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Inicialmente, importante conceituar e diferenciar os contratos bancários e os contratos de crédito. Pode-se afirmar que o contrato bancário é o gênero do qual o contrato de crédito é a espécie. Tal contrato é firmado entre o banco ou instituição financeira e o cliente, que pode ser uma pessoa física ou jurídica, e engloba operações econômicas diretas ou indiretas, entre as quais está a outorga de crédito. O contrato de crédito, por sua vez, intermedia a soma em dinheiro entregue pela instituição financeira ao consumidor, para que este lhe devolva o valor acrescido de juros e demais encargos, dentro de um determinado período de tempo pré- estabelecido. De acordo com Arnoldo Wald (2020, p. 292), os bancos desempenham uma função social de extrema importância ao possibilitar o acesso ao crédito às classes menos favorecidas, especialmente através dos financiamentos. O aumento do crédito também é importante para todos os países, sendo ainda mais relevante para as economias emergentes, no qual o Brasil se enquadra.

Os contratos de crédito consignado foram introduzidos no Brasil pela Lei nº 10.820/2003, que permitiu o pagamento mediante desconto direto na remuneração de empregados celetistas, aposentados e pensionistas, possibilitando o acesso de muitos consumidores no mercado, com taxas de juros mais reduzidas do que as demais modalidades, além de ser legalmente previstas. Tal lei representou um avanço nas relações sociais, pois permitiu o acesso de grande parte da população ao crédito pessoal com juros mais baixos, melhorando os índices sociais por conta do consequente crescimento econômico. Conforme Wald (2020, p. 292) “[...] o crédito consignado representou, para as classes menos favorecidas, uma verdadeira integração social e econômica [...]”. O autor ainda afirma que:

[...] a institucionalização dos empréstimos com consignação em folha de pagamento, teve por objetivo permitir que as instituições financeiras ofertassem crédito de forma mais simplificada e segura aos empregados, pensionistas e aposentados, de modo a proporcionar-lhes a oportunidade de acesso mais fácil e barato a recursos financeiros, com prazos de pagamento mais elásticos. (WALD, 2020, p. 299).

Atualmente, o empréstimo consignado é um contrato de concessão de crédito muito realizado. Tal modalidade de empréstimo é bastante atrativa e oferecida para os idosos pois,

sendo ele aposentado ou pensionista, poderá contratar esta modalidade, ainda que possua restrições em seu nome. Ao adotar o pagamento através de descontos diretos em folha de pagamento, reduziram muito os riscos de inadimplência, tendo como grande vantagem a oferta de taxas de juros mais baixas. Tal segurança proporcionada despertou grande interesse nos bancos em realizar esta modalidade de empréstimo, gerando uma concorrência entre eles, o que acaba melhorando as condições oferecidas aos tomadores. De acordo com Efing, Polewka e Oyague (2020, p. 391):

Desde a introdução do crédito consignado no Brasil, em 2004, por exemplo, as contratações desta modalidade somente aumentam. Com risco nulo de inadimplência, sem necessidade de consulta aos bancos de dados de inadimplentes (como por exemplo Serasa e SPC), juros mais baixos do que os cobrados em outras modalidades e excelente negócio para os bancos, o empréstimo consignado em folha para trabalhadores públicos e privados na ativa, aposentados e pensionistas bate sucessivos recordes no Brasil.

O crédito consignado é um contrato de caráter especial, sujeito a normas próprias. Possui um regime legal diferente do mútuo bancário, por conta da sua natureza, finalidade e os riscos assumidos pelo banco. Enquanto as operações financeiras em geral possuem um conteúdo essencialmente econômico e subsidiariamente social, o crédito consignado, por sua vez, abarca uma função basicamente social, apesar do dever de manter o equilíbrio das prestações e de garantir a remuneração da instituição que o concedeu.

Para caracterizar-se as consignações em folha de pagamento, é necessária a prévia e expressa autorização do mutuário à instituição financeira, bem como a concordância de seu empregador ou da previdência em realizar a retenção e o repasse dos valores devidos à instituição. A Lei nº 10.820/03 estabelece que o prazo para o pagamento, os encargos e as taxas de juros são passíveis de negociação entre as empresas e as instituições financeiras. Referida lei também viabiliza a negociação e a inclusão no contrato da possibilidade de utilizar parte da multa rescisória como garantia do empréstimo, já que o maior risco do crédito consignado é a rescisão do contrato de trabalho do consumidor-empregado. Também assegura ao empregado, pensionista e aposentado o direito de escolher instituição consignatária que tenha convênio com o banco pagador.

O art. 6º da Lei nº 10.820/03 prevê que o desconto sobre os benefícios da aposentadoria se dá com a solicitação do consumidor e com a autorização do INSS a procedê-lo diante da instituição financeira na qual recebe o seu benefício. O §1º do referido artigo também permite

ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) dispor, em ato próprio, sobre algumas formalidades, prazos e encargos.

Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1º e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS.

§1º Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre: I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1º; II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento; III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;

IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;

V – os encargos a serem cobrados para remuneração dos serviços de operacionalização das consignações, inclusive o ressarcimento dos custos operacionais; e

VI - as demais normas que se fizerem necessárias. (BRASIL, 2020).

Para Lucíola Fabrete Lopes Nerilo (2020 p. 403), esta parceria entre autarquia federal e instituição financeira gera uma expectativa de segurança nos procedimentos de empréstimo consignado, entretanto, na prática, o INSS não controla a legitimidade destes créditos, frustrando a confiança depositada neste negócio jurídico. Percebe-se que a concessão do crédito consignado é realizada de forma simples. Ao procurar a agência bancária, apresentar os documentos solicitados e assinar o contrato de negociação, o dinheiro será disponibilizado na conta. Conforme a autora, “a vantagem para o credor é que há uma garantia de pagamento, pois, antes mesmo de o mutuário receber salário, aposentadoria ou benefício, já se desconta o valor da parcela devida ao mutuante” (NERILO, 2020, p. 398). Em contrapartida, o empréstimo consignado tem gerado dados alarmantes, desencadeando o superendividamento dos idosos, que já possuem capacidade produtiva reduzida e, em muitos casos, são a única fonte de renda da família, sendo os responsáveis pelo sustento.

Quando criada, a Lei nº 10.820/03 previa que o valor da prestação poderia comprometer até 30% da remuneração do mutuário, mas, em 2015 houve uma redação dada pela Lei nº 13.172/15, que passou a permitir descontos de até 35%, conforme art. 1º, §1º da Lei nº 10.820/03, in verbis:

§ 1o O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas

rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para:

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (BRASIL, 2020).

De acordo com Renara Damasceno dos Santos (2020, p. 39)há “[...] um limite para esse desconto em folha, que é chamado de margem consignável, que corresponde a 30% para empregados e 35% para aposentados e pensionistas.”. Entretanto, conforme afirma Queiroz (2020, p. 106), é muito corriqueiro ocorrer a tentativa das financeiras em driblar esse limite legal de 35%, vinculando o benefício do mutuário aposentado ou pensionista em uma conta corrente onde recebem o salário, da qual realizam os descontos da parcela. Desta forma, conseguem desvincular o empréstimo do auxílio recebido, pois, diferente do que ocorre no empréstimo consignado, os descontos são realizados diretamente na conta corrente. Tal modalidade é denominada empréstimo pessoal. Além disso, muitas financeiras se valem da condição de vulnerabilidade do consumidor, principalmente do idoso, impondo a contratação de seguros adicionais. Neste viés, é corriqueira a atitude mal intencionada do mercado para atrair os idosos a consumirem através dos descontos em aposentadoria, “[...] ainda mais, por ser um contrato irrevogável, valendo-se para tanto de propagandas e de figuras de autoridade, que exploram medos específicos às pessoas, em um nítido abuso das condições intrínsecas a esta parcela da população.” (COELHO; AYALA, 2020, p. 256).

Os idosos são os grandes alvos das financeiras, por terem uma renda fixa mensal, tendo em vista que a maioria é aposentado ou pensionista. Assim, o desconto pode ultrapassar os 35% previstos em lei, pois o idoso pode contratar um empréstimo consignado utilizando o limite legal e, caso necessite de mais crédito, poderá contratar outros empréstimos não consignados que descontem as parcelas de sua conta corrente. Desta forma, o mutuário compromete praticamente toda a sua renda com dívidas creditícias, restando muito pouco para sua sobrevivência, além de que, normalmente, o empréstimo consignado tem um longo período para pagamento, comprometendo a renda por anos, e neste período é comum ocorrer a contratação de novos empréstimos pessoais, fator que contribui com o superendividamento e atinge a qualidade de vida e a dignidade do consumidor, conforme afirma Queiroz (2020, p. 107):

Soma-se ao crédito facilitado a falta de informação e educação para o consumo, a conduta do fornecedor que se aproveita da hipervulnerabilidade do consumidor idoso, oferecendo o serviço creditício mesmo tendo conhecimento, muitas vezes, que a pessoa idosa já está com sua renda comprometida por outras dívidas oriundas de outros empréstimos, ciente assim, que essa pessoa fatalmente restará superendividada e terá a sua dignidade atingida.

A autorização para tal desconto é irrevogável e irretratável. Para Coelho e Ayala (2020, p. 256), tais características revelam a dificuldade dos consumidores em administrar suas dívidas, pois, frente à ausência de legislação específica em nosso país para tratar o superendividamento, a contratação de dívidas sem prévia análise da capacidade de adimplência do consumidor é permitida, viabilizando o comprometimento de sua renda além da possibilidade real, o que gera o superendividamento. Por conseguinte, manifesta-se um problema social quando o consumidor idoso compromete sua renda mensal de forma que o impossibilite de adimplir suas dívidas atuais e futuras, necessitando sempre de mais empréstimos para suprir suas necessidades básicas, como medicamentos, moradia e alimentação. Tal dependência pelo crédito se agrava ainda mais diante do envelhecimento, pois as necessidades pessoais são maiores. Nota-se também o abuso dos fornecedores de crédito frente à hipervulnerabilidade dos idosos pois, na maioria das vezes, as informações acerca deste negócio jurídico não são transmitidas com clareza e boa-fé.

Quanto ao empréstimo pessoal, por sua vez, é um tipo de financiamento no qual não há garantia de bens, sendo um contrato firmado entre instituição financeira e consumidor pessoa física. Aplica-se a esta modalidade as leis consumeristas. Enquanto o empréstimo consignado permite o desconto da parcela diretamente na folha de pagamento ou do benefício previdenciário do tomador, o empréstimo pessoal é restabelecido através de desconto na conta corrente. O empréstimo consignado é regulamentado pela Lei nº 10.820/03, podendo ser pactuado pelos trabalhadores celetistas, servidores públicos estatutários, aposentados, pensionistas e militares, em que o limite a ser descontado é determinado pelo Estado e pela sua legislação específica. O empréstimo pessoal, por seu turno, é regrado pelo Banco Central e não possui limite de desconto em conta corrente, dependendo da negociação realizada com a instituição financeira, de acordo com Troster (2002, p. 124-125, apud TADDEI; QUEIROZ, 2020, p. 23):

A taxa de juros calcula-se em porcentagem referente a determinada unidade de tempo, por exemplo, 12% ao ano, 7% ao semestre e 1% ao mês, variando com o risco da operação ou com a garantia oferecida pelo devedor ou de acordo com o período em que se concede o empréstimo. O regime de juros pode ser o de juros simples ou de

juros compostos. Na primeira hipótese somente o capital inicial ou o valor principal tomado emprestado rende juros e, por consequência, não são capitalizados. No caso de juros compostos somam-se os juros do período ao capital, calculando-se novos juros nos períodos posteriores, ou seja, os juros são capitalizados e rendem juros sobre juros.

O parâmetro utilizado pelo Banco para analisar a taxa de juros total é calculado pela soma da taxa média e dos encargos fiscais e operacionais. Normalmente, é fixado um prazo não superior a 36 meses, podendo o contrato ser de adesão ou por consignação. Por não exigir garantias de bens, o risco de inadimplemento é maior, elevando as taxas de juros.

As taxas de juros do empréstimo consignado são bem inferiores às do crédito pessoal, em decorrência das parcelas consignadas serem descontadas diretamente da aposentadoria ou benefício do mutuário e, diretamente repassadas às financeiras, tornando o risco de inadimplência praticamente nulo. Por sua vez, no empréstimo pessoal, o cliente pode ser um bom pagador ou se tornar um devedor, sendo uma modalidade menos segura para o banco. Enquanto o crédito consignado é um empréstimo realizado para o devedor pagar sua dívida com o banco, o empréstimo pessoal permite ao consumidor tanto amortizar sua dívida quanto direcionar seus recursos a outras finalidades.

Conforme Taddei (2020, p. 20), “os contratos de empréstimo pessoal encontram-se regidos pelas normas de proteção e defesa do consumidor, inclusive porque a aderência a esses empréstimos por meio de contratos de adesão denota a situação de vulnerabilidade do consumidor.”. Assim sendo, aplicar-se-ão as normas gerais de proteção contratual estabelecidas pelo CDC aos contratos de empréstimo pessoal, desde a oferta e publicidade, o dever de informar acerca das cláusulas contratuais, a nulidade de cláusulas abusivas e a interpretação das cláusulas mais benéficas aos consumidores. De acordo com Rodobens (2020, s.p.), o empréstimo pessoal é oferecido pelos bancos, financeiras, cooperativas e fintechs, ou seja, bancos online. Entre os tipos de empréstimo pessoal, estão o crédito pessoal não-consignado, crédito pessoal consignado e o crédito pessoal com garantia de veículo ou imóvel. As únicas exigências para contratar o empréstimo pessoal é que o contratante seja maior de 18 anos, possua identidade e CPF válidos e que resida no Brasil. Grande parte dos bancos liberam o crédito pessoal para correntistas.

Dentre as vantagens desta modalidade está a agilidade na liberação do dinheiro e a liberdade em sua destinação, ou seja, não é necessário comprovar o objetivo da contratação de

tal empréstimo. A sua facilidade de aquisição é outra vantagem, tendo em vista que o contratante consegue realizar o empréstimo pessoal também pela internet, de forma simples e rápida. Além disso, muitas instituições concedem o crédito para os consumidores inscritos nos cadastros negativos, como SPC e Serasa. Entretanto, neste caso, a taxa de juros pode ser maior, como uma forma de proteção em caso de inadimplência. Em contrapartida, como desvantagem, estão as taxas de juros significativas, que margeiam entre 3% a 27% ao mês, por isso, o empréstimo pessoal deve ser utilizado visando pagá-lo em poucos meses, pois quanto maior o prazo de quitação, mais alto será o valor final.

Conforme Rodobens (2020, s.p.), além dos juros, também incide sobre o valor total do empréstimo a cobrança de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) que, no empréstimo pessoal, corresponde a 0,38%, além de uma alíquota diária limitada em 3% ao ano. Se comparado com os juros rotativos do cartão de crédito e do cheque especial, o empréstimo pessoal ainda é vantajoso. Enquanto as primeiras modalidades possuem juros mensais entre 12% e 15%, é possível encontrar taxas menores que essas nos empréstimos, entretanto, como existem muitas opções no mercado, esses valores variam e podem chegar em 30% ou até mais por mês. Por isso, o tomador de crédito deve procurar condições concorrentes.

Do exposto, é possível concluir que o contrato de crédito é bastante atrativo e pode servir para o consumidor sair de uma crise financeira, desde que seja cuidadoso na contratação, para evitar contrair ainda mais dívidas incompatíveis com o seu orçamento. Nesta situação, o crédito consignado é a melhor opção, pois para sua concessão não é exigido que o consumidor esteja com o “nome limpo”, bastando ser aposentado, pensionista ou que a empresa em que trabalha seja conveniada com a instituição financeira para realizar o desconto em folha de pagamento. Por outro lado, os representantes das instituições de crédito, na maioria das vezes, são remunerados por comissão, assim, há um incentivo ainda maior para convencer o consumidor a firmar o contrato, não havendo interesse em informar sobre os riscos da contratação. Desta forma, os idosos, por serem hipervulneráveis, são os alvos mais fáceis de serem iludidos e convencidos a adquirir o crédito, especialmente com a omissão de informações necessárias sobre os juros, e por acreditarem que estão contratando os juros mais baixos do mercado, sem ter consciência das consequências que este negócio pode acarretar.

Assim sendo, um dos principais fatores que acarretam o endividamento pessoal é a concessão de crédito fácil. Em razão da falta de dinheiro no momento da compra, os

consumidores recorrem à facilidade do crédito, sem se preocupar com a taxa de juros, seja pela falta de educação financeira, seja pela omissão de informações no momento da contratação. Ao mesmo tempo, as instituições financeiras não fazem questão de alertar sobre os riscos do negócio jurídico, nem de prestar as informações necessárias e imprescindíveis, especialmente sobre as taxas de juros e o período de tempo para pagamento do empréstimo. Com isso, o tomador não tem noção de quanto lhe custará no final, perdendo o controle de sua vida financeira. Todavia, tais práticas são consideradas abusivas e fraudulentas, como veremos no tópico a seguir.

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