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Elementos que Potencializam os Ganhos de Curto e Médio Prazo

3. MAPEAMENTO DOS PADRÕES DE ATUAÇÃO DOS PAÍSES NAS CGV POR

4.3 ELEMENTOS EXÓGENOS E ENDÓGENOS QUE POTENCIALIZAM AS

4.3.1 Elementos que Potencializam os Ganhos de Curto e Médio Prazo

Desde o surgimento do paradigma de fragmentação internacional da produção, a inserção dos países em desenvolvimento nas cadeias de valor tem sido condicionada pelas vantagens comparativas exógenas, associadas à disponibilidade de mão-de-obra e à

localização. Observa-se, com isso, a entrada de países nesta dinâmica de produção com mão- de-obra abundante e barata e que estejam próximos as empresas líderes ou aos outros estágios de produção subsequentes. Não obstante, é fundamental ressaltar que o deslocamento de etapas para esses países é uma decisão das firmas líderes, que caso surjam alternativas mais atraentes para as mesmas, o país perde sua posição na cadeia.

Como exemplo da inserção de países em desenvolvimento nas cadeias condicionada a essas vantagens exógenas, tem-se os países asiáticos (distribuídos nos grupos 2, 3 e 4) que se inseriram nas redes de produção lideradas por empresas japonesas em atividades intensivas em mão-de-obra. O mesmo valeu para os países europeus menos desenvolvidos (grupo 5) que atuam em atividades terceirizadas pela empresas líderes alemãs e para o México (grupo 6) em relação as empresas norte-americanas. Os países que se inseriram nas cadeias como fornecedores de matérias-primas – na amostra, grupo 6, e fora dela, vários países africanos e na América Central – o elemento localização perde a relevância, com esses países exportando para países mesmo com distâncias maiores.

Além disso, a participação dos países nas cadeias requer uma produção com competitividade internacional, sendo necessário que elementos como infraestrutura, ambiente de negócios burocratizados e protecionismo não pesem na estrutura de custo de produção destes países. Assim, a criação de vantagens comparativas endógenas é essencial já nesta fase inicial, com as vantagens competitivas sendo criadas a partir de redes de comunicação e transporte eficientes em paralelo a ambientes favoráveis à efetivação de negócios. Adicionalmente a estes aspectos de cunho estrutural, medidas de liberalização comercial e de investimento implicam positivamente para a inserção dos países nas cadeias globais de valor dado o acentuado volume de insumo importado e do fluxo de IDE inerente a esta dinâmica de produção. Além desses elementos, observa-se a criação de zonas de processamento de exportação com incentivos tarifários e aduaneiros para produção voltada à exportação também servindo como um instrumento utilizado para a inserção nas cadeias.

Dos exemplos citados anteriormente referentes à existência de vantagens exógenas, todos aqueles países apresentaram também condições estruturais e institucionais mínimas assegurando a lucratividade das firmas líderes, que são as que comandam a fragmentação e distribuição das etapas produtivas existentes na cadeia de valor. A respeito da liberalização, nos anos 90, o processo de abertura comercial e financeira foi seguido amplamente pelos países em desenvolvimento, no entanto, em diferentes intensidades. A redução do protecionismo comercial ocorreu de forma mais uniforme entre esses países, o mesmo não ocorrendo quanto à abertura da conta de capital. Nos países asiáticos de industrialização

recente de 2ª geração (grupo 2 e parte do 4), nos países europeus do grupo 5 e no México, a flexibilização do controle de investimento direto estrangeiro ocorreu mais intensamente, com esses países se aproveitando da acentuação desses fluxos decorrente da criação de redes de produção regional. Destaca-se ainda entre os países asiáticos, a existência de acordos de investimento contribuindo positivamente para a distribuição regional de etapas produtivas. A criação de zonas de processamento a exportação (ZPE’s) – difundida principalmente entre os asiáticos – contribuiu para inserção de muitos desses países, transformando-os em plataformas de exportação, com a atuação restringindo-se a etapas de baixo VA.

A evolução dos países nas CGV após a fase de inserção também ocorre condicionada a alguns elementos, sendo uma parte exógena a decisão desses países, mas em geral, condicionado a esforços adicionais criados endogenamente. A evolução nas cadeias ocorre inicialmente, sob a forma de upgrading de processo e produto, podendo prosseguir via upgrading de cadeia, e por fim, em nível mais difícil através do upgrading funcional, atuando como um mecanismo de sustentação dos ganhos nas cadeias no longo prazo. Esse último quando de forma generalizada e com efeitos de transbordamento para o restante da economia atua como um elemento de dinamização da economia rumo ao degrau produtivo mais elevado. Observa-se nesse caso, medidas realizadas no âmbito microeconômico refletindo para a dimensão macroeconômica.

O primeiro tipo de evolução nesta dinâmica de produção fragmentada internacionalmente refere-se ao upgrading de processo e/ou produto. Utilizar processos produtivos mais eficientes e/ou ampliar a sofisticação do produto são de interesse das firmas líderes, fazendo com que realizem muitas das vezes investimentos voltados à maior qualificação, padronização e certificação no âmbito das firmas fornecedoras, de forma que a produção destas atenda totalmente a suas necessidades. Medidas de caráter similar são despendidas pelas firmas domésticas implicando na sustentação de sua posição e lucratividade nas cadeias. Alguns incentivos produtivos através de políticas industriais potencializam as ações das empresas voltadas para uma melhor inserção.

Esses dois tipos de upgrading têm sido obtidos amplamente entre todos os países que participam das cadeias de valor, cuja melhora não garante qualquer alteração quanto ao padrão de atuação nas cadeias e ao estágio produtivo. Como exemplo de medidas exógenas, Humphrey (2004) cita o investimento realizado por empresas europeias de fabricação de chocolate na formação de cooperativa de pequenos produtores de cacau orgânico no Caribe de

forma que a produção local fosse padronizada, atendendo com isso, aos seus interesses65. Esse tipo de incentivo à firma fornecedora irá ocorrer sempre que o investimento realizado for menos custoso do que a atuação nesta etapa produtiva pela firma líder. Sobre as políticas produtivas que contribuem para o upgrading de produto/processo, tem-se os países europeus ex-socialista, localizados no grupo 5. Uma série de medidas foram implementadas, algumas gerais, como subsídios para atração de IDE e investimento em infraestrutura, e outras setoriais, principalmente no setor automotivo, o que refletiu no aumento significativo da produtividade dos setores integrados as redes de produção internacional (MACHADO, 2010; DULLIEN, 2010). Lembrando que em muitos países, o setor automotivo é beneficiado por políticas verticais, por exemplo, no México, cujos instrumentos contribuem para a inserção e o upgrading de processo/produto.

O upgrading de cadeia é inicialmente parte das estratégias das grandes corporações em transferir etapas do processo produtivo para outros países, só que agora de cadeias mais sofisticadas. Isso significa que, antes de qualquer coisa, é uma decisão das firmas líderes, cuja estratégia atua como um elemento exógeno para esse tipo de avanço obtido pelos países em desenvolvimento. No entanto, a criação de um ambiente rentável para as empresas líderes – como isenção fiscal, pouco controle de investimento direto, ou mesmo uma política vertical que estimule setores específicos (como a indústria automobilística citada anteriormente) – também atua como um mecanismo endógeno para a evolução dos mesmos nas CGV. Observa-se que nos países em desenvolvimento, a sofisticação da cadeia ocorre geralmente, com o país permanecendo em atividades de baixo VA. Assim, o salto para degraus mais elevado decorrente deste tipo de upgrading de cadeia somente é possível em função da incipiência do nível de desenvolvimento dessas economias.

Como exemplo de países que evoluíram nas CGV através do deslocamento para cadeias mais sofisticadas, tem-se os países asiáticos do grupo 4, que desde a inserção nas cadeias nos anos 90, muitos deixaram de atuar em cadeias tradicionais pouco intensivas em tecnologia, como vestuário e calçados, para as de maior sofisticação tecnologia (equipamentos eletrônicos e de transporte). A realização de uma ampla gama de incentivos à produção – isenção fiscal e crédito subsidiado – em paralelo a livre entrada de investimento estrangeiro tem contribuído para esse movimento.

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Nesse texto, o autor faz uma ampla discussão sobre o papel das firmas líderes, denominada no texto como “foreign buyers”, no processo de upgrading nas cadeias de valor.

E, por fim, numa maior evolução nas cadeias, têm-se o upgrading funcional. O direcionamento para atividades mais sofisticadas, geralmente de serviços, além de contribuir para a maior captura de valor adicionado na cadeia gera efeitos de transbordamento para outras atividades na economia. Na maioria dos casos observados, a evolução ocorreu pontualmente com pouco efeito spillover. Esses países, seguindo o padrão de especialização anterior, ampliaram o campo de atuação em cadeias específicas desempenhando atividades adicionais. Essa evolução pontual é recorrente em setores tradicionais (alimentícios e de vestuários) com fatores exógenos influenciando diretamente neste resultado. Existe uma maior permissividade das empresas líderes quanto à transferência de atividades mais sofisticadas quando esta não for a principal para elas, como, por exemplo, atividades referentes ao beneficiamento de produtos primários, fornecimento de insumos de maior VA e serviços de transporte. Já o upgrading funcional em cadeias mais sofisticadas tecnologicamente, o elemento endógeno prevalece, com os incentivos a produção contribuindo para a capacitação local para desempenhar essas atividades, cujos incentivos abrangem também gastos em qualificação da mão-de-obra e em pesquisa.

Nos exemplos de upgrading funcional em setores de baixa intensidade tecnológica, Milberg e Winkler (2013) citam a indústria de vestuário no México, em que as empresas locais passaram a desempenhar atividades adicionais além da montagem das roupas e vários países africanos e na América Central, em que as empresas locais ampliaram suas atividades para beneficiamento de alimentos. Embora uma maior abrangência das atividades desempenhadas por essas empresas, estas ainda são de baixo valor adicionado e em setores com baixo potencial de endogenização tecnológica. Outro exemplo citado em Palma (2004) refere-se à evolução da indústria de madeira processada no Brasil, Chile, Taiwan e Malásia. Nos anos 60, os primeiros três países eram recursos naturais abundantes e não tinham uma indústria de madeira processada. A Malásia, visando replicar o sucesso de Taiwan, implementou uma política industrial em que se restringia a exportação de lascas de madeiras concomitantemente ao estímulo às manufaturas de madeira e mobiliário. Nos anos 2000, Brasil e Chile mantiveram-se como exportadores de madeira enquanto Malásia e Taiwan, de madeira processada (manufaturas de madeira e móveis). O mesmo pode dizer do Chile quanto à exportação de minério (siderurgia) enquanto outros países buscaram avançar na escada tecnológica concentrando-se no setor de metalurgia.

A tabela 31 resume os elementos exógenos e endógenos que potencializaram a inserção e evolução dos países nas cadeias, destacando-se algumas medidas que contribuíram para avanços pontuais dos países em determinados setores/cadeias/funções, recorrentes

principalmente entre os países em desenvolvimento que vem obtendo os ganhos de curto e médio prazo da atuação nas CGV.

Tabela 31 - Elementos que potencializam a inserção e evolução dos países em desenvolvimento nas Cadeias Globais de Valor.

Exógenos Endógenos

Inserção - Disponibilidade de fatores, - Localização - Investimento em infraestrutura, - Liberalização comercial e de investimento, - ZPE, - Acordos de investimento Upgrading produto/ processo

Incentivos fornecidos pelas firmas líderes (foreign buyers) sob a forma de investimentos em:

- infraestrutura,

- qualificação, padronização e certificação

- Isenção fiscal, - Crédito subsidiado

Upgrading cadeia

Estratégias das firmas líderes em transferir etapas de novas cadeias - Isenção fiscal, - Crédito subsidiado, - Liberalização comercial e de investimento, - Acordos de investimento Upgrading

funcional Estratégias (permissividade) das empresas líderes

- Isenção fiscal, - Crédito subsidiado,

- Política tecnológica – construção e fortalecimento de um SNI.

4.3.2 Elementos que Potencializam os Ganhos de Longo Prazo Decorrente da Atuação