com deficiência uma possibilidade de adquirir hábitos coerentes com o trabalho, antes mesmo de adquirir alguma capacitação específica. Na ocorrência de dificuldade em atingir esse objetivo pretendido pela oficina, fosse pela falta de potencial ou pelo limite de aprendizado situar-se abaixo do que exigia o mercado de trabalho, foram instituídas as oficinas abrigadas ou protegidas. Nelas, o processo de preparação para o trabalho contribuía para a segregação da pessoa com deficiência, em razão das poucas relações ali estabelecidas, o que implicava em sua reduzida participação na vida da comunidade. Assim, mesmo que chegasse ao mercado de trabalho tecnicamente capacitado, nas palavras de Glat (1998, p. 98), socialmente esse indivíduo era “um estrangeiro”.

A partir de uma nova perspectiva de educação, ao lado dos programas de caráter terapêutico e assistencial desenvolvidos por meio das citadas oficinas, uma formação

instrumental foi oferecida com o objetivo de conduzir o indivíduo com deficiência para desempenhar determinadas atividades no mercado de trabalho (JANUZZI, 2004). Na década de 90, o conceito de inclusão passou a ser utilizado nas políticas de Educação Profissional, contemplando as pessoas com deficiência através de programas como o Plano Nacional de Educação Profissional (PLANFOR), realizado em parceria com organizações governamentais e não governamentais especializadas, além de outras instituições como os CEFET’s, atualmente Institutos Federais de Ensino Profissional e Tecnológico.