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3 TRABALHO PRISIONAL: ESVAZIAMENTO DAS TEORIAS SOBRE A

3.2 O efeito ressocializador do trabalho

No sistema prisional, o trabalho é um meio de ressocialização que ajuda a reduzir os efeitos da prisão. É por isso que a Lei de Execução Penal, em seu artigo 28, estabelece que o trabalho do condenado é um dever social e condição de dignidade humana que terá finalidade educativa e produtiva. Baseado nisso, o trabalho do preso não pode ser forçado.

Portanto, apesar de o trabalho ser obrigatório, não é forçado, já que o apenado pode optar por não trabalhar, se esta for a sua vontade. O único revés que vai sofrer é que seu tempo não será remido, porém não poderá sofrer nenhuma penalidade, trabalhando se assim o desejar.

Outra será a situação se o Estado não lhe proporcionar trabalho, pois é obrigatório fornecer ao apenado condições de trabalho ao preso, a fim de que ele possa remir parte da sua pena.

A Convenção nº 29 da OIT foi aprovada na 14ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra, e entrou em vigor no plano internacional em maio de 1930, porém apenas foi ratificada pelo Brasil em 1957. Todos os países que ratificaram a referida Convenção se comprometeram a abolir todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório, salvo as hipóteses previstas pela própria Convenção. O seu artigo 2º define trabalho forçado ou obrigatório como todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente. Ou seja, é aquele trabalho exigido do cidadão sem que haja o elemento volitivo. Além disso, não se pode

permitir, em nenhuma hipótese, o trabalho forçado ou obrigatório em benefício de particulares.

Da mesma forma, no Pacto de São José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil em 1992, consta em seu artigo 6º que

Artigo 6º - Proibição da escravidão e da servidão

1. Ninguém poderá ser submetido a escravidão ou servidão e tanto estas como o tráfico de escravos e o tráfico de mulheres são proibidos em todas as suas formas.

2. Ninguém deve ser constrangido a executar trabalho forçado ou obrigatório. Nos países em que se prescreve, para certos delitos, pena privativa de liberdade acompanhada de trabalhos forçados, esta disposição não pode ser interpretada no sentido de proibir o cumprimento da dita pena, imposta por um juiz ou tribunal competente. O trabalho forçado não deve afetar a dignidade, nem a capacidade física e intelectual do recluso.

3. Não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios para os efeitos deste artigo:

4. Os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária competente. Tais trabalhos ou serviços devem ser executados sob a vigilância e controle das autoridades públicas, e os indivíduos que os executarem não devem ser postos à disposição de particulares, companhias ou pessoas jurídicas de caráter privado; (...) O referido Pacto prevê a proibição de trabalho escravo e da servidão. O mesmo deixa claro que o trabalho do preso não pode ser escravo ou degradante, exaltando a condição humana do preso e a necessidade de resguardar a sua dignidade. (NICOLI, 2008)

Há diferenças entre o trabalho escravo e o trabalho degradante? A resposta é afirmativa. No trabalho escravo não há a expressão da vontade do trabalhador. É caracterizado pelo cerceamento à liberdade e pela coação moral, econômica ou física. Segundo Alvim e Paduani (2002, p. 58) é considerado crime, pelo disposto do artigo 197, CP.

Já o trabalho degradante ocorre quando o indivíduo, apesar de manifestar a vontade de aceitar o trabalho, é submetido a condições subumanas, jornadas extremamente excessivas, ambientes insalubres, não havendo nenhum respeito à sua dignidade como ser humano.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada em 1789, imbuída dos ideais iluministas da Revolução Francesa,

preconiza que todos os homens são iguais perante a lei, tendo os mesmos direitos e deveres. Em seu artigo 23 é capitulado que

Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego.

Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.

Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.

Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão foi tão importante que serviu de inspiração para a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que mais uma vez consagra a igualdade entre os homens e a dignidade da pessoa humana.

Portanto, das linhas acima se extrai que o trabalho do preso é modalidade de trabalho subjetivo. Ou seja, não constitui trabalho forçado ou obrigatório, logo, o preso pode exercê-lo ou não. Nestes termos, tem previsão na Convenção nº 29 da OIT, no Pacto de São José da Costa Rica, na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do cidadão, e na Declaração Universal do Direitos Humanos da ONU.

No Brasil é adotado o Estado Democrático de Direito, onde são aplicados os princípios previstos nas declarações supracitadas, sendo que o princípio da dignidade da pessoa humana é o primeiro a ser analisado, tendo em vista sua suprema importância no ordenamento jurídico brasileiro, principalmente após o advento da Constituição Federal de 1988.

Tal importância é tamanha que o referido princípio inaugura a ordem constitucional brasileira, onde em seu artigo 1º, determina o seguinte:

artigo 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania; II – a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana; [...]

Já no seu artigo 5º, são tratados os direitos e garantias fundamentais, sendo que no inciso XLI, o texto constitucional afirma que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais. Dispõe ainda, no seu inciso XLIX, que é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral. Como se não bastasse, proclama nos seus arts. 6º e 7º, que tratam dos direitos sociais, o direito de todo homem ao trabalho e sob garantias mínimas de exercê-lo.

Observa uma interligação entre os princípios, sendo que o princípio da dignidade da pessoa humana é considerado um sobre princípio. NUNES (2002. p. 46.) entende que a dignidade é garantida por um princípio. Logo, é absoluta, plena, não pode sofrer arranhões nem ser vítima de argumentos que a coloquem num relativismo.

Com a sua concepção, a pessoa nasce digna de respeito e deve o mesmo apreço aos outros com quem se relaciona. E não há como desvincular a dignidade humana do trabalho. É por meio dele que os seres humanos colhem frutos para poder gozar de sua existência de forma saudável, com alimentação, saúde e educação garantidas. Se antes o trabalho era visto com desgosto, devido a nosso passado escravagista, hoje é visto como forma de dignificação do homem. É por isso que as relações de trabalho também são objetos de proteção pelo Estado.