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PARTE 1 – CONTEXTUALIZANDO A GÊNESE DA PROPOSTA DE OFERTA DAS LICENCIATURAS INTERDISCIPLINARES NA UFMA

2. A UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO: um percurso de endividamento delineador da demanda de inclusão social

2.1 Educação Superior e formação de professore(a)s no Maranhão: algumas aproximações

históricas

A reflexão sobre as LI, como novas modalidades de licenciatura oferecidas no contexto de expansão da UFMA demanda, de antemão, algumas considerações sobre esse curso. Sendo uma das modalidades de graduação na Educação Superior, juntamente com o Bacharelado, sua particularidade se refere à formação para o magistério de disciplinas específicas para a atuação em nível médio (ou secundário conforme denominação mais remota).

No Brasil, tem aparecimento tardio, somente na década de 30 do século passado, a reboque do bacharelado, uma vez que tinha a função de conceder “licença magistral” ao(à)s portadore(a)s de “licença cultural” adquirida mediante a conclusão de um curso de formação científica em determinada especialidade (TANURI, 2003).

Tardio porque, na realidade, por um período bastante longo, o Brasil não contou com instituições de Educação Superior, limitando as iniciativas em sentido aproximado aos Seminários Teológicos e aos Colégios de educação jesuíta. Tendo em vista a formação das elites, em geral, para fins de governo, cursos de Filosofia e Teologia eram neles desenvolvidos mediante um currículo que privilegiava a “moral e os bons costumes” (MILANESI, 1998). Destarte, após a invasão portuguesa, no início do século XVI, foram necessários três séculos para que as primeiras instituições culturais e científicas de Educação Superior fossem criadas.

Tal realidade é decorrente do colonialismo que colocava o país numa posição de dependência aos desígnios da metrópole portuguesa, tais como: acumulação de riquezas à custa da exploração mediante o extrativismo, monopólio comercial e pacto colonial. No entanto, é uma situação com suas peculiaridades visto que a Espanha, que também empreendeu um processo de colonização baseado na exploração, fundou instituições de Educação Superior em alguns países sob sua possessão. Um caso ilustrativo é o México que, logo no início do período colonial, em 1553, teve sua primeira universidade institucionalizada. Sem falar nos territórios colonizados pela Inglaterra, que do mesmo modo tiveram acesso a esse nível de ensino ainda no período colonial. Decerto, isso se deve às características do processo colonizador desses países.

Quiçá o Maranhão teria uma outra história caso o desfecho para as disputas entre ingleses, franceses e holandeses pelo domínio de exploração de suas riquezas e ocupação de seu território fosse diferente. Desconsiderando-se as polêmicas acerca da fundação de sua capital (LACROIX, 2008), mais comumente imputada aos franceses, poderíamos ter outra história da educação e, em particular, da Educação Superior, caso os portugueses não os tivessem vencido, tomando por base as iniciativas desses países em relação às colônias por eles instituídas.

Todavia, o fato de não ter instituído a Educação Superior no país não significa que os filhos das elites portuguesas, nascidos no Brasil, ficassem sem frequentar cursos de formação profissional superior. De acordo com Teixeira (1989), a Universidade de Coimbra recebeu mais de dois mil estudantes nos cursos de Direito, Medicina e Filosofia, além de Teologia. É oportuno mencionar a análise de Oliven (2002, p. 24)

Essa universidade, confiada à Ordem Jesuítica, no século XVI, tinha, como uma de suas missões, a unificação cultural do Império português. Dentro do espírito da Contra-Reforma, ela acolhia os filhos da elite portuguesa que nasciam nas colônias, visando a desenvolver uma homogeneidade cultural avessa a questionamentos à fé Católica e à superioridade da Metrópole em relação à Colônia.

Segundo Meireles (1994), na região que, atualmente, compreende o estado do Maranhão, os governantes deixaram a educação a cargo das ordens religiosas, sendo que, nesse nível de ensino, se sobrepuseram jesuítas e carmelitas. Durante o período colonial dois colégios estavam autorizados pelo Papado a conferir doutoramento: o Colégio dos Jesuítas (Nossa Senhora da Luz), criado ainda no século XVII, e o Colégio da Madre Deus, construído no século seguinte, ambos com o principal propósito de formação para o sacerdócio. Quanto às demais formações, apenas tinham acesso os filhos da elite maranhense, enviados para estudos fora da província, de preferência em Coimbra ou Évora, manifestando-se, portanto, uma subordinação

para além de econômica, mas também cultural e religiosa, à metrópole, assim como o caráter elitista e excludente que vai se constituir uma das características da Educação Superior desse estado da federação.

No País, não obstante algumas solicitações de criação de universidades, durante todo o período colonial, assim como no período imperial e até início da República, o que se testemunhou foi a dependência da metrópole quando se tratava do acesso a níveis mais elevados de ensino, o que revela, além do caráter elitista, o intento de preservação dos valores portugueses.

Como referencial analítico dessa realidade, diversas proposições têm sido formuladas, das quais destacamos Bourdieu (2013) que questiona a ideologia da ‘escola libertadora’ e argumenta que o sistema escolar é um dos fatores mais eficazes de conservação social, utilizado pelas classes mais favorecidas para monopolizar a “[...] manipulação dos bens culturais e dos signos institucionais de salvação cultural” (p. 72).

Dessa forma, como resposta aos anseios da população local, entraram em cena as soluções compensatórias ou substitutivas (TEIXEIRA, 1989), algo que vai se perpetuar nas políticas educacionais brasileiras.

Com a vinda da família real, no início do século XIX, mudanças significativas ocorreram, tanto no campo econômico e político, quanto no educacional. As primeiras instituições de Educação Superior foram fundadas para atender às elites vindouras, em detrimento da garantia da educação básica, com cobertura bastante pequena. Há de se ressaltar que essa oferta efetivou-se por meio de cursos isolados e profissionalizantes nas áreas de Medicina, Engenharia, Direito e Agricultura. Também foram criadas a Academia Real da Marinha, no Rio de Janeiro, em 1808, e a Academia Real Militar, em 1810.

Não obstante as alterações no quadro desse nível de ensino, é preciso sublinhar a não preponderância de um papel propriamente formativo dos cursos e, sim, um viés imediatista, pautado no pragmatismo (FÁVERO, 1977), tendo em vista o atendimento dos interesses da elite portuguesa em manter um sistema hierarquizado de poder e privilégios. A garantia de instrução para o desenvolvimento de atividades militares e a habilitação de profissionais liberais para ocuparem postos privilegiados, que conferiam prestígio social a uma parcela restrita da população revela a desigualdade de acesso/apropriação tanto ao capital econômico (melhores salários e possibilidade de aquisição de imóveis, por exemplo), quanto ao capital cultural na sua forma de conhecimentos, habilidades e competências legitimados por diplomas. Além disso, os referidos cursos eram organizados à margem dos problemas locais, limitando-se à

valorização e transmissão da cultura elitista, o que, na análise de Teixeira lhes conferia um papel alienador. Em suas próprias palavras:

[...] tínhamos duas alienações no ensino superior. A primeira grande alienação é que o ensino, voltado para o passado, nos levava ao desdém pelo presente. A segunda alienação é que toda a cultura transmitida era cultura européia. E nisso tudo o Brasil era esquecido. (TEIXEIRA, 1998, p. 93-94).

Outras instituições foram criadas na primeira década do século XIX, a exemplo da Faculdade de Medicina da Bahia, em 1808. Contudo, todas tinham a finalidade de gerar uma infraestrutura mínima aos intuitos da elite portuguesa, caracterizando-se, em consequência, por uma visão reducionista de educação superior. Convém ressaltar que a visão utilitarista que passa a informar o ensino no Brasil, decorre também da perda da hegemonia católica sobre os rumos da educação, ocasionada pela expulsão oficial dos jesuítas. Nesse sentido, são os institutos isolados ou as faculdades específicas voltados para o ensino, e de orientação profissional, que estão na gênese da Educação Superior no país, contribuindo, mais tarde, para a construção de algumas de suas marcas identitárias, tal como a fragmentação.

No decorrer de todo o século XIX, trinta e cinco desses cursos de orientação profissional foram criados, visando a formação de jovens oriundos das elites, sendo que vinte e quatro deles localizavam-se nas regiões atualmente conhecidas como sudeste e sul do país e apenas dez estavam na região nordeste, mais especificamente nos estados da Bahia (oito) e Pernambuco (dois), ou seja, nas cidades mais importantes do ponto de vista da economia.

Decerto este critério contribui, embora não de forma exclusiva, para a compreensão da não criação de uma dessas instituições no Maranhão, apesar da ideia, construída e difundida à época, de seu lugar de destaque dentre as demais províncias do Império brasileiro, em decorrência da cultura e intelectualidade que conferia identidade singular e imponente à cidade de São Luís. Identidade esta forjada na comparação entre a referida cidade e Atenas – conhecida como principal centro cultural e intelectual da antiguidade ocidental – tendo como referência a erudição dos letrados ludovicenses21 da época e sintetizada na expressão Atenas Brasileira.

Contudo, não obstante os “oitocentos” constituírem-se pano de fundo para a construção da “ideologia da singularidade”22 (LACROIX, 2008) e serem considerados a idade

de ouro do Maranhão, nem mesmo para a elite local foi ofertada alguma oportunidade de formação em nível superior, sendo a Europa a opção predominante. Contraditoriamente, há uma

21 Adjetivo pátrio relativo a São Luís – MA.

22Expressão cunhada por Maria de Lourdes Lauande Lacroix, no livro “A Fundação Francesa de São Luís e seus Mitos” (2008), referindo-se ao processo da história do Maranhão em busca de uma identidade, no qual edifica a imagem de uma terra singular. A origem francesa da cidade de São Luís, segundo a autora, é um dos mitos que integram tal ideologia.

situação inferior à do período colonial, pois que os dois colégios anteriormente citados foram extintos, tendo sido inaugurado em 1838 o Seminário Eclesiástico de Santo Antonio, sem a prerrogativa do doutoramento, e a Escola de Cutim, de vida muito curta (quatro anos), com caráter profissionalizante, para a formação, em nível médio, de técnicos agrícolas. São oportunas as palavras de Meireles (1994, p. 57) sobre o assunto:

A nós, o que nos surpreende e intriga, sabendo-o, é que essa elite socialmente refinada e culturalmente aprimorada não se tenha empenhado, ao menos por uma questão de envaidecimento e orgulho para a terra, na criação de uma escola superior, à semelhança do que ocorreria com o Rio de Janeiro, a Bahia, Pernambuco e São Paulo [...].

Apesar da fundação do Liceu Maranhense em 1838, com o objetivo de oferecer uma formação propedêutica que encaminhasse seus egressos para estudos superiores (SALDANHA, 2008), não foi criada nenhuma instituição desse nível de ensino, sendo natural a saída dos filhos das elites para outros estados brasileiros ou países europeus.

O século XX inicia-se sem que o poder público tenha compromisso com a criação de universidades no Brasil. Prova disso é o fato de o parlamento não ter aprovado nenhum dos quarenta e dois projetos apresentados com tal finalidade no século anterior23. Argumentações

em torno da obsolescência dessa instituição de ensino e, por conseguinte, seu descompasso com as necessidades do novo país a ser edificado, justificaram tal resistência e a defesa do ensino utilitário de preparo profissional, em detrimento da pesquisa e produção de científica, assim como de outros aspectos da cultura. A análise de Teixeira (1989, ?) sintetiza o pensamento da época:

Havia no Brasil, na classe governante brasileira, a idéia de que a sociedade que se estava construindo ia ser uma sociedade utilitária, uma sociedade de trabalho e, como tal, não ganharia muito em receber os ornamentos e as riquezas da velha educação universitária.

Não há como deixar de situar nesse posicionamento a raiz de uma inserção capitalista dependente e importadora de ciência e tecnologia que, em maior ou menor medida persiste até os dias atuais, por isso sinalizada em épocas diferentes por Teixeira (1989) e Neves (2000). Registramos as palavras desta autora ao analisar as políticas educacionais contemporâneas,

[...] ao invés de se direcionarem ao aumento da nossa capacidade produtora de ciência e de tecnologia, encaminham-se à capacitação da força de trabalho em seu conjunto, no sentido de operar produtivamente a ciência e a tecnologia transferidas do capitalismo central (NEVES, 2000, p. 29).

23 A não aprovação se deve à influência dos positivistas, adversários da criação de universidades no Brasil, alegando ser uma iniciativa contrária à liberdade de ensino e sua laicidade (CUNHA, 1980). Não é demais recordar que a doutrina do positivismo teve grande êxito no Brasil, fornecendo os parâmetros para a teoria geral da instrução.

Destarte, constatamos que até o final do século XIX, a Educação Superior no Brasil concretizou-se, sobretudo, na formação vocacional, em instituições religiosas, e em escolas profissionais de ciências aplicadas limitadas a algumas cidades24. Mas, o início da República

testemunha o primeiro movimento de expansão desse nível de ensino, embora seu principal traço característico não tenha sido superado, o do elitismo, e outro tenha sido reafirmado, o da dualidade.

Em decorrência das Reformas Benjamim Constant (1890-91), Epitácio Pessoa

(1901) e Rivadávia Correa (1911)25 surgiram as escolas superiores livres, a

oferta de cursos de graduação se diversificaram e as formas de acesso foram facilitadas. Vitória do positivismo, defensor da liberdade no ensino superior, tal expansão altera não apenas quantitativamente o quadro desse nível de ensino no País como compromete sua qualidade, submetida aos interesses do mercado, uma vez que tanto podia oferecê-lo o Estado em suas esferas administrativas nacional e estadual, quanto a iniciativa privada (entidades e indivíduos), a partir de estruturas administrativa e didáticas diversas, com mínimo controle do governo federal.

Quanto à formação para o magistério, por muito tempo não se efetivou em nível superior, seja para os estudos clássicos e históricos ou para ciência. Ademais, tal formação tem histórias distintas no Brasil, a depender do nível e/ou modalidade, assim como da localidade (estado, município). Para o magistério das séries iniciais, por exemplo, a partir do século XIX, foi criada a Escola Normal (1830), correspondendo, inicialmente, à escolarização primária e mais tarde elevando-se ao nível secundário. Já a formação para o ensino no nível médio constituiu-se nos anos 30 do século XX nas Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras ou Faculdade de Educação, como na Universidade do Distrito Federal, a qual, de acordo com Tanuri (2003), concedia licença magistral após conclusão de uma formação pedagógica a quem possuísse graduação em alguma especialidade.

24 De acordo com Cunha (1980, p. 132): Rio de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Salvador, Recife/Olinda, Cruz das Almas (BA) e Pelotas.

25 A Reforma Benjamim Constant, entre outros dispositivos que facilitaram o acesso ao ensino superior, “criou condições para que escolas superiores particulares viessem a conceder diplomas dotados do mesmo valor dos expedidos pelas escolas federais”; a de Epitácio Pessoa (1901) consolidou o processo de desoficialização do ensino promovendo a equiparação entre as escolas secundárias privadas e oficiais, sob inspeção nos currículos; isso permitia aos estudantes daquelas escolas ingressarem no ensino superior em caso de aprovação em exame específico ao final da última série; e a de Rivadávia Correa (1911) além de reafirmar o sistema de admissão nas próprias faculdades, concedeu autonomia didática e administrativa aos estabelecimentos de ensino e acabou com o monopólio estatal na concessão de diplomas e títulos.

Vale ressaltar que tal formação baseada no modelo 3 + 126, tendo perdurado por

muitos anos, confere uma das características principais dos processos formativos iniciais de professore(a)s no Brasil, qual seja, a dissociação entre conhecimentos específicos da área/disciplina de atuação e os conhecimentos pedagógicos, sendo enfatizados os primeiros. Não somente uma das principais características, assim como, um dos problemas cruciais dessa formação, tratando-se, na essência, da relação entre teoria e prática. Por conseguinte, constitui- se em um indicativo para a (re)configuração de propostas curriculares direcionadas para a superação de tal problema, como é o caso das LI implementadas nos campi do continente da UFMA.

Para retomar o rápido apanhado acerca da formação docente, convém ressaltar que após em período que privilegiou uma formação concretizada em instituições religiosas, voltada para o desenvolvimento de habilidades necessárias ao cumprimento de tarefas pastorais baseada nos clássicos antigos e voltada a padrões da sociedade europeia, passamos a um período em que a centralidade estava no processo de seleção de professore(a)s (as) para as Aulas Régias, não sendo exigido do(a)s candidato(a)s a comprovação de formação para o magistério e, logo depois, à instrução no domínio do método mútuo, segundo Tanuri (2000, p. 63), “[...] a primeira forma de preparação de professores, forma exclusivamente prática, sem qualquer base teórica [...]”. Após 1835, data da constituição da primeira Escola Normal brasileira, criada na Província do Rio de Janeiro, é que a formação docente vai ganhando espaço nas iniciativas governamentais relacionadas à educação, porém ainda por muito tempo, é concretizada em escolas primárias (elevadas tardia e lentamente em nível médio), com diferentes padrões e fazendo parte dos sistemas provinciais/estaduais.

A segunda década do século XX é o período em que as instituições de orientação profissionalizante são reunidas sob o regime de universidade, ainda que, de acordo com Teixeira (1989), a maioria não tivesse as condições necessárias para conquistar esse status, pelo menos, não aquele condizente com o modelo alemão, ou humboldtiano. Com efeito, tal concepção de universidade coaduna estudo e produção de conhecimento, e não somente ensino, característica principal das iniciativas do século XIX, excetuando-se, em certa medida, algumas escolas de Medicina. Vale destacar que, para além da polêmica acerca de uma definição de modelos universitários clássicos e apesar da coexistência de aspectos do modelo profissional

26 Modelo que tem origem nos anos 30, por ocasião da criação das Licenciaturas nas antigas faculdades de Filosofia, no qual as disciplinas de natureza pedagógica, com duração de um ano, justapunham-se às disciplinas de conteúdo, com duração de três anos.

napoleônico e do que alia produção do conhecimento e qualificação para o mercado de trabalho em profissões liberais, comumente considera-se que no Brasil adotou-se, nos principais centros desde a primeira República, o modelo humboldtiano (SGUISSARDI, 2006; SAVIANI, 2010). No entanto, sabemos que tais modelos inscrevem-se no esforço intelectual de apreensão do real e, portanto, não encontram equivalência na realidade de outros países diferentes daqueles que lhes deu origem. Afinal, conhecimentos e saberes não podem ser transplantados, de forma mecânica, de um contexto peculiar para outro, ainda mais quando guardam profundas distinções socioculturais. Sobre esse aspecto, é bastante oportuna a assertiva de Sguissardi (2006, p.276).

Sem necessidade de maior demonstração, pode-se afirmar que o que se tem feito nestas terras do Novo Mundo são verdadeiros transplantes ou adaptações autóctones de estruturas universitárias européias, principalmente de viés confessional até a Revolução Francesa, e vazadas nos conhecidos modelos clássicos – no caso do Brasil, primeiro, o francês/napoleônico ou pombalino/coimbrão; depois, alemão ou humboldtiano – após a laicização da sociedade e da vida universitária sob a égide da revolução burguesa.

Na realidade, considera-se que a primeira27 universidade brasileira foi criada na

capital do país, em 1920, constituindo-se uma conquista frente à resistência dos positivistas, que a entendiam como uma instituição medieval e ligada estritamente à igreja católica. Porém, não significou uma ruptura com as condições anteriores, tendo em vista que a materialidade que a ensejou era marcada pelo domínio das oligarquias paulistas e mineiras (em revezamento), assim como pelo não atendimento às demandas, mais populares e/ou das classes médias, de acesso a esse nível de ensino. Conquanto, voltando-se mais para o ensino do que para a pesquisa e mais próxima do modelo francês de especialização e profissionalização (ou napoleônico), a universidade em tela, além de dar continuidade ao caráter elitista, que vinha caracterizando a Educação Superior até esse período, conserva a autonomia das faculdades.

Esses elementos permitem, uma vez mais, averiguar algumas particularidades da história dessa instituição no Brasil. Por um lado, diferenciam-na da origem da instituição universitária em outros países da Europa, porquanto aquelas atuavam como centro de consolidação da cultura, no século XI, mediante a formação de mestres (zeladores e guardiões da cultura e dos métodos de elaborá-la) e considerada a profissão das profissões, sendo todas as demais a ela subalternas (TEIXEIRA, 1989). Por outro, ajuda-nos a constatar, no País,

27 Segundo Cunha (1980), antecedeu esta primeira, a Universidade do Rio de Janeiro, algumas outras que tiveram vida breve e, por isso, denominadas de “passageiras”: Universidade de Manaus (1909-1920); Universidade de São Paulo (1911 – 1917) e Universidade do Paraná (1912 – 1915). Há de se ressalvar também que é quase consensual entre os estudiosos da temática relacionada à Educação Superior no país que a universidade, como instituição, teve