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3. REVISÃO DE LITERATURA

3.3. Efeitos dos Investimentos Encadeados e Interdependência

Dentro da literatura sobre desenvolvimento econômico, Hirshman se destaca por ter conhecido in loco os problemas de algumas regiões e discorrido sobre eles de maneira enriquecedora. O autor iniciou suas pesquisas sobre desenvolvimento em países atrasados pela Colômbia, movido pelo desafio visualizado, que consistia num país pobre, mas com oportunidades. Mais tarde, Hirschman ampliou sua obra analisando, além da Colômbia, o Brasil e o Chile. Publicou em 1963 o livro Journeys Toward

Progress, onde abordou, entre outros, o caso do nordeste brasileiro, discutindo o papel

da SUDENE nesse contexto, integrando economia e ciência política.

Contestou algumas afirmativas anteriormente consagradas. Enquanto Rosenstein-Rodan (1943) e Nurkse (1953) acreditavam na ideia de crescimento equilibrado, Hirschman repudiava essa afirmativa em seu livro Estratégia do Desenvolvimento Econômico, publicado em 1958. Ele discorreu sobre a forma que os investimentos deveriam ser processados, acreditando na importância de concentrar esforços em um único setor inicialmente, o que pode parecer contraditório em se tratando de promover o desenvolvimento de países atrasados. O setor escolhido para receber os investimentos seria aquele que apresentasse maior poder de encadeamento na economia. Com isso, essa política resultava na escolha de um setor em detrimento de outros. Porém, os setores “esquecidos” seriam alvo, posteriormente, das forças de mercado e de ações de políticas públicas, corrigindo disparidades conferidas no curto prazo, lembra Lepenies (2009). Só então, a ideia de Hirschman convergia para um crescimento equilibrado no longo prazo. Assim, quando uma economia se afasta do equilíbrio, ela estaria, no final, recebendo estímulos para promover o desenvolvimento.

alcança-se uma situação ideal quando, [...], um desequilíbrio provoca um movimento desenvolvimentista que, por seu turno, cria um desequilíbrio similar, e assim por diante ad infinitum. Se tal cadeia de desenvolvimento não-equilibrado puder se estabelecer, basta aos criadores da política econômica observar ao largo o processado. Pode- se notar que, em tal situação, a capacidade privada de lucro e a desejabilidade social provavelmente coincidirão, não pela ausência de economias externas e sim porque o input e a produção de economias externas são os mesmos para cada empreendimento sucessivo (p. 115). Portanto, um investimento que resulta em outro investimento faz com que a capacidade completiva da indústria e suas economias externas estimulem o desenvolvimento. A ideia do encadeamento, talvez a mais importante de Hirschman, surgiu desse processo não-equilibrado das cadeias de investimentos.

Por sua vez, Bianchi (2007) destaca que os

encadeamentos implicam interdependência. O termo pode ser usado para apontar inter-relações em um sistema de equilíbrio geral, onde tudo depende de tudo, mas também para denotar uma variedade de efeitos multiplicadores, inclusive de transbordamento (spill-over) (p. 136-137).

Assim, os encadeamentos para trás correspondem a estímulos às empresas produtoras de insumos necessários para a atividade que está sendo estimulada, enquanto que os encadeamentos para frente se referem ao estímulo de atividades que utilizam o produto em seu processo produtivo da atividade que fora estimulada. Segundo Bianchi (2007), Hirschman foi o primeiro a desenvolver a ideia de encadeamento como a chave para uma estratégia deliberada para o desenvolvimento. Concluiu que essas empresas que possuem um grande poder de encadeamento eram personagens indispensáveis para o desenvolvimento.

Destaca-se também o poder do investimento público na multiplicação do investimento privado e, portanto, no crescimento e desenvolvimento econômico do país. Em sua tese, Hirschman (1958) afirma que em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, cabe ao Estado estabelecer prioridades dos investimentos públicos a fim de otimizar os recursos aplicados e promover o crescimento econômico. Um dos critérios seria o investimento em setores com maiores possibilidades de impulsionar investimentos privados. Por consequência, os efeitos de ligação para frente e para trás

advindos dos investimentos privados, que por sua vez foram estimulados pelos investimentos públicos, são interessantes mecanismos para dinamizar a economia.

Entretanto, em regiões subdesenvolvidas, a incerteza do ambiente é maior que em regiões já desenvolvidas, isto porque pode não haver tecnologia disponível, pronta mão de obra especializada, entre outros requisitos. Dessa forma, Hirschman (1958) acredita que o investimento deve ser induzido e com ele toda a estrutura que, por ventura, pudesse não existir, passando a fazer parte do dia a dia da região. A estratégia possui dois alvos: os investimentos intersetoriais, onde investimentos em setores-chave são induzidos de tal forma que complemente a matriz produtiva; e o outro ponto são os investimentos público-privado, que devem ser responsáveis pela execução de obras que apoiem esses investimentos, como a infraestrutura. Com isso, ocorrem os transbordamentos inter-regionais, favorecendo o desenvolvimento de novas regiões.

Considerando os investimentos em infraestrutura, os mesmos são capazes de movimentar a indústria que fornece os insumos, bem como impulsionar o segmento que irá usufruir de tais investimentos públicos. Um exemplo claro seria a construção de aeroportos que, por um lado estimularia a produção de material de construção (efeito para trás) e por outro aumentaria a demanda do segmento de aviação (efeito para frente).

Hirschman (1958) afirma que o Estado também tem a função de alívio das pressões ao ilustrar o caso onde ele promove a industrialização através do estabelecimento de uma siderurgia. A partir da instalação dessa atividade, algumas lacunas vão surgindo na economia, como a deficiência de energia, transporte e educação para atender à siderurgia. Com isso, o governo é forçado a melhorar essas deficiências. De certo, a resolução desses problemas deveria se antevir a instalação da siderurgia, mas o fato é que isso nem sempre ocorre.

Como o desenvolvimento econômico de um país é algo desejado pela população e pelos governos, um dos caminhos para alcançá-lo é através da industrialização. Ao contrário do que alguns podem pensar, as aptidões industriais podem ser adquiridas por qualquer povo e mesmo os países com poucos recursos naturais podem atingir altos níveis de produção e rendimento per capita (HIRSCHMAN, 1958).

É posto por Hirschman (1958) que os efeitos que duas indústrias podem causar numa economia podem ser superiores a soma dos efeitos de cada indústria instalada isoladamente e simula a seguinte situação:

Quando a indústria A se estabelece primeiro, os seus satélites logo surgem; quando, porém, a indústria B é subsequentemente instalada, pode isto contribuir para a criação não só dos seus próprios satélites, como também de algumas firmas, que nem A nem B, isoladamente, poderiam ter provocado. E, com a entrada em cena de C, seguir-se-ão outras empresas, que requerem os estímulos conjugados, não só de B e C, e sim de A, B e C (p. 161).

O reflexo desse processo encadeado de investimentos está no aumento da velocidade do crescimento industrial, fundamental para promover o desenvolvimento tão almejado. Portanto, o incentivo a tais indústrias interdependentes é uma estratégia interessante quando se deseja proporcionar um aumento do volume de produção. Todavia, o grau de interdependência de uma indústria pode ser conhecido pela proporção de produção que é encaminhada para outras indústrias (cadeia prospectiva), bem como pela proporção da produção adquirida de outras indústrias (cadeia retrospectiva).

Através dos efeitos de encadeamento para trás e para frente, uma economia pode iniciar o processo de desenvolvimento a partir de um estímulo. O investimento concentrado, por sua vez, gera um desconforto, que termina por impulsionar medidas para desenvolver as demais regiões. As contribuições de Hirschman para a teoria de desenvolvimento regional ultrapassam a ideia de investimentos encadeados em regiões subdesenvolvidas.

Nota-se, portanto, que o renomado autor estudou a fundo as questões dos países subdesenvolvidos, através de uma pesquisa exploratória empírica que deu origem a três obras sobre o tema de desenvolvimento econômico. Para isso, não hesitou em mesclar algumas ciências a fim de buscar soluções específicas para o problema que visualizava nas regiões analisadas. Foi ousado ao propor o modelo de crescimento desequilibrado, quando outras teorias apontavam para o caminho contrário. Contudo, mirou em questões particulares de países subdesenvolvidos e acertou também nas questões concernentes aos países avançados, desenvolvendo uma teoria universal.