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10. A EMOÇÃO, AFETOS E OUTRAS SUBJETIVIDADES NA

10.1. A emocionante participação na rinha

É dentro dos três tambores que os galos são intensivamente instigados a lutarem. Na rinha é sempre assim: aos gritos, os participantes estimulam os animais. As disputas geram mais vibração quando participantes ou animais famosos pelas vitórias se enfrentam. Esses combates fazem o público se emocionar com mais frequência.

As aves lutam em um plano simbólico em que há um enfrentamento entre os homens, que estão sendo representados por seus animais dentro dos rinhadeiros. Essas emoções são ligadas ao desempenho do galo no ringue.

Podem representar uma alegria diretamente ligada a um excelente performance do lutador ou uma vitória. Mesmo que o animal que esperava-se fosse vencedor não vença, por vezes, a sua demonstração de bravura em enfrentar o desafio é considerado um feito heroico.

De maneira contrária, pode motivo de tristeza ou até vergonha ao galista, quando seu galo não corresponde às expectativas dentro do tambor, fugindo do adversário como ocorre frequentemente.

Sobre esta emoção, um dos galistas entrevistados relatou que “é aqui que a gente esquece dos problemas da semana e a gente tira o estresse ", afirmou Tulio, participante frequente das rinhas paraibanas.

As rinhas de galos como afirmou Gertz (1989, p.283) são “jogo absorvente”, por gerarem prazer aos participantes, que ficam durante várias horas na observação e análise os saltos, os ataques e as defesas de cada galo, desse espetáculo ao qual se referiram com único.

Esses dois extremos de reações por parte do público – a felicidade na boa performance da ave no combate ou a tristeza quando não faz uma boa luta – traduzem- se em emoções semelhantes às de quem está na torcida em eventos esportivos, sejam eles de luta ou atividades desportivas coletivas. A vibração ou descontentamento estão estampadas na expressão de cada participante da rinha de galo.

Para Silva (2011, p. 119) em dissertação de mestrado em que faz um estudo antropológico sobre das rinhas no Rio Grande do Sul:

Alguns fatores fazem os jogos ficarem mais interessantes como galistas ou galos de renome que se enfrentam. Isso atrai mais público e valores mais altos nas apostas principalmente nas paralelas, mas principalmente, torna-se um ingrediente para que o jogo se torne mais interessante, aumentando a vibração a cada golpe efetuado pelos animais.

Dessa forma, em um local onde a atração é gerada pelos atos violentos travada nos combates entre as aves, a ordem disciplinar desse lugar frequentado por atores de de diferentes ideologias, classes sociais, credos, entre outras possíveis diferenças, se dialogam sem obstáculos separando-a, aliado ao fato de envolver apostas em dinheiro.

Silva (2011, p. 120) complementa:

Poderia fomentar a ideia de um lugar que está prestes a explodir em atos violentos, proporcionados pelo conjunto de elementos envolvidos nesse contexto, partindo do exemplo que vem de outros esportes em que a torcida é segregada para evitar o conflito, gerado pelas emoções que são afloradas durante as partidas. Essa ordem é mantidas por valores morais fortemente estabelecidos pelo grupo em uma noção de honra, que é mantida pela palavra do homem. Por outro lado a mais alta honraria, pelo prestígio de ter conhecimento sobre rinhas e conduta ilibada perante os demais participantes, é ser juiz, que tem suas decisões inquestionadas pelos participantes das brigas de galos (SILVA, 2012, p.120).

Dessa forma, percebe-se que a identidade, como construção social, na rinha é integrante parte de um contexto onde ocorrem interações múltiplas. Nesse contexto entende-se que a identidade dos galistas e participantes das rinhas de galos não se dá de forma homogênea, e sim de uma pluralidade de interações que formam essa figura que é o galista, sendo então esse o interesse da pesquisa, porque eles recorrem à identificação de galistas, por que e por quem e em qual momento se busca essa identidade em particular, e não saber quem são verdadeiramente os galistas.

Tratar de emoções é estudar um fenômeno sociológico. O estudo sociológico de emoções pode contribuir com a psicologia, a biologia e a neurociência para produzir uma compreensão mais rica e multifacetada do fenômeno. Emoções podem ser sociologicamente estudadas e a partir de diferentes referenciais teóricos da antropologia e sociologia.

Ao analisar as imagens das rinhas, a doutora em antropologia e professora da Universidade Federal da Paraíba Lara Amorim (informação verbal)20 entende que as emoções são repassadas aos galos, objeto da disputa. “Há uma transferência emocional

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no sentido de que o desprezo que acontece ali em relação aos galos representa a emoção dos homens, galos estão como objeto”, disse a professora em entrevista a esta pesquisa.

Percebe-se, nesse contexto, que a questão das emoções é tratada como problema sociológico e antropológico, como um instituto sociocultural, e nos compete neste estudo entender como se origina este fenômeno e como desenvolve-se a cultura emocional a partir de vivências emocionais destes atores sociais presentes e inseridos no confronto real do contexto social relacional em que atuam.

As emoções, estabilizadas em um sistema espaço-temporal de coordenadas, significa um repertório de conceitos simbólicos, linguísticos e comportamentais. Nele, cada um dos atores desenvolve propriamente e de maneira individual as emoções de cunho social, a interação assume contornos estáveis e as emoções se sucedem como produtos relacionais na relação entre o indivíduo, cultura e sociedade desse contexto (KOURY, 2009, p. 88).

Encontrar explicação para a dimensão subjetiva se faz necessário tanto quanto apreender o aspecto objetivo, as formas relacionais em que se instituem a ação social, das emoções.

A sociologia e antropologia das emoções constituem análises do confronto entre cultura objetiva e cultura subjetiva. Neste contexto, se insere a questão do condicionamento ou da determinação das emoções individualmente vividas pelas formas relacionais da cultura objetiva, bem como do impacto da cultura subjetiva na rede imaginária e instituinte da cultura objetiva (KOURY, 2009, p 88).

Na obra “Emoções, Sociedade e Cultura”, Mauro Guilherme Pinheiro Koury introduz a emoção como categoria na sociologia clássica. Trata vida emocional dos indivíduos, que segundo o antropólogo é negligenciada pela perspectiva macrossociológica, totalizante e linear do estrutural-funcionalismo. O autor coloca esta perspectiva das emoções como indispensável para o compreensão dos aspectos sociais e humanos, em função de que, a partir do entendimento da intersubjetividade, se torna perceptível a singularidade de cada sujeito relacional, ou seja, da cultura subjetiva, dentro de uma sociabilidade histórica (KOURY, 2009, p 90).

Sobre o costume destes atores sociais de reunirem-se aos finais de semana para esta prática, a socióloga da Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre-RS. Jussara Kalil Pires (infomação verbal)21 entende que a rinha é uma paixão. “A

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explicação para este amor e essa dificuldade de romper, é porque é uma tradição que está enraizada na cultura de um determinado grupo social”.