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PARTE I. ENQUADRAMENTO TEÓRICO E REVISÃO DE LITERATURA

CAPITULO 2 A Educação Artística no âmbito da Educação Especial

3.1. Educar para Incluir

Rumo à inclusão, a Educação Especial tem vindo a sofrer modificações quanto à sua conceção e prática, estando este percurso diretamente relacionado com o modo como se perspetiva a diferença. Desde as opções politicas que determinaram na educação, a exclusão, a segregação, a integração e, atualmente a inclusão de crianças e jovens com necessidades educativas específicas, que temos vindo a assistir nas últimas décadas a modificações de fundo no plano social e cultural, na visão sobre a educação inclusiva.

Entre a intervenção educativa realizada anteriormente em instituições de Educação Especial de caráter segregacionista, à mudança de paradigma que ocorre a partir dos anos sessenta (ancorada na Declaração dos Direitos da Criança e dos Direitos do Homem), foram sendo criadas condições do ponto de vista educativo e social, para o movimento de integração de crianças e jovens portadores de deficiência nos estabelecimentos de ensino regular. Sobre esse momento de transição Maria Odete Emygdio da Silva, no artigo Da Exclusão à Inclusão: Conceções e Práticas (2009), refere que:

«Defendia-se um atendimento educativo diferenciado e individualizado, de forma a que cada aluno pudesse atingir metas semelhantes, o que implicava a necessidade de adequar métodos de ensino, meios pedagógicos, currículos, recursos humanos e materiais, bem como os espaços educativos, tendo em conta que a intervenção junto destes alunos, respeitando a sua individualidade, deveria ser tão precoce quanto possível» (p.139).

Também a publicação de outros dois documentos trazem contributos fundamentais no sentido da integração dos alunos com NEE (ultrapassando os efeitos do legado psico- médico): o designado Warnock Report (1978) e, posteriormente a Declaração de Salamanca (1994), a qual examinou os princípios, as políticas e as práticas na área das NEE fez um re- enquadramento da ação, reconhecendo a necessidade de actuar eficazmente segundo o objetivo da “escola para todos”. Países como a Suécia e Dinamarca estiveram entre os

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precursores da aplicação do princípio da normalização e, nesse sentido, a perspetiva de que «a educação das crianças e dos alunos com deficiência deveria ser feita em instituições de educação e de ensino regular» (Silva, 2009:139), estendeu-se rumo à Europa, Estados Unidos e Canadá.40

Nos diagramas 2 e 3, adaptados da publicação Towards Inclusion: Lessons from the South, An International Disability and Development Consortium (IDDC) é apresentada uma base de discussão auxiliar à definição de integração e de inclusão41:

Diagrama 2 - Conceito de Integração (adaptado do original)42

Em Portugal, com o decreto-lei 35/90 e 319/91 já se havia responsabilizado o sistema de ensino regular por todos os alunos, prevendo para esse efeito, as medidas educativas individualizadas e, em 2008 estabeleceu-se nova legislação para assegurar a desinstitucionalização de crianças e jovens em idade escolar com deficiência, que ainda frequentassem os estabelecimentos de Ensino Especial, contemplando o apoio pedagógico

40 O princípio da normalização foi «definido nos finais da década de cinquenta do século XX, por Bank- Mikkelson, director dos Serviços para Deficientes Mentais da Dinamarca» (Silva,2009:139).

41 Os conceitos de integração e inclusão diferem nas suas premissas, sendo que os argumentos iniciais são geradores de representações e abordagens diferentes.

42 Diagramas adaptados do documento relativo ao seminário sobre Educação Inclusiva (1998), India.Disponível em «http://www.eenet.org.uk/resources/docs/agra.php» [Consult:01/07/14]. o aluno como problema tem dificuldade em aprender tem necessidades educativas especiais é diferente dos outros alunos precisa de equpamento especial precisa de professores especiais precisa de um ambiente especial

personalizado, as adequações curriculares individuais, as adequações no processo de matrícula e de avaliação, o currículo específico individual e as tecnologias de apoio. Neste enquadramento legislativo prevêm-se as intervenções educativas consideradas mais adequadas a cada problemática, mesmo as mais graves como as de alunos com perturbações do espectro do autismo, multideficiência ou surdocegueira congénita, segundo uma via educativa mais estimulante das suas capacidades. No entanto, a inclusão educativa difere da educação inclusiva (Silva, 2009:147), na medida em que algumas modalidades específicas de EE podem configurar medidas internas de exclusão, o que vem acrescentar grande controvérsia no terreno.

Perante as dificuldades evidenciadas nas escolas, o Conselho Nacional de Educação (CNE)publicou em 1999 um parecer com o tema Uma Educação Inclusiva, a Partir da Escola que Temos, no qual são apresentadas reflexões e orientações (numa perspetiva dotada de grande atualidade) sobre a progressiva tomada de consciência internacional sobre esta matéria, e afirma que:

«O modelo da escola inclusiva não é um projecto descontextualizado (...), é uma exigência social e política, é a tradução, em termos educacionais, dos valores da democracia, da justiça social e da solidariedade que, desde a segunda metade do século XIX, impuseram, progressivamente, o reconhecimento do direito de todos à educação, à escolaridade obrigatória, o direito ao acesso e sucesso na escola».43

Podemos supor a inclusão como um “princípio” ou axioma no sentido em que se preconiza um conjunto vasto de condições indispensáveis para se atingir esse objetivo: não só as mudanças jurídico-legislativas que garantam concretamente esses direitos, mas mudanças socioculturais e de mentalidades de professores e famílias e outros intervenientes, mudanças organizativas e de gestão ao nível das escolas, mudanças ao nível da natureza e

43 Fonte: Parecer Nº 1/99 do Conselho Nacional de Educação: Crianças e alunos com necessidades Educativas

Especiais, disponível em «http://www.dgidc.min-edu.pt/educacaoespecial/index.php?s=directorio&pid=31»

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da estrutura do currículo e mudanças nos modelos de apoio individual aos alunos numa perspetiva de escolarização de todos.

Diagrama 3 - Conceito de Educação inclusiva (adaptado do original)

Na salvaguarda do princípio da EI, determinou-se o conceito de necessidades educativas especiais, o qual veio enquadrar a elegibilidade de um aluno para a Educação Especial se nele se verificar um desfasamento do nível de atividade e participação relativamente aos seu pares, desfasamento este baseado em dificuldades permanentes que exigem a adaptação das condições em que se processa o ensino/aprendizagem, isto é, dificuldades significativamente maiores em aprender do que a maioria dos alunos da mesma idade, ou incapacidades impeditivas do acesso às mesmas oportunidades em contexto escolar. Ora, nessas condições, um número crescente de alunos com NEE, cerca de 2,7% do número total de alunos atual, frequenta o sistema de ensino português de acordo com a legislação internacional vigente que estabelece a frequência de um ambiente educativo o menos restritivo possível.

De acordo com a Declaração de Salamanca:

o sistema de ensino como problema atitudes dos professores falta de flexibilidade curricular e metodológica falta de recursos humanos e materiais pouca participação das famílias ambientes inacessiveis insucesso escolar- abandono e retenções formação de docentess insuficiente

«O princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentem. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação com as respectivas comunidades. (1994:1).

Depreende-se que a experiência e a interação social constituem uma base importante do desenvolvimento e da aprendizagem e serve de alicerce ao desenvolvimento cognitivo e socioemocional, e como tal, uma das premissas subjacentes à actuação da EE deverá fornecer a rede de suporte a estas experiências num ambiente securizante. Este entendimento está baseado na teoria vygotskyana, a qual atribui importância à dimensão social e interpessoal na construção do sujeito psicológico, e remete para interação entre as condições sociais e a base biológica do comportamento humano, na formação das estruturas mentais da criança. Algumas das implicações da sua abordagem para a educação situam-se no papel dos pares na construção do conhecimento, e no papel mediador do professor nessa dinâmica de interações interpessoais, bem como na interação entre o aluno e o objeto de conhecimento. Um conceito central da sua teoria da aprendizagem com destaque para a perspetiva da Educação Inclusiva, designa-se por Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), cuja definição situa a aprendizagem no intervalo entre o conhecimento real e o conhecimento potencial do aluno recorrendo à mediação com um aluno ou adulto em níveis de desenvolvimento mais adiantados.

Segundo a ZDP, as diferenças dos alunos são tidas como um recurso e não como um obstáculo à aprendizagem afirmando que através da mediação a Zona Proximal de hoje será o nível de desenvolvimento real amanhã, ou seja: aquilo atualmente a criança só consegue fazer com a ajuda, posteriormente conseguirá fazer sozinha. Assim, segundo o postulado de Vygotsky desde há mais de 80 anos, a integração de crianças em diferentes níveis de desenvolvimento passou a ser encarada como um fator determinante no processo de aprendizagem, dando origem a alguns modelos educativos com abordagens sociointeraccionistas.

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