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Natal recebe uma Copa do Mundo: bons ventos? O objetivo deste trabalho é avaliar os possíveis impactos

dos investimentos relacionados à Copa do Mundo de 2014 sobre a dinâmica do setor turístico em Natal/RN. Focamos, particu- larmente, nos processos de concentração e desconcentração de investimentos, e na atração de novos equipamentos turísticos para a cidade-sede, bem como na governança desenvolvida entre os atores políticos do setor turístico na preparação para o megaevento.

O estudo procurou estabelecer uma linha de base con- siderando os projetos e intervenções urbanas ligadas ao setor turístico, nos quatro últimos anos de preparação para a Copa do Mundo em Natal (2009-2013). Assim, procurou-se trabalhar com foco em dois resultados esperados: a) a análise do desempenho do setor turístico e equipamentos previstos na cidade-sede (2009-2013), com ênfase na sustentabilidade dos investimentos realizados, impactos sociais e econômicos sobre o setor turístico; b) a análise da governança no setor turístico, verificando a percepção dos agentes políticos (governos) e agentes privados (hotelaria) e os efeitos das intervenções urbanas na dinâmica local, tendo por referência os princípios de integração e justiça social.

Nesse caso, partimos da hipótese geral de que a Copa do Mundo 2014 expressa um projeto urbano de reestruturação da cidade, envolvendo em suas linhas específicas o turismo como elemento-chave. Para além do evento esportivo em si mesmo, o que está em jogo, portanto, é a projeção da cidade como atratividade em um cenário de competitividade e atração de novos negócios (turísticos e imobiliários), onde o discurso em torno da viabilidade econômica do megaevento é acionado para legitimar um conjunto de ações propostas.

Tal hipótese geral, entretanto, sofre alterações ao obser- varmos de perto o comportamento dos agentes e processos

diretamente ligados ao setor turístico, em grande parte devido a sua estruturação interna em Natal. O setor público e o setor privado realizaram alguma coalizão pró-crescimento do setor, agindo de modo integrado e articulado? Ou as ações foram desencontradas, permeadas pelo conflito? As especificidades locais são mediadoras importantes que podem nos ajudar a compreender tais questionamentos.

Em Natal, podemos destacar a atuação do setor turístico estruturado fortemente pela imagem de um destino sol e mar, concentrando sua rede hoteleira e infraestrutura turística na orla marítima. Os primeiros hotéis da cidade estavam locali- zados nas áreas centrais (afastadas da orla), mas deixaram de existir nos anos de 1990 sob o efeito da consolidação da Via Costeira, uma rodovia estadual construída à margem de praias urbanas na região Sul da cidade e destinada à implantação de um complexo de hotéis. A Via Costeira tornou Natal extrema- mente competitiva em escala regional, nacional e até mesmo internacional em termos de modernização da rede hoteleira nos últimos anos, pois ligou o atrativo ao produto turístico de modo físico territorial criando, assim, uma zona praticamente exclusiva ao setor.

Com a decisão de relocar o Aeroporto Internacional para o município de São Gonçalo do Amarante (concluído em junho de 2014), criou-se um novo eixo de deslocamento para os recep- tivos, agora com parte do trajeto passando pela região Norte da cidade – área urbana historicamente ocupada por população e conjuntos habitacionais de baixa renda. Como terceira caracte- rística recente está a intensa valorização imobiliária por qual a cidade tem passado, principalmente, nos bairros da região Sul e Leste. Tal valorização foi, em parte, estimulada pelo boom turístico e imobiliário que Natal enfrentou entre os anos de 2003 e 2008, quando estrangeiros passaram a investir fortemente na aquisição e construção de unidades para segundas residências (SILVA, 2010).

Mesmo após a crise financeira internacional, em 2008, parte dessa valorização imobiliária se manteve em bairros de classe média e alta, principalmente em Lagoa Nova – no entorno do estádio Arena das Dunas. Tais fatores associados configuram uma situação local, cuja ênfase em novos empre- endimentos turísticos também está associada a uma disputa do território por usos de melhor localização e rentabilidade pelo setor imobiliário.

No que se refere à infraestrutura, as intervenções locais de ampliação da capacidade hoteleira se deram através de empréstimos de bancos públicos para a construções de novos hotéis na região do entorno do novo estádio Arena das Dunas por parte de empresários imobiliários já estabelecidos na cidade. Natal, dentre as cidades-sede da Copa do Mundo, possui uma das maiores ofertas de leitos hoteleiros do país, aproximada- mente 26 mil. Daí surge algumas questões que interessam a ampliação da oferta hoteleira da cidade-sede: Mas qual era o grau de expectativa do setor turístico para o megaevento Copa do Mundo 2014? E qual a base de crescimento que se esperava ultrapassar?

Considerando a Figura 1, é possível visualizar a diferença entre o fluxo do movimento aeroviário doméstico e internacio- nal para Natal entre 2006 e 2013. O movimento de passageiros em voos domésticos regulares no aeroporto de Natal aumentou de 1 milhão de passageiros em 2006 (antes da escolha da cidade-sede Copa do Mundo) para 2,5 milhões no ano de 2012. Somente a partir de 2013, é que começa uma pequena inflexão no fluxo de passageiros domésticos. Uma das causas apontadas pelo aumento no fluxo aeroviário doméstico nos últimos anos relaciona- se, entre outros fatores, às políticas de incentivo ao turismo regional induzida pelo Governo Federal mais recentemente, aliado a uma estratégia comercial de redução de tarifas pelas companhias aéreas com pacotes mais atrativos para a classe média em expansão no país e em condições de fazer turismo,

utilizando para isso o transporte aéreo. Trata-se, portanto, de uma consequência da expansão do turismo em âmbito nacional mais do que propriamente um resultado de estratégias locais. O movimento de passageiros nos voos regulares inter- nacionais, por outro lado, apresentou menor variação em anos recentes, se comparado ao movimento dos voos domésticos. No ano de 2006, o movimento de passageiros em voos regulares era de 73 mil passageiros por ano passando para 80 mil em 2008. Desde então ocorreu uma queda no movimento de passageiros em voos internacionais, relacionada à crise econômica que afetou o sistema financeiro global, com impacto sobre o mercado de viagens, as companhias aéreas e ao setor como um todo nos anos posteriores.

Percebeu-se no ano de 2010 a 2011 uma reação do setor, em parte pela recuperação do movimento de passageiros em voos internacionais e pela atração de eventos internacionais e novos investimentos ao estado, chegando à ordem de 100 mil passageiros/ano no Aeroporto Internacional Augusto Severo, em 2011. Entretanto, as constantes instabilidades econômicas advindas de países europeus – principais emissores interna- cionais ao RN – trouxe mais uma vez a queda nesses números, levando que 2013 apresentassem os mesmos patamares de 2007 – aproximadamente 80 mil passageiros/ano.

Outra forma de medir o fluxo de visitantes que utilizam o meio aeroportuário pode ser vista pelos voos não regulares, isto é, pelos voos charters e executivos (Figura 3). Em relação a estes, houve uma queda no fluxo de visitantes desde o ano de 2006, quando Natal registrou 176 mil passageiros internacionais e 194 mil domésticos; e em 2012 foram apenas 20 mil passageiros internacionais e 36 mil domésticos (INFRAERO, 2012).

FIGURAS 1 e 2 – Natal: Movimento anual