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PARTE I O ADMIRÁVEL MUNDO DO EMPREENDEDORISMO

4 CAPÍTULO IV – À PROCURA DA GESTÃO EMPREENDEDORA

4.1 Um tributo à Peter Drucker

4.1.1 Empreendedorismo nas perspectivas de Peter Drucker

A análise do livro “Inovação e Espírito Empreendedor (entrepreneurship): prática e princípios”, de Peter F. Drucker será estruturada em dois momentos e de forma condensada. No primeiro momento, serão expostos os temas centrais trabalhados pelo autor, alguns conceitos e definições da inovação relacionada com o empreendedor; no segundo momento,

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os ensinamentos ou “dicas” do autor que devem ser praticados pelos empreendedores das micro e pequenas empresas.

O autor informa, logo no início do livro, que a inovação é o instrumento específico do ator que empreende. Apenas iniciar um negócio que é feito da mesma maneira ou mesmo procedimento, na visão de Drucker (1986), não é ser um empreendedor. Quem seria então esse homem distinto? Drucker afirma que somente aqueles que criam uma nova satisfação ou uma nova demanda para o consumidor são os verdadeiros empreendedores: criam um novo mercado, um novo cliente, ou seja, alguém que gera algo novo, algo diferente, muda ou altera valor. A empresa empreendedora é aquela que possui características especiais e é uma minoria.

O espírito empreendedor está em qualquer indivíduo ou instituição. A atividade, seja ela puramente econômica (empresa) ou não (organizações sem fins lucrativos), pode ser definida como uma organização empreendedora, desde que apresente algo incomum, algo específico. Nas empresas de pequeno porte, o atendimento rápido e cortês, um produto diferenciado, uma forma de pagamento inusitada, gentileza no trato ou alguma coisa que a distinga das demais são ações dessa natureza.

O político, o cientista, o gerente, o reitor, o prefeito, o professor e demais profissionais podem ser descritos também como empreendedores, quando assumem um papel de inovador. Esses homens bem-sucedidos, qualquer que seja a sua motivação pessoal – dinheiro, poder, curiosidade, desejo de fama ou reconhecimento -, tentam criar valores novos e diferentes e fazem uma contribuição mais produtiva à combinação dos recursos existentes. Tem-se, então, o significado real do empresário (Maculan, 2005).

Drucker (1986) critica a personalidade empreendedora e afirma que as qualidades intrínsecas das pessoas não são as determinantes do sucesso empreendedor e sim o comportamento empreendedor, que exige trabalho árduo, conhecimento profundo do mercado, habilidades e técnicas administrativas. A intuição para o autor existe, mas o que realmente são as bases de uma atividade empresarial profissional são as teorias e os conceitos organizados. O resultado favorável de um estabelecimento que conseguiu êxito – lucro ou sobrevivência – pode ser atribuído ao feliz acaso, mas segundo Drucker, essa situação é

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muitíssimo rara; o que está por trás desses casos é um trabalho sistematizado da inovação e receptividade a mudanças.

A inovação e a mudança fazem parte do mundo empresarial. A inovação tem que ser sistemática, racional e, portanto, consiste em uma busca deliberada e organizada de mudanças. As invenções devem ser uma atividade diária dentro das empresas com um próposito preestabelecido, planejado e estruturado com alto grau de previsibilidade dos resultados almejados e das possibilidades de serem alcançados com retorno financeiro.

As ideias brilhantes, se não contribuirem para o uso prático, uma melhoria nos processos visíveis, um produto que atenda à necessidade do cliente e um retorno favorável (lucro e bem-estar), não passam de invenções. As invenções resultantes de ideias excepcionais só são trasformadas em inovações, quando proporcionam combinações melhores dos recursos, quando criam valor para o cliente, quando o desempenho de um bem é mais significativo, quando introduzem novidades radicais ou incrementais nos produtos e serviços e, por fim, geram lucro para as organizações. Essas sim, são inovações excelentes, e o responsável pela condução dessas situações são os empreendedores exitosos que praticam a inovação sistematicamente (Sarkar, 2010).

A mudança é outro pressuposto do empresário. Somente aquele que busca de forma sistematizada a mudança, reage a ela e a explora como sendo oportunidade é descrito como empreendedor. As mudanças acontecem dentro e fora da organização, e o indivíduo que souber explorar essa oportunidade terá mais chance de obter resultados favoráveis na atividade que desenvolve. O empreendedor tem que estar atento as mudançasque ocorrem no local em que atua, pois as alterações que ocorrem nos ambientes externos – social, demográfico, tecnológico, político, legal, cultural – e nos internos – novas máquinas, procedimentos administrativos, processos técnicos – são possibilidades de oportunidades para seus negócios, afirma António (1986).

O empreendedorismo está em todo lugar, desde estabelecimentos de ensino, escritórios contábeis, centros de saúde, laboratórios de pesquisa etc. A essência desses estabelecimentos é o comprometimento de recursos atuais em expectativas futuras, o que significa incertezas e riscos. Drucker (1986) adverte que qualquer atividade econômica e não

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econômica está inserida numa prática extremamente arriscada, e o ator tem que tomar constantemente decisões num ambiente imprevisível.

O empreendedorismo, a inovação, as mudanças e tomadas de decisões são companheiros inseparáveis no fenômeno empreendedor. As mudanças constantes e cada vez mais rápidas, características da sociedade, são matérias-primas para as inovações. O empreendedorismo envolve a procura dessas inovações e tenta tirar a melhor vantagem disso. O empresário é um tomador de decisão que está envolvida em risco e incerteza.

Os proprietários dos micro e pequenos empreendimentos têm muitas dificuldades nas tomadas de decisões, porque as informações são imperfeitas, os dados só são dados e não revelam o significado qualitativo, a disponibilidade de informações tem um custo elevado e muitas vezes de difícil acesso. Pode-se considerar que empreender é um desafio constante do agente e requer um estado de alerta, sempre.

O livro de Perter F. Drucker é caracterizado por diversas demonstrações do processo inovador. O autor afirma que a inovação deve ser sistemática e fazer parte da cultura organizacional. A pequena empresa deve seguir esse conselho, pois a inovação é uma estratégia a ser seguida, é um adubo gerencial para criar, crescer e manter uma organização. As inovações são de diversos tipos. A mais visível refere-se a tecnologia.

Novidades nos processos, uma engenhosidade no cadastro dos clientes, uma interação maior do fornecedor com o comprador, novas preferências dos consumidores são também alterações oriundas das inovações (Sarkar, 2010) e, portanto, são consideradas inovações. Drucker (1986) assevera que a inovação sistemática significa o monitoramento de “sete fontes” que geram uma oportunidade inovadora.

As primeiras quatro fontes, segundo Ducker, acontecem dentro da própria organização, seja ela pública ou privada, dentro do setor industrial ou de serviços, são visíveis, apresentam sintomas, são confiáveis e são descritas como: o inesperado, a incongruência, a inovação baseada na necessidade do processo e mudanças na estrutura do setor industrial e na estrutura do mercado; já o segundo grupo acontece fora da empresa ou do setor; surgem no ambiente social e são: mudanças demogáficas (mudanças populacionais);

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mudanças em percepção, disposição e significado; conhecimento novo, tanto científico como não-científico.

A primeira fonte de Drucker para inovação está associada ao sucesso, insucesso e acontecimentos externos inesperados. Segundo esse autor, todos esses eventos são fontes de oportunidades. O gestor não está preparado para enfrentar esses desafios. No caso do sucesso alcançado com um aumento de vendas que estava fora do previsível, os empresários não sabem o que fazer, como tomar decisões, como ajustar e como tirar proveito desses “ventos” favoráveis no negócio. A experiência demonstra que casos bem-sucedidos não são fáceis de administrar; exigem diretrizes específicas. O gestor, ciente dessa ocorrência, tem que agir rapidamente, não negligenciar o momento de prosperidade, o sucesso pode ser transformado em problemas.

Drucker (1986: 55) assevera que “um motivo para essa cegueira frente ao sucesso inesperado é que nossos atuais sistemas de informes, como via de regra, não mencionam e muito menos clamam por atenção da administração”. O exemplo bem característico dessa situação: quando há aumento de vendas, um acréscimo de clientes acima da expectativa, um produto dispara no mercado e assim sucessivamente, o empreendedor tem que estar atento ao êxito e não desprezar esses momentos nem gastar energia em procedimentos não estratégicos. A outra fonte de inovação está relacionada com o insucesso inesperado. O indivíduo, quando cria uma empresa ou mesmo estabelecido no mercado, sempre espera um resultado favorável no empreendimento. A realidade empresarial é muito complexa, e o empresário tem que saber lidar com os problemas de fechamento da empresa, perda de cliente, crise econômica, redução dos lucros etc. Esses fatores são sintomas de oportunidades, por incrível que pareca, sublinha Drucker (1986), e não podem ser esquecidos ou negligenciados pelos gestores.

Muitos fracassos são simplesmente decisões tomadas equivocadamente, erros cometidos, muita ganância, participação irrefletida ou incompetência no projeto ou na execução. Os erros empresariais devem ser vistos como uma possibilidade futura de aprender com os problemas. O empresário tem que enfrentá-los e tirar boas lições do ocorrido. Converter os desastres negociais em uma inovação deliberada e eficaz é uma prática nos

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negócios. “O fracasso inesperado exige que o indivíduo saia, olhe à sua volta e escute. O fracasso pode ser sempre considerado um sintoma de uma oportunidade inovadora, e, como tal, deve ser levado a sério”, afirma Drucker (1986: 66).

A última questão acerca do inesperado envolve um evento externo o qual é, também, importante pois ocorre fora das organizações. O ambiente externo muitas vezes contraria a posição das estratégias organizacionais; acontece como um choque não previsto pelos tomadores de decisões. As alterações no ambiente econômico, por exemplo, como aumento de juros imprevistos, redução na concessão de empréstimos, uma nova matéria-prima, preferências dos consumidores modificadas trazem novas condições que devem ser exploradas pelas empresas.

Diante dessa situação acima informada, Drucker adverte que para aproveitar esse momento, o empreendedor tem que ter conhecimento e capacitação no negócio que opera, tem que ter competência especializada e habilidade de mobilizar recursos substanciais, com muita rapidez, para continuar no mercado.

A segunda fonte de inovação chama-se “incongruência” e pode ser interpretada como uma discrepância, uma dissonância, entre o que é e o que “deveria” ser, ou entre o que é e o que se pressupõe ser. As razões da sua existência não são percebidas ou interpretadas pelos empresários, mesmo assim são sintomas de oportunidades. As incongruências podem ser identificadas nas “falhas” latentes que o mercado oferece, e essas falhas são um convite para inovar e não estão nos relatórios empresariais; são mais qualitativas do que quantitivas. O empreendedor tem que estar atento às mudanças que ocorrem no setor, no mercado ou no processo; estas transformações estão diante dos seus olhos.

As espécies de incongruências estão relacionadas entre a realidade econômica, entre a realidade de um setor, entre os esforços de um setor e os valores e as expectativas de seus clientes e, por fim, uma incongruência interna dentro do ritmo ou lógica de um processo. Diversos exemplos podem ser verificados. Drucker (1986) observou o fenômeno do seguro de saúde da Grã-Betanha. O sistema britâncio de saúde estava com dificuldades de atender seus utilizadores: demora, muita espera por uma consulta e precariedade no atendimento ao paciente por uma cirurgia, sem “risco de morte” e que passava anos para serem operados.

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Essa falha no sistema abriu oportunidades para o seguro privado de saúde. O paciente, com necessidade de uma cirurgia eletiva, sem “risco de morte”, era operado de imediato.

O ensinamento gerencial dessas “falhas” pode gerar oportunidades de novos negócios, descobrir “algo” ainda não desenvolvido, soluções simples e pequenas para problemas complexos. O que deveria ser um acontecimento contraditório é, na verdade, fonte de inovação.

Uma situação inusitada poderia assim ser descrita: uma crise sem precedentes atingiu um enorme número de países. Os créditos foram suspensos, os governos reduziram os gastos públicos e a economia está estagnada. O empresário acredita no seu potencial, leva a sério a atividade econômica, dedica tempo integral ao negócio, conhece profundamente o ramo em que atua e decide investir, seja em novos equipamentos, em processos, em novas tecnologias, em plena crise gerenalizada. O que esse empreendedor está a fazer é perceber que, nas incongruências, tipos já especificados acima, surgem opções e alternativas de negócios, uma oportunidade inovadora diferente e com muita chance de sucesso, apesar do momento vulnerável.

A terceira fonte de inovação, segundo Peter Drucker (1986), está na necessidade concreta de alteração de um processo; significa um evento independente do meio ambiente interno ou externo. Inicia-se com o trabalho a ser feito; constituindo-se de um processo já existente e que precisa de melhorias; redesenha uma antiga forma de trabalhar já conhecida; é o “elo que faltava”.

Para os micro e pequenos empreendimentos as inovações que ocorrem nas tarefas podem ser bem-vindas, pois reduzem custos, agilizam as atividades diárias, reduzem o tempo de fabricação ou da prestação do serviço. A inovação praticada gera, enfim, uma maneira mais econômica de fazer o trabalho, a empresa torna-se mais eficiente, aumenta a capacidade produtiva, ou seja, resume-se em descobrir um processo com menos desperdício e mais econômico do que o existente.

A inovação na estrutura de mercado ou na indústria, quarta fonte de inovação, também é uma oportunidade que deve ser apreciada pelas empresas. Nesse caso específico, são as grandes empresas que mais adotam este tipo de inovação. Drucker informa que as estruturas

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industriais e de mercado aparentam solidez e podem existir para sempre; exemplifica as grandes lojas de varejo, a indústria de alumínio e do tabaco, como, na verdade, sendo bastante frágeis, pois, a um pequeno arranhão, elas se desintegram e, para se manterem no mercado, exigem um espírito empreendedor por parte dos representantes do setor.

Os empreendimentos utilizam estratégias de liderar o setor, de diferenciar produtos pela análise do estilo de vida das pessoas, de explorar o potencial de mercado, de agregar benefícios, garantias extras, conforto e qualidade ao consumidor, de serviço de asistência ao cliente final, de novas necessidades e preferências dos indivíduos. Todas essas ações são oportunidades oriundas das mudanças que ocorrem nas estruturas do mercado e da indústria e podem funcionar bem; outras vezes, razoavelmente bem. Drucker orienta os empresários para aproveitarem esses procedimentos e ao tempo em que alerta para eventuais fracassos porque as decisões e as escolhas são difíceis de serem tomadas.

As micro e as pequenas empresas podem apropriar-se dessas ideias, adaptá-las e incorporá-las ao quotidiano dos objetivos empresariais. De modo geral, alguns procedimentos podem ser feitos por essas empresas, como: oferecer produtos singulares para um nicho de mercado, ter um atendimento diferenciado aos clientes, identificar um mercado em crescimento e disponibilizar bens ou serviços de um setor específico, dar uma assistência personalizada aos usuários, criar comodidade e facilidades aos clientes.

As fontes de inovação traçadas por Drucker (1986) e externas às organizações são: mudanças demográficas, mudanças em percepção e conhecimento novo, as quais ocorrem no meio social, filosófico, político e intelectual. O crescimento populacional, estrutura etária, composição, emprego, nível de educação e renda podem criar possibilidade de negócios e fazem parte desse contexto. Como exemplo, Drucker, explica que a população mundial está a aumentar e, com isso, gera demanda por produtos e serviços inovadores. A questão da pessoa querer ter uma vida saudável cria um sem-número de novos empreendimentos e inovações ligados a alimentos orgânicos. A esperança de vida das pessoas está a aumentar, tanto nos países desenvolvidos como nos países emergentes, o que leva o empreendedor a descobrir novas e infinitas oportunidades nesse mercado específico.

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As mudanças na percepção do humor e de sentido são fontes de oportunidades inovadoras. Elas desenvolvem-se quando os pressupostos gerais da sociedade, atitudes e crenças são alterados. Eis um exempo significativo: em 1970, a mulher começou a fazer parte do mercado de trabalho e a competir igualmente com o homem. Nesse cenário, a mulher é detentora de renda, novos gostos, preferências e, com isso, tem necessidades e desejos a serem satisfeitos. O empreendedor, sempre alerta, percebe que essa situação é um convite à inovação e vai ofertar “algo” que atenda essas novas demandas, como exemplo, refeições rápidas.

A última fonte de inovação está caracterizada pelo conhecimento. Peter Drucker diz que qualquer tipo de conhecimento científico ou social é gerador de inovação. Assevera, ainda, que esse tipo de inovação tem muito risco envolvido; é imprevisível, e a chance de sobrevivência é menor, desde a má qualidade na gestão (inovação social) até a tecnológica, quando da oferta de um bem/serviço não é aceito pelos consumidores. Nesse modelo, podem fazer parte as alterações de cunho social, técnico, econômico.

Para encerrar o debate do pensamento de Peter F. Drucker, far-se-á um comentário da empresa empreendedora, da administração empreendedora e, por fim, da sociedade empreendedora que tanto o autor defendeu nos seus postulados teóricos e também nas evidências práticas.