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4 TRABALHO ARTÍSTICO DO ATOR

4.3 Negócio Jurídico do Contrato de Trabalho Artístico do Ator

4.3.1 Eficácia Jurídica Pretendida pelas Partes

Diferentemente do ato jurídico stricto sensu, no negócio jurídico, a vontade é manifestada para compor o suporte fático de certa categoria jurídica, à sua escolha, visando à obtenção de efeitos jurídicos que tanto podem ser predeterminados pelo sistema, como deixados, livremente, a cada um. Assim é que, por exemplo, nos contratos – que são a mais importante espécie de negócio jurídico –, em geral os figurantes podem ter a liberdade de estruturar o conteúdo de eficácia da relação jurídica resultante, aumentando ou diminuindo-lhe a intensidade, criando condições e termos, pactuando estipulações diversas que dão, ao negócio, o sentido próprio que pretendem.132

Sobre o contrato individual de trabalho, Pontes de Miranda se manifesta da seguinte forma:

131 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado: Parte Especial, v. 48, Livro

XLVIII, § 5123, 2. ed. Rio de Janeiro: Editor Borsoi, 1965, p. 103.

132 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: plano da existência. 7. ed. São Paulo: Saraiva,

Contrato individual de trabalho é o negócio jurídico em que uma, duas ou mais pessoas físicas se vinculam mediante remuneração, a prestar serviço não eventual, à pessoa física ou jurídica, empresa privada, ou pública, dependentemente

[…]

Bilateralidade – como quaisquer contratos de trabalho, o contrato individual de trabalho é consensual, bilateral, e um dos figurantes promete a prestar o trabalho e outro retribuir.

A relação jurídica que o contrato de trabalho se irradia é entre o empregado e o empregador; mas o figurante133 que promete o trabalho e o figurante que o quer

só se fazem empregado e empregador porque concluíram o negócio jurídico bilateral.134

Todos os negócios jurídicos têm como elemento nuclear do suporte fático a manifestação ou declaração consciente de vontade, de modo que o contrato tem como elemento nuclear de seu suporte fático, também, a manifestação ou declaração consciente de vontade.

Portanto, a manifestação ou declaração consciente de vontade é um elemento nuclear do suporte fático e, se ocorrer no mundo (incidência), tornará o suporte fático suficiente e, consequentemente, existente. Vale dizer: para a existência do contrato, é necessário ter ocorrido a manifestação ou declaração consciente de vontade de sua realização.

Pelo conceito de contrato, também é possível a identificação de um elemento completante do núcleo do suporte fático, que é: a bilateralidade entre empregado e empregador.

Uma vez ocorrendo no mundo (incidência) os elementos nucleares e completantes, que tornam o suporte fático suficiente, o contrato existente tem entrada no plano da validade, em que se verificará sua eficiência. Se faltarem os elementos complementares, o núcleo do suporte fático será imperfeito. O contrato será existente, pois seu suporte fático é suficiente; no entanto, será inválida, pois o suporte fático, embora suficiente, é deficiente.

O contrato de trabalho existindo, serão analisados os elementos complementares do suporte fático, ou seja, os pressupostos de validade.

133 Figurante, como sinônimo de parte da relação jurídica.

134 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado: Parte Geral. São Paulo: Ed.

Após passar pelo plano da existência e da validade, o contrato está apto a entrar no plano da eficácia, que é composto de duas partes:

1. Eficácia contida no preceito. Consequência jurídica prevista para o negócio praticado;

2. Eficácia jurídica pretendida pelas partes. Consequência escolhida pelas partes para situações decorrentes do negócio jurídico.

Como visto, o negócio jurídico é o fato jurídico cujo elemento nuclear do suporte fático consiste em manifestação ou declaração consciente de vontade, relação à qual o sistema jurídico faculta às pessoas, dentro de limites predeterminados e de amplitude vária, o poder de escolha de categoria jurídica e de estruturação de conteúdo eficacial das relações jurídicas respectivas, quanto ao seu surgimento, permanência e intensidade no mundo jurídico.

Assim, no plano da eficácia, podem as partes escolher a categoria jurídica e estruturar o conteúdo eficacial das relações jurídicas respectivas.

A escolha da categoria jurídica é a escolha pelo negócio jurídico pretendido, que pode ser negócio típico135 (transação, contrato de trabalho, contrato de prestação de serviços, contrato de compra e venda, contrato de locação etc.) ou atípico.136

Assim, depois de feita a escolha do negócio jurídico do contrato de trabalho artístico do ator como categoria jurídica, podem as partes, ainda, estruturar o seu conteúdo eficacial do negócio jurídico escolhido.

Nas palavras de Marcos Bernardes de Mello:

Daí se pode concluir que a margem deixada à vontade pelo sistema jurídico traça os contornos do campo onde se pode exercer o poder de auto- regramento (autonomia). Constitui, portanto, regra fundamental a de que a vontade somente pode ser manifestada quando admitida e sempre de

135 Aqueles que têm previsão e regulamentação legal, cf. MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato

Jurídico: plano da existência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 190.

conformidade com as normas jurídicas de natureza cogente. Com isto queremos dizer que, se há o reconhecimento do poder de auto-regramento da vontade, é preciso verificar, ainda, a sua compatibilidade com o ordenamento jurídico, sob pena de sofrer as sanções por ele impostas, que vão desde a inexistência do negócio jurídico – quando se trata de negócio proibido – à sua invalidade (nulidade e anulabilidade) e ineficácia.137

Na realidade, onde é possível e as partes encontram espaço, a autonomia da vontade pode ser expressa com liberdade negocial:

De tudo isso, parece resultar evidente que a autonomia da vontade, ou seja, o poder de auto-regramento das relações jurídicas negociais, não pode ser considerada uma prerrogativa absoluta, ilimitada, das pessoas. Ao contrário, as suas limitações podem ser tão amplas que apenas lhe reste a possibilidade de manifestação, pura e simples, da vontade de realizar o negócio, que a lei já regulou exaustivamente, sem permitir outras opções. Vê-se, destarte, que tanto quando há ampla liberdade negocial, como quando existe disciplinamento prévio, restringindo-a, o que, efetivamente, se tem é outorga de poder às pessoas pelo ordenamento jurídico. A vontade assim não é fonte: Nem das categorias jurídicas, porque, apenas, as escolhe e as preenche, compondo-lhes os suportes fáticos.

Nem, tampouco, dos efeitos jurídicos correspondentes, porque, também, somente lhe cabe escolhê-los, quando permitido, e tudo isso dentro dos limites traçados pelo sistema jurídico.138

Fabíola Marques comenta a dificuldade da fixação de valores salariais, reconhecendo a livre estipulação contratual:

A doutrina é unânime em afirmar que se trata de um assunto difícil e complicado, tendo em vista o caráter essencialmente pessoal do salário e sua livre estipulação contratual. Apesar da liberdade de contratar o valor do salário, na prática, sua estipulação decorre de inúmeros fatores, tais como, a capacidade econômica do empregador, a necessidade do empregado, o custo de vida da região, a oferta e a procura do trabalho, a especialização do empregado, a complexidade dos serviços, dentre outros fatores.139

E será dentro da possibilidade de as partes exercitarem sua autonomia da vontade, que o ator poderá negociar com o contratante as cláusulas de seu contrato.

137 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: plano da existência. 7. ed. São Paulo: Saraiva,

1995, p. 158.

138 Ibid., p. 159.

139 MARQUES, Fabíola. Equiparação Salarial por Identidade no Direito do Trabalho Brasileiro. São Paulo: