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3 TRABALHAR PARA O BEM PENSAR, EIS O COMPROMISSO ÉTICO DA

3.2 Educação e Reforma do Pensamento

No livro A Cabeça Bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento, Morin (2006) dedica-se ao tema da educação e do ensino, convencido da necessidade de uma reforma do pensamento, logo de uma reforma do ensino. O autor, mais uma vez, desliza entre dois termos formando um conceito híbrido. Do conceito educação e do conceito ensino ele elabora o conceito-híbrido “ensino educativo”. Isso porque, não lhe agrada apresentar os conceitos dos dois termos separadamente, como esclarece nesta passagem:

‘Educação’ é uma palavra forte: ‘Utilização de meios que permitem assegurar a formação e o desenvolvimento de um ser humano; esses próprios meios’. O termo ‘formação, com suas conotações de modelagem e conformação, tem o defeito de ignorar que a missão do didatismo é encorajar o autodidatismo, despertando, provocando, favorecendo a autonomia do espírito. [...] O ‘ensino’, arte ou ação de transmitir os conhecimentos a um aluno, de modo que ele os compreenda e assimile, tem um sentido mais restrito, porque apenas cognitivo (MORIN, 2006, p. 10-11).

O autor entende que a palavra educação comporta, simultaneamente, excesso e carência, ao tomar para si a totalidade que permite a formação e o desenvolvimento de um ser

humano, bem como que há insuficiência no conceito de ensino como a ação cognitiva de transmissão e compreensão de conhecimentos. Para amenizar as carências encontradas nos dois termos Morin (2006, p. 11) tem em mente um ensino educativo no qual “a missão desse ensino é transmitir não o mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa condição e nos ajude a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre”. Sobretudo, fica claro que o autor considera que a educação pode ajudar a tornar melhor cada um de nós, talvez até mais felizes.

No entanto, Morin (2006) denuncia que o sistema de ensino que adotou o modelo de desenvolvimento disciplinar das ciências na organização do conhecimento escolar torna impossível a compreensão do complexo, daquilo “que é tecido junto”. O conhecimento, conforme Morin (2006, p. 24), “[...] constitui, ao mesmo tempo, uma tradução e uma reconstrução, a partir de sinais, signos, símbolos, sob a forma de representações, idéias, teorias, discursos”. E sua organização se dá em função de princípios e regras estabelecidas, comportando operações, ora de ligação, ora de separação; de análise e de síntese.

Sabemos que o ensino tem privilegiado a organização disciplinar do conhecimento pautando-se sob os princípios de separação e análise, suprimindo os princípios de ligação e síntese. A disciplina escolar é caracterizada, em Petraglia (2008, p. 38), como um “[...] conjunto específico de conhecimentos com suas próprias características sobre o plano de ensino, da formação dos mecanismos, dos métodos, das matérias”. A organização do conhecimento com essas características tem por intenção a redução, a fragmentação e a simplificação do saber, muito presente no campo da ciência. No âmbito escolar, tal condição promove a perda da capacidade do aluno em pensar de forma contextualizada integrando os saberes. Isso porque, segundo Morin (2006, p. 15):

Na escola primária nos ensinam a isolar os objetos (de seu meio ambiente), a separar as disciplinas (em vez de reconhecer suas correlações), a dissociar os problemas, em vez de reunir e integrar. Obrigam-nos a reduzir o complexo ao simples, isto é, a separar o que está ligado; a decompor, e não a recompor; e a eliminar tudo que causa desordens ou contradições em nosso entendimento.

Essa organização constitui uma educação que tem como característica a transmissão do conteúdo para o aluno. A educação escolar assumiu, como modelo de educação, a transmissão e assimilação dos saberes e informações de cada disciplina. Ademais, sendo as informações parcelas dispersas de saber, necessita-se de um conhecimento para organizar, relacionar e contextualizar os saberes e informações. No entanto, a organização do conhecimento escolar em disciplinas não consegue contemplar a imensa quantidade de

saberes em cada especialidade e muito menos consegue fazer com que o estudante integre o conhecimento na compreensão e na condução da sua vida. Tem-se, assim, o que o autor vai denominar de estudante ‘cabeça cheia’.

A primeira finalidade do ensino foi formulada por Montaigne: mais vale uma cabeça bem-feita que bem cheia. O significado de ‘uma cabeça bem cheia’ é óbvio: é uma cabeça onde o saber é acumulado, empilhado, e não dispõe de um princípio de seleção e organização que lhe dê sentido. ‘Uma cabeça bem-feita’ significa que, em vez de acumular o saber, é mais importante dispor ao mesmo tempo de: uma aptidão geral para colocar e tratar os problemas; princípios organizadores que permitam ligar os saberes e lhes dar sentido (MORIN, 2006, p. 21).

O conhecimento fragmentado nas disciplinas escolares imprime, na mente dos estudantes, um pensamento demasiado técnico-instrumental, conduzindo inevitavelmente à redução e à limitação da compreensão. É por isso que, segundo Morin, “devemos, pois, pensar o problema do ensino, considerando, por um lado, os efeitos cada vez mais graves da compartimentação dos saberes e da incapacidade de articulá-los, uns aos outros; por outro lado, considerando que a aptidão para contextualizar e integrar é uma qualidade fundamental da mente humana, que precisa ser desenvolvida, e não atrofiada” (2006, p. 16). É justamente esse pensamento, da necessidade do desenvolvimento da aptidão da mente para contextualizar, para pensar complexo, que Morin (2006, p. 24; grifos do autor) toma como imperativo da educação “[...] o desenvolvimento da aptidão para contextualizar e globalizar os saberes torna-se um imperativo da educação”.

O desenvolvimento da aptidão da mente para contextualizar aspira à promoção de um pensamento ecologizante. O termo ecologizante é utilizado pelo autor para marcar o laço que o conhecimento deve manter com o seu lugar, com o seu contexto. O pensamento ecologizante é, assim, entendido por Morin (2006, p. 25):

[...] no sentido em que situa todo acontecimento, informação ou conhecimento em relação de inseparabilidade com seu meio ambiente – cultural, econômico, político e, é claro, natural. Não só a situar um acontecimento em seu contexto, mas também incita a perceber como este o modifica ou explica de outra maneira. Um tal pensamento torna-se, inevitavelmente, um pensamento do complexo, pois não basta inscrever todas as coisas os acontecimentos em um ‘quadro’ ou uma ‘perspectiva’. Trata-se de procurar sempre as relações e inter-retro-ações entre cada fenômeno e seu contexto, as relações de reciprocidade todo/partes: como uma modificação local repercute sobre o todo e como uma modificação do todo repercute sobre as partes.

Para enfrentar o desafio da educação disciplinar, o autor não propõe uma medida simples e imediata de romper com as fronteiras entre as disciplinas, tanto científicas, quanto escolares. O que Morin (2006) propõe é que sejam estabelecidos princípios organizadores do

conhecimento que superem as barreiras entre as disciplinas. Para isso, ele propõe a reforma do pensamento que consiste em agregar e articular os operadores cognitivos do pensamento complexo no cérebro humano: dialógico, recursivo, hologramático. De fato, o que o autor propõe é a substituição de um pensamento que isola (disjuntivo) e separa (redutor) por um pensamento que distingue e une, ou seja, por um pensamento complexo.

Há, efetivamente, necessidade de um pensamento:

- que compreenda que o conhecimento das partes depende do conhecimento do todo e que o conhecimento do todo depende do conhecimento das partes;

- que reconheça e examine os fenômenos multidimensionais, em vez de isolar, de maneira mutiladora, cada uma de suas dimensões;

- que reconheça e trate as realidades, que são, concomitantemente solidárias e conflituosas (como a própria democracia, sistema que se alimenta de antagonismos e ao mesmo tempo os regula);

- que respeite a diferença, enquanto reconhece a unicidade (MORIN, 2006, p. 88- 89).

O autor apresenta, como hipótese para superar a fragmentação do saber, a reforma de pensamento, sustentada pela teoria da complexidade, visando à religação dos saberes num conhecimento em movimento: “[...] um conhecimento em vaivém, que progride indo das partes ao todo e do todo às partes” (MORIN, 2006, p. 116). Sem negar a importância do conhecimento disciplinar, para o autor os complexos de inter-multi-trans-disciplinaridade são importantes para realizar o movimento necessário à reforma do pensamento, pois nesses conceitos está imbricada a noção-chave de cooperação entre conhecimentos. O importante é conservar a ideia de um conhecimento em cooperação, aberto e em movimento. Ainda, conforme Morin (2006, p.115). “devemos ‘ecologizar’ as disciplinas, isto é, levar em conta tudo que lhes é contextual, inclusive as condições culturais e sociais, ou seja, ver em que meio elas nascem, levantam problemas, ficam esclerosadas e transformam-se”.

O ‘ensino-educativo’ promovido pela escola precisa potencializar, nos jovens, aptidões mentais para eles, segundo Almeida (2008, p. 129), “[...] saber pensar bem para enfrentar e conviver com os enormes problemas e desafios colocados hoje nos níveis locais e globais”. Espera-se que, principalmente, pela aprendizagem da condição humana e pela aprendizagem do autoconhecimento e da autoanálise, tal empreendimento possa resultar em sujeitos com atitudes mais éticas em relação ao mundo e a si mesmo.

Precisamos, pois, unir os saberes formativos, que são fundamentalmente éticos, aos técnicos e culturais, para que possamos aprender a condição humana. Trata-se de estabelecer uma nova aliança entra cultura científica e cultura humanística. Vale destacar ainda que, se somos seres biológicos e culturais, aprenderemos sobre nós mesmos quando situados em nosso universo cultural. Somos produtos e produtores

dessa cultura. E essa relação auto-eco-organizadora deve contribuir para que aflore uma consciência ética e reflexiva de pertencimento à espécie humana, como também a consciência de uma cidadania, que é planetária (PETRAGLIA, 2008, p. 43).

O saber de que a ética precisa é um saber aberto, capaz de gerar um pensamento que concilie a reflexão sobre o macrossocial e as escolhas pessoais. Essa razão aberta se dá pela aprendizagem do saber pensar para além da racionalidade e da racionalização, numa razão crítica e autocrítica. “Torna-se necessário saber ver, saber pensar além da racionalidade e da racionalização que tomaram conta do desenvolvimento científico e do pensamento ocidentais” (LIMENA, 2008, p. 16). É necessário saber ver e saber pensar com o pensamento complexo, aberto e solidário.

3. 3 O Imperativo Ético da Educação

Sabemos que a crise gerada no interior das ciências ultrapassa as epistemologias tradicionais, que operam no paradigma da simplificação, contestando as certezas do conhecimento. Para Morin, instaura-se, assim, no centro da discussão científica, a questão da incerteza do real, da história, do conhecimento, pois, como lembra Martinazzo (2002, p. 22), a própria realidade “[...] se apresenta sempre em novo estágio de evolução/involução”, exigindo que o conhecimento sempre esteja aberto à renovação. Por isso, entende-se que o conhecimento precisa abrir-se à incerteza, à transitoriedade e à inconclusão do real complexo. E, como recomenda Morin, (2007b, p. 16), para enfrentar as incertezas, “é preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certezas”. Para tanto, é necessário estar com o pensamento em alerta.

Com o abandono das concepções deterministas do real e do conhecimento, que instaura a crise dos fundamentos da certeza e a constatação de que não se pode mais recorrer ao real como garantia de validação do conhecimento, entram em crise os fundamentos da sociedade contemporânea. Como caminho para sair dessa crise, o autor aposta na reforma do pensamento, na necessidade de repensar o pensamento e preparar as mentes pra enfrentar a incerteza. Para tanto, torna-se necessário à escola ensinar um conhecimento que capacite o estudante a navegar nesse oceano de incertezas, conforme Morin (2009, p. 218): “É isto que é preciso ensinar: acordar para as incertezas e saber afrontá-las, saber modificar o desenvolvimento das acções em função do desenvolvimento das situações. Antes de mais, devemos ensinar a esperar o inesperado. De seguida, ensinar os princípios de estratégia que permitem afrontar os acasos, o inesperado, o incerto”.

Nesta perspectiva, salienta o autor, torna-se imperativo repensar a educação escolar. As práticas educativas realizadas pela escola, de transmissão e acumulação de saberes como meio de conhecer o mundo, esgotaram-se diante da nova conjuntura civilizacional, da iminente eminência da planetarização da humanidade. Esse modelo de educação que aborda o conhecimento de forma simplificada, fragmentado em disciplinas, impede a compreensão do todo do mundo, pois fragmenta a realidade. A divisão do conhecimento e a separação sujeito- objeto produziram uma educação escolar de caráter conteudista, com o predomínio de um ensino quantitativo, marcado pela quantidade de informações nos conteúdos transmitidos/assimilados, na prática educativa. Assim, essa educação caracteriza-se pela compartimentação de saberes, pelo ensino fragmentado, que não estabelece relação, promovendo um pensamento que só separa e simplifica o complexo do mundo, um pensar alienado, devido à incapacidade de articulação e contextualização da mente.

Desta forma, é possível afirmar que as práticas educativas da atual educação escolar não proporcionam a constituição das disposições mentais necessárias para a compreensão, contextualização e globalização. No entanto, são exatamente essas as competências necessárias para o cidadão do mundo planetário que a escola necessita implantar e potencializar em sua prática educativa. O elo recorrente que o autor estabelece entre desenvolvimento da compreensão e educação fica evidente quando Morin (2007b, p. 104) prescreve esta recomendação: “Dada a importância da educação para a compreensão, em todos os níveis educativos e em todas as idades, o desenvolvimento da compreensão necessita da reforma planetária das mentalidades; esta deve ser a tarefa da educação do futuro”.

A fragmentação do conhecimento em disciplinas desconexas não contempla, portanto, a visão complexa do mundo por fragmentar o conhecimento que se deve ter deste mundo. Em contrapartida, as exigências postas pela planetarização da humanidade, pelo reconhecimento da complexidade do mundo, exigem que a escola realize uma reforma educativa para reformar o pensamento, contemplando, assim, a multidimensionalidade do conhecimento.

Portanto, é compromisso ético da escola desenvolver o pensamento complexo, a partir de princípios cognitivos de interpretação da complexidade do real. Tais disposições mentais - de interpretação, percepção, contextualização - possibilitam ao pensamento enfrentar a complexidade e a incerteza do mundo. Neste sentido, entende-se que o compromisso ético da escola é enriquecer a formação dos cidadãos, afim de que possam compreender a complexidade do mundo e atuar neste mundo de forma consciente e ética. Por isso, a escola precisa assumir o compromisso com a reforma do pensamento para que os estudantes possam pensar complexamente os desafios éticos planetários.

Podemos, então, depreender do pensamento de Edgar Morin que o objetivo da educação consiste em, por meio de aprendizagens de conhecimentos pertinentes, o homem aprender a pensar bem, apropriando-se plenamente do patrimônio cultural da humanidade e, assim, compreender o mundo e viver nele de forma mais consciente, atuando com princípios éticos pautados na solidariedade. Como destaca Morin (2003b, p.97), ”um modo de pensar, capaz de unir e solidarizar conhecimentos separados, é capaz de se desdobrar em uma ética da união e da solidariedade entre os humanos”. Deste modo, para dar conta da planetarização da humanidade, são necessárias a reforma do pensamento e a emergência de uma ética pautada na solidariedade e na responsabilidade, para despertar a humanidade da humanidade, uma verdadeira civilização humana.

Assim, a dimensão ética da educação, de acordo com o pensamento complexo e, sobretudo, com Edgar Morin, é organizar um ensino-educativo, tendo por finalidade o pensar bem para o agir bem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ética resignificada na complexidade é denominada de ‘ética do gênero humano’, esta, por sua vez, não é uma ingênua novidade na denominação do conceito, ela implica numa radical re-interpretação da ética pela ótica da complexidade. A ética do gênero humano é a antropoética, que considera a complexidade inerente à condição humana, a inseparabilidade da tríade indivíduo/espécie/sociedade. A ética inaugurada sob a complexidade reconhece o pertencimento simultâneo do humano às três instâncias da condição humana: é indivíduo, membro de uma sociedade e pertencente a uma espécie. As três instâncias são totalmente inseparáveis e estão recursivamente incluídas umas nas outras, uma contendo a outra e vice- versa. Assim, a espécie está no indivíduo que está na espécie; o indivíduo está na sociedade que está no indivíduo.

Tendo esta compreensão Morin entende que há três imperativos éticos que precisam ser considerados: a ética pessoal, social e planetária. Por estes serem complementares, mas também antagônicos, pode-se escolher provisoriamente entre uma e outra, então se pode dar preferência a uma ética pessoal, de pessoa a pessoa, em detrimento da ética social ou planetária. Mas seu caráter de complementaridade assegura que depois se reencontre a trindade ética, pois, tudo se revela interdependente e complementar. A ética nesta interpretação é ligação, liga o indivíduo à espécie e à sociedade, mas é também aposta provisória e incerta. E a consciência da incerteza, da provisoriedade, da contingência e da trindade ética é condição necessária para realizar a antropoética.

Todavia, a consciência da antropoética possibilita o desenvolvimento do sentimento de pertencimento à comunidade planetária. Este sentimento de comunidade planetária emerge da nova forma de sociedade posta pela consciência da comunidade de origem e de destino do Planeta Terra. A sociedade de âmbito planetário regenera a noção de humanidade constituindo uma cidadania terrestre que exige um outro pensar e agir nesta sociedade planetarizada. Essas

questões que aparecem com a nova conjuntura da sociedade em âmbito planetário complexificam a compreensão simplificada e linear de sociedade que historicamente foi consolidada.

Edgar Morin aponta a necessidade de um conhecimento que leve a pensar e, sobretudo, agir na sociedade complexa. Para ele, cultivar este conhecimento constitui-se no grande desafio posto à educação escolar. O autor sugere como caminho para este desafio a necessidade de reformar o pensamento. A sua proposição é produzir um pensamento capaz de dar conta da diversidade da condição humana e da complexidade do mundo, abarcando a multidimensionalidade dos saberes, ligando os conhecimentos, potencializando assim, a compreensão e a realização de ações solidárias.

Morin destaca também, a necessidade de se continuar repensando as racionalidades e as supostas certezas e verdades que sustentam e legitimam o processo educacional. Há, sem dúvida, a necessidade de um pensamento capaz de lançar um outro olhar mais aberto, plural e multidimensional para toda e qualquer realidade biológica e/ou sociocultural podendo compreender as múltiplas e complexas dimensões que as caracterizam e perpassam. O mundo como um fenômeno complexo, multidimensional, contraditório e globalizado precisa ser compreendido por meio de um pensamento que contemple essa complexidade. Sem dúvida, o pensamento complexo, conforme proposição de Morin pode dar conta deste empreendimento.

A reforma do pensamento promovida pela complexidade consiste em constituir na mentalidade as disposições mentais para o pensar complexo. Como já bem destacado no texto essas disposições mentais são promovidas pelos princípios do pensamento complexo destacando-se o princípio dialógico, o princípio hologramático e o princípio do elo recorrente. Esses princípios possibilitam o desenvolvimento das competências necessárias ao pensar bem, à contextualização, à compreensão e à globalização.

A reforma do pensamento e o surgimento do pensamento complexo, sobretudo, se fazem urgente dada a necessidade de desenvolver a compreensão. A compreensão é apontada pelo autor como o elo que liga a ética à cognição. No seu entendimento o pensamento complexo potencializaria a ampliação e a complexificação da compreensão alargando o juízo intelectual e o julgamento moral.

A esperança de Morin é que a reforma do pensamento necessária à emergência da cidadania planetária e à antropoética possam se concretizar pela educação escolar. Para a escola realizar estas reformas, segundo seu ponto de vista, seria impreterível ela repensar a organização dos conhecimentos escolares no sentido de que as áreas do conhecimento pudessem dialogar e realizar a tarefa educativa, apresentar o conhecimento que se tem sobre o

mundo em toda sua complexidade e desencadear, assim, um projeto de regeneração humanista regido pelas ideias de complexidade.

A educação escolar precisa levar em conta a forma complexa de organização do conhecimento capaz de promover a produção de conhecimentos pertinentes, em que docentes e discentes desenvolvam a competência de situar-se e compreender-se no universo onde vivem aprendendo a conviver e atuar num mundo com características planetárias.

Portanto, a reforma do pensamento e a emergência da cidadania planetária estão num elo recorrente com a consolidação de uma ética propriamente humana, ou seja, uma ética que emerge da consciência de pertencimento à espécie humana e à sociedade. Esta antropoética é alcançada quando assumida a condição humana de indivíduo/espécie/sociedade, principalmente pelo equilíbrio dos três termos desta relação. Assim, esta pesquisa teve como objetivo trazer para o campo da educação a discussão quanto a tomada de consciência da necessidade da emergência da antropoética, por meio de práticas educativas que ensinem a condição humana, a identidade terrena e o desenvolvimento da compreensão, promovendo a reforma do pensamento e da cidadania planetária.

Para Edgar Morin a educação tem como função contribuir para a formação da cabeça bem-feita que realize o pensar bem, um pensar aberto, que compreende e solidariza. O pensar bem se constitui por meio de aprendizagens pertinentes que possibilitam ao homem compreender o mundo para viver, no mundo interior e social, de forma mais consciente, atuando com princípios éticos pautados na compreensão e na solidariedade.

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