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Por fim, uma das obras mais polêmicas de todo o conjunto de intervenções do chamado “legado” da Copa do Mundo 2014 em Natal é a obra de reestruturação da Av. Engenheiro Roberto Freire, Zona Sul da cidade. Em 2009, quando da definição das obras viárias necessárias à adequação ao megaevento, o governo Estadual determinou esta avenida como estratégica, no sentido de ligar a Via Costeira (localização de maior parte da rede hoteleira da cidade) com o estádio Arena das Dunas.

O projeto original previa a supressão de alguns semáforos por meio de túneis e adequação viária, a um custo aproximado de R$ 40 milhões. Mas com a mudança de gestão, em 2011, tal projeto foi redefinido e ampliado, envolvendo um conjunto de obras viárias e de engenharia com exigência de área e redefi- nição de acessos – a custo que ultrapassou os R$ 220 milhões. Como o governo Estadual não possuía tais recursos, solicitou à Assembleia Legislativa do RN a liberação para contratação de crédito (empréstimos); para tanto, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) ampliou a capacidade de crédito do Governo do estado em R$ 648 milhões, capacitando-o a investir em duas obras de mobilidade para Copa do Mundo 2014, envolvendo tanto transformação da Av. Engenheiro Roberto Freire em via expressa quanto na construção dos acessos ao novo Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante. Desse modo, em 2012, o projeto modificado de reestruturação da Av. Roberto Freire é incluído na MR sob a responsabilidade do Governo do Estado, com o custo cinco vezes maior do que o previsto no projeto inicial.

A proposta desse novo projeto, desenvolvido pelo Governo do RN, consiste na transformação da avenida em uma via expressa com 4,1km de extensão, dotada de doze faixas – o dobro das existentes no traçado atual, construção de trechos em ciclovias, além de um corredor exclusivo para ônibus. Para evitar o congestionamento no início da avenida, o projeto prevê outra ampliação do viaduto de Ponta Negra – já ampliado e modificado em 2007. Desse modo, a justificativa do governo ao projeto aposta no aumento de velocidade dos veículos automotivos e na capacidade de maior carga viária, por meio de maior área útil de faixas. Para tanto, outras áreas nas margens necessitarão ser desapropriadas para o alargamento de trechos da avenida.

Assim, o projeto de reestruturação da Av. Engenheiro Roberto Freire visa adentrar, no seu ponto máximo, 30 metros da Zona de Proteção Ambiental 02 (Parque das Dunas5), área sob

o domínio do Exército Brasileiro e protegida ambientalmente por leis estaduais e municipais.

Mesmo com tal proteção legal e domínio (público), o governo Estadual atuou de forma a garantir a apropriação de parte da ZPA 02, mesmo sem o Estudo de Impacto Ambiental concluído. Conforme Yuno Silva (2012), é relatado no Boletim do Exército nº 27, de 06 de julho de 2012, que a área com intenção de ser cedida pelo Comando do Exército no RN é de 35 mil metros quadrados (na margem direita da avenida, sentido Ponta Negra - BR 101) do Campo de Instrução do bairro de Capim Macio. Entretanto, no Boletim é mencionado apenas a forma de negociação da cessão de área com o Governo. De acordo com o documento, o Estado terá como medida compensatória pelo uso do bem o compromisso de realizar obras de interesse do Comando do Exército e terá dois anos para cumprir a finalidade prevista e atender às exigências ambientais. Ou seja, antes mesmo da formalização dos estudos urbanísticos e ambien- tais, o Governo do RN e o Comando do Exército já iniciaram

procedimentos administrativos visando a futura cessão da área para os projetos viários.

Em contrapartida a essa intervenção, na primeira audi- ência pública realizada no segundo semestre de 2012, o Comitê Popular da Copa (CPC) colocou fortes críticas à condução da obra como a baixa transparência dos detalhes do projeto e ausência dos estudos de impacto, assim como o confronto a legislação ambiental e ao Plano Diretor de Natal (Lei Complementar nº 082, 21 de junho de 2007); a ausência de discussões abertas junto ao Conselho Municipal de Planejamento e ao Conselho Municipal de Trânsito e Transportes. A principal argumentação do CPC, nesse caso, é o desconhecimento do projeto por parte da população, impossibilitando que a comunidade avalie os possíveis impactos e ofereça sugestões de alterações, como foi o caso da APAC na Av. Capitão-Mor Gouveia.

Não obtendo sucesso nessas audiências, o CPC e a APAC solicitam a suspensão de todo o processo de reestruturação da avenida, devido aos possíveis impactos ambientais, sociais e econômicos provocados pela obra, assim como apresentação de justificativas sobre a real necessidade desse tipo de inter- venção à mobilidade da área como um todo (SILVA, 2012). Desse modo, passa também a atuar o Ministério Público por meio do Grupo Espacial de Acompanhamento das Obras e Atividades Relacionadas à Copa do Mundo 2014 que é formado por diversas promotorias que tratam das questões ambientais e urbanísticas ligadas ao megaevento. Ainda segundo Yuno Silva (2012), o Ministério Público avaliaria todos os detalhes contemplados na obra, a partir dos estudos de impacto ambiental. Entretanto, os estudos, ainda se encontram em fase de elaboração desde 2012.

Devido a tais questionamentos, a indefinição dos projetos e a dificuldade em obtenção dos recursos, o governo do RN decide solicitar ao Governo Federal a retirada desse projeto da MR e sua inserção no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Mobilidade, ao final de 2012. O objetivo de tal manobra foi

garantir a aplicação do Regime Diferenciado de Contratações e a manutenção do financiamento, sem comprometer os acordos para Copa do Mundo 2014. Desse modo, a MR para Natal é modi- ficada com o objetivo do não comprometimento do quadro de exigências do Comitê Organizador Local e do Governo Federal, tanto em termos de prazo quanto também de recursos, pois, embora retirado da MR, tal projeto continuou sendo anunciado como “legado” à cidade, relacionado à Copa do Mundo 2014.

Ainda em 2013, o governo estadual (Secretaria de Infraestrutura e DER) continuou empreendendo esforços no sentido do início das obras, por meio do uso da RDC para con- tratação da empresa Thenge Engenharia Ltda para realizar os estudos topográficos, de tráfego e hidrológicos da área de intervenção6; e para a homologação do processo licitatório para

a contratação da empresa vencedora Galvão Engenharia S/A, que ficará responsável pela execução do projeto7.

Até meados de 2014, ocorreram alterações no orçamento previsto da obra passando de R$ 221,70 milhões para quase R$ 260 milhões. Além disso, não foi definida a data de início das obras, já que depende tanto da aquisição do financiamento através do Tesouro Nacional, quanto da Caixa Econômica Federal. Pendente ainda, neste período, a obtenção da licença ambiental de instalação, cujo processo corria de forma compartilhada entre SEMURB e IDEMA e que só será obtida após a conclusão do EIA-RIMA e realização de audiência pública.