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Durante o seu processo de fabrica¸c˜ao e a sua vida operacional, os materiais comp´ositos s˜ao submetidos a uma variedade de ambientes, que podem afetar bas- tante o seu desempenho, de maneira revers´ıvel ou irrevers´ıvel [37–52]. Entre os fato- res ambientais, a temperatura e a umidade requerem grande aten¸c˜ao, devido a cau- sarem mudan¸cas relevantes, sobretudo nas propriedades das matrizes polim´ericas.

O termo “higrot´ermico” se refere `a combina¸c˜ao de efeitos de umidade (hi- grosc´opicos) e de temperatura (t´ermicos) que s˜ao respons´aveis por uma s´erie de fenˆomenos, tais como: corros˜ao, hidr´olise das fibras (ex: fibras de vidro), hidr´olise da matriz (ex: ep´oxi), fluˆencia, expans˜ao diferenciada entre fibra e matriz etc que acarretam tens˜oes internas, distor¸c˜oes e queda de propriedades ao longo do tempo. Podemos classificar a atua¸c˜ao higrot´ermica em dois principais grupos fenome- nol´ogicos: degrada¸c˜ao das propriedades da matriz e gera¸c˜ao de tens˜oes internas. A seguir, cada um desses grupos ser´a descrito de maneira mais extensiva.

2.7.1

Degrada¸c˜ao por efeito higrot´ermico

Matrizes polim´ericas s˜ao muito mais sens´ıveis a mudan¸cas ambientais que as fibras. Consequentemente, as propriedades dominadas pela matriz s˜ao mais afetadas pe- los efeitos higrot´ermicos (ex: rigidez e resistˆencia transversal, ao cisalhamento e `a compress˜ao). A Figura 2.31 mostra o impacto da mudan¸ca de temperatura nas propriedades mecˆanicas de um comp´osito de carbono/ep´oxi.

Esta queda de propriedades se torna bastante acentuada quando pr´oximo `a tem- peratura de transi¸c˜ao v´ıtrea (Tg), sendo portanto indesej´avel que a opera¸c˜ao ocorra

em tais temperaturas. Outras vari´aveis do ambiente tamb´em exercem um papel im- portante, podendo alterar o valor da Tg. A Figura 2.32 apresenta esquematicamente

a influˆencia da umidade, que migra atrav´es da estrutura da matriz, facilitando sua movimenta¸c˜ao molecular (a¸c˜ao plastificante), e consequentemente reduzindo a Tg.

Como uma evidˆencia quantitativa do efeito da temperatura e da umidade na queda de propriedades das matrizes polim´ericas, a Figura 2.33 apresenta os resulta- dos obtidos por Browing et al. [54], onde foram levantadas curvas tens˜ao-deforma¸c˜ao de resinas ep´oxi sob diferentes condi¸c˜oes de temperaturas e umidade. ´E poss´ıvel ob- servar que o efeito combinado de temperatura e umidade ´e muito mais grave que a soma de seus efeitos isolados. Isto ocorre porque a difus˜ao ´e um fenˆomeno termica- mente ativado, onde a difusividade D varia com a temperatura segundo a equa¸c˜ao de Ahrrenius (Equa¸c˜ao 2.62). D = D0exp  −Ea RT  (2.62)

Figura 2.31: Influˆencia da temperatura no m´odulo de elasticidade e na resistˆencia mecˆanica de comp´ositos de fibras de carbono/ep´oxi [53].

Figura 2.32: Gr´afico de varia¸c˜ao da rigidez com a temperatura, sob influˆencia da umidade [8].

Figura 2.33: Curvas tens˜ao-deforma¸c˜ao de resinas ep´oxi 3501-5 em diferentes condi¸c˜oes de temperatura e umidade [54].

Um ponto importante a ser identificado ´e que parte dessas altera¸c˜oes de pro- priedades possui um car´ater transit´orio, resultado de mudan¸cas f´ısicas, devido ao aumento de mobilidade molecular com a temperatura e do efeito plastificante da umidade em meio `as cadeias polim´ericas. Outra parte dessas altera¸c˜oes de propri- edades possui um car´ater permanente, devido ao processo de relaxa¸c˜ao t´ermica e de quebra molecular por hidr´olise. Estes fenˆomenos s˜ao interdependentes em suas causas e efeitos, onde um processo contribui para a acelera¸c˜ao do outro.

Para demonstrar a interdependˆencia de fenˆomenos, assim como a sua transito- riedade, Wang et al. realizou ensaios de fluˆencia em amostras de poliamida 6,6 em temperatura fixa, alternando a umidade relativa do ambiente durante o ensaio. O resultado do ensaio ´e apresentado na Figura 2.34, onde ´e poss´ıvel observar que a taxa de fluˆencia aumenta em um ambiente de maior umidade relativa e reduz com a redu¸c˜ao da umidade relativa.

Da mesma forma que a umidade acelera processos t´ermicos de relaxa¸c˜ao, a tem- peratura acelera fenˆomenos causados pela umidade. A hidr´olise ´e um processo de quebra de mol´eculas por a¸c˜ao da mol´ecula de ´agua. Este processo ´e t˜ao mais in- tenso quanto maior for a temperatura. Alguns pol´ımeros s˜ao bastante suscept´ıveis `

a hidr´olise e este processo acarreta perdas de propriedades irrevers´ıveis.

A quantifica¸c˜ao das altera¸c˜oes de propriedades causadas pelos efeitos hi- grot´ermicos ´e uma quest˜ao importante no processo de sele¸c˜ao de materiais e para o c´alculo de vida ´util de componentes polim´ericos e comp´ositos. A seguir ser˜ao apresentados alguns modelos presentes na literatura.

Figura 2.34: Curva de fluˆencia de nylon 6,6 [41].

2.7.1.1 Modeliza¸c˜ao da degrada¸c˜ao higrot´ermica

Diversos modelos termomecˆanicos foram desenvolvidos nos anos 80 com o intuito de descrever a dependˆencia das propriedades mecˆanicas de pol´ımeros com a tempe- ratura [44]. A maioria dos modelos propunha interligar empiricamente resultados experimentais em temperaturas relevantes, como a Tg e a temperatura de decom-

posi¸c˜ao (Td). Muitos resultados do m´odulo de elasticidade E em fun¸c˜ao da tempe-

ratura puderam ser obtidos sistematicamente atrav´es da t´ecnica de DMTA (an´alise termodinˆamico-mecˆanico), onde uma amostra, inserida em uma cˆamara fechada, ´e submetida a uma tra¸c˜ao ou deforma¸c˜ao oscilat´oria e seu m´odulo de elasticidade ´e medido a cada ciclo de carregamento, ao passo que a temperatura ´e progressivamente elevada. Neste ensaio, ´e poss´ıvel controlar a umidade no interior da cˆamara. Con- comitantemente, outras propriedades f´ısicas s˜ao lidas durante o ensaio, incluindo: densidade, calor espec´ıfico e constante diel´etrica.

Devido a grande quantidade de resultados de DMTA lan¸cados na literatura, muitos pesquisadores propuseram rela¸c˜oes emp´ıricas entre o m´odulo de elasticidade e as propriedades f´ısicas medidas. Neste contexto, Dutta e Hui [55] propuseram uma rela¸c˜ao entre o m´odulo de elasticidade e a densidade ρ medida ao longo do ensaio, na seguinte rela¸c˜ao:

E(t0, T0) =

 ρ T ρ0T0



E(t, T ) (2.63)

Onde E(t0, T0) ´e o m´odulo de elasticidade inicial, ρ e ρ0 s˜ao as densidades

medidas ao longo do ensaio e na condi¸c˜ao inicial, respectivamente.

Equa¸c˜oes como estas s˜ao bastante interessantes para analisarmos a interliga¸c˜ao entre as propriedades. Por´em, ´e muito mais pr´atico obtermos rela¸c˜oes diretas entre

o m´odulo de elasticidade e a temperatura. Assim, Gu e Asaro [56] propuseram que: E(T ) = E0  1 − T − Ta Tref − Ta g (2.64) Onde Ta ´e a temperatura de in´ıcio do ensaio, Tref ´e a temperatura na qual o

m´odulo de elasticidade tende a zero e g ´e um parˆametro ajustado experimentalmente. Entretanto, apesar do DMTA ser uma t´ecnica bastante r´apida e pr´atica, as amostras utilizadas s˜ao lˆaminas finas e pequenas, que n˜ao representam de maneira fiel o comportamento de uma estrutura. Al´em disso, ensaios de flex˜ao tendem a gerar resultados diferentes de ensaios de tra¸c˜ao, devido ao cisalhamento das interfaces influenciar no resultado final da estrutura. Por fim, apesar de este ensaio revelar a tendˆencia do comportamento el´astico do material, n˜ao s˜ao obtidas informa¸c˜oes sobre a sua resistˆencia final.

Por este motivo, ensaios monotˆonicos at´e a ruptura s˜ao fundamentais para a obten¸c˜ao da resistˆencia real de um material comp´osito. Entretanto, apesar da li- teratura apresentar bastante informa¸c˜ao sobre alguns sistemas de materiais sub- metidos a carregamentos monotˆonicos espec´ıficos, ainda n˜ao ´e poss´ıvel prever de maneira precisa o impacto na resistˆencia final de uma estrutura comp´osita sob um carregamento qualquer, submetida a altera¸c˜oes higrot´ermicas.

2.7.2

Tens˜oes internas

O processo de fabrica¸c˜ao utilizado na confec¸c˜ao de componentes mecˆanicos de comp´ositos pode produzir tens˜oes internas relevantes no produto final. Como exem- plo, no processo de enrolamento filamentar, as fibras s˜ao tensionadas durante o seu assentamento no mandril, resultando em tens˜oes internas diferentes das que seriam obtidas em um processo de moldagem, onde n˜ao h´a tensionamento das fibras. Al´em disso, a incompatibilidade da expansividade t´ermica e higrosc´opica dos componentes de um FRP faz com que tens˜oes internas e distor¸c˜oes sejam geradas durante o seu processamento t´ermico de cura.

Posteriormente, o FRP poder´a operar em uma grande variedade de ambientes que podem provocar altera¸c˜oes no seu desempenho. Apesar de possu´ırem naturezas diferentes, temperatura e umidade possuem grande similaridade quanto `as perdas de propriedades causada e quanto `a gera¸c˜ao de tens˜oes internas no comp´osito.

A difus˜ao de ´agua no comp´osito ´e acompanhada por processos de absor¸c˜ao e dessor¸c˜ao que ocorrem de maneira diferente em fibra e matriz. Tais processos, al´em de provocar tens˜oes internas no material, podem causar distor¸c˜oes indesej´aveis no componente.