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EFEITOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO ABANDONO AFETIVO

4. DO ABANDONO AFETIVO DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

4.2 EFEITOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO ABANDONO AFETIVO

Como bem assinalado no decorrer do trabalho, na responsabilidade civil subjetiva, tem-se de provar a ação ou omissão do agente, o dano experimentado pela vítima e a relação de causalidade entre a ação ou omissão e o dano sofrido, onde faz-se mister provar que o agente agiu com culpa. (CARVALHO NETO, 2005, p. 48)

Com muita propriedade é que Noronha (2003, p.368) esclarece que “só haverá ato ilícito se a conduta do agente, seja ativa ou omissiva” puder ser imputada a culpa.

Neste norte, Noronha (2003, p.369) ainda assevera que a vontade do agente é relevante, seja a ação dolosa, intencional; seja culposa, eivada de negligência ou imprudência, sendo sempre associada à vontade do seu autor, explicando que:

Negligência é desatenção, falta de cuidado, que faz não prever um fato danoso que poderia acontecer; imprudência é excesso de confiança ou imprevidência, que leva a não adotar as cautelas necessárias, a não tomar as precauções que seriam exigíveis para evitar o fato danoso. [...] Em todas estas hipóteses o autor poderia ter agido de forma diferente, se quisesse ou se tivesse sido mais cuidadoso, como era de se exigir que fosse.

Em se tratando do abandono afetivo do menor, Aguiar Dias (1995, p.730) divulgando uma definição de dano moral originada do italiano Minozzi, que data de 1901, consegue alcançar uma visão bem precisa do dano moral por abandono afetivo que se quer trazer à tona, posto que:

Não é o dinheiro, nem uma coisa comercialmente redutível a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a dilaceração física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuindo à palavra dor o mais largo significado [...] onde o dano moral é o efeito não patrimonial da lesão.

O objetivo da indenização civil pelo abandono afetivo está em reparar o dano já causado ao menor, posto que a pretensão perante a justiça das perdas e danos, especialmente o dano moral, tem por escopo reparar o prejuízo irreversível causado ao menor, que sofreu com a ausência do pai ou da mãe, onde por conseqüência já não há amor para se tentar recuperação. (MADALENO, 2006)

O fato gerador da obrigação de indenizar o abandono afetivo, baseado no rompimento dos deveres de educação, guarda e sustento, habita na proteção dos direitos da personalidade, do qual faz parte a dignidade da pessoa humana, onde é sustentado que os pais não podem esquivar-se de conviver com seus filhos furtando-se aos deveres de guarda (no caso de cumprimento de visitas) e os deveres de educação, que são de sua responsabilidade. (HIRONAKA, 2006)

Lima (2004, p. 630), informa que a responsabilidade civil dos pais pelo abandono afetivo de menores, decorrente do dever de educação, deve ser analisada sob a ótica da teoria clássica, que se baseia na culpa, ponderando que:

Na abordagem do tema responsabilidade dos pais na educação e na formação escolar dos filhos:

a) A palavra responsabilidade pode ser traduzida de duas maneiras; b) Em uma das suas acepções, responsabilidade denota as atribuições conferidas aos pais, pelas normas constitucional e infra-constitucional, com o objetivo de viabilizar o desenvolvimento físico, moral e intelectual da criança e do adolescente;

c) Na outra acepção, responsabilidade denota o dever de indenizar atribuído aos pais, em decorrência do descumprimento daquelas atribuições;

d) O dever de indenizar somente será reconhecido quando a omissão ou falta dos pais ou de um deles for atribuível a negligência.

Neste mesmo norte, Hironaka (2006, p. 143) discorre que a indenização causada pelo abandono afetivo, à luz da responsabilidade civil subjetiva, onde fica configurada a culpa, enquanto elemento caracterizador da obrigação de indenizar, esclarece que:

Além da inquestionável concretização do dano como elemento da configuração do dever de indenizar, torna-se necessária a comprovação da culpa do genitor não-guardião que deve ter se ocultado da convivência com o filho, e deliberadamente se negado a participar do desenvolvimento da sua personalidade, de forma negligente ou imprudente. Como é o caso do abandono afetivo, com a concomitante inobservância dos deveres de ordem imaterial atinentes ao poder familiar, expressão maior da relação paterno/materno filial, configurar-se-á a culpa em sua modalidade omissiva.

Assim, o abandono afetivo nas relações de família configura ato ilícito tanto na modalidade ativa quanto na omissiva, onde o dano sofrido pelo abandono afetivo dito extrapatrimonial, imaterial, moral, sobrevêm dos direitos da personalidade do menor e do preceito constitucional da dignidade da pessoa humana.

Com muita propriedade Noronha (2003, p.444) assevera que ofensas à direitos da personalidade configuram a responsabilidade civil:

A primeira categoria de lesões que geram responsabilidade civil em sentido estrito é constituída pelas violações de direitos da personalidade. Estes são os direitos que, pode dizer-se, constituem a versão civil dos direitos fundamentais da pessoa humana, tutelando esta, na esfera privada: têm por objeto salvaguardar o respeito devido ao corpo (vida, saúde), à imagem, ao nome, pensamento, honra, liberdade e mais atributos da pessoa. Os princípios gerais aplicáveis a tais direitos são objeto de expressa previsão nos arts. 11 e seguintes do Código Civil.

Sob esta ótica, o dano proveniente do abandono afetivo é antes de mais nada um dano à personalidade do menor, onde a explicação jurídica da configuração do dano experimentado no abandono afetivo do menor é extraído dos ensinamentos de Hironaka (2006, p. 141):

Macula o ser humano enquanto pessoa, dotada de personalidade, sendo certo que esta personalidade existe e se manifesta por meio do grupo familiar, responsável que é por incutir na criança o sentimento de responsabilidade social, por meio do cumprimento das prescrições, de forma que ela possa, no futuro, assumir a sua plena capacidade de forma juridicamente aceita e socialmente aprovada.

Diante disso é que Pereira (2006, p. 234) assevera que “[...] a falta de afeto faz crianças tristes e revoltadas; mostram-se rebeldes, indisciplinadas, ou simplesmente incapazes de agir com segurança e serenidade”.

Por este feito é que o abandono afetivo materializa-se na falta de convivência das relações familiares, habitado na indiferença, no desleixo e descaso dos pais para com seus filhos, acarretando uma construção de personalidade deficiente nos filhos e refletindo diretamente no seu desenvolvimento enquanto parte integrante da sociedade.

A par disto, em recente julgado o Dr. Luis Fernando Cirillo, juiz da 31ª. Vara Cível de São Paulo – Processo n° 000.01.036747-0 – j. 07.06.2004, condenou um pai, por danos morais, a indenizar sua filha, reconhecendo que a “paternidade não

gera apenas deveres de assistência material, e que além da guarda, portanto independentemente dela, existe um dever, a cargo do pai, de ter o filho em sua companhia”, ponderando ainda que:

Não se pode rejeitar a possibilidade de pagamento de indenização do dano decorrente da falta de afeto simplesmente pela consideração de que o verdadeiro afeto não tem preço, porque também não tem sentido sustentar que a vida de um ente querido, a honra e a imagem e a dignidade de um ser humano tenham preço, e nem por isso se nega o direito à obtenção de um

benefício econômico em contraposição à ofensa praticada contra esses bens.

Verificado o exposto, tem-se que o abandono afetivo de menores não pode ser reparado, posto que anímico, deve assim, ser compensado, onde tal compensação dá-se pela transformação da obrigação de fazer, a qual o menor foi vítima de seu descumprimento, cuidar com afeto, para a obrigação de dar quantia certa em dinheiro. Portanto, o abandono afetivo do menor por seus pais acarreta em conseqüências patrimoniais para aquele que causou o dano.

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