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EFEITOS DO RUÍDO NOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Os efeitos do ruído nos profissionais de saúde merecem igualmente um foco de atenção, dadas as interferências na sua saúde e as potenciais repercussões na segurança e qualidade dos cuidados prestados.

Os centros hospitalares/hospitais públicos, são estruturas complexas e com características particulares, pelo que nomeadamente do ponto de vista da saúde ocupacional, se diferenciam de outras unidades empresariais e devem por isso também serem considerados alguns aspetos próprios (Direção-Geral da Saúde [DGS], 2014).

Num serviço específico de neonatologia desempenham funções múltiplos profissionais, que prestam cuidados 24 horas por dia, nomeadamente médicos, enfermeiros, e assistentes operacionais. As particularidades da estrutura física das unidades, o tipo de cuidados requeridos aos profissionais, com exigência de resposta e desenvolvimento de ações de forma intensiva e com prontidão, aliada ao uso de tecnologia especializada e à pressão psicológica, designadamente a organização do trabalho e a proximidade com a doença, o sofrimento e a morte, implicam que se efetue um olhar atento para as condições de trabalho destes profissionais.

Para além das questões enumeradas, o fato de desenvolver atividade numa estrutura particular como um hospital, faz com que os profissionais se encontrem desde logo expostos a um cocktail de riscos profissionais, de natureza diversa e por vezes com exposições simultâneas. Desta forma, “a proteção da saúde e o bem-estar dos trabalhadores da saúde e a prevenção dos riscos profissionais são direitos que devem ser salvaguardados pelas entidades patronais, mas também requisitos imprescindíveis à qualidade da atividade prestada, e importantes condições para mais ganhos em saúde, dado que trabalhadores da saúde, saudáveis e seguros, garantem o funcionamento do serviço nacional de saúde e a prestação dos cuidados de saúde à população em geral” (DGS, 2014, p. 1).

Considerando que a gestão em saúde e segurança do trabalho deve consagrar um ciclo de melhoria contínua, deve ser encarada também do ponto de vista de saúde ocupacional dos profissionais, como um processo “inacabado” e que “tem sempre lugar a melhoria”, devendo ser sempre implementadas ações, de forma cíclica e contínua, de forma a melhorar as condições de saúde e de segurança dos trabalhadores e a eliminar/reduzir os riscos profissionais existentes (DGS, 2014, p.8).

O ruído apresenta efeitos nocivos comprovados. No entanto, este poluente não é visível e o ouvido humano apresenta capacidade para se adaptar a níveis elevados de ruído, deixando de os perceber como se fossem assim tão elevados (Swathi et al., 2014). A

existência de fenómenos de habituação ou de adaptação ao ruído, face a um estímulo continuado, encontram-se descritos e ocorrem à custa de alterações fisiológicas e psicológicas da pessoa (Instituto do Ambiente [IA], 2004).

A OMS (1999) alerta para os diversos efeitos do ruído na saúde física, psicológica e social das pessoas expostas. Os profissionais de saúde são efetivamente também afetados a nível fisiológico e psicológico por toda a estimulação sensorial do ambiente da UCIN. Efeitos como aumento da pressão arterial, vasoconstrição, alterações da frequência cardíaca e do tónus muscular, potenciando contraturas musculares, aumento da glicose sanguínea, aumento do colesterol, alterações do ciclo circadiano, distúrbios do sono, cefaleias, perda auditiva, fadiga, confusão, irritabilidade, burnout e insatisfação com o trabalho encontram-se descritos na literatura (Daniele et al., 2012; Grecco et al., 2013; Neto et al., 2010). Náuseas, mudanças de humor, aumento da libertação de catecolaminas, da hormona adrenocorticotrófica e do cortisol, distúrbios do sono e alterações do sistema imunitário constituem potenciais efeitos igualmente descritos (Barbosa et al., 2015; Lai & Bearer, 2011).

A exposição dos trabalhadores aos riscos devido ao ruído é uma temática relevante e com interesse de saúde pública, sendo que, de acordo com o Decreto-Lei nº 182/2006 (2006, p.6585), “a eliminação ou a redução do ruído excessivo é uma obrigação legal muito importante para empregadores e trabalhadores, pois quanto mais seguro e saudável for o ambiente de trabalho menores serão as probabilidades de acidentes de trabalho, de absentismo elevado e de diminuição de rendimento do trabalho”. Desta forma, são recomendados como valores de limite de exposição calculados para um período normal de trabalho diário de oito horas ou para uma média de valor semanal dos valores diários de exposição pessoal ao ruído de 87 dB(A) e um valor máximo da pressão instantânea (LCpico) de 140 dB(C), tendo como valores de ação inferiores de 80 dB(A) e de valor máximo de pressão instantânea de 135 dB(C).

De acordo com Cordeiro et al. (2005), citado por Neto et al. (2010), os profissionais expostos ao ruído ocupacional intenso apresentam três a quatro vezes mais risco de sofrerem acidentes de trabalho. Para além disso, a exposição prolongada ao ruído pode provocar perda auditiva induzida pelo ruído, sendo que quanto maior a exposição, maior a probabilidade de redução ou perda auditiva.

Num ambiente tão particular como o hospitalar, os níveis de exposição ao ruído diários verificados são, por norma, inferiores às recomendações nacionais existentes. No entanto, a sua importância não pode ser descurada dada a possibilidade de ocorrência dos diversos potenciais efeitos extra-auditivos, pelo que o Decreto-Lei nº 182/2006, que

estabelece os limites para a exposição pessoal diária ao ruído, não se adequa ao ambiente hospitalar (Santos & Miguel, 2012). O ambiente acústico é considerado como uma fonte de tensão e stress para os profissionais e potencial fator de risco para a segurança dos cuidados prestados, podendo alterar a performance e satisfação profissional e potenciar o risco de erro, dada a sua interferência na concentração e comunicação dos profissionais, seu efeito promotor de perda de atenção, e as alterações fisiológicas e comportamentais que ocasiona (White, 2011).

É reconhecido que o ambiente de trabalho que requeira esforço mental e necessite de concentração não deve ter um NPS superior a 55 dB(A) sob a consequência de aumentar o risco de stress, fadiga e erro (Basner et al., 2014). Tal questão é aplicável ao trabalho desempenhado pelos profissionais a exercerem funções numa UCIN.

De acordo com a AAP (Oliveira et al., 2013), um valor de NPS inferior a 50 dB seria o desejável para situações laborais, sendo referido que o nível de ruído não deve exceder os 55 dB em locais como as UCIN, onde o trabalho exige esforço mental e necessidade de concentração.

Dado a inexistência de diretrizes nacionais para o controlo do ruído em ambiente hospitalar, são consideradas as orientações existentes de acordo com a metodologia desenvolvida pelo Finnish Institute of Occupational Health, designada por Ergonomic

Workplace Analysis (EWA), de forma a avaliar a exposição dos profissionais ao ruído. Tendo

por base estas orientações, reconhece-se que num local de trabalho que requeira concentração, como o de uma UCIN, o nível de ruído deveria ser inferior a 45 dB(A), estabelecendo-se o nível de risco e a prioridade de intervenção nos locais de trabalho apartir desse valor (Santos & Miguel, 2012).

A importância do ruído tem vindo a ser reconhecida também como um fator determinante do bem-estar e conforto, não só do ponto de vista do doente, mas igualmente dos profissionais (Santos & Miguel, 2012). Estudos referem que o ruído apresenta influência na própria motivação dos profissionais para interagir com a família na UCIN, constituindo-se assim um potencial fator perturbador para o desenvolvimento das suas funções, com interferência nos cuidados centrados na família (Peixoto et al., 2011).

A preocupação pela ecologia do ambiente de trabalho é uma questão importante, sendo necessário o controlo de fatores como o ruído intenso, de forma a promover a redução do stress e da fadiga dos profissionais de saúde, contribuindo dessa forma para uma melhor performance profissional e para melhorar a sua eficácia assistencial (ANVISA, 2014). Pretende-se práticas de trabalho saudáveis que concorram para a segurança nos cuidados e para a melhoria contínua dos cuidados prestados.

Face aos potenciais efeitos adversos do ruído em todos os que frequentam uma UCIN e apesar de ainda haverem várias questões por clarificar relativamente às consequências do mesmo, a cultura do silêncio deve ser um objetivo no âmbito hospitalar. À semelhança de práticas e a investimento que assistimos relativas ao controlo de infeção e higienização do ambiente hospitalar, com grande enfoque nas instituições, deveríamos proceder ao controlo do ambiente, com a respetiva higienização do ambiente acústico das unidades hospitalares.