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3 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A ARTE

3.3 O Trabalho Artístico

3.3.3 Lei do Artista

A Lei nº 6.533, publicada em 24 de maio de 1978, dispôs sobre a regulamentação das profissões de Artistas e e de técnico em Espetáculos de Diversões e foi regulamentada pelo Decreto nº 82.385 de 5 de outubro de 1978.

Ambas as normas versam sobre o exercício das profissões de Artista e de Técnico em Espetáculos de Diversões, definindo como Artista:

I - O profissional que cria, interpreta ou executa obra de caráter cultural de qualquer natureza, para efeito de exibição ou divulgação pública, através de meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizam espetáculos de diversão pública.

A primeira observação que se faz em relação às normas citadas é que o empregado artista possui legislação específica, que o diferencia das demais profissões, o que, por si só, já o distingue e demonstra sua especificidade de tratamento em relação à maioria dos empregados.

Alice Monteiro de Barros ratifica este posicionamento, afirmando que

o artista distingue-se, ainda, dos demais trabalhadores porque, além da aptidão e qualificações especiais, por meio de sua obra, comunica-se com o público. Em conseqüência, surgem novos fatores no exercício de sua profissão, como o risco da censura e as pressões provenientes do fato de se encontrar muito exposto a elogios ou a criticas, nos meios de comunicação.109

A segunda observação advém do fato de a legislação limitar a definição de artista. O artista que se encontra sob a incidência desta norma é aquele considerado como tal no artigo 2º da Lei nº 6.533.

Mantendo-se a utilização da teoria em todo o trabalho, identificam-se os elementos do suporte fático da norma e seu preceito.

Regra jurídica: Art. 2º da Lei nº 6.533. Para os efeitos desta lei, é considerado:

I - Artista – o profissional que cria, interpreta ou executa obra de caráter cultural de qualquer natureza, para efeito de exibição ou divulgação pública, através de meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizam espetáculos de diversão pública.

Suporte fático – elementos nucleares:

109 BARROS, Alice Monteiro de. As Relações de Trabalho no Espetáculo. São Paulo: Editora LTr, 2003, p.

− (se) pessoa que cria ou interpreta ou executa; − (se) obra de caráter cultural;

− (se) para efeito de exibição ou divulgação pública;

− (se) através de meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizam espetáculos de diversão pública.

Preceito: (então) Consideram-se Artistas para efeitos desta lei.

A definição de artista, para efeitos desta lei, não implica a conclusão de que outras pessoas que produzem obra de arte, mas sem objetivo cultural ou sem pretensão de exibição ou divulgação pública, ou mesmo sem utilização de meios de comunicação de massa, não sejam artistas. Estas pessoas podem ser artistas, mas, para estes casos, nos quais não ocorrem os elementos do suporte fático enunciados na regra jurídica acima, não se aplicam os efeitos (preceitos) previstos nesta lei.

No caso do trabalho artístico do ator (delimitação do artista objeto dessa análise), verifica-se que haverá a incidência desta regra em muitas situações, mas, repita-se, quando não houver, não se descaracterizará o ator, como artista, nem mesmo seu trabalho artístico, apenas este não incidirá no suporte fático desta lei.

Assim, por exemplo, se um ator decide participar de um grupo teatral, no qual os integrantes se reúnem para trabalhar juntos em leituras de peças, ensaios, realizar treinamentos, bem como aperfeiçoar técnicas de interpretação, de forma remunerada, mas este trabalho não será exibido nem divulgado publicamente, por meio dos veículos de comunicação de massa ou em locais onde se realizam espetáculos de diversão pública, este ator continua sendo artista, mas não haverá incidência do suporte fático da norma analisada; portanto, ele não é considerado (não existe) como artista para os efeitos desta norma.

Prosseguindo-se na análise da situação citada acima, caso este ator, além de realizar seu trabalho de interpretação, também acumulasse outra função, por exemplo, sendo responsável pela produção da obra que está criando, interpretando e executando, não haveria para ele a incidência do art. 22110 da mencionada lei, pois, uma vez que ele não é

considerado como artista para efeitos da lei, não há entrada deste fato jurídico nos planos da existência e da eficácia, de modo que não será devido o adicional de 40%, por acúmulo de função (preceito).

Já, para os efeitos da Lei sobre Direitos Autorais, consideram-se artistas intérpretes ou executantes, todos os atores, cantores, músicos, bailarinos ou outras pessoas que representem um papel, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem em qualquer forma obras literárias ou artísticas ou expressões do folclore.111 Não há, portanto, no suporte fático da lei autoral, as hipóteses limitadas encontradas no suporte fático da lei dos artistas.

Feitas estas observações e prosseguindo-se na verificação das regras jurídicas que regulamentam a profissão do artista, é interessante constatar que o art. 19 da Lei nº 6.533, reafirma “que o profissional contratado por prazo determinado não poderá rescindir o contrato de trabalho sem justa causa, sob pena de ser obrigado a indenizar o empregador dos prejuízos que desse fato lhe resultarem”.

Não obstante esta normativa estar prevista para qualquer profissão, a ratificação desse compromisso por meio da legislação especial demonstra a importância do compromisso pessoal que o artista deve ter com a obra que produz.

Tal situação fica bastante nítida, ao se imaginar que prejuízos o empregador sofreria, caso um ator decidisse rescindir seu contrato antecipadamente, para ser protagonista de uma novela (obra de caráter cultural), destinada a ser exibida à população (divulgação pública), por meio de canal de TV Aberta (por meio de veículos de comunicação de massa). Certamente, a desistência do empregado no meio da obra traria prejuízos de grandes proporções e, portanto, muito oportuna é a redação do art. 19 da mencionada lei.

Outros dois artigos da Lei nº 6.533 que merecem destaque são:

Art. 24 - É livre a criação interpretativa do Artista e do Técnico em Espetáculos de Diversões, respeitado o texto da obra.

[…]

assegurado ao profissional um adicional mínimo de 40% (quarenta por cento), pela função acumulada, tomando-se por base a função melhor remunerada. Parágrafo único - É vedada a acumulação de mais de duas funções em decorrência do mesmo contrato de trabalho.

Art. 27 - Nenhum Artista ou Técnico em Espetáculos de Diversões será obrigado a interpretar ou participar de trabalho possível de pôr em risco sua integridade física ou moral.

Estas normas ratificam a liberdade que o artista possui na condução do seu trabalho criativo, que é extremamente pessoal e particular. O processo criativo que conduzirá o modo como o artista, no caso em análise o artista ator, interpretará seu personagem que dará origem à obra final é, em sua essência, caracterizado pela liberdade. Vale dizer, cada ator é livre na sua criação interpretativa.

Segundo Alice Monteiro de Barros,

O caráter intuitu personae do empregado também assume relevo importante na celebração do contrato do artista, exatamente porque sua prestação de serviços, a par do aspecto fiduciário que a envolve, se exterioriza por meio de valores intrínsecos como a criação e a interpretação. A criação interpretativa é livre, observado, porém, o texto final da obra (art. 24 da Lei n. 6533, de 1978, e art. 52, parágrafo único, do decreto n. 82.385, de 1978). A liberdade da prestação naquilo em que ela tem de criativa “e no que supõe de adesão espontânea do artista aos valores de sua arte, e a subordinação no que tem de rigorosa obediência a uma disciplina de equipe, confluem para qualificar como de extrema pessoalidade os vínculos de trabalho em causa”.112

O art. 27 também é consequência desta liberdade que o ator tem de proteger sua integridade física e moral. Basta que o ator entenda que a interpretação de um papel ou a realização de um trabalho pode pôr em risco sua integridade, ele está desobrigado a atuar.

Essas considerações sobre as regras jurídicas, que versam sobre a profissão do artista, vêm corroborar com percepção de que o trabalho artístico não se desvincula do artista e que as peculiaridades desta categoria não podem ser desconsideradas, quando se propõe a verificação do instituto da equiparação salarial.

112 BARROS, Alice Monteiro de. As Relações de Trabalho no Espetáculo. São Paulo: Editora LTr, 2003, p.